Naquela sexta-feira, Gerard não foi ao parque após o trabalho. Justamente por ser uma sexta-feira. Passou no mercado para comprar cervejas para os amigos, assim como refrigerante para si próprio e, quando chegou a casa, ligou para a pizzaria que sempre ligava e sentiu prazer ao falar “o de sempre”. Tomou um banho, razoavelmente demorado, e ficou na sala assistindo televisão, enquanto esperava os amigos chegarem, bem como as pizzas.

Logo estavam Bert, Quinn e Mikey ali com ele, comendo pizza e falando besteiras, como faziam toda sexta depois do trabalho, cada semana na casa de um deles.

- Hey, Gee, você não vai acreditar em quem eu vi hoje na rua... – Bert comentou, despreocupado – Estava voltando do trabalho quando cruzei com ninguém menos que Eliza. Ela me perguntou de você, é claro.

- Você diz a Eliza... Eliza? – perguntou incrédulo, deixando de lado seu refrigerante – A minha Eliza?

- Não, é claro que não. – Bert revirou os olhos - A Eliza do vizinho, por isso estou contando. – Completou, arrancando risadas dos demais.

Gerard piscou os olhos algumas vezes, enquanto se perguntava por que diabos ele iria querer saber sobre qualquer outra Eliza que não fosse a sua Eliza. Mikey interrompeu suas risadas para se lembrar de um detalhe muito importante, ao notar a expressão do irmão.

- Ele não entende ironia nem sarcasmo, nem nada do tipo; é da doença. Igual ao Sheldon do The Big Bang Theory.

- Isso explica muita coisa. – Quinn fez uma cara de quem se lembrava de várias situações que poderiam ser explicadas com esse importante dado.

- Bem, de qualquer modo, é a sua Eliza sim, Gee. – Bert concluiu, querendo mudar de assunto quanto antes.

Logo, o que poderia ter sido uma noite de sexta como outra noite de sexta qualquer, tornou-se um desastre para Gerard, uma vez que este ficou bastante abalado com as lembranças que haviam invadido sua mente. Lembrou do como havia gostado de Eliza, porém, sem saber que gostava. Por outro lado, lembrou também do como não havia percebido ela demonstrar nitidamente que gostava dele e isso o deixou muito bravo com sua doença. Poderiam ter vivido algo realmente bom e, quem sabe, estivessem juntos até aquela noite em especial; mas devido a sua síndrome, ele era incapaz de entender ou reconhecer tanto os seus próprios sentimentos, quanto os sentimentos das demais pessoas. E, naquele momento, isso o entristeceu muito.

Naquela noite o homem teve dificuldades em pegar no sono, revivendo lembranças que estavam bem guardadas, para que ele não viesse sofrer mais. Várias situações em que havia sido rude com pessoas que amava, sem se dar conta disso. E também muitas vezes nas quais ele presenciou a tristeza de pessoas queridas, sem poder consolar nenhuma delas, simplesmente por não entender como faria para que se sentissem melhor.

Depois de muito tempo tentando dormir e já percebendo que não conseguiria tão cedo, o homem levantou de sua cama e foi até o seu ateliê, onde terminou sua tela ali mesmo, sem ter um céu para olhar, sem estar no parque de sempre, sentado no banco de sempre, olhando para o lugar de sempre. Terminou a tela, quebrando toda a sua rotina, que no momento era a sua pior inimiga. “Maldita doença”, pensou ele, enquanto as lágrimas rolavam pelo seu rosto pálido, “maldita doença”.

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No sábado não foi capaz de acordar cedo para caminhar, devido à hora em que havia dormido. Tampouco sentiu disposição para ir até a casa do irmão, almoçar. Gerard estava muito pensativo, tudo aquilo era um grande mistério para ele. Desde sempre tivera a doença, já deveria estar acostumado com ela, mas parecia que dia após dia ela vinha surpreendê-lo novamente. Além disso, era a primeira vez em toda a sua vida em que ele realmente se sentia incomodado com ela. Alguma coisa o dizia, mesmo que este relutasse em aceitar, que estava na hora de se tratar, que ele precisava buscar ajuda. E Gerard, apesar de tudo, começava a acreditar que talvez, e somente talvez, fosse a coisa certa a se fazer.

Por isso, quando o irmão o telefonou para conferir se estava tudo bem, e perguntar por que diabos ele não havia aparecido para almoçar, o homem simplesmente contou tudo àquilo que o estava incomodando. Disse que não entendia o que existia de tão diferente entre ele e as demais pessoas; disse que se sentia aborrecido por não compreender sentimentos; assim também com o fato de levar tudo ao pé da letra, já que só entendia o sentido denotativo das coisas... Enfim, tudo o que Gerard fez foi colocar para fora todas aquelas coisas que o atormentavam no momento e, por fim, perguntou ao irmão o que deveria fazer. Mikey pareceu feliz, de certa forma, ao ouvir as queixas do mais velho, dizendo, antes de desligar, que iria pesquisar todo tipo de ajuda disponível na cidade.

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Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.