Issa

Sentei em uma pedra, observando a neve caindo levemente, mesmo com a presença do sol. Fagan, por sua vez, observava tudo à sua volta, cuidando do perímetro. Ele parecia humano, mas meus instintos gritavam que ali não encontraria nada além de perigo. As horas se arrastaram, nada de perigoso parecia se aproximar do castelo.

- Por que você cuida do castelo? Talvez fosse melhor deixar invadirem e matarem todas elas. – comentei, tentando sanar uma dúvida que estava ali desde que fui “acolhida”.

- Não adianta... Elas matariam qualquer um que tentasse...

- Então por que tenta? – interrompi-o, encarando o homem que estava de braços cruzados, encostado relaxadamente na parede.

- Mataria qualquer um que tentasse sozinho. – disse, parecendo completar o pensamento. – Por isso você está aqui. – apontou para mim, sorrindo, como se estivesse se divertindo.

- Não fale como se eu fosse uma arma. – sussurro.

- Como?

- Nada... – desconverso. – Mas por que quer matar todas as bruxas?

- Tantas perguntas para uma pequena mulher só. – ele dá ênfase à palavra “pequena”, como se tentasse me irritar. Vendo a imparcialidade estampada no meu rosto, resolveu responder. – Digamos que as bruxas não são legais com filhos homens de bruxas.

- Então filhos homens de bruxas se dedicam a matar todas as bruxas? – pergunto, dando ênfase à palavra “todas”, observando até onde aquilo era uma conversa divertida.

- Tem uma bruxa que talvez eu mantenha viva... – ele comentou, se aproximando com as mãos nas costas, como um velho nobre em inspeção à tropa.

- E ela talvez seja a sua mãe?

- Não. – ele respondeu curto e grosso, parando à minha frente. – Minha mãe morreu. E uma das bruxas que não gostava da ideia do filho homem era ela.

- Olha... Que história emocionante. – digo, um tanto irônica. Realmente não me importa magoar ou não o feiticeiro.

- Cuidado com o que diz criadora de abelhas, posso muito bem desistir de manter a tal bruxa viva. – seu rosto a poucos centímetros de meu rosto estava sério. Os olhos parecendo em chamas, como se quisesse me incinerar.

- A menos que essa bruxa seja minha irmã, não me importa quem será a última bruxa no mundo. Aliás, um mundo sem bruxas para continuar essa raça desgraçada será melhor, e não digo só pelas mulheres. – falo ácida, encarando seus olhos.

- Mulher idiota. – ele desvia o olhar, levantando a mão, como se fosse desferir um tapa em mim.

Um barulho nos paralisou. Parecia vir de dentro do castelo.

- Droga. – Fagan segurou meu braço, me levando até a parede do castelo. Imaginei que por algum motivo ele iria de encontro a ela, mas a parede mostrou uma passagem para o interior do castelo.

- O que? – digo apontando para passagem.

- Castelos são feitos com milhares de passagens para fuga, não imagina quantas há aqui. – ele subia escadas, que para mim não passavam de labirintos.

- Pensei que bruxas soubessem voar. Ou será que são para você? Afinal há provas de que feiticeiros voam? – ri, apenas para irritá-lo mais, já que isso se mostrou uma atividade prazerosa.

- Cale a boca, a menos que queira ver quanto tempo sobrevive ao fogo. – sua mão esquentou levemente, como se realmente quisesse me matar ali. A última porta que atravessamos deu em um corredor com várias portas, que imagino ser os vários quartos do castelo. A porta em uma das extremidades do corredor abriu, mostrando um par de olhos verdes.

- Axel... ? – me espantei, sendo ele a última pessoa que esperava ver. Atrás dele, várias bruxas lutavam contra Hansel e Halias.

- Isso... Distraia-o que irei aproveitar a confusão para matar Lilith. – o ruivo sussurrou para mim, indo para a porta na outra extremidade do corredor.

- Bruxas... Nunca confie nelas. – Axel parecia dizer isso para si mesmo. Carregou a arma e partiu em minha direção. Ele atirou, mas por pouco desviei da bala.

- Já não bastou aquele tiro no meu braço? – pego um esfregão que estava encostado na parede, para usá-lo como arma.

- Deveria ter te matado antes. – seus sucessivos tiros estavam fáceis de desviar, talvez pela fúria que o cegava, logo estava sem munição. Jogou a arma no chão, tirando uma faca do cinturão.

- Espere, eu posso explicar. – paro sua investida com o pedaço de madeira destinado à limpeza.

