– Anda, Ryan! Assim a gente vai chegar atrasado.


– Quer se acalmar, por favor? Me ajuda aqui.


Brendon abriu a porta do banheiro e entrou, os braços cruzados. Eu o tinha acordado às seis e meia para irmos à liquidação do supermercado e, desde então, o humor dele se extinguiu. Seus lábios grossos estavam ressecados e o cabelo bagunçado, resultado da décima soneca no chão da sala.


– Azul ou verde?


– Ryan, é um aniversário de criança. Por que você vai de gravata?


– Porque não gosto de andar igual a um mendigo, que nem você. Vai, escolhe.


– Verde.


– Obrigado, pode sair.


– Mas eu tenho que tomar banho.


– Você pode esperar mais um pouco.


Ele saiu, fechando a porta com força. Fiz o nó na gravata e arrumei o cabelo, que já estava bem grande outra vez. Patrick iria reclamar.

Saí do banheiro o deixei tomar seu banho em paz. Boris estava deitado na cama, entre duas calças jeans de Brendon, olhando intensamente para mim. Atrávessei o quarto, peguei um casaco no armário e desliguei o despertador.

Fui para a sala, onde as malas da viagem já estavam prontas e próximas da porta, e me sentei no sofá. O cômodo tinha um leve aroma de pêssego, que eu não fazia a menor ideia de onde vinha. Mas era bom, como um abraço de despedida. Mesmo que só por uma semana.

Brendon apareceu na sala trinta e quatro minutos depois com Boris, vestindo apenas um casaco preto, uma camiseta vermelha e calça jeans. Ele parecia mais animado, mas não comentei nada. Peguei Boris no colo e abri a porta. Brendon pegou nossas malas e saiu, indo para o elevador. Desliguei as luzes e saí com o cachorro, trancando a porta e guardando a chave no bolso da calça.

Nós três descemos junto de nossos novos vizinhos de cima, Sr. e Sra. Armstrong. Eles murmuraram 'bom dia' quando entramos no elevador. A doce mulher se aproximou de Brendon, dentro do possível, e eles começaram a conversar. Os dois riram sobre coisas bobas até que o casal saiu no segundo andar.

Brendon colocou as malas no banco de trás do meu carro e pegou Boris de mim. Entramos juntos e eu dei partida. Antes de começarmos a nos mover, Brendon me puxou pelo queixo e me beijou. Senti seus lábios carnudos tocarem os meus e não consegui controlar o sorriso que se formou em meu rosto.


– Vamos.


– É...


Dirigimos sem parar até a parte sul de Summerlin e paramos bem em frente ao prédio de sete andares que agora representava uma parte da DecayDance Records em Vegas. Saímos do carro e eu deixei as chaves com o flanelinha.

Entramos no prédio e fomos direto para o elevador. Nós já tínhamos estado ali milhares de vezes, então ninguém mais perguntava; só acenavam e sorriam para nós. Subimos até o último andar e entramos em um largo corredor cheio de portas. Uma música infantil ecoava pelo lugar e ficava cada vez mais alta conforme andávamos pelo corredor, em direção à última porta à direita. A sala de reuniões da diretoria.

Bati na porta uma, duas, três, quatro, Patrick.


– Oi! - Ele não tinha mudado nada; O cabelo voltou a cor original - Um mesclado de loiro e ruivo alaranjado - mas, tirando isso, ele continuava o mesmo baixinho de sempre - Que bom que vieram. Entrem.


A sala estava uma bagunça. Crianças corriam por todos os lados, gritando, e havia balões e brinquedos espalhados. Patrick nos levou até o outro extremo da sala, onde Pete estava brincando com o aniversariante, Bronx. Sim, Bronx Mowgli. Eu sei...


– Pug! - O garoto abriu os braços e correu para Brendon, que se abaixou e o deixou fazer carinho no cachorro.


