Through The Wonderland Glass

Capítulo 2 – Onde está Alice?


Capítulo 2 – Onde está Alice?

- Estou preocupado com ele – o coelho dizia enquanto observavam o chapeleiro sentado na porta de entrada de sua casa.

- Eu nunca vi ele ficar tanto tempo em silêncio – Marllykum respondeu.

A Lebre de Março apenas emitiu um riso louco e calou-se. Bayard brincava com sua esposa e seus filhotes, já todos bem grandes, na frente do chapeleiro, que parecia nem vê-los.

- Está deprimido... – Chess apareceu de repente, sorrindo como sempre – Sente falta de sua donzela. Faz quase quatro anos que ela nos deixou outra vez.

Continuaram a observar o amigo até Mirana aparecer de repente montada em seu cavalo branco e acompanhada por dois guardas do castelo. Ela desceu, sorridente e transbordando calma e paz como era de costume. Cumprimentou os amigos e olhou para o chapeleiro deprimido.

- Como ele está? Não parece bem – a rainha falou com um olhar preocupado.

- Ele precisa de sua dama... – Chess disse – Sempre comenta que a encontra em seus sonhos, mas aquilo que os humanos chamam de saudade o está apertando – o gato falava enquanto flutuava e girava no ar agarrando os próprios pés.

- Está para fazer quatro anos que Alice se foi... Outra vez.

- Talvez não volte com medo da tirana – A Lebre de Março falou antes de cair no chão de tanto rir.

O coelho olhou o amigo no chão com revolta e o repreendeu severamente por dizer tal coisa da irmã da rainha, que agora estava do lado certo, embora o próprio coelho admitisse ainda sentir raiva dela. Mirana fitou a lebre com um olhar entre dúvida e diversão, e por fim sorriu e decidiu ignorar. Não podia culpar ninguém por pensa daquilo a pior, muito pior, de sua irmã. Séculos se passariam até que os habitantes do País das Maravilhas começassem a aceitá-la.

- Alice não temeria, nem minha irmã nem nada. Se não voltou ainda, é porque não pode. Mas tenho certeza que ela quer. Em algum momento ela vai voltar.

- Ela levou dez anos pra voltar depois da última vez que veio quando era criança – o coelho falou.

- Ela vai voltar – a rainha falou com enorme ênfase no “vai”.

E todos se tranquilizaram. Se Miranda dizia alguma coisa, então era certa. Era uma verdadeira rainha e conseguia saber muito bem o que se passava a sua volta quando mais ninguém estava percebendo e até o que ainda nem tinha acontecido. Viram o pai do chapeleiro sair da casa e se sentar ao lado do filho.

- Meu filho... – o homem começou – Há muitos anos não o vejo assim. Até sua criatividade com os chapéus parece estar paralisada. Ultimamente quase todos os seus chapéus, apesar de continuarem excelentes, são amarelados ou dourados. Nos dói ver você assim. Não quer que pensemos que se arrependeu de nos ter de volta... – brincou tentando animar o filho.

- Nunca mais repita uma coisa dessas – Tarrant falou sério.

- Eu sei... Só queria ouvir você rir, Tarrant. É aquela moça, não é? Alice...? Quando ela foi embora naquele dia, pude perceber que algo muito forte liga você com ela.

- O senhor acha? – Tarrant sorriu brevemente – A Rainha Branca me disse a mesma coisa. Mas... Quatro anos... Ela parece demorar cada vez mais.

- Ela vai voltar, Tarrant. Você não disse que ela levou dez anos da primeira vez? Alguém que foi tão longe por você, pelo País das Maravilhas, e por nós, arriscando a própria vida, não o deixaria nunca.

- Sempre estamos com problemas quando ela volta... E ela sempre resolve todos eles – Tarrant encarou o pai mais uma vez – Mas eu queria que ao menos uma vez ela chegasse quando estivesse tudo bem, pra aproveitar a beleza do País das Maravilhas como deve ser – ele sorriu.

- Assim será, meu filho. Todos esperam a volta dela pelo que ouço falarem. Mal a conheço, sei apenas o que ouço de vocês, mas se até a Rainha Branca aguarda esperançosamente por seu retorno e a ama como se fosse sua irmã de sangue, eu posso entender porque você que é o mais próximo a ela está desse jeito. Sabe, Tarrant... Quatro anos não foram suficientes pra recuperar todo o tempo que perdemos. Há muitas histórias que ainda não lhe contei. O que você está passando agora... Quando eu conheci a sua mãe, eu me sentia assim quando ela tinha que voltar pra casa depois que nos encontrávamos – o homem mais velho riu levemente ao se lembrar – Eu sei que era bem menos tempo, mas o que quero dizer é que compreendo você, meu filho. Finalmente compreendo.

Tarrant pensou por alguns instantes e por fim sorriu encarando o pai. Dali em diante passaram mais de uma hora conversando e contando histórias dos anos em que estiveram separados.