The mine word: Blue roses.

Capítulo 2: O monstro no galpão.


Visão da Pompo:

O dia passou tranquilo após o almoço. Gisele não tocou mais no assunto da viagem, mas eu sabia que algo estava errado quando ela passou todo o restante do dia treinando.

As crianças estavam na cama, as velas estavam apagadas e Steve e eu estávamos debaixo dos lençóis. Nos beijávamos enquanto ele movimentava sua cintura. Poderíamos ter outro filho, isso não era impossível e eu gostaria da ideia. Quando Steve explodiu dentro de mim, me senti viva e entorpecida. Estava suada e ofegante, assim como ele.

Ele saiu de cima de mim e se deitou ao meu lado, alisando meus cabelos, assim como gostava. —Estava pensando em que? —Perguntou ele.

—Nada de mais.

—Está mentindo. Você sempre faz a mesma expressão de duvida quando pensa em algo sério.

—Não posso esconder nada de você, posso? —Suspirei. —Você não queria ter outro filho?

—Eu lhe daria mil filhos se você me pedisse. Mas, e bem sabemos disso, não é sempre que você engravida.

—Não fale como se a culpa fosse minha...! —Apertei o rosto com o travesseiro.

—Olha, já falamos sobre isso. Teremos outro filho quando pudermos ter um.

—Você é único, Steve. Que homem não gostaria de se vangloriar com vários herdeiros?

—Seu pai é um deles. Tem certeza de que isso não é de família?

—N-Não toque nesse assunto... É delicado. Minha mãe pode arrancar sua cabeça se disser algo disso a ela.

—Tenho sorte daquele monstro ficar trancado no galpão. —De repente ele solta uma risada abafada. —Por que sempre começamos com um assunto e nunca chegamos a lugar nenhum? É frustante de tão engraçado.

—Vamos dormir. Precisaremos estar descansados pra colheita de amanhã.

—Então finalmente poderemos colher aquelas batatas? Mal posso esperar pra comprar um jarro de óleo com a Pheal e fazer umas batatas fritas.

—Ouviu o que falei sobre dormir? Pense em comida depois.

Virei pro lado e adormeci. Meu estômago estava revirado e isso era bom e calmante. Acordei com o sol em meu rosto. Steve abria as janelas, ainda nu da noite anterior. Ele se virou e me olhou.

—Bom dia, querida.

—Bom dia... —Me espreguicei e tirei os cabelos da frente do rosto. —Parece animado.

—Poucas coisas me deixam animado, e uma delas é batata frita. —Ele apanha suas roupas e começa a se vestir enquanto fala. —Vou acordar as meninas e ir pegar o café da manhã no celeiro. Você vai amamentar o Pokko, certo? Trarei a sua comida quando voltar. —Ele terminou, já abrindo a porta pra sair.

—Espera! —Levantei da cama num salto, ficando meio tonta. —Não saia sem um beijo de despedida!

—Certo! Certo! Fiquei animado e acabei esquecendo. —Ele se curvou, exibindo sua bochecha com finos pelos de barba cortada a pouco tempo. O beijei e sorri pra ele. —Volto logo. É bom colocar uma roupa antes de sair.

—Não diga o obvio.

Ele saiu, me deixando sozinha. Coloquei as roupas sem muita pressa e penteei os cabelos da melhor forma que pude e fui até o quarto do Pokko. O quarto era dividido com a Alex, que já havia saído com Steve pra buscar a comida. Pokko estava em seu berço, um projetado pelo Steve com base nos berços do outro mundo. Estava dormindo tão bem que dava pena de acordar.

O peguei no colo da forma mais cuidadosa que pude e levantei a camisa, expondo meu seio esquerdo e aproximei sua boca dele. Logo ele começou a sugar o leite, ainda de olhos fechados e com pouca pressa de beber. Conforme acordava, sua fome ia aumentando, ao ponto onde ele fazia força pra tirar o leite.

—Calma, amor, vai machucar a mamãe. —Troquei pro seio direito. O esquerdo estava vermelho e molhado de sua saliva. —Você é um guloso, amor. Se continuar assim logo não terá mais nada pra beber.

Meio que me escutando ele parou de sugar. Bati levemente em suas costas e ele arrotou. Abaixei a camisa e limpei sua boca. Muito tempo devia ter se passado, já que, pela gritaria e agitação do lado de fora, Steve retornava com as meninas. Ajeitei Pokko em uma posição confortável e sai do quarto.

—Bom dia, mamãe! —Gritou Alex do outro lado da cozinha, toda animada.

—Bom dia, Pompo. —Disse Gisele enquanto cortava um pão na metade.

