SUHO

Mesmo sentado eu ainda sinto como estou fraco, nunca comi tanto como estou comendo agora, desde que acordei sinto como se meu estomago estivesse com um buraco que não consigo preencher de jeito nenhum.

— Algo mais que deva saber? – Pergunto à Kyungsoo que está sentado ao meu lado direito enquanto me observa encher a barriga.

— Na verdade, não, tudo que aconteceu nesse tempo em que você estava se recuperando foi isso... – ele deixa a frase no ar e exaspera de maneira ruidosa passando as mãos pelo cabelo curto, pelo pescoço e as parando em frente a boca.

— O que foi, Kyungsoo? – Pergunto enquanto pego um pedaço de carne e o abocanho – Porque esse olhar de espanto? – Pergunto ainda de boca cheia.

— Meus olhos são grandes assim mesmo. – Ele desconversa com um sorriso amarelo.

— Tem certeza que não tem mais coisa aí? – Eu insisto. Conheço esse baixinho, muito bem, quando fica fitando o vazio assim com os olhos vidrados sem piscar, sua mente está funcionando a mil por hora. – Eu acho que posso dizer pelo menos três coisas que possam estar passando por sua cabeça.

— Ah é? – Ele pergunta divertido, dessa vez sorrindo de verdade, apoiando o cotovelo na mesa e o queixo na mão – Arrisca o palpite?

— Deixe-me ver, - depois de comer o pedaço de carne pego uma maçã em uma mão e abocanho e com a outra mão começo a enumerar – o que pode estar por trás da tal parede, ou barreira, transparente que você e Kris encontraram, como treinar o Lay com sua habilidade de sugar vidas... – eu paro e o observo por um minuto.

— Falta um ainda. – Ele ergue a sobrancelha esquerda.

— Na verdade acho que consigo pensar em mais duas. Como atravessar a barreira transparente... e se é uma boa ideia ir procurar o Luhan lá fora, por ele ter os poderes do Namjoon. – Kyungsoo tem um problema em esconder o que ele pensa e como se sente, a verdade sempre fica escancarada no rosto dele.

Assim que termino de falar eu vejo que acertei pela expressão preocupada que ele assumiu, o sorriso sumiu e apenas um fantasma de diversão ainda está em seu rosto e ele voltou a fitar o vazio. – Esses são seus palpites? – Ele pergunta depois de piscar e voltar a atenção para mim.

— Acertei? – Pergunto terminando de comer a maçã. Preciso me controlar, se continuar assim vou acabar engordando demais.

— Eu já sei como treinar o Lay. – Ele responde sem muito entusiasmo.

— E como seria isso? – Questiono curioso, afinal, ele não pode sugar a vida de nenhum de nós.

— Pegamos criaturas pequenas no labirinto, as batemos bastante até cansá-las e então as imobilizamos e o Lay as toca, nada muito difícil, eu posso fazer a imobilização. – Ele responde, ainda sem parecer prestar muita atenção em nada específico.

— Ok, errei um, e quanto aos outros palpites? – Pergunto finalmente parando de comer não me sentindo satisfeito como gostaria, mas já serve para acalmar um pouco. – Acertei algum?

— Sim e não.

— Como assim?

— O que mais me preocupa é como esse Luhan possa vir a se comportar aqui dentro. – Ele responde cruzando os braços – A última coisa que precisamos agora é de outro louco tentando mandar em tudo e outra guerra interna, já foi irritante e cansativo o suficiente o Kai nos fazer falar do Namjoon.

— Kyungsoo, isso aconteceu, já foi, Namjoon é passado. Admito que não gostei da ideia de saberem que eu já tive que matar alguém, mas não há muito mais que possamos fazer. Na verdade, não tiro a razão dele de querer saber porque eu matei alguém.

— As vezes me irrita você ser tão calmo e compreensivo com tudo. – Kyungsoo provoca me olhando de canto de olho. – Enfim, precisamos voltar a procurar um jeito de sair daqui. Trate de se recuperar logo para todos poderem sair para procurar uma saída.

— Alguém precisa ir com o Sehun até essa barreira transparente para tentar averiguá-la. – Eu comento – Pode haver algo atrás dela que pode nos ajudar.

