Abri a porta dos estábulos, que seguiam por um longo corredor. Não possuíamos um grande número, mas nossos animais eram conhecidos como os melhores do reino. Apressei meu passo, já estava quase na hora do almoço, e precisava terminar logo de limpar o depósito. No final do corredor, abri uma porta larga, que dava para o vinhedo. Encontrei uma moça separando as frutas, cuidadosamente fechando as caixas. Como estava sem tempo, apenas cumprimentei-a, seguindo em frente.

Finalmente cheguei ao local, e enchi um balde d'água e peguei um pano. Era uma sala quadrada, e estava mais vazia de como eu me lembrava que era. Todas as tralhas antigas eram guardadas ali, por ser um local bem afastado do prédio principal. Com várias prateleiras, o local não era visitado há um bom tempo. Se não me engano, apenas uma vez por ano alguém ia limpar, e no caso, eu. Esfregava as paredes, sem sucesso. Teimoso como sou, continuei, mas o limo não saía de jeito nenhum.

– Você tem que usar uma escovinha, sabia? - disse uma voz atrás de mim - D-desculpe me intrometer- Me virei. A garota loira de antes, me olhava. Não a conhecia, porém era muito simpático de sua parte.

–Ah... Não sabia, obrigada - sorri, escondendo a vergonha de tanto esforço à toa. Peguei uma escova velha em cima do balcão.

– Se quiser ajuda, terminei mais cedo meu trabalho- Ela sorriu. Fiz um sinal e ela me ajudou, com outra escova.

Conversamos um pouco, e para minha surpresa, a moça era de outro reino. Estava trabalhando para ajudar o pai, aposentado. Acabamos mais rápido, o que me foi muito útil.

– Não sei nem como te agradecer... Nossa, não sei seu nome ainda!- Eu disse, guardando as coisas no armário.

– N-Neru - ela respondeu, limpando as mãos no avental e soltando os cabelos do coque.

– Sou Gakupo, te devo um favor - estendi a mão, ajudando-a a se levantar - se precisar de algo, só me procurar, estarei no prédio - disse, apontando para a direção. Ela sorriu, e nos despedimos. Já deveria estar próximo do horário combinado, então caminhei até o portão dos jardins, que ficavam do lado esquerdo do castelo. Sentei-me num banco, próximo às lavandas, que eu tanto amava o cheiro. Esperei por alguns minutos, distraído pela beleza das flores.

–Você veio - Luka se aproximou.

–Claro, na hora já soube que era você - ri, estendo meu braço para puxá-la para mais perto. Seus olhos a entregaram,eu a conhecia bem, precisava me contar algo. Ela juntou nossas mãos e me abaixou o olhar.

–Olha Gakupo, eu vou...embora.

–Quê?

–Eu estou doente, os médicos ainda não sabem direito,mas.. - eu a interrompi:

–Como assim Luka? Por que você não me contou?!- eu gritei, sem perceber.

–Por que eu sabia que você ia reagir assim - ela sorriu, quase chorando.

–Para onde você vai? - apertei sua mão.

–Vou morar com algumas freiras que conhecem meus pais. Não é muito longe daqui, não se preocupe. Mas é para prevenir qualquer contaminação que eu possa causar quando ficar pior.

–E-eu vou te visitar todo dia! - e a abracei, falhando em me manter calmo, dando um susto na moça, que tentou forçar contra.

–Gakupo, você vai... - percebeu que protestar seria em vão e desistiu - Nem estou tão preocupada com a doença, tenho medo do que você vai fazer sem mim - riu, envolvendo minhas costas.

Passeamos um pouco pelos jardins e nos despedimos, para apenas nos vermos novamente mês que vem, quando ela viria passar um tempo no castelo.

Vaguei pelos corredores , procurando algo para passar o tempo. Fui até a cozinha. Não havia comido nada o dia todo, mas incrivelmente não sentia um pingo de fome. Me servi do bolo que Meiko fez para os empregados, estava delicioso. Me sentei no balcão cozinha, apoiando minhas costas na cadeira. Suspirei, fechando os olhos e esticando os membros, cansados.

–Ei, você deveria comer mais - Yuma sentou-se perto de mim, comendo uma fatia de pão - além de trabalhar muito, ainda não se alimenta. Vai sumir assim – disse, bagunçando meu cabelo.

–Olha quem fala - ri, virando-me para ele.

–Eu tenho músculos - brincou, mostrando seu bíceps, cheio de orgulho.

–Vou começar a limpar janelas para ficar forte – e me levantei para pegar outro pedaço de bolo.

Quando anoiteceu, eu havia acabado de limpar o pó da blibioteca, e corri para meu quarto e tomei um banho. Coloquei minha camisa branca mais arrumada, e deixei meus cabelos soltos, caindo sobre meus ombros. Fui até as roseiras que cresciam na parede interna do castelo, e colhi algumas. E mais uma vez, fiz o caminho da rotina até meu quarto favorito no mundo.

Quando entrei, logo Kaito correu para meus braços. Afundou o rosto no meu peito, fazendo-me corar. Fechei a porta atrás de mim, retribuindo o abraço.

