Chapter III
canapés

every party claims for canapés

Alexandra girou o conteúdo transparente em sua taça sem muito entusiasmo, desinteressada em tudo que estava acontecendo ao seu redor. Era uma tragédia que os convidados de seus pais não tivessem garotas – ou garotos – bonitos e inteligentes com quem pudesse flertar. Todas as vezes que uma morena de cabelos escuros e andar elegante passava por ela, sua atenção era imediatamente atraída, e seu primeiro pensamento era: Xanthippe. Céus, ela sentia falta do beijo caloroso da ex-amante, aquela princesa balcã de tirar o fôlego…

Fora numa noite daquelas que se conheceram, exceto que o mundo parecia muito mais vibrante e elas eram muito mais novas; aquela demorada introdução da Família Real da Península Balcânica à Família Real de Illéa, o maravilhoso Príncipe Damianos, com quem ela eventualmente trocou alguns beijos, e a maravilhosa Princesa Xanthippe, com quem ela eventualmentetambém trocou muito mais.

Agora, no entanto… Tédio, tédio, tédio. Graças àquela triste política de seus pais sobre não beberem álcool em festas de Estado, aquelas reuniões eram absolutamente cansativas e tediosas; acenar, sorrir, acenar, cumprimentar, dois beijinhos nas bochechas para os franceses, quatro caso fossem sulistas, dois beijinhos e um aperto de mão para os italianos, aperto de mão e beijo nos nós dos dedos do gentleman inglês e um beijo na boca caso fossem Siberianos –afinal, o príncipe Matthias era realmente um pedaço de mal caminho…

O que está acontecendo comigo hoje?! Ela se perguntou, bebericando o champanhe sem álcool para disfarçar as bochechas vermelhas.

Cruzou as pernas, sentindo aquela estranha sensação do roçar das meias calças e mordeu o lábio inferior.

— Meditando, princesa? — antes mesmo de erguer os olhos, Alexandra soube quem era. Seus lábios se curvaram num sorriso inconsciente e incontrolável quando levantou-se com um salto e atirou-se nos braços do rapaz.

— Cale! Espere só até o Max te ver — ela se afastou do abraço e examinou as feições do amigo — Você pegou um bronzeado? Eu não sabia que ingleses eram fisicamente capazes de ficar morenos.

Ele revirou os olhos azuis, mas um sorriso também brincava em seus lábios.

— Rá-rá, Alex, muito engraçadinha — ele passou um braço por cima dos ombros nus de Alexandra e a guiou de volta à cadeira — Vamos dizer que Alexandria me deixou torradinho. Literal e figurativamente falando.

Ele realmente parecia torradinho; a pele que antes parecia papel de tão branca tornara-se quase irreversivelmente morena, fazendo um belo contraste com os cabelos loiro-platinados e olhos azuis intensos. Ele parecia um deus grego, e ninguém pegava aquele tipo de bronzeado na Inglaterra. Ninguém. Era fisicamente impossível, ia contra os princípios meteorológicos ingleses e ponto final. Ela franziu o cenho.

— Alexandria? Você não estava em Oxford?

— Eu estive… — ele coçou a nuca — Por dois meses?

— E o que diabos foi fazer em Alexandria?!

Os olhos dele brilharam e ela quase imediatamente se arrependeu de perguntar. Cale inclinou-se sobre os joelhos e esfregou as mãos uma na outra, ansiosamente.

— Eu conheci um professor em Oxford, no departamento de arqueologia — ele não se preocupou em mencionar que estava cursando Direito, não Arqueologia — E ele estava liderando uma expedição para o Egito. Eu vinha me correspondendo com ele por algum tempo, então me candidatei quase imediatamente. Estamos escavando a Biblioteca, Alex. A Grande Biblioteca. E encontramos escrituras na Itália que batem com as que encontramos no sítio arqueológico, o que nos dá acesso à–

Ele ficava positivamente empolgado conforme falava, seus olhos crescendo, tal como a voz, falando cada vez mais rápido, de forma que até mesmo Alexandra e suas tendências hiperativas tinham problemas em acompanhá-lo. Ela achava que ele ficava fofo quando começava a falar daquele jeito.