— Entre treino e recuperação, nossa equipe, de repente, ficou pequena. – Kyungsoo ri baixinho. – Essa semana vamos nos focar em treinar o Sehun e Baekhyun... de repente encontrar alguém novo, semana que vem voltamos a focar em explorar a nova área. Até lá você e Chen já terão...

— Kyungsoo, eles já estão aqui! – Kris nos interrompe em tom de urgência. – O Tao está berrando lá fora, você e o Xiumin têm que baixar a barreira!

— Eu sabia que não devia ter subido ela hoje. – Eu comento por baixo do fôlego já correndo para a porta que leva ao labirinto e vejo Xiumin já fazendo o gelo diminuir e recuar.

Como estou cansado, fico para trás e Kyungsoo já começa a mover os braços para fazer a pedra descer, como é um trabalho em conjunto dos dois, Kyungsoo acaba abaixando a pedra devagar, depende de Xiumin para desfazer o gelo o quanto antes.

Eu espero tenso enquanto vejo a pedra e o gelo descerem, mas então algo acontece.

A proteção de gelo e pedra feita por eles ainda está na metade, quando eles param e parecem conversar entre si, tensos, então, perante nossos olhos, o gelo e a pedra se espedaçam no ar em milhares de pedaços.

Kyungsoo e Kris olham para mim com um olhar que diz que eles também pensaram o mesmo que eu. Não preciso olhar para Chen, para saber que ele também pensou a mesma coisa.

Subconscientemente, memórias daquele dia me vem à cabeça, e não posso evitar de ficar em guarda, pronto para um possível combate se necessário. Posso estar fraco, mas nunca deixarei o terror que foi viver com Namjoon como líder se repetir. Posso não ser perfeito, mas eu sei que valorizo a vida alheia, muito mais que ele.

Não posso evitar me sentir nervoso com o que posso encontrar nesse Luhan.

Eles o encontraram, e ele aprendeu bem a usar suas habilidades, muito bem.

SEHUN

Baekhyun manca apoiado em Kai, parece muito cansado, deve estar debilitado pela perda de sangue, há uma trilha de pingos atrás dele, Tao segue berrando em frente ao paredão de pedra e gelo, de repente, o gelo começa a recuar, assim como a grande pedra, ele cai de joelhos aliviado com a cabeça encostada no paredão. Devia estar tão cansado, de olhos fechados, não sei ao certo, mas ele não viu quando uma placa de pedra a sua esquerda se moveu dando espaço para uma criatura que eu nunca havia visto.

O corpo era longo e magro, a pele de um tom esverdeado muito claro, seis patas grandes que pareciam prontas para pular a qualquer momento, flexionadas de um jeito que me dava agonia, a grande cabeça parecia fisicamente impossível de ser atada àquele corpo tão magro e aparentemente fraco.

Só conseguia ver suas costas, mas era grande, poderia comer Tao com facilidade. Antes de eu gritar, ou qualquer outro, antes que pudesse tentar fazer alguma coisa a criatura pulou com suas patas estranhas na direção dele.

Então parou no meio do ar.

Eu ouvia o som das mandíbulas abrindo e fechando com força e com raiva, um som alto que fazia minha espinha se arrepiar. Ele tentava se chacoalhar no meio do ar, mas parecia cada vez mais contido como se fosse esmagado por uma força invisível.

Então eu vi na minha frente, Luhan apontava a mão direita na direção do animal, de repente ele levitou um pouco mais que um metro no ar e afastando as duas mãos como se rasgasse algo no ar, a criatura deu um guincho de dor e foi partida em duas.

Em minha mente eu me lembrei do relato sobre Namjoon despedaçando as pessoas que se levantaram contra ele e não posso evitar de cair de joelhos com medo.

A essa altura, todos olhavam para Luhan, assustados, aterrorizados, melhor dizendo.

Seria ele outro louco?

Eu fico tão preso nisso tudo que quando eu percebo, já é tarde demais.

As duas metades da criatura se regeneraram, logo, tínhamos duas na nossa frente e ambas não perderam tempo em atacar, uma delas pulou na direção de Tao, que a atravessou com um punho acelerado bem na cabeça, a outra pulou na direção de Baekhyun e Kai, mas foi pega no meio do ar por Luhan, novamente. Dessa vez ele fez questão de afundar sua cabeça fazendo uma gosma verde escorrer dela.

