KRIS

É incrível como nosso corpo consegue arranjar energia mesmo quando você já achava que estava totalmente esgotado e sem um único fio remanescente de força, tudo que é necessário é um motivo, uma razão, uma necessidade para essa força surgir, e exatamente agora eu sei que foi isso que aconteceu.

A cada paço que dou em direção ao paredão de gelo que serve de portão para nossa comunidade, meu corpo reclama e protesta com ondas de dor, mas ao mesmo tempo, é como se não as sentisse mais, meu corpo já está anestesiado depois de tantas injeções de adrenalina pelas quais ele já passou, eu apenas sigo em frente, de maneira mecânica.

— Porque aquele gelo ainda não sumiu?! – Chanyeol ofega.

Tao, que estava o tempo todo perto de nós, salvo quando estava verificando o caminho para nós, desata para frente em direção ao paredão e aparece lá em um segundo e começa a socar e bater nele de todas as maneiras que pode, até mesmo acelera seu corpo e da vários socos tão velozes que seu braços chegam a sumir, mas nada acontece.

O som dos cascos batendo no chão estão mais fortes, me atrevo a olhar para trás e vejo que estão chegando cada vez mais perto, a pequena distração que Chanyeol havia feito, não resultou em muita distância.

Chego a sentir o chifre me cutucar nas costas uma vez e então tento uma última coisa.

Faço minhas chamas me levantarem no ar, dou um mortal para trás e consigo, no meio do ar, pegar o chifre do mais próximo a mim e ficar em cima de suas costas, ainda segurando seu chifre, acendo minhas chamas o máximo que posso, o que não é muito a essa altura, e consigo fazer a pele do animal queimar assim como seu chifre, que para minha surpresa pega fogo, o puxo com toda a minha força para o lado o que faz com que o corpanzil atarracado da criatura guine para o lado e então me jogo para frente e faço minhas chamas me projetarem com toda a força que ainda me resta.

— Saiam da frente! – Eu grito, fazendo Kyungsoo e Chanyeol virarem para trás e se esquivarem no momento em que que os acertaria bem na nuca.

Caio no chão aos pés de Tao, em frente ao paredão de gelo.

— Porque ele ainda não abaixou essa merda! – Tao ralha furioso socando o gelo – Xiumin, desfaz essa porra, agora! Estamos quase sendo esmagados aqui!

Olho para o céu e vejo que o pilar de luz sumiu de repente e fico mais apreensivo, porque Baekhyun iria apagar seu pilar de luz de repente? Algo está errado.

Me surpreendo ao ver que onde Tao havia socado o gelo, está com manchas de sangue, tamanha a força com a qual ele batia na pedra e nada dela se desfazer ou sequer, trincar ou rachar.

— Você só pode estar de brincadeira comigo. – Chanyeol exaspera começando a socar a pedra também. – Muito bem, Kris, conseguiu alguns segundos para nós.

Olho para trás e vejo que o corpo que eu guinei para o lado virou um pequeno obstáculo pelo qual os brutamontes agora têm de passar por cima e as patinhas curtas têm dificuldade.

— XIUMIN! DERRETE ESSE GELO, AGORA! – Kyungsoo grita com tanta força que as veias de seu pescoço ficam grossas como nunca havia visto antes e seu rosto fica tão escarlate que me assusta.

Agora estamos os quatro, em frente a parede de gelo com uma horda vindo em nossa direção.

Kyungsoo, em um último esforço de sobrevivência, cria uma parede de pedra na nossa frente, floreando os braços várias vezes e a cada movimento, uma placa retangular de pedra sobe e na frente dela, outras três até que metros de pedra nos separam e protegem dos brutamontes, logo estamos praticamente prensados entre pedra e gelo, mas não demora e a pedra começa a tremer levemente, rachaduras parecem e até mesmo vemos pó subindo a cada pancada e pequenos pedaços caindo após cada golpe dos brutamontes.

Eu olho para o gelo e começo a sentir meu peito apertar e pesar, chega a ser irônico, como estamos tão perto da segurança e tão perto da morte ao mesmo tempo.

Chanyeol, Kyungsoo e Tao se esgoelam para Xiumin derrubar o gelo, mas se ele fosse fazer isso, já o teria feito, até mesmo me atrevo a dizer que vejo sombras e vultos se movendo através do gelo.

