Sussurros De Uma Suicida.

Capítulo 34 - "Perca da Esperança" - Suicídio.


Sabe quando você tem aquela sensação de que está dando tudo certo para todo mundo, menos para você? Todo mundo evoluindo, crescendo, feliz e realizado. Mas você continua ali, passando noites em claro, esperando o dia que vai chegar a sua vez de ser feliz. Esperando o dia que você irá esfregar toda a sua incrível felicidade na cara de muitos por ai. Igual eles fazem contigo. Não é questão de inveja e nem questão de ser igual ou melhor. É só curiosidade de saber como é se sentir assim. Completa e inteira por dentro. E eu sinto uma sensação estranha esses dias, uma sensação dolorosa. É como se meu coração estivesse na mão de alguém, que não faz questão nenhuma de segura-lo com leveza e amor. Na verdade, não esta segurando e sim esmagando-o, tão forte, que me falta o ar. E dói, dói tanto que parece que nunca irá passar. Essa dor sufoca e parece que irá ficar ali para sempre, grudada em mim. Parece até que o amanhã não existe. Que as noites não tem fins, elas são tão longas e doloridas. O pior é que eu já aprendi a conviver com esta dor, com este buraco no peito, este vazio na alma. O problema é sempre que alguém muito feliz passa por mim, esta dor aumenta drasticamente, o buraco lateja no peito, o vazio vira um eco e de longe da para ouvir. Mas depois passa, sempre passa.

Não sei o que deu em minha mãe, mas naquele sábado, em meu aniversário, ela fez um grande almoço e eu estava sentada á mesa da sala de jantar, meus pais estavam sentados a minha frente, eles não se olhavam. Minha mãe tinha os olhos vermelhos e inchados, as lágrimas borravam sua maquiagem tão impecável. Meu pai estava limpo, casual, fazia tempo que não o via tão bem, e era muito incomum, já que ele sempre ficava todo desleixado, sem tomar banho e defendendo a "merda". Eles não se tocavam, não se olhavam, não sorriam um para o outro. Terminei de almoçar e subi para meu quarto. Então tudo voltou a seu devido lugar, ouvi meu pai falando todo seu discurso, dizendo que só iria um pouco para rua, ele iria beber de novo, ouvi minha mãe implorando para que ele ficasse dentro de casa, ouvi minha mãe chorando e meu pai dizendo que ele ficaria bem. Meu pai saiu de novo de casa, talvez indo para um bar qualquer encher a cara. Minha mãe subiu para o quarto dela e pude ouvir que ela chorava e que ela pedia a Deus alguma ajuda que eu não sabia de onde surgiria. Ouvi seus sapatos caminharem até a porta do meu quarto e depois ouvi quando ela abriu a porta do mesmo e entrou no meu quarto. Ela veio até minha cama, onde eu estava deitada toda encolhida. Minha mãe passou a mão em meu rosto, meu cabelo e tentou sorrir, mas ele sumiu e deu lugar ás lágrimas.

– Definitivamente seu pai não tem jeito e desculpe por estragar seu aniversário. –Ela estendeu um presente.–

Sentei em minha cama, de frente para ela e a abracei com força. Naquele momento nós nos consolamos. Minha mãe era tudo o que me restava naquele momento e eu era o tudo dela. Deixei que minhas lágrimas caíssem em seus ombros ao mesmo tempo em que sentia as lágrimas dela caindo nos meus. Seu abraço era firme, como se ela quisesse ter certeza de que eu estava ali e que eu não a abandonaria, mas infelizmente eu não aguentava mais. Ela decidiu sair, sai ela, minha cunhada e minha sobrinha, foram dar uma volta no parque, eu me levantei da cama e peguei um caderno e uma caneta e comecei a escrever.

" Carta de Suicídio.

Provavelmente minha alma já deve ter encontrado o céu agora. É tarde e eu fiz tudo isso com todos os planos para que nada desse errado. Eu espero esse fim há muito tempo. Eu decidi que seria meu ponto final, que acabaria com essa dor, com esse vazio. Eu tenho lutado contra todos os meus demônios, contra toda a minha dor e foi em vão, eu não sou forte e cansei de fingir que vou ficar bem, cansei de dizer da boca para fora que vou sair dessa, porque eu não vou. Bom, vocês devem querer saber os motivos. Eu mostrei eles um milhão de vezes e duvido que algum de vocês parou para ver. Vocês realmente acham que os machucados na minha perna e no meu pulso eram porque eu cai? Eu fui jogada. Essa dor já toma conta de mim a muito tempo, esses sorrisos já não são reais a muito tempo, essas cicatrizes já estão aqui a muito tempo e essa vontade de desistir já existe a muito tempo, é difícil você ter força para seguir quando esta sozinha, você sorri e todos acham que você esta bem, você caí e ninguém te estende a mão para te levantar e as pessoas que mais diziam te amar, te abandonam, te iludem da forma mais cruel e de tanto você se sentir sozinha e inútil, você cansa e já não da pra sorrir e já não da para fingir. Eu cansei de lutar, eu cansei de tentar, eu não estou bem, ninguém sabe, mas eu não estou bem e já não tenho forças, então definitivamente não dá mais. Espero que tudo se encerre aqui. Pam. "

