The mine word: Blue roses.

Capítulo 37: O som do trovão.


Visão da Alex:

Dois dias já se passaram e as coisas foram de mal a pior. Tudo foi bem num primeiro instante, até que a perna da Linna começasse a soltar um liquido esbranquiçado e a ficar inchada e avermelhada como um tomate. Rheal não conseguia esconder a preocupação com a irmã e passou os últimos dias limpando seu ferimento e trocando suas ataduras. A casa médica da vila foi destruída durante o incêndio, porém algumas coisas puderam ser salvas. Encontramos ataduras limpas, alguns frascos sem nome com cremes estranhos e mais água limpa.

Rheal andou me evitando nos últimos dias, principalmente depois daquela conversa.

—O que quer dizer com isso? —Questionou ele com um ar de seriedade.

—Tenho quase certeza de que estamos indo na direção errada. Não sabemos onde estávamos até que encontramos a Linna. Admita: Não sabemos pra onde ir.

Rheal suspirou. —Sei disso... Mas não podemos desistir. Nossos pais estão nos esperando.

—Podem já estar mortos. —As palavras pesaram mais do que pensei. —Sabe disso.

—Não temos certeza disso.

—Temos. Temos sim. Por que acha que os Endermans vieram atrás da gente? Somos só crianças. Se vieram até aqui, quer dizer que já pegaram nossos pais. Ou pior.

Ele pareceu pensativo e bravo ao mesmo tempo. Chegava a ser engraçado. —Vamos procurar um mapa. Até mesmo uma bússola já serviria. Algo mais pode ter sobrado entre os escombros. —Ele apoiou as mãos sobre a mesa. —Não podemos desistir assim. Não depois de tudo isso.

—Acredito que podemos.

—Por que está dizendo essas coisas, Alex? Parece que não quer ver seus pais.

—Não é isso. Só... Só estou cansada. Meus braços doem, minhas pernas doem, minha barriga dói, minha cabeça dói... Não aguento mais...! Sei que pensa assim, Rheal! Sei que não aguenta mais isso. Olha pro nosso estado! Olhe pra Linna! Ela mal consegue ficar em pé. Deixe de ser egoísta! —Os sussurros quase viravam berros a essa altura.

—Já sei aonde quer chegar. —Agora sim ele estava irritado. —Vou procurar algumas coisas. Tome conta de tudo até eu voltar.

—Mas já é tarde! Esp...! —Tentei impedi-lo, mas ele foi mais rápido.

Desde então nós evitamos conversas longas. Mesmo assim eu acho que ele concordou comigo, já que ainda estamos acampados na pequena igreja de pedra. Sem muito que fazer, decidimos arrumá-la, trazendo alguns colchões bons que encontramos e alguns outros móveis de pequeno porte como cadeiras e bancos.

Logo cedo eu já preparava o café da manhã de todos, usando outras coisas que conseguimos resgatar da plantação e pegar com os animais. O sol mal havia nascido e eu já tinha pegado ovos nos galinheiros e tirado um pouco de leite das vacas. Nada muito diferente do que fazia às vezes na fazendo do vovô. Vovô... Sinto falta dele.

O cheiro fez com que Linna despertasse. Que por sua vez despertou o Rheal. Ele foi direto trocar as ataduras e limpar o ferimento da Linna.

—Alex, sabe da novidade? —Disse Linna, empolgada.

—Novidade? Não, o que seria? —Disse, sem tirar a atenção da comida no fogo. Eram duas panelas, uma com sopa e a outra com leite.

—Não contou pra ela? Vou te bater, Rheal! Pare com essa briga boba.

—Certo, certo... —Disse ele, molhando o ferimento.

—Bom, voltando ao assunto, Rheal achou ontem uma pequena casa de banho nos arredores da cidade. Ouviu?! Podemos tomar banho! Não é incrível?!

—Bom... —Confesso que esperava algo melhor do que um banho. —Pode servir pra alguma coisa.

—Não é? Afinal estamos todos sujos, principalmente nós duas que tivemos que atravessar a vila durante o ataque. Nossa, estamos fedendo a fumaça e suor.

Cheirei minhas roupas discretamente, concordando com a Linna. —Pode ser. Quer ir lá depois de comermos?

—Claro! Vamos todos!

Engoli em seco, mas não pude me pronunciar antes do Rheal. —Desculpe, Linna, mas acho que não cabe todo mundo na casa. Vocês duas levam a Gisele com vocês e eu levo os meninos depois. Pode ser?

—Claro. Algum problema, Alex?

—N-Não, por mim tudo bem. —Bem até de mais. Não suportaria que o Rheal me visse sem roupa de novo. E só de me lembrar dele já me deixa com nojo.

Por algum motivo eu era a única que conseguia fazer alguma comida decente, mesmo que a base fosse sempre sopa de vegetais com carne. Não ficava ruim, principalmente pra quem passou uma semana sem comer nada. Todos comemos e depois eu levei a Linna e a Gisele pro banho. Rheal nos indicou o caminho até uma pequenina casa de madeira branca com telhado de tijolos, com uma porta pesada e uma imensa janela na parede esquerda. Rheal ficou de vigia com os meninos do lado de fora enquanto nos banhávamos.

