Era noite caída sem estrela nenhuma, a neve chegava pouca e sem pressa, apenas por estar. Pequenos flocos enfeitando, vento calmo soprando os galhos secos e retorcidos das árvores sem nenhuma folha. Folhas secas mortas debaixo da camada grossa de neve, filhas do outono, silenciosas. Era lua nova, como se não bastasse a falta de luz das estrelas. Na escuridão, era difícil discernir com certeza a cor das paredes da casinha, que de dia eram sem dúvida nenhuma cor-de-rosa. Lá dentro, onde costumavam guardar as noites de amores rolando na cama de solteiro ou no chão, não havia vestígio desse calor. Nenhuma esperança de beijo. O clima que era leve estava pesado e sufocante, cheio de gritos e pés batendo. Fazia muito tempo que Feliks não via Toris tão furioso.

Você está maluco?! Não me ouviu quando pedi para não me seguir?! Feliks, por muito pouco nós dois não morremos! — exclamou, andando de um lado para o outro, puxando a raiz do cabelo. — Aliás, não sei como de qualquer jeito eu não morri do coração! Você tem ideia da merda que quase se meteu?

Feliks estava apoiado com os cotovelos no balcão, fazendo biquinho e revirando os olhos por quase dez minutos já. Não importa quantas vezes explicasse, parecia que Toris pela primeira vez era o teimoso da história.

— Eu fiz isso porque você estava, tipo, muito estranho! Como quer que eu não me preocupe?! — repetiu pela sexta vez o mesmo discurso, colocando as mãos na cintura e unindo as sobrancelhas.

— Porque eu te disse para não se preocupar! É tão difícil assim me ouvir?!

Feliks arregalou os olhos, se soltando de vez no balcão.

Ainda bem que eu não te ouvi! — vociferou, igualmente furioso. — Tudo naquele lugar é doentinho, Liet! Doentio!

— Isso é problema meu. — sussurrou com rigidez, estreitando os olhos.

— Eu decido o que é ou não meu problema, e no caso, é sim, porque você está fazendo meu cabelo cair de estresse!

— Porque você se preocupa demais com o que não tem nada a ver com você! Eu sei o que é melhor pra minha vida!

— Obviamente não sabe!

Caiu um silêncio de ultraje de ambas as partes ao prenderem a respiração por um instante. Os olhares trocados tinham ira e gritavam por si só. Claro que toda a raiva era fruto de uma preocupação intensa, pois o zelo pela vida um do outro se tornava cada vez mais difícil. Toris tinha consciência de que seria muito complicado continuarem agora que a verdade tinha se revelado.

— Por que você não foge daquela merda de lugar de uma vez?! — Feliks continuou, sem se preocupar em controlar a voz de escárnio. — Só tem homens gigantes espancando pessoas no porão, grande coisa!

— Eu não posso fugir...

— Pode sim! Você vem pra cá todas as noites, quem disse que precisa voltar?! Até parece que é tão difícil. — revirou os olhos, cruzando os braços.

Toris de um suspiro pesado, massageando a ponte do nariz. Não sabia com mais como explicar.

— Ah, é, lembrei! — prossegui Feliks, com um sorriso ainda mais indignado. — Você ainda vem me dizer... Que não vai embora porque não quer!

— Você entendeu errado... — respondeu em tom baixo, porque sabia que não era totalmente verdade e os olhos de Feliks estavam realmente o intimidando.

— Quer dizer, — fingiu que não tinha ouvido nada. — Você poderia ter simplesmente colocado fogo e deixado tudo pra trás, mas não... Você tinha que levar uma surra e aparecer aqui em casa.

Seu discurso era o mesmo dos rebeldes da cozinha, que de uma forma ou outra, eram culpados pelo porão. Toris imaginou que, se Feliks fosse um morador da casa, debateriam constantemente em lados opostos, com muito mais fervor que as discussões comuns.

— Apanhei por já ter tentando fugir antes... — defendeu-se, sabendo que não adiantaria muita coisa.

Feliks não pareceu nem um pouco impressionado.

