The Reason

A razão (capítulo único)


Era uma noite fria e a chuva que caía batia com força na janela da sala da chinesa. Ling Xiaoyu já não se divertia há um bom tempo, desde que ele havia partido sem se explicar. Ling olhou para sua melhor amiga, a enorme Panda que dormia próxima a lareira de pedras. Um sono que parecia bom e tranquilo. Xiaoyu suspirou e desejou que pudesse dormir assim um dia.
A chinesa aproximou-se da enorme janela de vidro em sua sala, que dava visão para a varanda, e olhou para a lua. Mesmo com todas aquelas gotas que caíam fortemente no vidro da janela, a lua permanecia linda no céu, brilhante e cheia.

Jin havia partido há 3 anos, sem se explicar ou dizer qualquer coisa a alguém. Não queria causar problemas e nem permitir que as pessoas sofressem por sua causa. Ele só não sabia que essa sua atitude magoara a única pessoa que realmente se importava com ele.


* * *

Era véspera de Natal e a cidade estava toda enfeitada com lâmpadas e enfeites coloridos, exceto uma casa. Xiaoyu perdera toda a animação que possuía quando Jin partiu. Ela acordou com Panda cutucando o seu corpo que, mesmo forte e habilidoso, era frágil. Xiaoyu abriu os olhos com relutância devida a claridade que entrava no quarto. Sentou-se na cama e coçou os olhos. Sorriu de um jeito fraco ao mirar a Panda em sua frente.

– Bom dia, Pandinha. – Xiaoyu suspirou e levantou-se da cama, calçando as pantufas cor-de-rosa felpudas que ganhava no seu ultimo aniversário. Caminhou até a penteadeira diante da cama e ali pegou sua escova, passando pelos longos cabelos negros enquanto olhava a imagem fria no espelho, olhando de volta para ela.

Ling já não usava mais as maria-chiquinhas que lhe marcaram durante o torneio. Panda aproximou-se e observou a amiga pelo reflexo do espelho.

– Você não é a mesma desde que ele se foi. Porque nunca foi procurá-lo? Você o ama, Ling.

A chinesa suspirou e, por um segundo, não conseguiu encarar-se no espelho. Sentia o coração apertar e seus olhos se encheram de lágrimas.

– Porque se ele se importasse comigo, Panda, ele teria ao menos deixado um bilhete. – E Xiaoyu largou a escova de cabelo sobre a penteadeira e caminhou triste na direção da porta do quarto, deixando Panda para trás.

Panda desceu as escadas atrás da triste Xiaoyu e ambas tomaram o café da manhã em silêncio. Ouvia-se apenas o som do quebrar das torradas, das xícaras quando tocavam os pires de porcenala chinesa e do mastigar das duas amigas. Panda, que não aguentava ver Xiaoyu triste, resolveu quebrar o silêncio:

– E sobre o Natal, amanhã? Nós vamos até a cidade para ver o espetáculo, o que acha? – Panda olhava com animação para Xiaoyu, esperando que os olhos da pequena brilhassem. Ling sempre adorava ver as luzes se acenderem, mas desta vez, ela olhou para Panda com o desânimo de sempre, e forçou um sorriso.

– Pode ir ao Centro ver as luzes se acenderem, Panda. Eu ficarei bem em casa.

– Não acho isso certo, Ling! Você não pode deixar de viver. Já se passaram 3 anos ... – Panda alterou o tom de voz. A situação já lhe incomodara. Xiaoyu não podia deixar de viver sua vida por causa de um homem que não ligava a mínima para ela.

– Três anos, Panda. E ainda assim eu o amo. – Xiaoyu levantou-se em silêncio, Panda a olhava com tristeza. Xiaoyu tentando ignorar, recolheu a mesa, lavou a louça, e foi entregando para Panda secar as coisas que utilizaram, mantendo o silêncio. Ling Xiaoyu deixara de ser aquela menina contente do passado e não sorria, porque ela não tinha motivos.

* * *

Jin suspirou pesado. Vergonha, decepção e dor tomavam conta de Jin, que se conformara com o rumo que sua vida tomou. Ele estava instalado em um albergue na periferia de um bairro simples no Tibet. Durante 3 anos viveu migrando por cidades e países asiáticos, tentando deixar seus problemas para trás, mas ele sabia que precisava enfrentá-los para que eles sumissem. Ele havia tomado muitas decisões na vida e arrependia-se de muitas delas. Mas se arrependia, particularmente, de não ter dado explicações para uma certa moça que lhe fazia falta. Para ele era esquisito acordar sem que Ling surgisse e pulasse em seu pescoço, enquanto berrava seu nome com aquela voz estridente e chata. Levantou-se da cama que rangia a cada movimento que fazia, e foi até a sua escrivaninha e catou um livro para distrair o pensamento, mas antes que pudesse se ocupar da leitura, percebeu que um pedaço de papel caíra de dentro do livro. Abaixou-se e pegou o papel cor-de-rosa, largando o livro no mesmo momento. Nem se lembrava mais daquilo, mas sabia exatamente o que era: um cartão escrito por Xiaoyu há muitos anos atrás.