Nesse momento eu sentia meu estomago gelado de tanto medo daquela pessoa na minha frente.

Mas Tao não escapou ileso.

Aparentemente a gosma verde era prejudicial à nós, pois ele caiu de joelhos gritando com a carne de seu braço banhada em sangue e bolhas aparecendo.

Tudo isso aconteceu tão rápido que o paredão de gelo e pedra ainda estava na metade. Se eu não estivesse olhando para frente, não teria conseguido acompanhar tudo.

— Isso está demorando muito, eles precisam de cuidados. – Luhan comenta mais para si mesmo do que para outra pessoa.

Luhan se direciona ao paredão, andando calma e lentamente, com um movimento dos braços ele afasta Tao para o lado e então parece querer empurrar alguma coisa no ar com a mão direita e olha para a parede de pedra e gelo. Bem no meio dela uma grande rachadura aparece e ela só faz aumentar e ganhar mais território. Como último movimento, ele fecha a mão com força e a parede inteira se craquela bem diante de meus olhos, mas os pedaços não caem no chão.

Ele abre a mão lentamente com a palma para cima e os pedaços da parede começam a cair devagar até estarem todos no chão, em ordem e devagar com espaço suficiente para passarmos pelo meio.

Antes que eu me dê conta, movido pelo medo que sinto eu corro em direção à nossa área segura, fazendo questão de colocar o máximo de distância entre nós dois.

O que foi que acabou de acontecer? Porque senti tanto medo dele sendo que eu também faço coisas que não deveria ser capaz? Porque ele despertou tanto medo em mim?

Ele acabou de salvar a todos nós, então porque sinto tanto pavor dele e de ficar por perto? Porque sinto vontade de vomitar de tanto medo e meu coração está mais acelerado agora do que quando eu estava correndo?

Kai se teletransportou para levar Tao ao Lay mais rápido e deixou Baekhyun para trás, que mancava para correr e então eu sirvo de apoio para ele o segurando pela cintura e então ele desata a falar.

— Você viu aquilo, Sehun? Como ele fez aquilo? Ele só usou as mãos cara! Ele também matou aquelas criaturas lá fora, só usando as mãos!! Esse cara é um monstro, ele não é normal! Não que nenhum de nós sejamos normais ou que saibamos o que é normal, já que não sabemos como é a vida fora daqui, mas esse cara é pior ainda! Ele destrói as coisas com as mãos, ele só as move e as coisas morrem e viram pedacinhos, retalhos, e...

— Se acalma, Baekhyun. Você conseguiu falar mais de cem palavras em um único segundo. Sua mão, eu vou chamar o Lay para dar uma olhada nela.

— Sehun, o que foi que acabou de acontecer?! – Baekhyun se desespera e começa a falar feito um louco novamente, mas eu não consigo me concentrar no que ele esteja falando mais.

A confusão que se instaurou.

— Eu sabia que não devíamos ter ido atrás desse cara! – Chen grita já ascendendo as mãos e fazendo Chanyeol pular para longe dele conforme os raios começam a sair e atingir o chão. – Olha o que ele fez!

— Calma Chen, – eu deixo um Baekhyun histérico tagarela falando sozinho e fico de pé tentando me colocar entre Chen e Luhan, tomando o cuidado de me manter longe dos raios quase fora de controle – ele nos salvou, poderia ter sido bem pior se ele não estivesse lá para nos ajudar. – Eu tento persuadi-lo, mas seu olhar é de pura raiva, não devia estar pensando naquele momento, o que me faz achar que eu também não estou pensando por decidir ficar na frente dele.

— Sai da frente, Sehun... – Chen me avisa, quase ameaça, na verdade. – Não se intrometa nisso.

Luhan, por sua vez, que nem mesmo havia entrado na nossa área segura, recua alguns passos com as mãos levantadas como que dizendo não querer problemas.

— Vamos nos acalmar, Chen, - Suho pega no ombro dele o que parece acalmá-lo – se o Sehun disse que ele os salvou, devemos agradecê-lo, não queremos mais mortes aqui, não é? – Chen não o responde e continua fitando Luhan com faíscas saindo de suas mãos. – O que houve, Sehun, Baekhyun? – Suho questiona tentando transparecer calma e tranquilidade, mas eu vejo seu maxilar ser pressionado.