— Mesmo assim! Você não tinha que ir falar com aquele maldito pra ver se ele estava bem! Se a irmã dele fugiu, foi por um ótimo motivo com certeza! — achou melhor não mencionar que conhecia Katyusha e Natália. Se Toris tinha segredos, ele também poderia ter os seus. — Um monstro daqueles tinha que estar na cadeia, não batendo no meu namorado!

Toris se sentiu estremecer com a palavra monstro. Parou um segundo para se certificar que era aquilo mesmo. Não era surpresa que essa fosse a impressão de Feliks sobre Ivan, mas ele não o conhecia, não sabia de nada sobre sua vida. Odiava quando pessoas assim o julgavam. Dentro da casa, fora suas irmãs, Toris era o único que realmente conhecia todas as faces de Ivan, o suficiente para saber.

— Ele não é um monstro, Feliks, ele é só uma criança!

Seu berro pareceu congelar no tempo, condensando o ar. Veio com uma convicção e certeza que nenhuma outra fala já tinha tido. Feliks também congelou no lugar, completamente pasmo ao encará-lo. Toris não sabia ler o que sua expressão dizia, se era compreensão, raiva, pena. No final, se desfez em incredulidade. Feliks pegou um copo vazio em cima do balcão da cozinha e jogou no chão, fazendo com que ele se desfizesse em milhares de pedaços. Antes que Toris pudesse compreender o que tinha feito, o barulho estridente do vidro acordou seu subconsciente, trazendo à tona a noite no porão, o som das garrafas de vodca em suas costas, os cacos rasgando seu caminho para dentro da carne. Involuntariamente, ele se contorceu e estremeceu por um instante, sentindo a sensação de volta. Mas, no segundo seguinte quando abriu os olhos, não viu as paredes de concreto, mas os olhos irritados e insensíveis de Feliks.

— Por acaso preciso te lembrar do que essa “criança” fez com você?

Toris relaxou o corpo, de volta à realidade. Aquele tipo de reação era normal quando recebia punições, provavelmente estremeceria com vidro quebrando por um bom tempo. Mas a tentativa de Feliks de fragilizá-lo não mudou sua visão.

— Não. Mas ele teve seus motivos.

— Caralho, Toris, quando você vai parar de se colocar como culpado de tudo?! — berrou, jogando os braços para cima. — Sinceramente, eu to achando que você tá defendendo esse cara demais!

Ele estava. Estava e sabia que estava, era comum. Já tinha visto aquele olhar de suspeita inúmeras vezes no casarão, sempre que defendia Ivan. Todos pareciam não ver nele alguma coisa que só Toris via.

— Eu sei. — para sua surpresa, concordou com indiferença. — Eu conheço ele, sei o que ele faz ou deixa de fazer por mal.

Claro que Feliks não gostou da resposta. Enrijeceu a postura, estalando a língua.

— Você me disse que ele te obrigou a morar naquele lugar... — começou, suave e desconfiado, a tentar colocar Toris em cheque. — Mas diz que não vai fugir porque não quer deixá-lo, o cara que te espancou e te prendeu... Francamente, Toris, faz parecer que você quis ser levado e espancado esse tempo todo...

Toris recuou com a cabeça.

— Não acredito que você realmente pensa assim.

— Mas parece que é o que? Me conta logo, por que você se importa tanto com esse cara?

— Temos uma promessa, já te contei...

— Sim, uma promessa de criança! — interrompeu. — Caramba, qual é a mania de vocês com promessas de criança?! Se fosse só isso, você já teria fugido, eu sei. Fala a verdade. Ou eu vou descobri-la sozinho.

A mensagem em seu olhar era clara: Se não contasse, Feliks voltaria ao casarão, nem que precisasse perguntar a Ivan em pessoa. Era suicídio, mas com sua teimosia era bem possível que fosse até o final. O coração de Toris se apertou. Não podia deixar isso acontecer, a ideia de perder Feliks já era dona de seus pesadelos. Por mais que andassem brigando muito e as coisas não estivessem exatamente perfeitas entre eles, ele ainda o amava.

