Surreal - Art and Insanity

Capítulo 38 - Abstrato I


A porta se abriu e virei-me para ver Anne com sua cara de mau humor, abriu a porta e fez sinal para que eu entrasse. Era como se ela soubesse que agora não iria livrar-se de mim, ela estava dando o braço a torcer, mas eu nunca lhe contaria isso.

Entrei na casa, e foi como se fosse a primeira vez, aquelas cores que eu quase não sabia quais eram exatamente, atacaram meus olhos.

Anne apareceu com um copo e ofereceu a mim, peguei o copo e olhei o conteúdo, era um liquido vermelho um pouco espesso; olhei aquilo por alguns segundos pensando se beberia aquilo ou cheiraria para descobrir o que era.

Cheirar iria parecer muito grosseiro, Albert falou assustando-me um pouco.

_É um suco natural de betterave, maçã e gengibre; não se preocupe, a Rícina acabou._ Ela falou, talvez por perceber o quanto eu estava desconfiado analisando aquela bebida.

Anne tentou parecer um chefe francês, mas ficou mais parecida com uma pessoa que sabe um pouco de francês e faz questão de mostrar sua fluência quando tem uma chance.

Sorri de lado e levei o copo a meus lábios e deixei o suco vermelho passar por eles, o sabor marcante tomou conta de meu paladar: o suco era forte, refrescante e com toques que eu não sabia decifrar o que eram.

Era uma experiência sensorial: os cheiros, as cores, a textura daquelas almofadas, o sabor e o som dos pássaros lá fora e da respiração de Anne indo contra o ritmo da minha aqui dentro. Tudo acontecia ao mesmo tempo.

_Ele é ótimo._ Anne falou referindo-se ao suco, trazendo-me de volta à realidade.

Apenas concordei e a observei mais atentamente, ela usava uma camiseta preta larga e um short jeans que não era muito curto nem muito grande, a meu ver estava de acordo com o bom senso, ela tinha bom senso e pernas bonitas, não eram pernas bronzeadas ou muito bem cuidadas; eram pálidas, haviam algumas pequenas cicatrizes quase imperceptíveis no joelho esquerdo, eram firmes de um jeito que me fez pensar que ela não era tão parada quanto havia imaginado, pois os músculos em suas pernas eram os de alguém que corria, ou caminhava com certa frequência ou simplesmente fazia alguns exercícios.

Desviei o olhar e encarei os quadros coloridos nas paredes, eles tinham cores fortes e mais claras brigando num contraste de formas sinuosas e pequenos riscos negros.

_Sua mãe gosta de Abstracionismo Expressivo?_ Perguntei um pouco surpreso, por ter percebido aquilo naquele momento, só naquele momento.

_Sim, para ser mais exata ela gosta de Kandinsky._ Anne disse sentando-se no sofá_ Eu não entendo as obras dele._ Comentou olhando o copo em suas mãos.

_Não precisa encontrar um significado, acho que Kandinsky nunca quis que entendessem suas obras... Ele queria que fôssemos além disso, que sentíssemos algo... Mesmo que seja incompreensão como é em seu caso._ Falei tentando não parecer arrogante.

_Você fala como se o conhecesse, como se conseguisse analisar todos e como se essas suas técnicas funcionassem com todos, sempre._ Reclamou gesticulando um pouco, o que devia ser um sinal do quão irritada ela estava. Aquela era outra faceta dela: ficar nervosa de uma hora para outra ou talvez ela estivesse guardando aquilo a muito tempo.

Não consigo parar de analisar tudo a minha volta e isso não me incomoda, é uma ótima forma de passar o tempo.

_Não o conheço, provavelmente não consigo analisar todos, mas até agora tem funcionado._ Tentei argumentar de uma forma que não a fizesse ficar mais irritada.

Ela apenas pegou o copo vazio em minhas mãos e foi para a cozinha, voltando logo depois já com mãos vazias e disse:

_Vamos resolver logo esse projeto.

Seu tom não tinha o menor ânimo.