Ele também está tenso.

— Ainda temos o Tao com a mão...eu não sei ao certo como descrever aquilo – ele apontou olhando para a cabana de recuperação por um segundo antes de voltar sua atenção para mim - e Baekhyun está histérico no chão. O que houve?

Eu repasso a cena em minha cabeça tantas vezes que chego a perder as contas, tento me lembrar de cada detalhe porque não quero defender alguém que depois possa a ser problemas para nós, mas a verdade é essa, eu fiquei apavorado ao ver a cena, mas ele salvou todos nós. Não há outra explicação ou interpretação.

Explico o que houve, como a criatura apareceu do nada, se regenerou e como Luhan salvou Tao, Baekhyun e Kai e depois destruiu a barreira para Tao poder ser tratado.

— Baekhyun, foi isso que aconteceu? – Suho quis confirmar, mas agora ele também não tirava os olhos de Luhan um só segundo e eu não sabia dizer se seu olhar era de curiosidade, espanto ou avaliando um possível inimigo.

Ele ainda ofegava, segurava sua mão esmagada, antes de responder, Baekhyun olhou para Suho, depois para Chen, depois para Kris que estava um pouco mais perto, de volta para Suho e então para Luhan – Eu não sei como ele fez isso, mas ele destroçou aquele bicho estranho verde no meio do ar sem nem encostar nele, foi bizarro eu nem vi nada até um outro correr pra cima de mim e do Kai e eu não consegui fazer nada eu só gritei pela minha vida e depois o gelo e a pedra e tudo virou um monte de pedaços e... – Baekhyun ainda estava histérico e babava ao falar emendando uma palavra na outra.

— Baekhyun! – Suho o chamou de volta ao foco – Ele salvou vocês, ou não?

Ele olhou mais uma vez de Luhan para Suho, de volta para Luhan e soltou a respiração de maneira ruidosa antes de olhar novamente para Suho e confirmar com a cabeça. – Se não fosse ele, eu e o Kai teríamos sido comida de bichão verde. Ele nos salvou.

— Pois bem, Luhan, você os salvou e por isso eu o agradeço. – Suho o cumprimentou com uma leve reverência apenas de sua cabeça.

— Salvou a si mesmo, também. – Kris aponta e já vejo chamas rodeando seu corpo.

— Isso também. – Suho concorda. – Mas eles estão vivos graças a ele, não fosse ele, teríamos perdido quatro companheiros. Então vamos nos acalmar, ok?

— Eu não vou abaixar minha guarda contra ele. – As faíscas nas mãos de Chen voltaram a ser raios muito grandes e violentos, elas brilhavam com tanta intensidade que suas mãos parecem apenas duas massas de eletricidade.

— Não podemos deixar que todo aquele inferno volte a acontecer. – Kyungsoo fala calmo e não sei se isso me assusta mais do que ele nervoso.

— Eu garanto não retornará. – Suho pondera e suas mãos começam a produzir água e ela começa a rodopiar ao redor dele, ele não quer confronto, mas está pronto para ele – Luhan, não é? Nós só queremos garantir que você não é uma ameaça a nós. – Ele conversa, conforme se aproxima devagar.

— Porque eu seria uma ameaça? – Luhan perguntou com uma sincera curiosidade. – Eu nem sei o que acabou de acontecer, ok? Eu só...só...eu não sei explicar eu só senti algo em mim...como uma energia e quando eu vi...aquele inseto pulando no Tao...na hora eu nem pensei eu só quis salvá-lo.

— E por isso, eu lhe agradeço, e muito. – Suho o assegurou e parou ao meu lado para falar com ele. – Sehun ajude o Baekhyun, por favor.

SUHO

Eu estou cansado e fazer esse pouco de água me rodear está me consumindo mais do que eu pensei que poderia, mas eu preciso fazer isso. Kyungsoo está em um estado de espírito calmo demais, uma frieza perigosa, Kris e Chanyeol de olhos vermelhos e chamas se formando ao redor deles, Chen está destruindo o chão ao seu redor com o impacto dos raios atingindo o solo e Xiumin já fez a atmosfera ao redor dele mais fria, sua respiração já está visível no ar em baforadas de fumaça

O garoto pode sim ser uma ameaça como pode ser apenas uma triste coincidência.

