Um Aluno de Sorte

Aluno ó... nota mil, sqn - Parte 2


Papai chegou de mais um dia de trabalho duro. Vender imóveis todos os dias deve ser desgastante e não é isso que eu quero da minha vida.

— Sua mãe chegou?

— Ainda não.

Ele me pediu o dinheiro da venda do vaso que minha avó deu pra ele. Entreguei os oitocentos reais que tanto precisava para fazer algum pagamento.

— Nem a sua mãe sabe que eu vendi aquele vaso. Não sei o que a minha mãe viu naquilo.

Ele afrouxou o nó da gravata e se sentou no sofá da sala. Passou a mão no seu bigode fino e continuou a trabalhar ali.

Mamãe era a mais espalhafatosa da casa. Chegou do salão comentando sobre uma freguesa que fez o maior piti com os funcionários.

Na mesa do jantar...

— O Gerson, sabe como ele não leva desaforo para casa. Fez o maior barraco mais do que aquela cliente chata. Mas pelo menos os demais fregueses aplaudiram...

E foi um falatório acerca daquele salão que Deus me acuda.

Pensei que escaparia mais aquela noite sem perguntas, mas Marcela Schiarelli não dá ponto sem nó.

— E como vão as notas da escola?

Porque certas perguntas simples se tornam piores do que o corredor da morte? Engoli um pouco de suco e respondi cinicamente.

— Vou bem, mãe.

— Espero que sim, porque próximo ano você faz 18 e já o quero na faculdade. Sim ou com certeza?

— E a mensalidade tá cara. Ainda bem que você está no último ano — disse meu pai com aquele rosto autoritário.

Foi de repente, estavam me pressionando e depois começaram um outro papo completamente diferente. Meus pais precisam ser estudados.

...

No dia seguinte...

— E você sabe se foi bem no Enem?

— Acho que sim. Sou bom em matemática e as perguntas foram equilibradas. Agora o que me incomoda é a matéria de biologia. Justamente daquela Fátima.

— É amigo. A cabelo de lámen não se dá contigo.

Dois amigos conversando no intervalo. Edu e eu lanchávamos quando apareceram os caras do futsal. Eles sempre mexiam com a gente. Apesar de nós não sermos considerados "nerds", ainda sim sofríamos bullying.

— Schiarelli, soube que tá se engraçando com a minha prima. Acha mesmo que vou permitir isso?

Jonas, um cara pegador na escola. Ele se acha só porque é esportista e treina numa equipe de vôlei do Ceará.

— Que eu saiba ela é a sua prima, não seu objeto — disparei, Edu riu.

— É, mas eu estou gostando dela. Se por acaso descobrir que está cortejando ela, juro que nesse dia você vai assistir as aulas com a cabeça na privada.

Cortejando. Quem usa esse termo em 2017? Jonas saiu com suas duas sombras, seus amiguinhos. Odeio ele, porque é da minha classe e tenho que conviver com aquilo. E como desgraça é pouca, ele baba a professora Fátima para ganhar notas boas.

— Pedro, amigo, tive uma ideia pra acabar com esses caras.

— E o que é?

— Eu tava lendo naquele site de fanfiction que sempre leio uma história sobre o Massacre de Columbine em forma de drabble. Por que a gente não se inspira?

— Você tá é louco.

— Brincadeira. Mas que dá vontade dá.

Fiquei caminhando de volta para casa quando vi uma aglomeração na loja de antiguidades. Corri para ver o que aconteceu e vi o velho conversando com dois policiais. Percebi que as peças estavam quebradas.

— Oh, Pedro. Entre aqui.

— O senhor quer algo comigo?

— Vou me mudar daqui. Eu fui ameaçado de morte, mas antes quero que fique com isto.

Ele me entregou a caixa de vidro com o vasinho de porcelana dentro. A princípio recusei, porque poderia ser algo extremamete valioso, mas o velho insistiu tanto que acabei aceitando. Ele disse para nunca abrir o conteúdo.

— Cheguei — disse para a empregada. — Algum recado dos meus pais?

— Hoje não. Hoje você está livre.

Entrei no meu quarto, coloquei a caixa sobre o criado-mudo. Peguei minha cadeira de escritório e fui sentar-me à mesa do meu computador. Pesquisei em tudo que é lugar com algo parecido com aquela caixa.

— Me ajuda...

Olhei para a caixa assim que ouvi um sussurro no meu ouvido. Pelas barbas do nove dedos, peguei um objeto assombrado.