Linna foi a primeira a entrar na água, sendo seguida pela Gisele e por mim. Realmente não havia muito espaço, mas nós três cabíamos perfeitamente.

—Isso é tão bom... —Linna passava água sobre a pele. —Nem parece que tomamos banho há dois dias.

—Pois é. —Disse, esfregando os cabelos da Gisele. —Ainda não acredito que nos atacaram aqui.

—Foi má sorte. Mas até que foi melhor do que terem nos emboscado enquanto dormíamos na mata. Aqui tivemos como nos defender.

—Diga isso a sua perna. Estamos ferrados. —Enxaguei a Gisele. Seus cabelos azulados estavam cheios de nós. —Se ao menos a Gigi estivesse aqui...

—Não precisam se preocupar comigo. Estou bem. Não consigo me teleportar, mas ainda posso ser útil.

—Só não piore a situação, está bem? Rheal parece exausto. Deixe ele descansar um pouco.

—Pensarei no assunto. —Ela derramou uma bacia de água na cabeça. Sua perna vista agora não parecia tão ruim, mas continuava bem vermelha e com uma enorme marca onde a adaga penetrou. —Sabe, até que é bom ter a atenção dele assim.

—O que quer dizer?

—Não tenho certeza. Sempre fomos bem próximos, mas o Rheal tem uma mania de querer agir como nosso pai. Penso que ele se segura bastante pra parecer ter sempre o controle da situação.

—Percebi isso também. Às vezes ele é muito chato e mandão.

—É... Pode até ser. —Linna se levantou. A água escorrendo pelo corpo. —Mas ele ainda é meu irmão. Preciso dele. —Ela se virou pra mim. —Nós precisamos dele. —Ela pegou a Gisele no colo, me deixando livre pra me lavar. —Não é verdade, fofa?

Gisele apenas riu. Um riso abafado.

Me inclinei pra trás e caí de costas na água. —Isso é tão chato...! —Bati com as mãos na água. —Vamos parar de falar do Rheal. Vamos fazer outra coisa.

—Tipo o quê?

—Não sei... Tipo... —Nada me vinha à mente. —Não consigo pensar em nada. —Terminei de me enxaguar. —Depois penso em alguma coisa.

Terminamos o banho e trocamos de lugar com os meninos. Linna penteou nossos cabelos com as mãos e claro que tivemos que devolver o favor. Seus cabelos negros eram tão lisos e bonitos que davam certa inveja.

Os meninos não demoraram muito no banho e logo todos estávamos deitados na grama, aproveitando o sol da manhã. A brisa estava boa e o vento carregava as folhas que cobriam aos montes o chão. Algumas nuvens de chuva pareciam vir do norte.

—Isso aqui está tão bom... Dá vontade de dormir aqui fora. —Disse Linna enquanto se espreguiçava.

—Merecemos uma pausa pra variar. —Disse.

—Não podemos nos dar ao luxo de abaixarmos a guarda. —Disse Rheal, o único que ficara sentado. —Eles podem aparecer a qualquer hora. —Seu cabelo brilhava no sol.

—Não seja bobo.

Rheal se calou por um tempo, virando o rosto e encarando a igreja. De repente vimos uma série de brilhos vindos do bosque e logo começamos a ouvir risadas. Eram risadas masculinas, do tipo que nossos pais faziam quando bebiam muito.

—Rápido, atrás de mim! —Sussurrou Rheal em tom de ordem.

Deixamos as crianças atrás dele, mas nos recusamos a nos escondermos também. Iríamos precisar de todos se quiséssemos ter alguma chance.

Dois Endermans sugiram por entre as árvores, sendo seguidos por outros nove. Um deles era mais alto e muito magro, com uma barba pequena esquisita e vestindo o manto negro. Outro, que também ria, era gordo e meio baixo pra um Enderman, com uma grande barba negra e também vestindo o manto negro. Os outros usavam capuz, mas as risadas ainda eram audíveis.

—Ei, chefe, olha só o que encontramos. —Disse o magro. —Demos sorte ou não demos?

—Com certeza, Zac. Com certeza... —O gordo nos olhou de cima a baixo. —O que fazem por aqui, crianças? Cadê seus pais?

—Eles não sabem quem nós somos. —Sussurrei pro Rheal.

—Silêncio. —Disse ele. —Não abaixe a guarda.

—Ei! Parem de cochichar! —Gritou o magro. —O que devemos fazer, chefe?

—Huh... —Ele voltou a nos olhar. —Eles têm uma Enderman com eles. Será que é uma refém?

—Sim, a perna dela está machucada. Veja.

—Podem ter mandado as crianças pra nos distrair. Devem estar escondendo aquela azulzinha. E olhe, há três azuis entre eles. Certeza que é uma emboscada.

Linna se virou pra mim. —Isso não vai dar certo. Estão desconfiando de nós.

Rheal sacou a espada de diamante. —Vamos aproveitar então e atacar enquanto não sabem do que somos capazes. Devo conseguir ferir uns dois. Talvez três.