Pete acenou para mim e eu retribui. Patrick apontou para a mesa no centro da sala e nós dois nos sentamos, lado a lado. Ele me olhou com aqueles olhos azuis angelicais e eu não consegui desviar. Eu ainda sentia falta deles.


– Então... Como estão as coisas? Seu cabelo tá grande.


– Está tudo bem e, hm, eu não tive tempo de ir no barbeiro ainda.


– Sei.


– E por aqui? Tudo bem?


– Tudo ótimo. Lembra daquele e-mail que eu te mandei, sobre não estar preparado e tal?


– Claro.


– Esquece tudo o que eu disse.


– Tudo bem.


Ouvimos um barulho de algo se partindo em mil pedaços e Patrick pulou da cadeira. Ele olhou primeiro para Bronx - Por reflexo, talvez - E só depois para a nossa esquerda. Um moleque tinha quebrado um vaso. Pete saiu correndo gritando por ai com o menino no colo procurando não-sei-o-que e Brendon ficou rindo até que seu rosto ficou vermelho e ele começou a chorar. Patrick não achou graça: Só passou uma mão pelo cabelo, bagunçando-o todo, e suspirou profundamente.


– Tá tudo bem! - Pete gritou, depois de alguns minutos, voltando com o mesmo menino no colo para o nosso campo de visão, um band aid no rosto da criança - Zero kills.


– Pug! - Bronx gritou do outro lado e nós nos viramos mais uma vez. Ele estava sentado no chão, Boris em seu colo e Brendon ao seu lado. O menino acariciava as costas do cachorro de leve e sorria como se aquilo fosse a melhor coisa do mundo.


Pete se aproximou de nós e se sentou do lado de Patrick, colocando um braço em volta do marido. Brendon se cansou de ficar agachado no chão e se levantou, trazendo Bronx e Boris para a mesa conosco. Alguém devia estar tomando das crianças...

Cinco segundos depois, o telefone tocou. Pete se levantou para atender e nós continuamos ali, o barulho das crianças ficando insuportável.


– E ai, de quem são esses pirralhos?


– Do pessoal da Decay. É só mais uma desculpa para ficarem sem os filhos por um tempo.


– Putz...


– É. Pete mal sabe o nome da metade desses moleques. Mas Bronx não tem muitos amigos, então...


– Antisocial - Dei uma boa olhada no garoto loiro à minha frente, abraçado ao meu cachorro - De quem ele puxou isso, hein?


– Engraçado você, Ross.


– Muito, não é? - Brendon? Que facada nas costas - Eu que o diga.


– O quê?


– E chato. Mas como esse homem é chato.


– Verdade.


– Eu estou aqui! - Gritei, levantando os braços.


– Pug! - Bronx me copiou. Nos três olhamos para o garoto, e ele ficou vermelho. Patrick abriu um largo sorriso e parou de fazer contato visual conosco.



–-



Três torturantes horas depois, os pais dos pente- das crianças chegaram e levaram todos embora. Patrick e eu limpamos tudo (mais ou menos) enquanto Pete e Brendon abriam os presentes de Bronx. A maioria era de bonecos e carros de controle remoto, mas nada adiantou, o menino só queria saber do meu cachorro.

Depois que Bronx brincou com todos os presentes, ele acabou se entediando. Nós também já estávamos cansados de ficar ali, então decidimos dar uma volta.


– Ele quer um bulldog - Ouvi Pete falar quando passamos por uma loja de animais enquanto andávamos pela cidade. O tom dele era sério, mas não acreditei que fosse verdade.


Patrick parou, olhou para Bronx, depois para Pete, repetiu e deu meia volta, entrando na loja. Brendon e eu nos olhamos, espantados. Quarenta e sete minutos depois, ele voltou com um filhote no colo. O cachorro era todo malhado e tinha uma cara feia, mas Bronx ficou louco. Ele abraçou o bicho e parecia que nunca mais iria soltar. E foi o que ele fez por quase quinze minutos...