Desistiu, soltando os ombros num suspiro de cansaço. Não sabia nem como começar a explicar. Se virou de costas, tentando organizar os pensamentos longe dos olhos julgadores de Feliks. Sentiu os olhos ardendo, tal era o medo de falar aquilo em voz alta e ver a reação dele. Inspirou o ar até encher os pulmões e abriu a boca para deixar as palavras saírem. Se pensasse demais, acabaria desistindo.

— Eu e Ivan já tivemos um caso...

O silêncio de Feliks foi como vidro se quebrando no chão outra vez. Agora sim, estava verdadeiramente pasmo, sem reação, apenas com os olhos arregalados implorando que prosseguisse.

— F-foi a muito tempo atrás, eu juro... — tentou se justificar, virando-se novamente. — E não significa mais nada... Mas de um jeito ou de outro, — abaixou o olhar, vermelho. — Eu acabo me importando com ele.

Como esperava, Feliks estava horrorizado. Parecia prestes a expulsá-lo, ou fugir pra longe. Na busca por encaixar as peças, ficou de costas, apoiando os cotovelos no balcão. Não era questão de ciúme, apenas o peso da sensação de que Toris sempre parecia buscar as pessoas erradas.

— Entendo... — murmurou cheio de angústia, mordendo o lábio inferior tremido. — Bem, que seja, eu não tenho nada a ver com o que você faz ou deixa de fazer quando está aqui, não é como se fosse nada sério... — sua voz também era tremida, saindo dolorosa entre o gigante nó que se formava na garganta, se forçando a aceitar o novo fato. — Quer dizer, você tem o direito de dormir com quem quiser, por mais que essa pessoa seja um cara doido que parece que quer te matar...

— N-não é assim... — Toris gaguejou, percebendo que ele tinha entendido tudo errado.

— Mas sinceramente, Liet, eu não quero ficar competindo por seu amor com esse cara em nenhum triângulo amoroso, então...

— Não é um triângulo amoroso. — interrompeu, se aproximando e envolvendo com os braços. — Nunca foi, não é uma competição... Você é o único que eu quero.

— Pois parece que você está sempre escolhendo ele... — voltou-se para frentes, antes de afastar seus braços. — Eu não consigo entender como você pode ficar com cara desses nem por um minuto! Ele te forçava a isso ou o que?

Toris engoliu em seco, pois detestava se lembrar daqueles tempos. Detestava lembrar não só porque era ingênuo e porque traíra todos os seus valores na época, mas também porque não era de tudo ruim. As pessoas tendiam a achar que era forçado ou fazia por interesse, mas não. Ivan era capaz sim de amar e se importar com uma pessoa, se ela soubesse como retribuir. Mas sentimentos não duram para sempre e quando eles pararam de encontrar, foi desaparecendo. Mas graças àqueles dias, Toris conhecia faces de Ivan que ninguém mais conhecia. Era difícil definir aqueles tempos como somente bons ou ruins.

— N-não era nada disso... — gaguejou, identificando para onde o raciocínio de Feliks levava. — Era perfeitamente consensual... Eu acho.

— Como assim você “acha”? — a cada palavra, Feliks parecia ficar mais irritado. Como esperado de Toris, nem ele conseguia saber se tinham se aproveitado dele ou não.

— Eu não quero ficar falando sobre isso... Já te disse o que você queria saber, é por isso que eu me importo com ele. Eu não tenho mais nada com ele faz muitos anos, muito antes de eu te encontrar de novo.

Não conseguiu evitar de se lembrar do porão, do beijo repentino na escápula, no carinho no rosto, de como ele o segurou firme, antes de, é claro, enfiar as unhas na sua carne e ficar feliz com seus gritos. Aquilo contava como alguma coisa...? Não é como se tivesse sido relevante, menos ainda consensual. Mas sinceramente, ficava surpreso de Ivan não ter procurado por ele agora que Natália estava trancada no quarto. Ela que tinha proibido os dois de se verem quando tudo começou. Mas não importava, não teria aceitado e não faria isso com Feliks.

— Eu não gosto nada de saber que você ainda mora com esse cara. — rosnou, apertando as unhas nos próprios braços cruzados, parecendo ler sua mente. — Não que eu esteja com ciúmes, isso é sobre sua saúde. Eu não quero que, tipo, você continue naquela casa de loucos.