Eu também estou tenso e ansioso com ele, com sua presença aqui e como ele conseguiu destruir tudo tão fácil e ainda estar tão calmo e controlado, mesmo nesse momento, ele está vendo cinco homens a frente dele, cada um com sua habilidade estranha e esquisita, mas está calmo, tranquilo, na verdade, parece até fascinado.

Vez ou outra ele olha em volta como que observando algo que achasse fascinante e ninguém nunca acha isso fascinante.

— Perdoe nossa hostilidade, - eu pedi, tentando manter minha voz calma e convidativa, eu me recusava a ser igual Namjoon e agir como um tirano que achava que tinha o poder e controle de tudo – é que estamos um pouco tensos com algumas coisas que vêm acontecendo aqui dentro, como é de se imaginar, quem não ficaria tenho em um ambiente desses. – Ele permanece em silêncio e não sei o que interpretar disso. – Você já se lembrou de seu nome?

— Me foi dito que é Luhan. – Ele respondeu calmo, seguro, firme.

Ninguém nunca apresentou essa calma e frieza frente a tudo isso.

— Deve voltar para você em alguns dias. – Eu o asseguro. – Agora, me diga uma coisa, Luhan, isso não te assusta? Ver ...tudo isso? – Eu pergunto apontando para todo o nosso redor e para os rapazes. – Você está bem calmo observando tudo.

Pela primeira vez ele pareceu vacilar por um segundo, ele olhou direto para mim surpreso e um sorriso amarelo e sem graça apareceu em seu rosto antes de me responder – Eu ainda não entendi o que está acontecendo aqui... acho que ainda estou em choque com...tudo isso.

— Nós o explicaremos o que está havendo. – Eu o informo sem conseguir esconder em minha voz a desconfiança que sinto nesse momento, meu rosto também não deve esconder pelo jeito que ele me olha receoso agora.

— Porque eu sinto que estou na mira de vocês, por algum motivo? – Ele indagou com um sútil sorriso.

Sorriso.

Ele acabou de acordar em um labirinto e passou por um sufoco, encontrou e matou uma criatura que poderia ter saído direto de um pesadelo dele ou da oficina particular do próprio capeta, seja lá o que isso quer dizer, e está sorrindo.

— Desculpa, mas eu ainda não consigo entender como você pode estar tão calmo vendo tudo isso. – Eu dou uma risada nervosa que nem eu mesmo sei porque dei, cruzo os braços na frente do peito e acabo por perder minha pose que eu tentava manter calma e convidativa.

— Eu realmente não sei o que está acontecendo aqui, é só isso. – Ele se defende, dessa vez dando uma risada sem jeito e até nervosa também. – Eu acabei de salvar alguns amigos seus... porque está me olhando como se fossem me mandar para a guilhotina?

— Para o que? – Ouço Kyungsoo perguntar atrás de mim.

Exatamente, o que é guilhotina? A palavra não me é estranha, mas não sei o que poderia ser, formar a figura em minha mente, mas aparentemente é algo ruim, pela frase dele, algo muito ruim.

Mais uma vez, um sinal de confusão, mas dessa vez ele estava até mesmo inseguro e diria nervoso com algo, pressionou o maxilar uma vez e engoliu seco antes de falar com uma confusão misturada com simpatia – Para... sabe... guilhotina... é um... é um... – agora ele tinha as sobrancelhas juntas em sinal de confusão tentando pensar e de repente um sorriso tímido – pior que eu também não sei o que é, para ser sincero.

— É, isso acontece, as vezes... – eu comento – algumas palavras vêm à mente e não sabemos o que elas querem dizer, alguns nomes.

— Mas essa palavra, ninguém conhece, Suho. – Kris praticamente rosna mais à esquerda.

— Isso acontece, Kris. – Eu tento acalmá-lo.

— Suho, - Kyungsoo se aproxima de mim e fala um pouco mais baixo tentando evitar ser ouvido pelos outros – eu não gosto nada disso, olha esse cara, ele está calmíssimo como se já conhecesse isso aqui, inferno ele está mais calmo que o Baekhyun que estava tagarelando igual uma matraca! – Ele concluiu seu pensamento ralhando comigo quase me cuspindo.

— O que é matraca? – Eu pergunto antes de me dar conta.

