True Colors

Capítulo 3


True Colors

Capítulo 3

Mostre-me um sorriso então,

Não fique infeliz, não me lembro

Quando foi a última vez que vi você sorrindo.

Se este mundo te deixa louca

E você aguentou tudo que consegue tolerar,

Me chame

Porque você sabe que estarei lá...

Gregory House não se dava por satisfeito, sua paciente rendeu-lhe horas incontáveis de pensamentos e não chegara a nenhuma conclusão. Os únicos sintomas que Sandra apresentava eram alucinações. Nada físico, apenas psicológico. E, para complicar tudo, o caso estava em suas mãos. Como se ele fosse algum tipo de psiquiatra. O que não passava de suposições, já que diagnosticara os mais diversos casos no Hospital Princeton-Plainsboro. E os loucos, a seu ver, tornavam-se as pessoas mais interessantes do planeta. Por quê? Pelo simples fato de nunca mentirem.

Empurrou a porta, a figura da mulher ruiva inconsciente entrou em seu campo de visão. E ela era realmente bonita a seus traços naturais. Mancou até ela, apenas observando-a, porém os olhos verdes instintivamente se abriram, fixando-se em seus azuis. A imensidão límpida cobriu a sua turva e vazia.

— Oi... — Ela cumprimentou-o primeiro, a voz sonolenta e baixa. Sentou-se na cama, encostando as costas confortavelmente. — Você deve ser o doutor House. Engraçado, ouvi dizer que nunca visita seus pacientes.

— Depende... — House deu de ombros, divertido. — Se for dona de um belo par de seios e um traseiro enorme, eu posso pensar.

Sandra riu, uma risada sonora e que agradou os ouvidos do médico. Ela prendeu uma mecha de cabelo atrás da orelha, um gesto simples e rotineiro quando os fios ruivos encontravam-se livres, contudo para House teve outras expressões. Interpretar movimentos era seu ponto forte, e esse fato jamais mudaria. Quase se podia dizer que fazia automaticamente.

— Você é como Daniel. — Sandra verbalizou seus pensamentos altos. — Mas, diga-me, doutor House: Quando eu poderei ir para casa?

— Digamos que não posso deixar que vá sem que alguém venha buscá-la. — Suas palavras fizeram as feições de Sandra mudarem. Ela o encarava incrédula de que ele realmente estava destinando a ela aquele tipo de tratamento infantil. — Vamos supor que eu te libere e você saia pela rua livre, leve e solta e de repente...— House estalou os dedos, enfatizando. — Mais uma de suas crises psicóticas te domina. Provavelmente aceitará carona do primeiro cara que aparecer na sua frente.

— Crises psicóticas? — Sandra repetiu o que a incomodara, as sobrancelhas quase formando uma única linha em seu rosto. — Eu não sou maluca!

— Não foi isso que vi há alguns minutos. — House estreitou os olhos, forçando-a a pensar. — Talvez a minha teoria esteja certa: E se você apenas se faz de louca? Devo admitir que é ótima como atriz, já pensou em seguir essa carreira?

— Não brinque comigo, House! — Sandra alterou o tom de voz, confusa. Aquele médico só poderia estar tirando uma com a sua cara! Não havia lógica no que ele lhe dizia. — Eu sou uma pessoa normal, uma engenheira competente e completamente sadia! Não me venha dizer que, de um dia para outro, eu me tornei uma lunática.

— Eu não disse lunática, disse psicótica. — House a corrigiu, sustentando a bengala no antebraço e sacando o vidro de remédios do bolso do casaco. Virou alguns comprimidos na mão e atirou-os na boca. — São regras e eu sou um menino obediente. Posso ligar para esse tal de Daniel.

— Não! — Sandra negou repentinamente, não reconhecendo suas atitudes. — Quero dizer... Eu não preciso de Daniel, o único objetivo dele é me levar para cama e você estaria me dando de bandeja a ele. Muito obrigada, prefiro continuar quietinha onde estou.

— Desculpe, mas como uma paciente aparentemente sadia, você estaria... Como posso dizer... Ocupando um lugar que não deveria ocupar. — Gregory piscou, iluminando a mente da jovem com sua lógica. — Mas enquanto isso... — O médico sentou-se na cama. — Que tal me contar quando essas crises começaram?

— Que crises? — Se Sandra estivesse de pé, provavelmente andaria de um lado para o outro nesse momento. — Eu já disse que...! Será que hoje vai chover?

House arqueou as sobrancelhas, ele não esperava que ela continuasse a frase daquela forma. Analisou-a por um longo tempo, inspecionando a jovem que mexia os lábios constantemente em uma conversa muda. Como se sua presença não interferisse em seu espaço. Melhor, como se ela tivesse perdido o raciocínio.

— Você poderia me levar para casa, assim eu não pegaria carona com o primeiro tarado que aparecesse.— E apesar de ter fragmentado seu objetivo principal, Sandra não notou tal rompimento. Para ela, não houve interrupções em suas falas.

O médico não respondeu de imediato. Sandra não fingia estar louca, ela era louca a mais ou menos dois dias. Talvez mais, entretanto não poderia concluir se a própria louca não lhe confirmasse. Esfregou a testa com os dedos, a situação iria tomar um enorme tempo de sua vida. Como ele sabia? Simples, ele conhecia aqueles sintomas e também sabia que Sandra jamais trataria outra pessoa daquela forma quando tivesse suas crises. O que o preocupava era a falta de erros nos exames que mandara fazer.