— Pára um pouco — ela interrompeu o discurso dele — Respira — ele obedeceu — Pronto? Agora me diz em três palavras: você abandonou Oxford para seguir um professor maluco Egito afora e deixou o mundo inteiro achando que estava na Inglaterra, comendo peixe com batatas e bebendo leite conforme… Encantava belas donzelas e assistia Doctor Who, ou o que quer que vocês Ingleses fazem no tempo livre?

— Maximillian já sabia — ele se restringiu às três palavras, sabiamente.

— Ele… O quê?!

— Ele sabia — Cale deu de ombros — De qualquer modo. Eu fui pego pela Oxford’s Magazine, ironicamente, e agora estou de castigo.

— Bem feito.

— Minha punição é passar seis meses com você, então eu não ficaria tão triunfante — ele cruzou os braços e mostrou a língua.

— Castigo pra você ou pra mim?

— Você me ama, Alexandra, admita — ela tinha de admitir que amava o sotaque dele.

Ela suspirou dramaticamente, revirando os olhos.

— Vai procurar seu amante, vai?

— Se você estiver se referindo ao Maximillian, eu já fui, e ele está se amassando embaixo das escadarias com a minha prima Michelle — ele assumiu um tom extremamente dramático, do tipo que só os ingleses sabiam fazer — I’d rather not have to see her dreadfully pink panties again*, então você, querida, terá de me aturar por alguns minutos mais — ele fingiu inspecionar um relógio de pulso — Ou horas. A reputação da prima Michelle a precede.

— E é claro que você saberia — Alexandra provocou.

Ele mirou um sorriso malicioso com o canto dos lábios para ela e deu uma piscadela marota, ajustando o nó da gravata galantemente. Alexandra deixou que a boca caísse conforme ele girava nos calcanhares para fazer uma saída dramática.

— Calemere Winterford! — ela chamou quando se recuperou do choque inicial, mas ele continuou andando — Volte já aqui, você tem algumas explicações a me dar! Você não pode sair assim!

— A única pessoa a quem devo explicações, Alex Querida, é ao meu amante.

— Winterford! Come back here, you asshole!

— Minha mãe me ensinou a não falar palavrões, Alexandra. Você deveria tentar, é muito edificante.

Apesar das frases de efeito, Alexandra duvidava. A mãe de Cale era ninguém menos que Lunalysie Lefbrev, e foi ela quem certa vez mandou um Cardeal vindo diretamente de seu Palácio no Vaticano enfiar aquela batina dele no orifício anal, quando ele disse que “Deus curaria o problema de Victor caso eles orassem o suficiente, porque senão ele seria incapaz pelo resto da vida.”

O verdadeiro problema não era a fé da oração, Lunalysie ela mesma sendo católica, mas o modo como o Cardeal colocou aquilo — como a deficiência de Victor fosse um problema, uma inconveniência no plano perfeito, como se ele precisasse ser curado para ser capaz. Ele se provara muito mais que uma deficiência, nenhuma inconveniência e extremamente capaz, e não precisou ser curado para tal. Em suma, Lunalysie Lefbrev Winterford, era a heroína dos quadrinhos de Alexandra.

Ela observou Cale se afastar com um sorriso nos lábios. Céus, ela sentira falta daquele sorriso malicioso, diálogos espertinhos e lábia capaz de levar belas illeanas à perdição —não que ela tivesse caído alguma vez, é claro. É claro.