—Bom dia pra vocês. Estão atrasados. O pequeno aqui já tomou seu café da manhã a tempos. —Disse em um tom de brincadeira.

—É fácil quando a comida vem até ele. —Murmurou Gisele.

—Não comece, Gisele. Lembre do que conversamos. —Steve interferiu.

—O que você conversou com a Gigi, papai? É porque ela aprontou? —Perguntou Alex, inocente.

—Conversa de adulto, filha. Agora, quer o seu com geleia ou manteiga?

—Geleia! Geleia! Geleia! —Ela disse aos pulos.

—Será geleia então. —Ele preparou o pão e o deu a Alex. —Pronto. E sabe o que vamos comer daqui a alguns dias?

—O quê? —Perguntou ela, interessada.

—O papai vai fazer batata frita.

—Eba! Ouviu, Gigi?! O papai vai fazer batata frita!

—Parece divertido.

—Bom, não terá batata frita se ficarmos de enrolação e não tirarmos aquelas batatas de terra. Vamos comer logo e deixar a Alex e o Pokko na casa dos meus pais.

—Com a vovó? —Perguntou Alex, a única a quem minha mãe permitia chamá-la de vovó.

—Sim. Ela fará algumas coisas em casa enquanto colhemos as batatas.

—Eu adoro as histórias da vovó. Gosto da que ela mata o urso malvado com uma espada. Você já matou um urso, mamãe?

—Não e nem pretendo me encontrar com um. Agora comam.

A idade não pareceu afetar meu pai durante vários anos, mas sua juventude foi se esvaindo pouco a pouco desde o fim da Guerra do fogo, como ficou conhecida a queda do Reino Whiter e a tomada da fortaleza do Portão de fogo norte. Seus cabelos loiros desbotaram até ficarem com uma cor semelhante a beje e uma nova ruga surgia em sua testa a cada ano, o fazendo parecer mais zangado do que realmente está.

O encontramos já em frente a plantação de batatas. Estava com o forte peitoral nu e usava uma calça de tecido de couro tingido de verde escuro.

—Vovô! —Gritou Alex, correndo em direção ao meu pai.

Ela a segurou e rodopiou com ela enquanto soltava berros incompreensíveis de felicidade, assim como fazia comigo quando era mais nova. Ele a colocou no chão, tonta devido aos giros. Soltou uma gargalhada sonora e apoiou as mãos sobre os joelhos. —Nossa! Estou mesmo velho. Daqui a pouco não aguentarei erguer o Pokko no colo. Bom dia, filha. Vejo que trouxe as crianças.

—Sim. Vou deixá-las com a mãe e voltarei pra ajudar vocês.

—Não há necessidade. —Ela puxa o Steve pra junto de si. —O fortão aqui e eu damos conta do recado. Passe um tempo com as crianças. Ria um pouco. Não pode ser sempre séria como sua mãe.

—Pensarei no assunto. —Olhei pro Steve. Sua expressão era de surpresa. —Se não for problema pra você...

—Não, tudo bem. Brinque um pouco com as meninas e deixe o Pokko com a Cidia. Tentarei voltar inteiro.

—Você é um amor. —Dou um beijo em sua bochecha e deixo os dois trabalharem na plantação.

Chegamos até a casa dos meus pais, que ficava praticamente do outro lado da propriedade. Até hoje não entendo o porque do Steve ter construído ela tão longe.

Gisele foi a primeira a chegar, tirando suas botas sujas de lama antes de entrar na casa. Alex entrou logo em seguida, também tirando suas botas e as jogando pra cima. Entrei e fui em direção a cozinha, onde minha mãe parecia cozinhar algum tipo de caldo doce.

—Filha, bom dia. Não ia ajudar seu pai? —Perguntou ela enquanto mexia o caldo.

—Ele disse que só precisaria da ajuda do Steve. Pensei em passar o dia com a senhora.

—Bom, não será de todo ruim. Estou fazendo aquele doce de leite azedo que seu pai adora. Quer experimentar?

—Claro. —Entreguei Pokko a Gisele e fui até minha mãe. Ela mexeu um pouco mais no caldo e me entregou a colher de madeira. —Uhhh...! Bom como sempre, mãe.

—Sabia que iria gostar. Preciso pegar uns ingredientes no celeiro. Poderia ficar de olho pra mim?

—Posso, não será problema.

—Eu já volto. —Ela tirou o avental e saiu apressada da cozinha.