–Senti saudades- confessou.

–Imaginei - sorri, empurrando-o contra a parede e segurei seu queixo, roubando-lhe um beijo demorado.

Deixando um gostinho de ''quero mais'', coloquei as rosas colhidas num vaso em cima do armário. Virei e sentei-me no sofá, convidando-o.

– Que flores bonitas - comentou, sentando-se - Como foi seu dia? - me perguntou, encostando-se em mim.

–Cansativo - bufei, dando-lhe um selinho com carinho, encostando minha testa na dele - e não foi um dos melhores, mas meu príncipe me dá forças para continuar.

O menor deu uma risadinha e me beijou, com a mesma intensidade de ontem.

Continuamos a noite experimentando sensações e prazeres, sendo revigorador para nós dois. Acabou virando rotina, toda noite eu aprendia a amá-lo mais ainda, sem me importar em ser em segredo.

Tínhamos muitas coisas em comum, inclusive a paixão pelo proibido.

Quando estava com ele, me esquecia de preocupações, medos e saudades. Porém algumas coisas me incomodavam de uma maneira que nem ele me fazia esquecê-las.

Acordei de manhã, e de costume fui na cozinha preparar o café da manhã. Ouvi barulho de uma carruagem, e os portões se abriram. Eu, junto à Meiko, curiosos, corremos para ver o que estava acontecendo. Da cozinha, fomos até a sala principal, onde eram feitos os bailes. As visitas entrariam por ali, então nos escondemos atrás de uma coluna de mármore junto à parede para escutar. Os guardas abriram o grande hall de recepção, e por ele entrou

uma moça querida naquelas redondezas.

–Ah! Que saudade daqui! Vamos Yuki, sei que você vai amar aqui - Ela foi na direção que estávamos,então corremos de volta para a cozinha.

–Quem era? Que voz irritante - Meiko questionou, com uma cara enjoada.

Segurei a risada e espiei pela porta:

– A princesa do reino vizinho, Miku - estreitei a visão - acompanhada de uma empregada, parece ter no máximo treze anos.

–Ah, verdade. Ouvi que ela viria passar alguns dias aqui. Vou ter que cozinhar bem mais pelo jeito - andou até a bancada - será que ela gosta de peixe? - e começou a vasculhar em suas coisas.

Deixei-a falando sozinha e segui a princesa, num impulso tomado pela... raiva? Ela foi até o pátio central, onde Kaito estava. Ele acordou sem mim? Era cedo, normalmente não estaria acordado. Cerrei meu punho, tomando cuidado para não ser visto.

–Kaito querido, sentiu saudades? - ela o abraçou, rodopiando o vestido enorme.

Chega, não aguento mais. Me virei para ir cuidar de outras coisas, mas trombei com um rapaz bem atrás de mim:

–Ei, olhe por onde anda – o rapaz brigou comigo, arrumando seus óculos. Ele era bonito, mais ou menos da minha altura. Não aceito bronca de estranhos.

–Olhe, eu estava na minha, quem mandou ficar atrás de mim?! - cruzei os braços.

–Ora, não fui eu que estava bisbilhotando na vida da princesa, pelo menos - ele sorriu maliciosamente, com uma cara que me deixou preocupado. Senti meu rosto esquentando, sem saber o que falar.

–Relaxe, não sou de espalhar fofocas - ele estendeu a mão - Kiyoteru, conselheiro da princesa, muito prazer.

Hesitante, cumprimentei-o.

–Bom, tenho coisas para fazer - e virei-me para ir, porém fui puxado para trás:

–Você poderia me mostrar o castelo, não acha? – disse segurando meu braço- Vou passar alguns dias aqui, é bom que eu comece a me acostumar – e piscou para mim.

Ignorei-o, me soltando e voltando à cozinha. Era terça-feira, merda. Eu precisava cuidar do almoço novamente. que conveniência. Preparei tudo com ajuda de Meiko, porém dessa vez, para 4 lugares, o Rei viria também. Perfeito.

Quando a mesa estava pronta, mandei os guardas chamarem os convidados. Entrou pelo salão o Rei e o conselheiro, conversando. E, pelo corredor que dava aos outros quartos, Kaito e Miku.

Sentaram-se um em cada ponto cardial, e os servi vinho. Olhei discretamente para o príncipe, que para minha surpresa, me olhava também, com uma expressão preocupada. Nossos olhares se encontraram, e rapidamente ele desviou, envergonhado.

Os outros empregados entraram com os ensopados, e eu me encostei na parede perto da porta, como de costume, aguardando o almoço terminar. Por questões de etiqueta, os empregados durante o almoço, ficam parados assim, aguardando ordens.

O rei passou a mão em seus cabelos cinza e o conselheiro me encarava, como um leão que achou sua nova presa. Todos estavam vestidos casualmente, porém o castelo cheio assim era algo raro de acontecer.

–Um brinde! Ao casal mais louvado dos três reinos! - o Rei estendeu o braço segurando sua taça, e sorriu para os príncipes.

O quê?