Toris deu um suspiro pesado, se afastando. Feliks não entenderia, só conseguia ver as coisas do próprio ponto de vista. Não entendia que precisava ficar, por Ivan, por Eduard e Raivis e todos os moradores. E mesmo que fugisse, as chances de não ser encontrado logo em seguida eram mínimas, então seria mandado para a Sibéria e morreria de frio, muito provavelmente. Preferia morrer no casarão, ao lado da casa de Feliks, tentando ajudar Ivan, sendo exemplo para aqueles que precisavam. Sua vida não estava tão ruim assim, tudo ficaria bem quando Ivan se acalmasse.

Mas mesmo assim, Feliks insistia em querer dizer o que era melhor para ele, como se já não bastasse as ordens no casarão. Se achava no direito de colocar condições quanta a ir para a casa dele ou não, como se tivesse a menor noção do que ele passava ou das pessoas com que convivia. Desde criança, Feliks continuava aquele mandão egoísta que se achava rei alguma coisa.

— Eu não vou sair de lá, desculpa. Você não tem poder de decidir isso por mim.

Feliks não ficou nada feliz com a resposta, afastou-se um pouco mais. Sua expressão era nebulosa, como ficava quando era contrariado em temas mais sérios. Mas Toris não se intimidou, não deixaria ele pensar que mandava na sua vida daquele jeito.

— Como você quer que eu fique aqui parado sabendo do que está acontecendo?

— Sabendo que eu sei cuidar de mim mesmo e que vai ficar tudo bem.

Aquilo deixou Feliks furioso, realmente furioso. Aquilo tudo só estava acontecendo porque Toris era incapaz de se cuidar sozinho, incapaz de colocar sua sobrevivência acima dos caprichos dos outros. Se estivesse em seu lugar, teria usado aquela porcaria de caso para meter uma faca no pescoço de Ivan e se livrar daquela vida de uma vez por todas antes de chegarem àquele ponto. Mas ele era bonzinho demais e, oh, “ele era só uma criança, coitadinho, eu transava com ele então não posso ir embora.” Besteira, besteira e mais besteira.

Feliks não entendia pessoas que não lutavam por sua liberdade, que não se levantavam pelo que acreditavam, que deixavam ser usadas aquela maneira. Toris dizia que ficava por vontade própria, mas não acreditava. Estava sendo manipulado. Quando ele e Feliks começaram a se encontrar, ele dizia o quanto queria poder ficar lá e que não queria ir embora nunca, reforçava esse desejo todas as noites. O novo discurso não o enganava nem um pouco.

— Você não sabe se cuidar! — exclamou, cortando o diálogo que estava começando a se acalmar. — Por isso que as pessoas ficam mandando em você de todos os lados!

— Não fale comigo como se eu fosse uma criança...! — protestou.

— Mas aparentemente aquele psicopata é uma, não é?! — dessa vez, sua exclamação virou um berro do fundo da garganta, que poderia facilmente ser ouvido por alguém que passava por perto. Feliks estava cheio de todas aquelas desculpas. — Porra, Toris, para de ser tão ingênuo!

Ele gritou a última frase levantando com velocidade e força o braço no ar, para enfatizar com o gesto sua raiva. Toris conhecia movimentos assim. Quando viu o braço voando, na mesma hora cruzou os punhos na frente do rosto para se proteger, dobrando os joelhos para absorver o impacto e fechando os olhos, tudo por um instinto que já tinha feito aquilo demais. Foi tudo uma questão de segundos, mas mudou toda uma perspectiva. Feliks respirou fundo e abaixou os braços devagar, para tocar os punhos levantados de Toris e os tirar do rosto ainda apertado de antecipação.

— Você achou mesmo que eu ia te machucar?

Só então Toris entendeu o que tinha acontecido e relaxou a postura também. Por um momento, pareceu sim que levaria um soco ou um tapa, como os vários que levou no porão e na vida toda. Como o copo a se desfazer no chão, aquele gesto levava seu subconsciente direto para aquele dia. Mas quando abriu os olhos, novamente estava na sala de Feliks, e ele estava encarando seu rosto com uma expressão perdida. Feliks não era Ivan.

