Chegamos a Berlim, depois de quatro horas de viagem, sem levar em consideração as paradas do trem. Chegamos ao meio-dia na estação ferroviária. Desmond, Anne e eu lutamos muito para entrar na fila para sair do trem, que gerava muito alvoroço entre os participantes do Survival Game. Pegamos das nossas coisas e, com tanto esforço, conseguimos entrar na fila para sair. Muitos chegaram à porta dupla pisando no pé, se esparramando, espremendo uns nos outros para sair. Alguns gritavam sai do caminho!, tire esse pé daí!; outros apenas ignoravam os que reclamavam, passando sem dó, nem piedade. Enfim, conseguimos sair.

Depois disso, a algazarra parou de repente. De longe, conseguia enxergar um homem de uniforme pardo, com o desenho do Partido Nazista no antebraço esquerdo discursando sobre o tour que vamos fazer para chegar ao hotel do Reality. Já vi esse homem em algum lugar... Era o general Bertrand. Ele veio conosco!

– Bem-vindos, jovens participantes da 64ª edição do Survival Game! - começou com o discurso. - Daqui a dois dias, vocês estarão entrando no Reality, transmitido ao vivo nas telas da Alemanha e na TV. O objetivo, para os leigos no assunto, é matar uns aos outros, até que reste dois sobreviventes de sexos opostos. Bem, vou lhes ditar o regulamento do reality. - parou para pegar uma folha de papel dobrada em quatro partes, do bolso do casaco pardo. Todos o olhavam com aflição e palidez.

– Vamos lá. - retomou o discurso. - Regra nº 1: Como o objetivo é matar uns aos outros, matem durante o dia, enquanto de noite descansem.

Matar durante o dia e descansar durante à noite? É, pelo menos o jogo deve ser bem mais light.

– Regra nº 2: Se nenhuma menina ou menino restar no decorrer do programa, apenas um vencerá, independente deste ser muito apegado ao outro.

Aí, já é demais! É melhor se matar a ter que viver sem o seu melhor amigo ao seu lado. É de enlouquecer.

– Regra nº 3: Ai do participante transgredir ou mudar as regras do jogo, ele terá seus bens confiscados e os que ele mais ama, estarão todos mortos. - e retirou os olhos do papel. - E aí, não terá ninguém para contar história.

Que ironia!. Mordi o lábio inferior, fechei a minha mão desocupada em punho com tanta força, que deixou marcas da unha na palma. Enquanto a outra, que segurava a mochila transversal, posta sobre o ombro, apertei até as juntas ficarem brancas.

– Alguma dúvida, pergunta, opinião? - perguntou o general, que acabara de pôr o papel de volta no lugar de origem. - Só não vale criticar.

Ninguém respondeu. E o general prosseguiu.

– Beleza! Sigam-me! - e se preparou para seguir em direção aos carros prateados que jaziam estacionados na frente da estação. Eram oito deles, todos Wolksvagen, três participantes mais um motorista em cada um dos seis Amarok, dois berlinenses em um Gol e um Gol preto destinado ao general. Entrei com Anne e Desmond em um Amarok e os oito carros seguiram rumo ao hotel do Reality.

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Vi as ruas passarem, os departamentos, a zona comercial e financeira de Berlim, até as ruínas do Muro de Berlim e o Palácio de Reichenstag, a sede do governo. É lá onde o parlamento exerce suas funções. Fiquei maravilhado, pois é um momento de estar maravilhado antes de morrer, daqui a dois dias.

Chegamos em frente ao hotel do Reality. Era imenso! De sete andares e por fora, espelhado. Passamos pela chafariz e nós fomos recebidos com grande euforia dos fãs (nossos fãs? Temos fãs?) que esperavam do lado de fora da sacada do hotel. Estavam disponíveis sete elevadores para cada três participantes (dois berlinenses e três de outra localidade). Depois de subirmos, além de recebermos as chaves, paramos no sétimo andar. Nós temos sorte de ficarmos no andar mais alto. Dá até para ver a cidade toda! Se de dia é bonita, imagina de noite, toda iluminada! Deslumbrante!

Desmond, que segurava a chave, destrancava a porta. Estava escrito nela: 700. Abriu. Na frente, a janela dominava a nossa visão para a cidade. Sim, o quarto é espaçoso! Três camas para cada um! Fui o primeiro a desabar em uma delas. Qualquer uma está ótimo! Macia de se dormir!

Enquanto Anne tirava as botas de camurça preta, sentou-se na cama e começou a balançar as pernas.

– Quem diria, heim? - Anne perguntou, para ser ter vantagem do lugar e da situação. - Um lugar fino e confortável desses para a gente aproveitar e depois morrermos no programa!

– Falou e disse, gatinha! - Desmond concordou. Em seguida, olho de relance para mim. - E você, Heinrich?

Fui despertado do meu pensamento pela pergunta de Desmond. Tentei dar uma de desentendido.

– Eu?

– Sim, você. Pergunto o que você achou daqui.

Recobrei a atenção, fingindo.

– Ah, achei muito top de linha.

– Como assim, "top de linha"? - Desmond parecia não entender.

– Dê uma olhada. - mostrei a ele a bela vista de Berlim.

Desmond e Anne se entreolharam, mas já sacaram o que eu estou falando.

– Falou e disse! - os dois concordaram em um timbre uníssono.

De repente, um alto-falante vindo do teto nos deu um aviso:

Caros participantes,

hoje vocês terão o dia todo para fazerem o que quiserem. Podem fazer um tour pelo hotel, passar o dia na piscina, visitar as lojas de conveniência, enquanto amanhã teremos treinamento, teste de simulação e, posteriormente, a preparação para o desfile pré-Reality. Muito obrigado.

Um dia inteiro para fazermos qualquer coisa... Menos mal! Anne, Desmond e eu nos reunimos para decidirmos o que faremos. Desmond optou em ir para a piscina (trouxe traje de banho), enquanto Anne e eu optamos em conhecer melhor o hotel. E assim foi feito.

– FECHADO! - nós falamos juntos.