Max ajustou o colarinho da blusa social, deixando que Michelle trabalhasse no nó complicado de sua gravata. Por algum motivo inteiramente desconhecido, ele era absolutamente incapaz de dar o nó em sua própria gravata —acredite, ele tentou uma vez, e para deleite de Alexandra, acabou semi-enforcado e quase perdeu alguns dedos por falta da devida de circulação de sangue

Ele terminou, rápida e elegante, e afastou-se para ajustar o próprio vestido azul. Ele observou, tentando colocar o cabelo num estado remotamente apresentável.

— Acho que você deveria ir primeiro — ele disse depois que ela colocou o lenço azul-claro sobre os ombros nus.

Ils* estão sentindo mais sua falta — ela disse, aquele delicioso sotaque francês enchendo seus lábios e bochechas avermelhadas num biquinho adorável.

— É menos suspeito se eu desaparecer.

Ela pareceu considerar. Então suspriou.

— Certo, enton.

Ela segurou as saias e esquivou-se da mesinha de centro no quartinho embaixo das escadas, um quartinho que, oficialmente, se chamava Câmara de Repouso, e tinham várias espalhadas pelo castelo com o intuito de dar algum descanso aos pés das moças no meio de festas como aquelas ou ajudar pobres príncipes a fugir de pretendentes maliciosas ou mesmo uma escapatória para retocar a maquiagem, mas Max gostava de pensar neles como seu oásis no meio daquelas festas, fosse para contrabandear alguns chocolates extras da mesa do buffet ou algumas moças da pista de dança.

Michelle deu um tchauzinho insinuante e deixou-o, e apenas depois de alguns longos minutos que Max abandonou o local também.

Ele viu os convidados conversando entre si, algumas pessoas dançando valsa, e… Seu pai. Os dois trocaram olhares e Max quase acreditou que estivesse livre quando o rei fez aquele sinal universal de convocação. Ele grunhiu e ajustou as mangas da blusa uma vez, aproximando-se.

— Como vai a noite? — o pai perguntou, oferecendo uma taça contendo champanhe sem álcool (o único tipo que o pai bebia durante essas festas) para o filho. Porque se viu sem escolha, Max pegou e voltou sua atenção para a pista de dança.

— Incrível — ele disse — Consegui contrabandear alguns canapés da mesa, estavam divinos.

O rei tinha um sorriso conhecedor nos lábios.

— Canapés.

— Canapés.

Ainda observando a pista de dança, Hunterish bebericou de sua taça.

— Viu Cale por aí? Ele estava te procurando há alguns minutos atrás.

— Vi sim — ele respondeu, lembrando-se do terrível encontro com o melhor amigo logo quando estava com Michelle. Ele teria até se levantado para um abraço se suas mãos não estivessem tão cheias de seios e cabelos. — A tia Luna veio também?

— Naturalmente — Hunterish afirmou como se fosse o fato mais óbvio do planeta.

Alguém chamou o nome de seu pai, e então Max se voltou para ele rapidamente.

— O senhor viu a mamãe?

O rei sorriu enigmaticamente.

— Depois que contrabandeamos alguns canapés juntos, ela simplesmente desapareceu — ele disse e Max arregalou os olhos. O rei riu mais e aproximou-se da orelha do filho e cutucou o peito dele discretamente — Você se esqueceu de um botão.

Antes de desaparecer na multidão, Hunterish deu de ombros. Foi quando o príncipe escutou uma vozinha em seu ombro esquerdo dizer: “Você não acreditou que fosse o único a usar as Câmaras de Repouso para comer canapés, achou, Maxie?”

Silêncio. Max lutava para tirar aquelas imagens horrendas da cabeça. Ele nunca mais entraria naqueles quartinhos, mas estava tudo bem, porque felizmente existiam os armários de vassouras, apesar de serem extremamente pequenos e abafados, sem falar nas vassouras, e os antigos esconderijos contra os ataques rebeldes, Se bem que o vovô falou alguma coisa sobre eles algum tempo atrás…

Ele viraria padre. Pronto. Estava decidido. Ele nunca mais comeria canapés.