— D-desculpa... — balbuciou sem jeito, mas com a defesa ainda armada.

— Toris, eu nunca vou machucar você. — ele estava muito sério, mas era uma seriedade incrédula, um pouco ofendida, mas também cheia de preocupação.

— E-eu sei... — arrumou a postura e ajeitou o cabelo, desejando voltar no tempo para concertar aquela reação. — Desculpa...

— Entende porque eu não gosto de te ver assim?

Os olhos dele, com o brilho tremendo na íris, que parecia mais profunda do que nunca. Doía vê-lo assim, era como se alguém apertasse seu coração dentro do peito até se desfazer em pó.

Toris suspirou, soltando os ombros. Entender entendia, mas não tinha muito que fazer. Não iria abandonar o casarão, muito menos agora que Ivan estava sem as irmãs. Caso elas ainda estivessem lá, poderia até considerar ir embora, sabendo que não causaria grandes estragos, mas não era mais o caso. Se Ivan perdesse mais alguém, sabe-se lá o que aconteceria com ele.

Detestava ver Feliks se preocupando, mas também não o obedeceria para evitar. Não tinha muita saída, e se ele mandasse escolher, Toris escolheria ficar no casarão. Até porque, como se não bastasse todos os outros “porquês”, se ficasse com Feliks onde quer que fosse e Ivan o encontrasse, não sabia o que seria capaz de fazer com ele. Para todas as direções, as circunstâncias pareciam ordená-lo a manter as coisas como estavam.

Fitando novamente o rosto de Feliks, se viu de repente exausto de discutir. Se perguntava onde tinha parado a magia da casa cor-de-rosa, seu antro de felicidade e paz. Claro, tudo tinha sido destruído quando correu para lá com feridas abertas, destruindo o que segurava dentro a mágica: a ignorância. Agora que Feliks já sabia, nunca voltariam a ser como antes.

— Cansei de brigar... — grunhiu, cobrindo o rosto com uma mão, pois a dor de cabeça que já estava pareceu pesar dez vezes mais de repente. — Eu to exausto. Assunto encerrado.

Dito isso, caminhou para a cama antes que ele pudesse protestar e se ajeitou debaixo dos cobertores, querendo apagar aquela noite da mente. Ou melhor, queria voltar no tempo. Queria abrir os olhos e estar na primeira noite na casa cor-de-rosa, perdido em algum canto dos beijos de Feliks, sem saber o que o futuro reservava.

Ele, ainda parado no meio da sala, também já estava sem energia. Não importa o quanto falasse, Toris não estava disposto a ouvi-lo e mudar de ideia, então toda a argumentação se tornava ainda mais cansativa. Frustrado com o resultado da conversa, apenas o observou o caminho do outro até sua cama, sem se mexer, apenas relaxar o corpo e tentar espantar a dor de cabeça que também tinha.

Cada um num canto parecia frio demais, distante demais. Erguendo os braços para fora do cobertor, Toris fez sinal para que Feliks se juntasse a ele, acompanhado de um gemido desconfortável por estar sozinho. Derrotado, Feliks foi, ocupou o espaço esvaziado e selou o abraço oferecido, trazendo a cabeça de Toris em seu peito. Já tinham brigado antes, mas aquele era o fim da primeira briga de verdade como um casal.

— Feliks... — Toris sussurrou, liberando sua respiração quente contra o corpo quente e o coração audível de Feliks. — Você ainda me ama?

A dúvida era genuína, pois desde que se declararam, alguns dias antes, tudo parecia acontecer conspirando contra a continuidade desse amor. Se continuassem assim, Toris temia que até as borboletas pudessem sumir.

— Claro... — a resposta veio igualmente sussurrada, com uma caricia em seus cabelos compridos, mas com um resquício de incerteza, talvez de insegurança. Talvez medo do futuro. — Mais a cada dia.

Toris pensou em pedir desculpas, pensou em retribuir ou dizer qualquer coisas, mas só suspirou e afundou mais os dedos em suas costas. Fechando os olhos, ele tentou dormir, desejando que a noite toda tivesse sido apenas os últimos minutos.