- Pior que as desculpas do meu filho. – ele fala, chutando meu estômago, manchando de lama e neve o lindo vestido vermelho. Com a faca tenta alcançar meu pescoço, mas seguro seu punho e usando o bastão para empurrá-lo para longe. Ele bate na parede, derrubando a faca. Uso a chance e prendi o homem contra a parede com o bastão em seu pescoço. Ele estava com o joelho levemente dobrado, com o bastão prensado em seu pescoço, e eu na ponta dos pés, para ficar à sua altura. A situação seria cômica, se o olhar dele não estivesse carregado de ódio. – Vamos, me mate bruxa.

- Eu não mato humanos. – digo, encarando o caçador. Escutei o barulho de uma das portas, era a porta do quarto de Lilith. Fagan saiu dali puxando a bruxa pelo braço, seus olhos brilhavam fortes como o fogo, a ponto de matar a bruxa. Quando parecia que tudo estaria acabado, uma outra bruxa aparece e segura o braço de Lilith, enquanto encarava Fagan. A nova bruxa usava um vestido cinza com uma capa branca, sua pele parecia neve e o cabelo loiro quase desaparecia de tão claro.

- Olhe que maravilha. – Lilith sorriu, falando gentilmente, mas ouvidos experientes podiam escutar a maldade disfarçada. A bruxa com roupas curtas demais e uma outra, com roupas marrons com aspecto sujo, seguravam Hansel e Halias. Os dois pareciam abatidos e tive de me segurar para não partir para cima da bruxa de roupas curtas pelo modo grosseiro que segurava Hali. – Relaxem, meus queridos. – o sorriso da bruxa soava sarcástico e cruelmente vitorioso. – Vamos fazer um jantar para comemorar essa vitória. – ela riu. – Vand, Krajiny e Gale, levem eles daqui. – se soltou das mãos dos dois e voltou para o quarto, como se a invasão tivesse sido apenas algo planejado.

As bruxas pegaram os três, levando eles embora. Segui Hali com o olhar, lutando contra a vontade de arrancar a cabeça das três bruxas ali mesmo. Voltei meu olhar para Fagan, que observava os caçadores sendo levados, havia uma clara frustração estampada em seu rosto.

Fiquei no quarto, deitada na cama e encarando o teto. Vários planos passaram pela minha cabeça, mas a maioria foi descartada. Não havia nada que eu pudesse fazer sem que colocasse em risco a vida de um dos três.

- Levante. – Fagan entrou no quarto sem nenhuma cerimônia.

- Você não manda em mim feiticeiro. – apenas ignorei, voltando a pensar no que poderia fazer.

- Mas imagino que queira ver seus amigos. Descobri onde eles estão. – aquelas simples palavras me fizeram levantar e andar até a porta rapidamente. Passamos pelos corredores, descemos a escadaria principal, chegando até a porta ao lado da escada. Como imaginei, ali deveria ser uma espécie de calabouço do castelo. Nada mudara desde a última vez que abri aquela porta, tudo escuro, sem iluminação. Depois da escada, havia um conjunto de celas, com grades enferrujadas e o chão extremamente sujo com lama e, provavelmente, sangue. Em uma das celas era possível ver sombras, corri até a grade, tentando enxergar alguém ali. Encontrei Hansel e Axel encostados na parede, parecendo acabados, como se as bruxas tivessem torturado os dois. Halias não estava ali.

- Onde está Halias? – perguntei, me virando para Fagan.

- A mulher não estava com eles. Eu ainda não a encontrei.

- Droga... – provavelmente a fúria estava estampada em meu rosto. – Consegue abrir a cela? – o feiticeiro fez que não com a cabeça. Me aproximei da grade, a cela era relativamente pequena. Devia ter 1 metro e meio de uma parede a outra, e 2 metros da grade até a parede oposta. – Vocês estão bem? – perguntei. Hansel fez que sim com a cabeça, acenando para mim, já Axel me ignorou, como se eu fosse o real inimigo ali.

- Issa... Você precisa encontrar a Hali... Antes que algo aconteça... – Hansel pediu. – Nós conseguimos nos virar. – ele riu, dando um leve tapa no ombro de Axel, como se já fossem velhos amigos.

- Desculpa... A culpa é minha... Eu não deveria... – engoli o choro, passando a mão sobre o olho. – Isso tudo é culpa minha, não se preocupem. Vamos encontrar a Hali. – viro, poupando eles de uma Issa chorando feito bebê.

- A culpa não é sua. Nós decidimos vir te buscar. – me viro, para encarar Axel. Ele encarava o chão, enquanto segurava o ombro esquerdo, que parecia muito ruim.

- Eu vou tirar vocês daqui. – afirmo.