Minha mãe se tornou, como disse o Steve, a tipica avó da fazenda, seja lá o que isso queira dizer. Assim como meu pai, a idade também a mudou. Seus cabelos de cor verde água desbotaram até parecerem meio azulados e as rugas começavam a surgir debaixo dos olhos. Desde a assinatura do "Tratado Imperial das Raças" que minha mãe não precisa mais esconder o cabelo quando sai pra cidade, embora meu pai insista em acompanhá-la sempre.

Fiquei cuidando do doce, que já começava a virar uma pasta de cor caramelo. O cheiro estava tentador, mas ainda precisava ser resfriado em uma bacia com água pra ficar no ponto. Fiquei tão hipnotizada com o mexer do doce que nem percebi algo muito importante: Alex não estava mais ali.

Visão da Alex:

Meus dedos se enfiavam entre a terra molhada enquanto corria por entre as árvores do bosque. Era uma sensação fria e molhada, mas muito gostosa de sentir. Eu gosto de correr pela fazenda e de brincar com o bichinhos do vovô. Alguns são grandes e dão medo, outros são pequenos e fazem barulhos engraçados.

Conheço todos os lugares desse lugar. Gosto de nadar no pequeno lago que tem uma pequena cachoeira logo após o bosque do papai, também gosto de pegar flores nesse bosque, as rosas são tão lindas, mas elas fazem dodói, e, e esse é um dos que mais gosto, tem o galpão da vovó, onde mora o Guto.

A vovó não gosta venham até aqui, então é segredo. O galpão é grande e feito de madeira velha, com um telhado. Ele fica sempre trancado, mas, e isso também é segredo, tem um pequeno buraco na parte de trás dele.

Me agacho e engatinho até dentro do galpão. Está escuro e quase não posso ver nada. Vovô me ensinou a acender uma lanterna, então deixo uma escondida aqui dentro. Usou as pedrinhas de fogo que o vovô me deu pra acender o fogo e poder enxergar o grande monstro que mora ali, o Guto.

Guto, como a vovó chama, é um mostro muuuito grande feito de ferro. Ele é gelado e coberto por rosas. Ele é muito lindo. Subi sobre uma grande caixa que lá havia e pendurei a lanterna em um gancho no teto. Os olhos do Guto eram metálicos e brilhavam quando a lanterna era acendida.

O que mais gosto nele, e isso é outro segredo, é que, quando fecho os olhos, posso ver coisas uma garotinha. Quando fecho os olhos, não fica tudo escuro, eu consigo ver. A lanterna pendurada no teto, as correntes presas na porta, as caixas cobertas de poera e, o mais legal, eu vejo uma garotinha de olhos brancos me encarando. Ela não se mexe, não importa o quanto eu tente falar com ela. Seus cabelos são escuros como os do papai e os meus e ela sempre usa a mesma roupa que eu.

Quando abro os olhos, nada mudou. As vezes a cabeça do Guto está vidada e um dos grandes braços está um pouco mais pra frente, mas nada dele se mexer. Eu gosto do Guto.

Visão da Gisele:

Desembainho Atie e Adreu e elas tomam a forma de pessoas. Ambas não mudaram nada no decorrer dos anos, diferente de mim.

—Por que nos chamou, mestre? —Perguntou Adreu.

—Por quê? —Repetiu Atie.

—Preciso que vocês achem a Alex. Ela sumiu enquanto a Pompo cuidada de um doce e eu cuidada do Pokko. Vocês conhecem bem essa fazenda, não será difícil de encontrá-la.

—Se você pede... —Disse Atie.

—Será feito, mestre. —Completou Adreu.

As duas saltaram pela janela de meu quarto, um habito constante delas.

Me joguei na cama, esfregando o rosto. Estava cansada, pois corri até em casa para chamar as duas. Meu atual quarto não tem muita coisa e a maioria do que tem foram presentes da Pheal. Há várias estantes e prateleiras cheias de livros espalhadas por todos os cantos, muitos já lidos e relidos várias vezes.

Desço da cama e me agacho para pegar uma caixa guardada debaixo dela. Puxo a caixa e a abro, tirando meu antigo vestido de dentro dela. Ele não cabe mais em mim e está queimado em alguns lugares, assim como meu braço. Uma enorme cicatriz cobre parte do meu braço direito, uma triste lembrança de quando conheci Steve, Pompo e o resto do pessoal.

Com exceção da Atie e da Adre, esse vestido é a única coisa que me restou da minha antiga vida. Um presente de meu pai que guardo com carinho até hoje.

