Patrick ainda não tinha voltado da exposição e eu assistia ao jogo dos Kings na sala. Era o jogo das quartas de final e estávamos ganhando com folga. De repente, tudo ficou quieto. Não conseguia mais ouvir a TV, por mais alto que o som estivesse, e o ar estava pesado.

Decidi ir para a cozinha pegar uma cerveja. A luz estava apagada e demorei um pouco para achar o interruptor.

- RyRo?

- Bill? - William estava sentado em cima da mesa, o rosto machucado. Aproximei-me dele e o puxei para um beijo - Não quer ver o jogo comigo?

- Sabe que eu não gosto de esportes, RyRo.

- Vem, Bill. Estamos ganhando.

- Não, por que você não vem comigo?

- Para onde, Bill?

- Para o túmulo, amor - O sorriso nos lábios dele era macabro, e seus olhos estavam em brasa. Afastei-me.

- Está me assustando, Bill.

- Não tenha medo, Ry. Não tenha medo da morte...

- Bill...

Os olhos dele escureceram a um negro infinito e ele começou a andar na minha direção. Tentei correr, mas meu corpo estava estático. Ele logo me agarrou, afundando as unhas nos lados dos meus braços.

- Você sabe que não pode fugir, querido...

- Ryan? Ryan!

Acordei com Brendon em cima de mim, as mãos balançando meus ombros, sem ritmo. Minha respiração estava pesada e eu estava suando por todo lugar. Quando recuperei todos os sentidos e fui capaz de responder ao seu chamado, ele me abraçou forte.

- Você estava tendo um pesadelo, Ryan? Agora está tudo bem, eu estou aqui com você.

- Bren...

- Fica calmo. Foi só um sonho.

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Não falamos sobre o sonho no café da manhã, mas Brendon ficou segurando minha mão por todo o tempo em que estivemos sentados na mesa da cozinha, Pete e Patrick à nossa frente. Patrick percebia a minha tensão, e eu sabia que não adiantava tentar esconder. Ele iria ler tudo no meu rosto antes mesmo de eu contar os detalhes.

No entanto, ele foi paciente e esperou por três horas, quando estávamos apenas eu e ele na cozinha, preparando o almoço. Eu cortava os legumes de sua dieta vegan, enquanto ele cozinhava a carne para nós três. Sempre me questionei porque ele cozinhava algo que achava repugnante, mas nunca fiz menção de perguntar. Seja o que for, não quero que mude.

- Ryan? Se continuar viajando assim, vai perder os dedos.

- Hm? Ah. Desculpa, eu... Só estava pensando.

- Bom, tente pensar numa desculpa melhor, então. Porque essa já ficou ultrapassada.

- Vou anotar na minha agenda.

- George hm, o que aconteceu ontem à noite?

- O que quer dizer?

- Ouvi gritos vindos do seu quarto e Brendon berrando o seu nome... Você se machucou? - Ele parou de mexer a carne e olhou para mim, preocupado.

- Não... Só-só tive um pesadelo.

- Parecia bem grave. Brendon ficou apavorado.

- É... - Coloquei os legumes em uma tigela e larguei a faca na pia. Meu rosto começou a formigar.

- Sobre o que era?

- William. Ele... Ele vinha para-hm, para me buscar...

- Como sempre, não é? Pareceu semelhante a-

- A todos os outros de quando ele morreu? Sim, era exatamente igual - Lágrimas brotaram dos meus olhos e minhas mãos ficaram trêmulas - Eu não quero tê-los de novo, Patrick. Não quero assustar Brendon, não quero voltar a usar aqueles remédios- Você sabe que eu não preciso deles!

- Não grita, Ross! - Ele desligou o fogo, deu dois passos na minha direção e pôs as mãos nos lados do meu rosto, forçando-me a olhar direto em seus olhos azuis - Você não vai voltar a tomar coisa alguma, ninguém vai fugir de você e nada vai voltar a ser como antes. Entendeu? A morte do garçom fez você se lembrar... Só isso. Não tente reviver, Ryan. Siga em frente e enterre o passado. Isso foi um caso a parte, sabe disso.

- Eu-eu acho que sim...

- Vá ficar com seu namorado, então. Deixa que eu termino sozinho aqui.

Deixei Patrick e fui para a sala, onde Brendon e Pete estavam sentados afastados no sofá, assistindo a um filme qualquer. Sentei-me mais próximo de Brendon, puxando sua mão para cima da minha coxa. Ele não reclamou.

Pete mal se mexia. Às vezes ria sozinho e tomava um gole de cerveja, e era o máximo. Em algum momento, Brendon me puxou pelo queixo e selou nossos lábios, como se estivéssimos completamente sozinhos. Sua mão passou para o meu pescoço enquanto a outra continuava imóvel na minha coxa. Tentei quebrar o beijo, mas ele era mais forte do que eu. Senti o outro lado do sofá ficar mais leve: Pete tinha se levantado. Ouvi os passos dele se afastando e uma porta sendo aberta e fechada devagar.

- Chega - Brendon se ajeitou no sofá e lambeu os lábios.

- Isso... Nossa, me sinto usado.

- Desculpa - O sorriso que ele me deu foi o suficiente para afastar a raiva que começara a brotar em mim.

Brendon se aproximou de mim, ainda sorrindo, e nos beijamos outra vez. Uma fração de segundo depois, sinto uma coisa bater forte na minha cabeça. Era Patrick.

- Parem com isso, seus depravados.

- Você bateu muito forte.

- Você mereceu. Olha, o almoço está pronto. Venham logo.

Nos levantamos e fomos para cozinha. A mesa já estava pronta e os quatro pratos à frente das respectivas cadeiras. Pete já estava sentado em uma delas, esperando por nós. Patrick colocou o bife gigantesco no centro da mesa e os acompanhamentos ao redor. A Terceira Guerra Mundial se instalou enquanto tentávamos pegar o máximo de carne possível. Patrick apenas bebeu um gole de suco e baixou a cabeça. Isso era uma tortura para ele e eu admirava sua força.

Assim que acabamos de comer, Pete e Brendon saíram para não-sei-onde, Patrick foi passear com Boris e eu me tranquei no quarto. Meu livro estava pronto, finalmente. Li repetidas vezes o material inteiro e fiz algumas correções antes de enviar para a editora. Provavelmente, eles cortariam metade das páginas para encaixar na faixa etária dos meus "fans" então já me preparei para ouvir sermões mais pra frente. Já era normal.

Quando terminei tudo, respirei fundo e fechei o laptop. Era o fim de uma era, a solução dos meus problemas. Tinha que dar certo.