"Feliz Natal, Jin! Que seus desejos se tornem reais e que possamos passar muitos e muitos Natais juntos.

Com carinho, L. Xiaoyu"

Olhou pela janela e viu a decoração de Natal em um pequeno bar, lembrara-se da data. Lembrou-se dela. Novamente. Respirou fundo e suspirou decidido. Abaixou-se diante da cama e tacou para cima a sua mochila surrada, voôu em direção ao armário e tacou de qualquer maneira seus pertences, que não eram muitos, dentro da mochila.

Fechou a mochila com pressa, tacou-a nas costas e largou o quarto alugado para trás, descendo as escadas com passos firmes. Ignorou as pessoas que lhe desejavam um feliz Natal e seguiu seu rumo. Enquanto andava apressado e decidido, um filme passava em sua cabeça e ele foi se lembrando de todos os anos com Ling: desde a época da escola; as vezes que ele a rejeitou; as broncas que costumava dar na menina; o sorriso dela ... Lembrou-se de quando a fez chorar pela primeira vez. Ela havia declarado seus sentimentos à ele e Jin apenas disse que ela deveria esquecê-lo. Afinal, ele era um monstro.

Imediatamente parou de andar, seus pés fincaram no chão como se o seu corpo o impedisse de seguir em frente. Agora ele estava confuso. Depois de tanto magoar Ling, voltar consertaria tudo? E se ela já tivesse reconstruído sua vida? E se já o tivesse esquecido? Ele voltaria e estragaria a vida de Xiaoyu? Faria isso, pela segunda vez? Engoliu em seco e deixou a mochila cair no chão.

" I'm not a perfect person (eu não sou uma pessoa perfeita)/There's many things I wish I didn't do (Há muitas coisas que eu gostaria de não ter feito)/But I continue learning (Mas eu continuo aprendendo)/I never meant to do those things to you (Nunca quis fazer aquelas coisas a você)"

Jin balançou a cabeça negativamente. Fechou os punhos, catou a mochila no chão e seguiu em frente. Ele se arrependia de muitas coisas na vida, e não queria continuar com aqueles sentimentos que apertavam seu peito toda vez que se lembrava de Ling. Ela que sempre o acalmava quando a raiva tomava conta dele. Ele tomara uma decisão agora e colocou em sua cabeça que pediria perdão para Ling, por tudo que havia feito e, inclusive, por nunca ter tido coragem de dizer adeus.

Coragem.

* * *

A neve, agora, começara a cair. A tarde estava se aproximando e o céu obtinha tons de vermelho e rosa. Após o banho, Panda sentou-se diante da lareira e logo tratou de aconchegar o corpo, deitando-se. Xiaoyu passou pelo corredor da sala e viu Panda deitada, ela foi se aproximando devagar da amiga e sentou-se na enorme poltrona vermelha de veludo diante da lareira e suspirou pesado. Certificou-se que Panda não estava dormindo pois ela a acompanhou com os olhos, enquanto Ling sentara.

– Como seria passar o Natal com o Jin? Quero dizer ... Sabe, você se lembra do Natal com ele, Panda?

Panda virou o corpo na direção da poltrona e olhou Xiaoyu nos olhos. determinada, ela respondeu:

– Quer saber se me lembro? Sim. Lembro-me da casa enfeitada, e de você obrigando o Kasama a cozinhar biscoitos para o Papai Noel. Lembro-me que você não usava cabelos soltos, sorria sempre e gostava de festas. Era uma garota animada, e a noite, lembro que fomos até o Centro, ver as luzes.

As palavras de Panda pesaram em sua mente e ela se viu perdida olhando o fogo arder na lareira. Panda estava certa. Jin havia ido embora e levou com ele toda a alegria de viver que Ling possuía. Ela passou a mão pelos cabelos e se aconchegou na poltrona. Acabou adormecendo ali, sentada. As horas voaram, as duas passaram quase toda a véspera de Natal dormindo ali próximas a lareira.

Xiaoyu acordou com o som de vozes do lado de fora. Assustou-se ao perceber que havia adormecido na poltrona. Olhou para o relógio na parede e viu que faltavam cinco minutos para o Natal. Se debruçou sobre a poltrona e viu que flocos de neve batiam forte em sua janela. Pulou da poltrona e jogou-se ao lado de Panda, balançando-a com as duas mãos, apressada.

– Acorda, Panda! Acorda, acorda. Olha, está nevando! Acorda, Panda.

