Triste Noite Gélida

Triste Noite Gélida


Passaram-se anos após o fim do reality show, mas nunca puderam superar os amores que perderam na ilha. O inverno chegou, e com ele, uma profunda tristeza. Seria isso o que chamam de depressão sazonal? Nas redes sociais, o post que tanto temiam: Gwen e Duncan anunciaram que estão noivos. Courtney e Trent achavam que a uma altura dessa já teriam superado tudo que aconteceu, mas os sorrisos felizes estampados no rosto da gótica e do punk enquanto mostravam a brilhante aliança foram suficientes para partir os corações de seus antigos amores.

Courtney nunca foi de beber. Sua criação rígida a fez crescer com a ideia de que beber é coisa de delinquente. Essa era uma das coisas que sempre tentou mudar em seu antigo namorado. Mesmo quando ele a convenceu a experimentar cerveja pela primeira vez em uma das noites secretas que passaram juntos na ilha, ela odiou o gosto e decidiu que nunca mais colocaria uma gota de álcool na boca. Mas, as coisas mudaram. E já não parecia mais haver nada que a pudesse acalmar nesse momento de dor e desdém.

"É isso. Vou sair pra beber." Pensou, enquanto colocava seu sobretudo verde musgo para conseguir enfrentar o frio cortante da cidade. Depois de pesquisar no celular, encontrou um bar não muito longe dali que ficava na cobertura de um prédio. Se o plano era deixar de lado todos os valores que carregou consigo desde a infância, que fosse num lugar bonito com uma bela vista, pensou.

Courtney chamou um Uber e sentou-se no banco de trás. Enquanto o motorista dirigia, ela olhava para as escuras ruas desertas, debruçada na janela, sentindo-se em um clipe musical ao som de alguma música melancólica da Olivia Rodrigo. Normalmente ela passaria a viagem toda falando incessantemente sobre todas as frustrações de sua vida para o pobre motorista, mas não dessa vez. Dessa vez, Courtney queria apenas sentir sua dor calada, introspectiva. As frustrações da vida a forçaram a aprender o momento certo de manter o silêncio.

Ao chegar no prédio, pegou o elevador, ainda sem dizer uma única palavra para qualquer pessoa que passasse por ela. Ao chegar no terraço, escaneou todo o recinto com os olhos. Tentava ignorar a sensação inquietante de estar num lugar tão cheio e barulhento depois de anos acostumada ao silêncio de seu escritório, de seu lar e das bibliotecas que frequentava.

— Eu quero o vinho mais forte que você tiver. — Disse em alta voz para o barman, na esperança de ser ouvida em meio ao som alto e as conversas emaranhadas ao redor.

— Uma taça no capricho para a senhorita!

— Taça? Não! Eu quero a garrafa!

O homem arregalou os olhos sutilmente mas assentiu e virou-se para procurar um bom vinho.

— Aqui está. Vinho Madeira seco, direto de Portugal. 20% de teor alcoólico.

Courtney pegou a garrafa e colocou sobre o balcão uma cédula com o dobro do valor da bebida e virou-se sem dizer mais nada, buscando um lugar para se acomodar. As mesas estavam todas cheias de pessoas aparentemente alegres, brindando e se divertindo com seus aperitivos. Na ruidosa multidão, porém, algo chamou a atenção de Courtney. Ao fixar o olhar numa mesa no canto, espremeu os olhos na tentativa de enxergar melhor a pessoa que ali estava sozinha. Era um rosto familiar. Aos poucos foi identificando os olhos verdes bem conhecidos. Havia, porém, algo que os tornava diferentes. Não pareciam tão alegres e brilhantes como ela se lembrava. Estavam vermelhos e com olheiras. Além disso, os negros cabelos estavam mais longos do que ela se lembrava, presos em um rabo de cavalo baixo. No rosto havia uma barba por fazer. Ela não podia acreditar no quão diferente ele estava. Tomando coragem, ela se aproximou e disse:

— Trent?

— Ah, oi... é você. — Ele respondeu com uma voz levemente surpresa, mas monótona.

Courtney mordeu os lábios para não mencionar o quanto ele havia mudado. Ela olhou para as grandes portas de vidro que levavam para a parte de fora do terraço e voltou o olhar para o rapaz, como que o convidando para ir até lá. Ele se levantou e a seguiu até o parapeito de vidro ao ar livre, com uma lata de cerveja na mão.

— Então... Você ficou sabendo? — Courtney perguntou, debruçando-se sobre o parapeito.

— Do noivado? Sim... Estou feliz que ela esteja feliz, mas cara, isso dói muito.

— Isso não faz sentido! — Ela virou a garrafa, dando seu primeiro gole e voltou a falar ofegante — Por que ela e não eu?! — Ela finalmente libertou seus sentimentos enquanto as lágrimas borravam a maquiagem preta de seus olhos. — Eu sempre tentei ser uma boa namorada! Eu ajudei ele a se tornar uma pessoa melhor! É isso que boas namoradas fazem! Mas ainda assim ele preferiu aquela gótica insuportável! Sem ofensas... — lembrou-se dos sentimentos de Trent.

— Eu fui um imbecil. — Ele disse com os olhos vagueando pelas luzes da cidade no horizonte — Eu sufoquei com minhas obsessões idiotas. E agora eu perdi ela para sempre.

— Ei! Não fala isso! Quem perdeu foi ela! Ela deveria ter sido compreensiva e te ajudado, mas em vez disso ela fugiu! Com aquele... UGH! Eu odeio ele! Por que eu me importo tanto?!"

— Alguns dizem que o sentimento mais próximo do amor é o ódio.

— Deve ser... — Ela respirou fundo e começou a olhar para as estrelas. — Você já sentiu que precisa encontrar outra pessoa pra conseguir seguir em frente?

— Eu me sentia assim. E eu até tentei algumas vezes. Vida de músico, sabe como é, né? Mas não parecia justo usar aquelas garotas apaixonadas pra tentar suprir meu vazio. E esse vazio nunca deixou de estar lá... — Suspirou — Então eu decidi que eu precisava me curar primeiro.

— Cura... É, talvez eu deveria buscar isso também... — Ela cruzou os braços e estremeceu — Está esfriando..."
Em um movimento suave, Trent se aproximou e colocou o braço em volta do ombro dela e deixou que Courtney encostasse a cabeça em seu peito. E pela primeira vez depois de tantos anos, ela pensou:

"Talvez essa seja a sensação da cura".

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.