— E eu tenho cara de babá? — House levantou-se, mancando até a porta.

(...)

A diretora Lisa Cuddy andava de um lado para o outro em sua sala, altamente surpresa e incrédula. Sim, essas eram as palavras que a definiam fielmente naquele momento. House só poderia estar de brincadeira! Encarou-o firme, um sorriso rasgando-lhe os lábios em total desafio.

— Está mesmo ciente do que está me pedindo?

— Não, acho que andei cheirando por aí. — House rebateu com humor, tomando alguns comprimentos para dor. Seu inseparável companheiro Vicodin. — Vai me levar a sério ou não?

— Eu deveria? — Cuddy fez um sinal com as mãos antes que o médico continuasse com as piadinhas. — Não posso deixar você responsável por uma paciente fora do hospital. Não é da família, não é cônjuge ou sequer um amigo!

— Tecnicamente ela acha que sou o marido dela. — House deu de ombros, ignorando a histeria da diretora. — Você não diz que os contatos humanos são importantes? Qual é a diferença agora?

Cuddy deu a volta na mesa, pensativa, os braços cruzados. Aproximou-se de House, examinando cada linha da expressão masculina. Procurava por qualquer resquício de insanidade, porém o que encontrou foi a mais pura verdade. Um suspiro cansado escapou de seus pulmões, rendendo-se a ideia dele.

— Vou me arrepender muito depois. — Ela virou-se, procurando algumas folhas que House deveria assinar. Entregou-as ao médico, acompanhadas por uma caneta.

— Isso é um insulto! Não preciso assinar termos de responsabilidade. — Mesmo contrariado, House não teve opções a não ser assinar. — Legalmente casados, isso é tão estimulante. Espero ter entrado em um bom negócio com direito a separação de bens.

Antes que House saísse da sala, Lisa segurou-o pelo braço. De alguma forma, mesmo que não devesse, sentia-se quase orgulhosa dele. Há tanto tempo esperou por alguma humanidade por parte de House, que ela mal conseguia acreditar.

— Por favor, House, não faça com que eu me arrependa. Estou arriscando nossos empregos por isso.

Ao ver o brilho pedinte nos olhos azuis de Cuddy, o médico ranzinza não conseguiu formular nenhuma resposta evasiva. Apenas concordou com um aceno de cabeça, logo rumando ao quarto de sua paciente.

(...)

Sandra acabava de abotoar a camisa quando o médico adentrou seu quarto. Era um pouco estranho intitular aquele espaço como seu, porém fora inevitável. Acostumava-se fácil aos lugares, tanto que passava a observá-los como sua propriedade. Sorriu com seus pensamentos, inclinando-se para alcançar os sapatos. Tudo o que mais desejava era ir para casa, tomar um banho demorado e ter uma reforçada refeição. Ajeitou a saia de cintura alta ao se levantar, notando que os olhos de House a percorreram sem o menor constrangimento.

— Como sabia? — House interrogou, curioso.

— Você saiu daqui com cara de quem planeja alguma coisa. Eu só deduzi. — Sandra sorriu, pegando a bolsa e caminhando até o homem. — Estou pronta.

— Tenho certeza de que está. — O médico rebateu, fazendo com que Sandra o agraciasse com mais uma de sua risada.

Ambos se dirigiram ao elevador. Como estavam no verão, House viera trabalhar de moto. E quando Sandra vislumbrou o veículo, suas pernas vacilaram. Havia uma mulher sentada no estofado de couro, olhando-a com malícia. Nos lábios um sorriso de lado e chamava-a com um dos dedos. Hesitou por um instante, cogitando se aquilo era real já que House não parecia enxergar aquela figura. Ao retomar suas conclusões, a mulher encontrava-se a seu lado. Seu corpo inteiro reagiu à voz gélida e ininteligível.

Sandra tapou a audição com as mãos, o timbre cruel criava as mais variadas imagens a sua frente. O teto abaixara nesse tempo, fazendo a jovem notar que bastava levantar os braços para tocá-lo. Buscou House com os olhos, vendo que raízes prendiam-no pelos braços e pernas.

— Não toque no meu marido! — Sandra gritou, atirando-se contra as coisas imaginárias, mas que para ela pareciam completamente reais. Lutava contra o que quer que fosse, tentando livrá-lo das amarras. — Não quero te ouvir, cale a boca!

Em uma tentativa de contê-la, House agarrou-a pelos pulsos firmemente. Talvez as marcas de seus dedos ficassem na pele clara. Afastou-a de sua luta desesperada, obrigando-a manter a atenção nele. Loucos e suas manias... Ele pensou exaurido enquanto trazia-a para perto de seu corpo.

— Ei, não tem nada aí! — Ele fez com que sua voz surtisse efeito em Sandra. Os movimentos insanos dela foram cessando, e podia se ver refletido nos olhos verdes. — Caramba, isso foi de assustar.

Vencida e ao mesmo tempo envergonhada, Sandra aconchegou-se nos braços de House, permitindo que as lágrimas viessem. Ela não fazia à menor ideia do que havia acontecido e porque estava chorando daquela forma, porém não se impediu. Ouvira dizer que chorar lavava a alma.

— Molhei sua camisa... — Ela proferiu em um fio de voz, desvencilhando-se de House e limpando o rosto. — Desculpe-me, acho que é TPM. Podemos ir para casa, amor? As crianças não podem ficar muito tempo sozinhas.

Crianças? O médico cogitou consigo, percebendo que o quadro de Sandra estava apenas começando.