Sinto meus joelhos vacilarem, quando me dou conta, estou de joelhos no chão, uma lágrima solitária rola por meu rosto, apoio a testa no gelo e me deixo aceitar a verdade.

É aqui que eu morro.

XIUMIN

Estou começando a sentir o desespero tomando conta de mim, por mais que eu tente, simplesmente não consigo fazer o gelo me obedecer, na verdade não sinto ele de jeito algum.

— O que houve? Porque você apagou sua luz, Baek? Eles precisam dela e Xiumin, anda logo desfaz esse gelo! – Kai me apressa, mas não adianta, nada acontece, por mais que eu force.

— Eu não sei, eu não estou conseguindo acender, de jeito nenhum. – Baekhyun encara suas mãos confuso, sem entender. – Acho que estou mais cansado do que imaginei.

— Não é isso, eu não estou conseguindo usar meus poderes também. – Eu me assusto com o terror em minha própria voz, estou desesperado. – Eu não consigo, de jeito algum!

— Como assim, Xiumin, como não consegue desfazer o gelo? Está esgotado também? – Kai adota um tom mais cético do que preocupado – Abaixa esse picolé gigante logo! A qualquer...vocês...vocês estão ouvindo? – Kai pergunta de olhos arregalados. – São eles, eles estão do outro lado, gritando.

E realmente, eles estavam do outro lado do gelo, gritando pelo meu nome a plenos pulmões, eu acho que é o Tao e ele também está desesperado. Isso faz meu estomago se revirar de medo e angustia, meu coração parece parar uma batida antes de acelerar como nunca antes, eu tento com todo o meu ser conseguir abaixar o gelo, me ajoelho no chão de olhos fechados, tentando de todos os jeitos que sei e que poderia tentar, mas nada adianta, simplesmente não adianta.

— Xiumin, faz alguma coisa! – Kai grita e chega a desafinar, também aflito – Eles estão ali do outro lado!

— Eu já disse que não consigo! Eu não sei o que está acontecendo! – Ele ficar me pressionando apenas conseguiu me deixar irritado – Porque você não se teleporta e os trás para dentro?

Ele me encara com um olhar cortante por um segundo, não demora um segundo e ele também fica perdido e confuso e eu sei que é porque ele não consegue usar suas habilidades também, assim como eu e Baekhyun.

— O que está havendo? Porque nenhum de nós consegue usar nossas habilidades? – Ele chega a cair de joelhos por um segundo e então corre para o paredão de gelo e fica de um lado para o outro olhando os vultos que se mexem do outro lado, nossos amigos, que vão morrer por minha culpa.

Por minha culpa.

Tão repentinamente como aconteceu, também parou, em um segundo eu senti toda a extensão do gelo, todas as reentrâncias da pedra e até mesmo as pessoas batendo nela.

Com um movimento eu fiz o gelo vir a baixo e sumir no meio do nada, Kai sumiu no meio do ar e então reapareceu mais uma vez com Kris e Chanyeol de cada lado, Tao correu para dentro e se jogou no chão e então Kai apareceu mais uma vez com um Kyungsoo com a testa banhada de sangue e mancando do pé esquerdo e então sumiu mais uma vez e ouvi sua voz apressada dentro da nossa cabana de recuperação.

Na porta da nossa área livre e segura, blocos de pedra caiam um por cima do outro, nuvens de poeira subiam e brutamontes de chifres gigantes apareciam por cima deles com muita pressa e vontade de se aproximar de nós e apenas aquela visão daqueles animais me despertou uma mistura de sentimentos que não sei classificar.

Eram elas que queriam matar meus amigos, assim como quaisquer outras dentro desse labirinto infernal, mas alguma coisa na voracidade deles me deu nojo, raiva, ódio.

Movida por esse ódio, uma onda de energia aflorou e desabou em mim e levantando as mãos acima de minha cabeça, eu fiz uma chuva de estacas de gelo, com tantas estacas como nunca havia feito antes.

