“Com raiva, e também apaixonado por ela, e tremendamente arrependido, eu lhe dei as costas." - F. Scott Fitzgerald.

Todas as esperanças que ele nutria de que realmente poderia fazê-la desistir de ir às barricadas de repente pareciam extremamente insignificantes diante da insana confusão de êxtase, jovialidade e teimosia que era Éponine Thénardier.
Ela estava realmente determinada a lutar por um propósito que nem ao menos entendia. Não, não era pelo propósito que ela estava lutando. Não era contra a tirania do rei, nem contra a injustiça que assolava toda a França. Era por ele. Era por Marius.
"Sua tola", ele quis dizer a ela. "Ele não te ama, o garoto não te ama, aceite isso".
E ele disse. Ele disse todas estas palavras e vários outras. Disse tudo o que tinha direito a dizer para uma garotinha tola e apaixonada, menos o que realmente deveria ter dito para provar que realmente se importava com ela.
Ela o encarou e manteve seus lábios em uma linha fina, mas seus olhos pareceram, por alguns segundos, sorrir com tristeza. Eles provavelmente sabiam o que aconteceria à ela no fim da noite. Eles provavelmente enxergavam o perigo que a bela tolinha apaixonada disposta a lutar por seu amor não via, e enxergavam também que as probabilidades de ela sair viva do lugar para o qual estava indo eram quase inexistentes.
Ele esperou que ela dissesse alguma coisa, ou que fizesse algo. Que o xingasse, ou que lhe desse um tapa. "Como ousa falar assim de Marius?!", ela diria, enojada. "Como ousa dizer que ele não me ama? Ele..." e então sua voz vacilaria, mas ela não pararia por aí. "Ele não me ama, é verdade, mas eu o amo, e lutarei ao seu lado".
E então ela derramaria algumas lágrimas, e daria às costas ao inspetor cruel, ao monstro que tentava afastá-la de seu amado, ao homem egoísta que silenciosamente desejava somente o seu bem, que desejava que ela vivesse para ver um novo país, um novo governo, e principalmente, um novo dia.
Ela não fez nada disso.
Ela não falou nem fez nada. Ficou somente o encarando por um longo tempo, com seus olhos vazios e seu rosto livre de qualquer expressão, fosse medo, ansiosidade ou nojo.
E então ele se cansou de esperar por uma resposta que nunca viria, e, com raiva, apaixonado por ela e tremendamente arrependido, ele lhe deu às costas, sabendo que aquela seria a última vez que veria abertos aqueles belos olhos castanhos pelos quais fora apaixonado por tanto tempo.