Panda abriu os olhos e sentou-se rapidamente, percebeu que Ling estava animada com a neve e sugeriu que elas fossem lá fora. Xiaoyu estava contente, pela primeira vez, desde que Jin havia partido. Abriu a porta com força e correu para a calçada coberta de expessa neve. Ficou girando no mesmo lugar por alguns segundos e sorrindo olhou para Panda, que se aproximava dela com um olhar materno.

– Feliz Natal, Ling!

– Ahhhh, muuuito feliz Natal, Pandinha! – Xiaoyu ainda girava no mesmo lugar, e girou até ficar tonta e cair sentada na neve, rindo. O vento batia forte na floresta de pinheiros que havia próximo a casa de Xiaouyu, ela olhou para os pinheiros por um instante e seu coração acelerou, descompassado. Achou estarnho mas manteve silêncio. Panda não havia reparado.

As árvores balançavam com força. Jin as observava de longe, e percebeu que Ling estava diferente. Ficou ali, escondido atrás de uma árvore grossa, olhando a chinesa e sua segurança. Apoiou a mão na árvore quando pensou em se aproximar e sentiu um baixo relevo estranho. Na árvore havia um coração feito com cortes do que talvez tivesse sido uma kunai, os nomes "Ling e Kasama" dentro dele estavam ali há anos, mas ele não se lembrava. Xiaoyu nutriu um amor, e em sua fantasia ele era correspondido.

Ling olhou rapidamente na direção das árvores quando ouviu o partir de um galho. Levantou-se imediatamente e ficou estática, seus batimentos já não se controlavam e sentia como se seu órgãos fossem saltar da boca a qualquer momento. Ela saiu correndo na direção das árvores mas parou quando sua vista embaçou devido as lágrimas, que agora escorriam pelo seu rosto delicado. Ela havia reconhecido aquela silhueta, e caiu na neve de joelhos, logo na entrada do "Caminho dos Pinheiros". Panda correu para amparar a amiga mas antes que pudesse alcançar Xiaoyu, reconheceu também entre as árvores a silhueta que sua amiga tanto desejara ver. Jin estava ali mas não tinha coragem de se aproximar.

Devagar, lutando contra sua própria vontade e medo, foi dando pequenos passos na direção da garota que permanecia de cabeça baixa, ajoelhada na neve, chorando. Ele olhou para Panda, que recuou alguns passos, deixando Ling só. Jin aproximou-se da garota e tocou-lhe o ombro com a mão, estendendo a outra para ela se levantar.

– Levante-se. – Ele disse, o tom mais baixo do que de costume. Havia medo em sua voz.

Xiaoyu não conseguia encará-lo. Depois de tantos anos, ele estava lá. Panda foi se afastando mais e mais, observando-os de longe, apenas. Jin repetiu a ordem:

– Ling, levante-se! Por favor, me ... Perdoe.



"I'm sorry that I hurt you (Sinto muito por ter te machucado)/It's something I must live with everyday (É algo com que tenho de viver diariamente)/And all the pain I put you through (E toda a dor que te causei)/I wish that I could take it all away (Eu gostaria de poder levá-la embora)/And be the one who catches all your tears (E ser aquele que segura todas as suas lágrimas)"

Ela ergueu os olhos para a mão estendida e tocou-lhe com receio. Em um rápido movimento ele a pôs de pé em sua frente. Xiaoyu não o olhava nos olhos, na verdade, mal o olhava. Não conseguia falar. Ele adiantou-se:

– Meus problemas não sumiriam se eu fugisse. Eu preciso enfrentá-los mas eles pareciam nulos perto da falta que eu sentia de você. E ... E da Panda. Eu ... – O rosto dele, pela primeira vez, ficara corado. As palavras saíram de sua boca de um jeito que ele não controlara, estava falando com o coração. Ela o interrompeu, com um sorriso nos lábios.

– O que importa é que você está aqui. E que soube onde me achar. Não importa que tenha ido embora, que tenha me feito chorar. Agora você voltou. Mas ... vai passar o Natal aqui, Jin?

Ele coçou a nuca e desviou o olhar do olhinhos curiosos que ela possuía, suspirou e tomou ar para que começasse a dizer tudo que nesses três anos lhe estavam entalados. Envolveu Xiaoyu nos braços e aproximou os lábios do ouvido da chinesa e sussurrou:

– Vou ficar agora, e se me aceitar, para sempre. Eu ... Eu te amo, Ling.

"That's why I need you to hear (É por isso que eu preciso que você ouça)I've found a reason for me (Encontrei uma razão pra mim)/To change who I used to be (Para mudar quem eu costumava ser)/A reason to start over new (Uma razão pra começar tudo de novo)/ And the reason is you (E a razão é você). "

Fim.



Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.