—Isso é burrice, Rheal. Você não pod...

Rheal sumiu de repente enquanto eles estavam distraídos. Reapareceu no meio deles, movendo a espada de cima pra baixo e cortando a perna de um dos de capuz, voltando a sumir e reaparecer pra atacar outro pelas costas.

Linna me encarou, assustada. Estávamos muito longe pra poder ajudar ele. —Vamos tirar todos daqui. Rápido.

Pegamos as crianças no colo e começamos a correr, porém não fomos longe. Além da perna da Linna ter nos atrasado, dois Endermans apareceram na nossa frente, nos barrando.

—Aonde pensam que vão? —Disse o magro, segurando Rheal pela perna, de cabeça pra baixo.

—E pensar que existiam seres como ele... Esses mestiços me dão nojo.

—Ei, ele tem asas, chefe. Não basta ter a cara de um azulzinho, tem que ser um monstro também. —Ele puxou as asas do Rheal, o fazendo berrar de dor. —Parece que são de verdade.

—Espera, não tinha um pessoal falando que tava procurando uns mestiços com asas? Algo assim?

—Sim, lembro de ouvir durante o almoço. Falaram que um deles queimou um cara cuspindo fogo pela boca.

—Foi você, asinha? —Outro puxão nas asas. —Não parece tão perigoso.

—Qualquer idiota pode matar um homem com uma espada de diamante. —O magro o sacudiu mais um pouco.

—Senhor, ele matou o Jozz e o Liony. Melhor matarmos eles aqui mesmo. Levamos os corpos pra base e vemos o que queriam com eles. —Disse um dos encapuzados. Ele sacou um punhal. —Corto a garganta dele agora. Basta pedir. —O Enderman colocou a adaga na garganta dele e começou a pressionar.

Um vento pesado cortou todos nós, parecendo ventania em dia chuvoso. O céu ficou acinzentado e cheio de nuvens. —Ei, bobões, achei que estivessem atrás de mim! —Gritou uma garota bem ao longe, caminhando em nossa direção. —Será que essas crianças são mais interessantes do que euzinha?

—Droga! Peguem ela! —Gritou o gordo. —Vigiamos as crianças.

Os sete Endermans restantes sacaram suas adagas e espadas e desapareceram. Ao longe, ainda caminhando, a garota parecia rir, divertida com a situação.

—Isso vai ser divertido...! —Um estrondo. Seus olhos brilharam numa coloração azulada e seus cabelos começaram a voar. A garota abriu os braços. As nuvens se aglomeraram até ficarem totalmente escuras e então um raio despencou do céu, acertando a garota. —Podem vir!

Os primeiros Endermans surgiram com espadas, vindo um pela esquerda e outro pela direita. A garota correu num estrondo, tão rápida que mal deu pra ver. Acertou o da esquerda com três socos, cada um emitindo um estouro de luz e som, e o agarrou pela roupa, tremendo, e o jogou em cima do da direita, os deixando com espasmos, largados no chão.

O cabelo dela era arrepiado, curto e de um belo tom de azul, crepitando com faíscas, assim como suas roupas, um short curto de tecido grosso e uma grande camisa branca suja de terra e lama, e a ponta de seus dedos. Ela lutava de um jeito tão acelerado que os Endermans não tinham tempo de reagir. Nesse meio tempo ela acertou mais três, deixando um rastro na grama. Os dois últimos vieram de cima, com as adagas em posição de corte. A garota riu novamente, olhando pra cima. Ela abriu os braços, seus cabelos voaram novamente e outro raio a atingiu, passando direto pelos Endermans, que despencaram como pedras no chão, com os corpos soltando fumaça.

Os dois Endermans entraram em choque, ambos tremendo, ambos assustados.

A garota se virou pra eles. Ela tinha um olhar vidrado, um misto de graça e satisfação. —Ei! Agora é a vez de vocês! —Disse ela batendo os punhos, fazendo faiscar a palma da mão.

—C-Chefe... Vamos sair daqui... Não vale a pena. —Disse o magro. —Anda, v...! —Rheal, que até agora não se manifestara, chutou a cara do magro com sua perna que ainda estava livre, o fazendo cair no chão.

—Realmente não vale à pena. —Disse o gordo. —Levanta! Vamos ao ponto de encontro quatorze!

—C-Certo, chefe! —Os dois desapareceram num piscar de olhos. Foi como ficar muito tempo sem respirar. Foram instantes, mas pra nós pareceram séculos.

A garota serrou o punho e o chocou contra o chão, fazendo um barulho de trovão e marcando a grama com cicatrizes negras. Ela se levantou e arrumou os cabelos. —Nossa, foi melhor do que eu imaginava. Vocês estão bem? —Perguntou ela, esticando os braços. Nenhuma resposta. —Ei, é assim que agradecem alguém que acabou de salvar as suas vidas?

—Q-Q... —Rheal se recuperava da queda. —Quem é você?

—Aé, não me apresentei, né? —A garota se aproximou de nós. —Sou Shae, a bruxa do trovão.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.