Era desnecessário, afinal, não poderiam passar da porta, mas algo me fazia querer mata-los e com um único movimento eu fiz as estacas descerem do céu, mas para a minha surpresa, nenhum dos brutamontes foi perfurado por elas, pelo contrário, a pele cinza e grossa, conseguiu quebrar cada uma e eles só deixaram de avançar e morreram quando atravessaram a porta para nossa área segura, só então, seu corpos começaram a explodir um por um até que eles pararam, viram o que acontecia com seus semelhantes e então, recuaram.

Mas foi o suficiente, para me deixar amedrontado.

Um tipo novo de criatura, contra o qual eu não posso lutar.

Isso me fez sentir vazio, muito vazio.

- O que está acontecendo? – Eu sussurro sentindo meus joelhos vacilarem e meus olhos queimarem com as lágrimas de medo que descem pelo meu rosto.

KAI

O peso de uma pessoa que está quase desmaiando é ainda maior do que eu me lembrava, ou talvez meu corpo estivesse muito mais cansado do que eu me lembrava, mas levar Kyungsoo para a cabana de cura estava sendo mais difícil do que eu imaginava.

Quando a parede de gelo veio a baixo e todos começaram a entrar, eu vi quando ele perdeu a concentração e uma parede de pedra acabou caindo em cima dele e rasgou sua testa, ele está praticamente banhado em sangue.

Eu consigo deitá-lo em uma maca na tenda de recuperação, Chen e Suho estão cada um em uma, Lay está sentado em um banquinho de pedra alternando entre os dois.

— Calma, pequeno, o Lay já vai fechar esse corte. – O tranquilizo pegando um pedaço de pano e limpando sua testa.

Kyungsoo não responde, seu olhar está distante e cansado, seus grandes olhos quase não conseguem se manter abertos e algo naquela visão me assusta, muito, ele sempre foi uma das bases de todos aqui dentro e de repente ele é atingido e machucado de tal maneira. Aquilo me desespera, antes que eu perceba, minha visão fica turva, minha garganta parece inchar e lágrimas descem pela minha bochecha.

— Ele vai sair dessa, - Sehun me assusta quando coloca a mão em minhas costas ao ficar ao meu lado – ele vai sobreviver.

Eu não consigo responder, apenas seco minhas lágrimas, que eu nem mesmo havia notado chegar, o ofereço um sorriso e saio da cabana.

— Manda o Baekhyun entrar aqui, por favor. – Ouço Lay me pedir ao sair da cabana.

Xiumin e Baekhyun estão mais afastados, Kris e Chanyeol estão sentados observando a porta da nossa área segura, ambos estão calados, apenas olhando para fora, para os restos dos brutamontes que tentaram entrar aqui e acabaram explodindo.

Tao está um pouco mais atrás deles, ainda jogado no chão olhando para o céu, seu peito levanta e desce lentamente conforme ele respira, todos parecem estar muito abalados, atônitos com o que aconteceu, como quase todos morreram no labirinto.

Xiumin e Baekhyun estão em um canto, Xiumin encara o vazio parecendo muito abalado, Baekhyun está ao seu lado, esfregando suas costas, sem falar nada.

— O Lay te pediu para ir para a cabana, Baek. – Eu o informo e me assusto ao perceber como minha voz ainda está embargada e como acabo suspirando um pouco demais. – Você já consegue acender? – Eu o pergunto quando ele se levanta.

— Sim, - ele responde fazendo sua mão brilhar – eu não sei ainda o que...

— Nenhum de nós sabe. – Eu o corto e ele parece entender que não quero falar sobre aquilo e segue para a cabana onde Lay o esperava deixando Xiumin sentado de pernas cruzadas e ainda encarando o vazio.

— Hey, - me sento ao seu lado – como você está?

— Eles podiam ter morrido, Kai, - ele responde sem exatamente olhar para mim – eles podiam ter morrido e ia ser minha culpa.

— Não ia ser sua culpa, Xiumin, todos nós apagamos, por algum motivo, esqueceu?

— Nem me fale, - ele finalmente se mexe e apoia os cotovelos nas coxas e a cabeça nas mãos – como isso pode ser possível? Todo mundo simplesmente, apagar, o que foi aquilo, afinal?

— Eu também não faço ideia. – Exaspero tão confuso quanto ele.

