Senti um frio no estômago ao ouvir o som do salto de madeira se aproximando. Passos curtos, delicados, ao mesmo tempo em que me transmitiam medo. Senti dedos macios erguendo meu queixo, possibilitando-me olhar seus olhos intensamente azuis.

A princesa sorriu, abanando-se com um leque verde rasgado.

— Seja bem vindo ao meu palácio - me disse com sua voz ecoando pela sala de chá - Quem diabos é você?

— Sou um mero empregado - engoli em seco - trabalhava aqui.

Ela olhou para os guardas com desprezo, que logo se desculparam e saíram do cômodo rapidamente. Vasculhei-o rapidamente com os olhos, lamentando silenciosamente por tantas pinturas rasgadas.

Agora, o quarto estava quase vazio.

Um servo exausto. Uma princesa cuja beleza era manchada de morte. E alguém, amarrado na cadeira. Estreitei os olhos, sentindo o resto do meu coração doer ao reconhecer o jovem. Imobilizado, tentava desesperadamente falar, com sua voz que eu tanto amava abafada pelo pano que fora colocado em sua boca, sem piedade.

Ele balançava os ombros, fazendo um sinal negativo com a cabeça enquanto lágrimas lhe escorriam pelo rosto.

Fechei os olhos, abaixando os ombros.

— Será um convidado especial para a cerimônia - a princesa continuou - Será a mais linda de todas! - Ela riu. Um riso docemente terrível. Rodopiando o vestido amarelo, da mesma cor que seus cabelos, andou para trás em direção à mesa. Pegou uma garrafa nas mãos trêmulas. Bebendo no gargalo de um vinho, descuidadamente deixou algumas gotas lhe escorrerem pelo pescoço, e lambendo os lábios, voltou a falar:

— Somos um casal tão bonito... Não é, meu príncipe?

Dirigiu-se até ele, retirando com força o tecido que o impedia de falar. Ele tossiu, afastando o corpo da loira.

Jamais, seu monstro.

— Você parece tão triste, agora tem um escravo para lhe fazer companhia! Perfeito. - Ela apoiou os braços na cintura.

Meu príncipe me encarou. Pareceu me beijar com seu olhar. Abraçar-me novamente, me embalando em uma paz que durou mínimos segundos, ainda capaz de restaurar quase completamente minhas forças.

Ou foi só ilusão que minha mente carente imaginou.

Liberte-o! - ele ordenou.

De início a princesa não entendeu. Mas após alguns segundos, abriu um sorriso, olhando de canto para mim. Ela murmurou algumas palavras, jogando o leque no chão, voltando para perto de mim.

Nos meus pulsos amarrados que descansavam na frente dos joelhos, ela cruelmente pisou, amassando minha mão contra o chão. Soltei um grito rouco de dor, ao sentir minha mão começar a formigar. Ela foi gradualmente aumentando a força em seus pés, virando a cabeça com uma expressão sádica para o príncipe. Rangi os dentes, encolhendo-me em defesa. Kaito lhe implorou misericórdia, voltando a mexer o corpo amarrado na cadeira, em desespero. Alguém parecia estar se divertindo muito com aquilo. Retirou os pés de mim, e quando eu achei que ela estivesse satisfeita, transferiu um golpe cortante do meu rosto, com os punhos cerrados. Com o rosto virado, cuspi um pouco de sangue em minha boca em sua direção, não desviando meus olhos dos dela.

Por sua vez, a loira riu. Continuou rindo. Continuou socando-me, ignorando os berros de Kaito. Meus sentidos, gradativamente se apagando, não me permitiam resistir.

— Então sente algo por ele?! Sinta, meu amor!- Ela berrava.

—----------------------------------------------------------------------

Caí. Desabei de lado no chão, juntando os membros mais próximos ao meu corpo que fosse possível. Senti chutes, senti o interminável escárnio. Sangue escorria interminavelmente da minha boca e nariz.

— Pare! - ele implorava incansavelmente.

— Você deve amar apenas a mim - Ela parou, arfando. Passou os dedos em seu próprio rosto, sujando-o com meu sangue.

— Se o libertar, juro me casar contigo!

Senti uma enorme tristeza. Senti-me culpado. Lembrei de Meiko, Yuma e Neru. Estariam todos bem?

Se eu não existisse, meu príncipe não precisaria sofrer tanto. Talvez, se ele amasse alguém digno, teria sua vida merecida. Seria ele ainda era capaz de me amar?

''Me perdoe..''

Murmurei, sentindo nos lábios o gosto salgado de lágrimas misturadas com suor.

Não consegui ouvir mais nada. Não ousei abrir os olhos. Me rendi ao cansaço.

------------------------------------------------------

Apenas acordei quando fui jogado bruscamente contra uma parede de pedras, que me doeram em cada centímetro do meu corpo. Correntes prendiam minhas mãos, e só me dei conta daonde estava quando fecharam a porta de madeira, deixando-me isolado no minúsculo quarto. Minha barriga roncava, e meus hematomas que me cobriam a pele ardiam intensamente. Sem conseguir ver nada na escuridão, alimentava minha mente apenas com vozes e cheiros que eu conseguia identificar de dentro da cela, que eu sabia que se situava no subterrâneo. Tateei em volta, sentindo na ponta dos dedos a umidade das pedras.

Minha mente só se ocupava com ele. Não pensei em mais nada durante horas, dias que pareceram passar ali, numa solidão extrema.

—-----------------------------------------------

Ouvi um grupo de homens se aproximando. Peguei uma pedra solta e guardei-a na palma da mão, para me proteger. Quando a porta se abriu, cobri os olhos com o braço, sentindo-os arder.

— Olha só quem temos aqui.

Não podia ser. Não podia crer.

Olhei para cima, para encontrar com Kiyoteru, com as sobrancelhas arqueadas, sorrindo para mim.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.