Terminei de escrever e deixei o papel sobre a mesa do computador. Isso me leva ao lugar onde estou agora. Corro até a cozinha e tomo vários comprimidos. Eu estou totalmente gelada, algumas lágrimas escorriam em meu rosto, me fazendo sentir o quente das gotas, tentava manter o meu corpo em pé, mas estou tão mole e fraca que quase não me aguentava e ainda por cima tinha o cenário daquela tarde, que era nostálgica e fria por sinal, aquilo só complementava mais o meu sofrimento, que me deixa ainda mais morta por dentro, desfiando, completamente vazia. Havia uma neblina no céu, uma brisa fria e forte que me embalava naquilo tudo, minha vista já estava completamente embaçada, mal conseguia ver por onde andava e onde tocava, eu tonteava pela casa, esbarrando nos moveis, me chocando contra parede, tentando achar o caminho para varanda, então eu consegui, caminhei lentamente Eu me sentei naquele velho banco e agora me lembro de tudo que me trouxe aqui. Puxo as minhas pernas para perto de mim e as cruzo. Fica mais fácil me equilibrar desse jeito. Finalmente olho para o objeto que trago em minhas mãos. Sorri sem forças. Meu braço movimentou-se em direção ao pulso. Respirei fundo, profundamente. Há dias eu relutava em tomar essa decisão, mas a minha dor era maior do que poderia suportar. Ela não passaria e não diminuiria, permaneceria ali para sempre. Apoiei a parte afiada da lâmina verticalmente em meu pulso. Novamente respirei fundo, profundamente. Em um movimento rápido, pressionei a lâmina contra meu pulso e a puxei para trás. Um corte profundo de abriu em meu pulso. Vi o sangue antes de sentir a dor. Não foi um dor excruciante. Era suportável. Sangue começou a escorrer pelo ferimento, mas não era o que eu queria. Repeti o movimento e quando o sangue esguichou, sorri ao perceber que havia acertado uma artéria. Se era a radial ou a ulnar eu não sabia, mas não importava. Com o meu braço termendo, troquei a lâmina de mão e repeti o movimento com o outro pulso. Dessa vez acertei a artéria de primeira.

O sangue jorrava livremente em minha roupa, minhas pernas e no chão, mas eu não estava desesperada. Estava conformada com a minha decisão, mesmo abandonando a pobre coitada da minha mãe. Espero não me arrepender e não tinha como. Além de minha artéria bombear o sangue rapidamente, ninguém iria me procurar. Após observar por alguns segundos o fluxo contínuo de sangue, minha respiração aumentou. O pânico tomou conta de mim, mas aquilo apenas fez jorrar mais sangue. Ao perceber que as extremidades do meu corpo estava ficando dormentes, sorri. Não iria me deitar, pois assim demoraria mais. Uma sensação ruim tomou conta de mim, de meu estômago e eu pensei que iria vomitar. Eu comecei a respirar com mais dificuldade. Respirações curtas e rápidas. Calculei que estava perto do fim. Nesse momento minha visão se tornou turva e eu não tinha mais controle de meus movimentos. Um grito escapou por meus lábios secos e meu corpo caiu do velho banco, o chão já estava empapado de sangue. Ouvi alguém se aproximando e depois um grito " O QUE É ISSO? O QUE VOCÊ FEZ? ME AJUDEM. " Era uma voz masculina, mas não conseguia ver quem era, mas não importava. Nesse momento, eu estava extremamente sonolenta. Minha mão voava para longe e eu não conseguia pensar direito. Não sentia mais dor, não sentia mais frio. Apenas sentia a letargia tomar conta de meu corpo. Mas essa letargia era irreversível e eu estava feliz por isso. Meus pensamentos estavam indistintos, até que tudo perdeu a cor. A última coisa que pensei foi que a morte é tão parecida com adormecer, apenas não se acorda horas depois.