— E ainda me aparecem aquele monte de... de... sei lá o que e eu não consegui fazer nada contra eles... – Xiumin pareceu realmente apavorado por ter um novo tipo de criatura que ele não podia lutar contra. – O que está acontecendo? – Xiumin começa a chorar novamente.

— Cala a boca, Xiumin! – Tao ralhar nos pegou de surpresa, ele ainda encarava o céu, mas sua voz estava irritada – Eu não quero ouvir sua voz por enquanto, eu quase morri por sua causa.

No tempo em que estou aqui dentro e que conheço Xiumin, eu nunca o vi tão ofendido, triste e irritado antes, eu estava esperando que ele fosse brigar, revidar, falar alguma coisa, qualquer coisa, mas ele não falou nada, apenas abaixou a cabeça e deixou mais lágrimas descerem.

Xiumin é tão confiável quanto qualquer outro aqui dentro e eu vi como ele ficou desesperado para abaixar aquela parede de gelo e senti o mesmo desespero que ele quando não consegui usar meus poderes. Tao culpa-lo era tão errado e injusto.

— Ah, para com esse chororô ridículo...

— Cala a boca, Tao! – Eu fiquei de pé antes que me desse conta, e fui andando até ele – Cala a boca ou eu juro que te faço calar.

Ele apenas me olhou de canto de olho e voltou a encarar o céu antes de me responder – Você também demorou bastante para se teletransportar lá para fora para nos buscar, não?

Meu sangue ferveu e então eu o puxei pela camiseta, o coloquei sentado – Será que você é surdo? Eu mandei você calar essa boca! Você não deveria abrir a boca para falar tamanha asneira, seu imbecil!

Uma lufada e ar e no momento seguinte, onde Tao estava não há mais nada e de repente estou sendo empurrado no chão. – Desde quando você é defensor dele e desde quando ele precisa de defensor?

Me teleporto apenas para sumir no ar e quando reapareço estou no meio do ar e dou um chute bem no peito de Tao fazendo-o cair de costas no chão. – Nenhum de nós conseguia... – Eu sou impedido de falar no meio da minha explicação, o chão pareceu sumir debaixo dos meus pés e quando me dou conta, caí de barriga no chão.

— Parem com isso! – Kris já havia se levantado e se aproximava, mas eu não ia deixar Tao falar tanta merda sem saber do que estava falando em primeiro lugar.

Quando eu me levantei para revidar, uma parede de fogo se ergueu ao meu redor, mas eu apenas me teleportei, então eu vi Tao sendo agarrado por um braço de gelo mais para frente e sendo levado até Xiumin.

— Tao, você tem toda razão de estar nervoso e desconfiado de mim, - Xiumin o encarou e falava de maneira clara, séria e forte – mas eu posso te garantir que nunca, jamais, foi minha intenção deixar vocês chegarem tão perto da morte, você pode perguntar o Kai e para o Baekhyun, por um breve momento, nenhum de nós conseguiu usar nossos poderes, Baekhyun apagou e não conseguia acender, Kai não se teletransportva e eu não conseguia controlar o gelo.

— Me poupe. – Tao debochou – Como vocês não conseguiram usar seus poderes e nós conseguimos? O Kyungsoo levantou pedras igual louco lá fora. E do nada, de repente, eles voltaram, assim, simplesmente? Você espera que eu acredite nisso?

— Você acredita em um homem capaz de controlar gelo, - Xiumin o contestou de maneira ríspida – você sabe tão bem quanto eu que isso não é possível, no entanto, cá estou eu fazendo exatamente isso. Eu sei que em momento algum eu quis prejudicar vocês ou que vocês morressem. Cabe a você, acreditar ou não.

E com um movimento rápido o braço de gelo se desfez no ar e soltou Tao que ficou em seu canto um tanto quanto envergonhado sem saber o que dizer ou fazer.

— Quanto mais tempo eu passo aqui dentro, menos eu sei o que real e no que eu posso ou não confiar, ou em quem. – Tao resmunga ao ir para sua cabana.

Nesse momento eu me lembro da informação que eu consegui no labirinto. Suho matou um de nós, matou outro humano no passado. Namjoon, quem era você e porque Suho o matou? E um novo nome apareceu lá naquela sala, Luhan.

Olho para Chanyeol à distância e eu quase consigo sentir que ele está pensando nisso também.