Eu tinha duas opções:

Opção número um: ir até a delegacia da cidade e dizer tudo o que aconteceu na noite passada, talvez meu depoimento fosse muito, muito importante.

Opção número dois: Eu poderia ficar calada e deixar que a polícia investigasse tudo, porque se eu abrisse meu bico, poderia correr mais perigo do que estou correndo.

Optei pela primeira, mesmo que me causasse danos, mas eu não poderia guardar uma coisa importante dentro de mim. E claro, havia uma vantagem nessa primeira opção também. Se eu corresse risco, Jimmy iria me salvar, então logo viraria humano.

Por volta das nove da manhã, fui até a delegacia da cidade com John — que sabia tudo sobre Xavier, o jantar com Kate e a visita da minha antiga casa — e quando fui chamada para dar o meu depoimento, John ficou sentado numa cadeira do lado de fora e eu entrei no gabinete do delegado, que por sua vez me recebeu muito bem, já que eu disse ter importantes fontes sobre o mistério de Kate.

Expliquei claramente e contei tudo nos mínimos detalhes. E até a parte que Xavier me perseguiu. O delegado, por sua vez, ouviu tudo atentamente e fez mínimas perguntas, querendo saber o horário que eu saí da lanchonete, e o horário que Xavier me encontrou na antiga casa.

— Acho que esse foi o depoimento mais conclusivo. — O delegado murmurou, parecendo satisfeito. —Xavier não é tão santo como imaginávamos que fosse. Algumas pessoas afirmaram que quem a matou, foi ele. Só que sempre me pareceu ser um bom cara.

— As aparências enganam. — Sorri desconfortavelmente. — O que vocês vão fazer?

— Uma busca na casa dele, perguntas, perguntas e mais perguntas. Iremos procurar roupas e pertences de Kate, que não foram encontrados no local do crime.

— Ótimo. — Respondi a ele, enquanto me levantava e dava um aperto em sua mão.

Quando saí da delegacia, fiquei até pensando: eu estava com medo. Na última vez que dei um depoimento, logo depois eu fui atropelada e mantida em cativeiro durante dias. Será que ao invés de ficar presa numa casa mal abandonada, eu vou morrer de uma vez?

Três dias depois da morte de Kate, meu pai chegou à fazenda com Ana, Jack e Bridget. Para me animar, fizemos antigos programas, que fazíamos quando éramos mais novos. Andamos de cavalos, nadamos na cachoeira, acampamos no jardim e saíamos quase todas as noites para ouvir música country.

— Não quero ir no mesmo carro que Johnnie. —Berrou Louise, se espremendo na picape junto com eu, Bridget e Jack.

— Ah, qual é, Lou Lou? Você não irá correr perigo enquanto eu estiver no volante. — Buzinou, colocando o sedã prata do papai bem ao lado da picape.

— Já te disse que não vou com você. —Gritou.

Abri a porta e saí do carro.

— Eu vou com John. — Sorri pra ele e franzi o cenho ao olhar para Louise.

Abri a porta e entrei no carro, ouvindo um rock tocar baixinho no rádio.

— Ei, Louise? —John chamou pouco tempo depois, quando estávamos prestes a sair.

— O quê? — Seus olhos se arregalaram.

— Eu não mordo. —Sorriu, dando uma piscada.

Ela se encolheu e não disse mais nada.

Decidimos ir à mesma lanchonete que eu tinha ido com Kate. Optamos por ir em outras nos dias anteriores, mas como aquela era a mais famosa da cidade, e Bridget e Louise não a conheciam, resolvemos ir pra lá. Senti um frio na barriga assim que entrei lá, era muito estranho lembrar que há dias atrás, uma mulher que eu falecera horas depois que tinha me ajudado a conhecer mais do passado de minha própria mãe.

As garçonetes estavam correndo entre as fileiras de mesas com suas bandejas lotadas e caminhoneiros sentados no balcão pedindo cerveja. Notei, que em um canto menos movimentado da lanchonete, Xavier me olhava incrédulo. Será que ele já sabia que eu havia dado meu depoimento? Será que a polícia já tinha ido à casa dele?

Procurei proteção me sentando ao lado de John, onde Xavier não pudesse me ver e nem o cara estranho que o acompanhava. Senti uma vibração no bolso da minha jaqueta de couro e fui lá fora atender, já que a música estava alta demais.

— Oi? — Atendi, ignorando o frio que batia no meu rosto.

Ninguém respondeu.

— Alô? — Minhas mãos ficaram trêmulas, e não era de frio.

Andei mais para perto do movimento, onde algumas pessoas bebiam no estacionamento e fiquei perto de um poste de luz, ouvindo os murmúrios das pessoas bêbadas.

Eu estava protagonizando uma cena de filme de terror, outra vez.

Primeiro, uma ligação sem emissor, completamente muda.

Segundo, aqueles arrepios constantes, que pareciam dizer “tem alguém atrás de você, querida.”

E por último, eu sabia que era verdade. Tinha alguém atrás de mim.

— Não precisa fazer escândalo. — Disse a voz que eu conhecia muito bem.

Fechei os olhos.

— Jimmy. — Sussurrei, chamando-o.

Soltei um som agudo pela boca e dei um passo a frente, me distanciando de Xavier.

— Sem escândalo, por favor. — Sua mão se dirigiu ao meu braço, apertando-me um pouco.

— Droga. — Sussurrei outra vez, deixando meu celular cair no chão.

— Vamos passear pelo bosque nessa noite tão linda.

— Não. — Lutei, tentando correr.

Os bêbados que estavam perto de nós pareciam não perceber nada do que estava acontecendo comigo. Seu punho foi na direção do meu olho direito e ele quase me arrastou pelo chão de terra, levando-me até o sedã preto que estava perto de nós. Tentei atrasá-lo ao máximo com a esperança de que Jim aparecesse novamente e me ajudasse. Mas onde estaria aquele anjo? Eu sei que precisaria correr o risco para que ele voltasse, mas se eu morresse, acabaria de vez. Não adiantaria em nada ele estar vivo, como ele mesmo falou. Eu precisava dele naquele momento. Precisava muito.

Temia por minha vida, pois se Harry, que era considerado “novo” pela polícia, era capaz de me matar em um estralar de dedos, imagine esse cara! Que mata pessoas por recompensa! Um profissional da morte.

— Jimmy. — Chamei-o, perguntando-me onde ele estaria.