Por alguns milésimos de segundos senti meu coração parar apenas observando as dezenas de Cranks que se amontoavam em nossa frente. Olhei para o buraco no teto mostrando vários andares acima fazendo-me pensar como aquele homem havia pulado dali.

Ou será que o tal de Jorge era mais um fruto da minha mente? Olhei para meus amigos conseguindo ver em seus olhos que eu não era a única a ver o Crank que havia saltado alguns andares.

–Algum Crank comeu a língua de vocês? – Jorge falou mostrando traços de humor que não combinavam com o prédio abandonado. – Ou estão com medo que atiremos vocês no chão e comamos seus olhos? Hmmm, que gostoso, adoro comer olhos depois e um bom rango, tem gosto de ovo.

Minho tomou a frente tentando disfarçar a dor no corpo levando toda a responsabilidade com ele

–Então admite que é um Crank? Um velho alucinado?

–Ele acabou de falar que gosta de comer olhos. – Disse. – Acho que já temos uma resposta.

–Garota esperta. – Ele disse apontando para mim. – Venham meus novos amigos, não precisam ter medo. Só comeríamos seus olhos se estivessem mortos, claro que poderíamos dar uma ajudinha, se é que vocês me entendem. – Completou soltando uma piscadela.

–São quantos de vocês? – Newt perguntou ao meu lado.

–Quantos? Quantos Cranks? Somos todos Cranks aqui meu amigo, vocês devem ser também e não sabem.

Sabemos sim - falei mentalmente.

–Você sabe o que eu quis dizer.

O Crank começou a andar para frente e para trás, chegando perto e voltando, apenas dando medo nos Clareanos.

– Vocês precisam entender uma porção de coisas sobre o funcionamento desta cidade. Sobre os Cranks e o CRUEL, sobre o governo, sobre por que nos deixaram aqui para apodrecer com nossa doença, para que nos matássemos e nos tornássemos total e inteiramente insanos. Precisam conhecer os diferentes níveis do Fulgor, e compreender que é tarde demais para vocês... a doença vai pegá-los, se já não o fez.

Ouvir Jorge falar sobre o Fulgor me dava arrepios pelo corpo todo. Mesmo fazendo meu cérebro lutar contra a simples ideia do vírus já estar implantado no meu organismo, da pequena sensação de sentir meus anticorpos sendo destruídos, a simples menção da palavra Fulgor me deixava nervosa.

Fazer isso comigo mesma era quase uma forma de tortura. Uma tortura que o C.R.U.E.L. estava fazendo com todos nós. Mesmo eu querendo mentir para mim mesma e falar que tudo isso era uma farsa seria apenas adiar o inadiável. A morte.

A vontade de simplesmente sair daqui correndo, sentar em um canto e começar a chorar apenas aguardando as alucinações noturnas chegarem era grande. Mas eu não podia fazer isso, eu tinha que ser forte.

Pensar sobre as alucinações me fez lembrar da noite passada. O frio era quase congelante no deserto, o que não era ironia nenhuma, pois desertos costumam ser bem frios a noite. Os meninos ao meu lado dormiam em um sono agitado.

Sentir minha cabeça rodando fez com que me levantasse logo sentando no chão. Uma pequena tempestade de areia passou em nossa frente revelando pessoas vindo em nossa direção.

Me preparei para acordar os meninos, mas quando ia tocar o braço de Newt vi o rosto com clareza.

Era minha mãe.

Ela estava com uma roupa impecável, totalmente branca, com os cabelos loiros bem arrumados aparentado ser muito mais nova do que era.

Ava caminhava em minha direção sendo seguida por outras pessoas. Tentei focalizar meus olhos nos indivíduos atrás dela e quando consegui desejei não ter feito isso.

Era Newt.

Olhei para o lado vendo o loiro deitado ao meu lado logo voltando a atenção para o que estava em pé.

Não é real.

Repetia na minha cabeça, mas cada vez mais parecia ser mentira.

–É tudo sua culpa! – O loiro ajoelhou na minha frente com um semblante de raiva, algo que nunca tinha visto em Newt. – É tudo sua culpa! Se você não tivesse ido para a Clareira tudo poderia ter sido diferente! Quantas mortes teríamos evitado? Alby? Gally? Chuck? – Ele gritava para mim cuspindo raiva em cada simples silaba.

As lagrimas escorriam em meus rosto em ouvir as palavras dirigidas a mim. Olhei para o lado vendo Teresa caminhar em minha direção.

Ela estava com a mesma roupa que tinha visto ela usar na Clareira.

–Por que? – Ela me perguntou com uma feição que mostrava que ela queria compreender algo. – Me diga, por que? Olhe para seu redor! – Ela disse esticando os braços. – Você poderia ter impedido isso! Sua... sua pequena mimada. Você podia ter impedido tudo isso! Mas não! O que você quer provar? Quer provar que é apenas uma garotinha que tem medo de tudo? – As palavras de Teresa faziam meu coração doer.

Atrás de minha mãe um vulto apareceu segurando algo prateado em suas mãos. Era Janson que carregava uma simples pistola.

–É tarde demais. – Minha mãe disse antes de uma bala fria passar pelo meio de seu crânio.

Um grito seco saiu de minha garganta devido ao frio levantando o loiro ao meu lado. Passei as mãos pelos meus cabelos forçando-as contra meus olhos tentando fazer todas aquelas pessoas sumirem. Senti uma mão nos meus ombros fazendo-me tirar minhas mãos da cara.

Posso dizer que nunca vi o rosto de Newt tão preocupado em toda a minha vida. Olhei pra frente para garantir que eles não estavam mais lá.

–Beth? Ta tudo bem? – Sua voz carregava preocupação até a última palavra.

–Tá. – Respondi com uma respiração pesada depois de todo o acontecimento.

–Não tá não. – Ele disse tirando meu cabelo do rosto que ficou grudado devido ao suor.

–Ta tudo bem Newt, ta tudo bem. – Falando isso consegui dormir mais um pouco.

A fala de Jorge me tirou dos meus devaneios.

–Mas a de concordar Hermanos, que vocês estão em desvantagem. Logo vocês falam primeiro. – Jorge disse parando a centímetros de Minho.

–Desvantagem? Somos onze contra um bando de malucos, a menos que a chuva de raios tenha torrado minha retida eu não achei a desvantagem.

–Nós estamos em desvantagem? – Jorge disse deixando a calma para trás transferindo uma raiva enorme para sua voz. – Como ousa falar comigo como se eu fosse seu cachorro? Peça desculpas!

–Vai ficar esperando. – Minho disse com deboche.

–Tem dez minutos para pedir desculpas, ou vou começar a arrancar seus dedos.

–Peça desculpas. – Thomas disse para minha dando um tapa em seu braço.

–Peça desculpas logos Minho. – Reforcei o pedido de Thomas.

–Não vou me desculpar. – Minho disse ainda com o ar arrogante.

–Não vai pedir desculpas? – Jorge perguntou. – Então acho que podemos começar com o procedimento.