Visão do Steve:

O dia já terminava e o sol já encostava na base do horizonte. Ponko e eu conseguimos colher quase toda a plantação sozinhos, recebendo alguma ajuda da Gisele junto da Atie e da Adreu depois. Foram sacos e mais sacos de batata empilhados sobre mais sacos de batata, um trabalho ardo que valeria a pena daqui a alguns dias, mas que daria dores nas costas por várias semanas.

Coloquei o último dos sacos sobre a pilha e estiquei as costas, sentindo todas as articulações estalarem como se fosse tiros de festim. Gisele já descansava recostada sobre a pilha enquanto Ponko bebia de um cantil de couro.

—Acha que já acabou? Precisamos levar esses sacos e guardá-los no celeiro. —Disse ele, rindo enquanto escorria bebida pelo canto da boca.

Havia me esquecido desse detalhe. Sempre me esquecia, na verdade. —Não aguento mais...! —Reclamou Gisele.

—Não sejam bobos. Está tarde, não conseguiremos levar tudo ainda hoje. Querem ver algo legal? Já volto. —Ele foi até sua casa e voltou algum tempo depois com Cidia, Pompo, Pokko e Alex. —Pode levar isso pro celeiro, amor? Só dessa vez?

—Essas suas "só dessa vez" estão me custando caro, sabia? —Cidia suspira. —Eu já volto. Esperem aqui.

Ela foi até o bosque, demorando um tempo razoável pra voltar. Já estava desanimando quando um tremor na terra começou. Ele foi ficando mais e mais forte, pássaros voavam da copa das árvores e folhas caiam no chão. Um enorme mostro saiu de dentro do bosque, vindo em direção a nós. Só havia visto ele uma vez, e ele não se mexia e nem parecia tão amedrontador. O mostro parou em frente a pilha de saco, foi quando percebe que Cidia montava na garupa dele. As mãos do monstro eram como blocos de ferro maciço, mas se moldaram na forma de uma empilhadeira pouco antes de erguerem todos os sacos de batata de uma só vez.

Todos ficamos boquiabertos, talvez Gisele, Alex e eu com maior intensidade, mas era realmente surpreendente ver aquilo acontecendo bem diante de meus olhos.

O mostro caminhava devagar, mas conseguiu depositar tudo dentro do celeiro. A noite já caíra e Ponko achou por melhor que o monstro fosse deixado ali dentro do celeiro pela noite, pra ser guardado no dia seguinte.

Visão da Alex:

Fui a primeira a acordar. Não queria chamar a atenção de ninguém, eles poderiam brigar comigo. Tirei meu pijama, coloquei minhas roupas normais e sai do quarto, fechando a porta com cuidado pra não acordar o Pokko.

Sai de casa e corri até o celeiro que ficava perto da casa do vovô e da vovó. Foi tão incrivel ver o Guto se mexendo daquele jeito ontem a noite. Eu queria vê-lo de novo, perguntar a ele como fez aquilo.

O celeiro estava trancado, assim como o galpão sempre ficava, mas eu sabia um jeito de entrar. Havia uma janela um pouco em cima da porta e o vovô deixava uma escada guardada atrás do celeiro. Seria perfeito.

Peguei a escada, ela era mais pesado do que parecia, e a coloquei em pé, com muita dificuldade. Subi por ela e entrei pela janela. Não estava escuro lá dentro, diferente do galpão.

Desci um andar e encontrei Guto parado em frente a porta do celeiro, imóvel. Fui até ele e tentei conversar, mas ele continuou não me respondendo. Eu estava brava. O que a vovó fazia pro Guto se mexer? Ontem ela estava em cima dele. Será que era isso?

Subi nas costas do Guto, ficando com um pouco de medo de cair. Tentei de tudo, falei com ele, bati com as pernas e com as mãos nas costas dele, tentei balançar sua cabeça, mas nada de resposta. Foi quando lembrei do que via quando fechava os olhos. Os fechei, mas não vi a garota de olhos brancos, apenas a porta do celeiro. Tentei olhar pros lados, mas só via os animais e a palha no chão.

tentei mover um braço, ele parecia muito pesado, e o encostei na porta do celeiro, fazendo um barulho muito alto. Recuei, andando pra trás. O que estava acontecendo? Eu... Eu conseguia andar. Por que aqui eu conseguia e no galpão não? Era divertido imaginar.

Comecei a dar voltas dentro do celeiro, cada passo era um estrondo. Eu estava rindo, mas parecia que as palavras não saiam. Foi quando a porta do celeiro se abriu. Vovó estava parada em frente a porta, olhando em minha direção. Abri os olhos e estava novamente montada nas costas do Guto. Me assustei e cai dele. Tudo que pude ouvir antes de dormir foi a vovó dizendo:

—Santa Lua...! N-Não é possível.