— Não vem ao caso agora... até porque eu também não sei.

— E o que eu deveria fazer? Mandá-lo de volta para o labirinto? Nunca.

Para isso, Kyungsoo não teve resposta, apenas continuou ao meu lado sem tirar o olho de Luhan por um segundo. Ele é sim, estranho, é sim, suspeito, tanta calma e aparente controle logo de cara, algo me diz que tem coisa aí, mas não posso simplesmente manda-lo de volta para os perigos do labirinto, eu seria um monstro se fizesse isso, além do mais, isso é tudo reflexo do que vivemos com Namjoon, nenhum outro rapaz que tivesse as mesmas habilidades dele veio para cá depois.

Eu também não quero ele aqui, me sinto desconfortável e fora do meu eixo, mas não tenho um motivo claro e concreto para isso ainda.

Ele salvou os rapazes, Tao, Baekhyun, Sehun e Kai poderiam estar mortos nesse momento, eu não posso deixar isso de lado, simplesmente não posso.

— Nós vamos dividir cabana. – Eu começo a informar Kyungsoo.

— O que?

— Eu irei dormir na mesma cabana que você...

— Suho, você não...

— ... ficaremos sempre de olho nele...

— ... você só pode...

— ...montaremos guarda a noite também...

— ... isso só pode ser brincadeira...

— Ele não é aquela mesma pessoa, ele não pode pagar por erros e atitudes que não foram dele.

— Eu não acredito que...

— Você confia em mim? – Eu o pergunto olhando direto nos olhos.

Kyungsoo sempre foi meu melhor amigo aqui dentro, tudo que eu fiz sempre foi com o apoio dele, sempre com ele ao meu lado, muitas vezes era ele que tomava as decisões eu só o consultava, a verdade é que foi ele que me fez líder de todos aqui dentro desde aquele louco, se não fosse por ele me aconselhando e ajudando, eu não sei o que teria acontecido comigo e com todos nós.

Por isso seu apoio sempre é tão importante para mim.

Eu estou assustado e sem saber o que fazer nessa situação, Luhan pode ser tão perigoso quanto ou até pior que Namjoon, eu sei disso, tenho plena consciência, como também pode ser alguém muito diferente e que pode vir a ser uma grande ajuda para todos nós aqui dentro.

É um grande risco, eu sei disso.

— Você confia em mim? – O pergunto mais uma vez.

Ele me encara com seus grandes olhos por um longo momento antes de me responder suspirando alto – Confio. – Solto a respiração que nem havia percebido que estava segurando, aliviado. – Mas não posso te apoiar nisso. – Na mesma velocidade que me senti aliviado, sinto meu peito pesar e meu estomago ficar gelado. – Eu ainda respeito suas decisões e estou com você até o fim... – ele olha para Luhan com uma frieza que chega a doer – mas saiba que fará isso sem meu apoio.

— Eu só peço um voto de confiança, você sabe que nunca iria fazer algo que prejudicasse qualquer um aqui dentro. – Eu tento argumentar, mas sei que é inútil, nessa decisão, estou sozinho.

— Se algo acontecer, será sua culpa, só espero que você lembre disso. - O mesmo olhar frio que direcionou a Luhan há um segundo, ele direcionou a mim agora. – Eu vou mostrar o lugar para ele e explicar o que eu puder. Coloque sua cama no meu quarto.

— O que?! – Chen perguntou indignado quando se deu conta do que estava acontecendo. – Suho, você não pode estar falando sério!

— Chen...

— Vai para o inferno! – Ele ralhou antes de sair andando para sua cabana a passos pesados.

— É isso mesmo, Suho? Ele vai ficar? – Kris me pergunta incrédulo.

De repente sinto todos os olhares em mim, esperando a minha palavra, a minha decisão.

— É. – É a única coisa que eu respondo.

A reação é exatamente igual para todos, revolta, incredulidade, raiva. Em todo esse tempo é a primeira vez que me sinto sozinho em uma decisão. Kyungsoo me olha a distância por um momento muito longo antes de ir em direção a Luhan para lhe explicar o que estava acontecendo e onde ele estava.

Uma coisa eu prometo para mim mesmo, ficarei de olho nesse cara o máximo que eu puder, no primeiro sinal que ele pode ser uma ameaça para nós, eu não hesitarei em mata-lo.