Caminhamos mais algum tempo até pararmos em frente ao Giannini. O restaurante estava meio envelhecido, mas ainda tinha seu charme. O palco estava montado e havia umas poucas pessoas, sentadas bem distantes umas das outras. Ninguém estava com fome, mas mesmo assim nos sentamos em uma mesa grande próximo ao palco.


– Então, o que vão querer? - Uma voz familiar se fez presente.


– Olá, Jon - Patrick e eu dissemos, sem realmente olhar para o rapaz.


– Oi... - Ele foi pego de guarda baixa, mas logo se recuperou - Er, tudo bom com vocês? Quem é o baixinho?


– Meu filho - Patrick sorriu ao responder. Bronx começou a ficar vermelho.- Que gracinha. Qual é o nome dele?


– Bronx - Pete disse, desviando o olhar para qualquer outro lugar.


– Hm - É amigo, eu te entendo - Er, é Brendon, né? Só pra constar, adorei seu cd novo.


– Obrigado.


– Que ótimo. Bom, vocês vão pedir alguma coisa?


–-


– Tem certeza que está tudo aqui dentro? - Patrick estava checando pela milésima vez.


– Tenho.


– Mas e-


– Eu tenho certeza! Para de ser paranóico, homem.


– Tá, desculpa. Patrick fechou o porta malas do meu carro e se afastou, andando até o carro de Pete, bem atrás de nós. Brendon já estava dentro do carro com Boris, que não parava de latir. Ele não gostava muito de viajar de carro.


Pete passou com o Mercedes na nossa frente e eu liguei o motor. A viagem até Chicago era longa, mas valeria a pena. Eu já tinha um bom material para minha próxima publicação, Patrick tinha duas exposições importantes na mesma semana, Pete iria assinar contrato com mais um grande sucesso emergente e Brendon ainda precisava encontrar um bom baixista. Seria mais uma viagem de negócios que qualquer outra coisa. Mas até que seria bom, sair um pouco da rotina.

Assim que entramos na estrada, Brendon ligou o rádio. A música eu conhecia, Pumped Up Kicks do Foster the People. Brendon abriu para eles na turnê pela América do Sul no ano passado. Ótimas pessoas, ótimo som.

A música preencheu o ar de Summerlin até a fronteira com Utá, quando paramos para dormir em um hotel. O lugar era quatro estrelas, mas eu daria apenas duas. As paredes eram finas e estavam desgastadas e as luzes dos corredores piscavam como em uma cena de Resident Evil. Pegamos nossas chaves, deixamos Boris e Hemingway - Sim, Pete Wentz não sabe que seu filho tem apenas três anos - dentro de uma gaiola e partimos para nossos quartos.

Brendon não disse uma só palavra. Só caiu na cama e apagou. Eu não estava com muito sono, então fiquei passando os únicos quatro canais durante uma hora e meia. Tudo o que estava passando era a reprise do basquete e pornografia de quinta. Da janela do nosso quarto, tudo o que dava para ver era o deserto e alguns poucos pontos brancos no céu, fracassando em iluminar a paisagem.


– Quer parar com isso? - Brendon sussurou, ainda meio inconsciente.


– Isso o quê?


– Iss- Essa luz.


– Que luz? - Brincar com ele nunca deixou de ser divertido.


– Vai à merda.


– Olha a boca, Urie.


– Desliga, Ryan - Ele se virou na cama e me empurrou com o braço - Eu quero dormir.


– Pede por favor.


– Eu odeio você.


– Não odeia não - Desliguei a tv e me aproximei dele. Seus olhos castanhos seguiram meus movimentos enquanto eu o puxava para mais perto de mim. Envolvi-o em meus braços e sussurei em seu ouvido - Você me ama.


– Metido.


– Fofo.


– Chato.


– Lindo.


– Quer me beijar logo?


– Pensei que nunca fosse pedir.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.