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Três anos depois

Depois da bombástica prisão de Nevel Alexander Papperman, o mundo que rodeia aquele secretamente chamado de Superman entrou em calmaria.

Devido à recente ficha criminal, a guarda de Percy foi passada a Carly, que tem sido devota em sua educação; Nevel continuava preso, apesar de haver indícios de que um novo habeas corpus havia sido solicitado por seu advogado. Ela continuou com sua carreira bem-sucedida de apresentadora/repórter, mas havia conseguido um cargo mais significativo em uma das maiores redes de jornalismo dos EUA, a CNN.

Freddie não teve mais problemas com meta-humanos estranhos criados pela NevelCorp, que, como esperado, havia caído demais, perdendo muito valor de mercado.

Sam ainda trabalhava como capitã da SWAT de Seattle, sendo condecorada por sua bravura e astúcia.

Já o kryptoniano erradicado na Terra continuava trabalhando como fotógrafo-repórter de campo do Planeta Diário, cuidando da área de assuntos internacionais; por diversas vezes, cobria guerras no Oriente Médio.

Os inimigos do herói do uniforme azul diminuíram drasticamente. Havia um ou outro meta-humano que surgia de repente, mas nada que fizesse o herói suar. Consequentemente, suas aparições tinham rareado.

Ele sempre tinha um tempo para visitar a esposa, uma porque podia atravessar o planeta em poucos segundos, e outra que o jornal lhe dava um período sabático por ele se manter com família tanto tempo fora de casa.

Era uma noite agradável, algo raro em Seattle, Freddie estava fatiando com agilidade uma peça de presunto, preparando rapidamente vários sanduíches. O casal completaria quatro anos de casados naquela noite, e o rapaz queria preparar algo especial para sua esposa.

Sam ainda demoraria a chegar, pois estava enrolada com um caso de um bêbado segurando como refém sua sobrinha; Freddie mantinha-se afastado, pois viu que o caso estava sob controle e, ademais, a loira odiava que ele interferisse em seu trabalho.

O homem finalmente se entregou, Freddie pôde ver Sam algemando-o. Ela agiu de forma calma e calculada, quem diria que algum dia veria o demônio loiro agindo assim?

Depois de tudo ser preparado e acondicionado em um mochila, Freddie se sentou no sofá, ligou a TV e assistiu às notícias.

Na CNN, Carly comentava fatos políticos. Ela era sensacional, por isso seu status não parava de subir; tal fato, entretanto, não a tornava uma mãe relapsa, muito pelo contrário, a morena era uma mãe exemplar.

Pouco depois, um repórter anunciou que advogados de Papperman haviam entrado com um pedido de habeas corpus para que Nevel esperasse pelo julgamento em liberdade. Freddie franziu suas sobrancelhas, pois sabia que a possibilidade de ele obter sucesso era grande.

Mas ele tinha de confiar na justiça do seu país. Fosse necessário, ele próprio, caso Nevel fugisse, o traria de volta, arrastando-o pelo cangote.

Já passava das nove da noite.

A maçaneta da porta se move, e logo depois adentra o imóvel sua reluzente loira, agora mais experiente e bela, mas ainda assim, sempre sarcástica.

“E aí, nerd?”, ela o cumprimentou, jogando sua mochila preta no sofá e pulando em cima do marido, beijando-o.

“Tudo bom, amor? Parabéns, eu vi como você se manteve calma na negociação com aquele bêbado.”

“Ah, aquilo foi baba. O cara mal conseguia ficar em pé.”

Sam se aconchegou ao lado de Freddie, ambos assistindo à TV. Alguns minutos se passaram até que o kryptoniano quebrasse o silêncio.

“Você... sabe que dia é hoje?”

A loira abaixou suas sobrancelhas, olhando para o marido confusa.

“Aniversário de casamento, Sam.”, ele respondeu, torcendo a boca.

“Ai, caraca! Tinha esquecido!”, ela exclamou, batendo na testa com a mão direita.

“Não esquenta”, disse Freddie, levantando-se e indo em direção à cozinha, pegando a mochila. Ele acionou seu uniforme.

“O que você vai fazer?!”

“Surpresa”, ele fez sinal para que ela se aproximasse, enquanto abria a janela dos fundos.

“Mas, tipo... eu vou sair assim, sem me arrumar?!”

“Você está linda, vem.”

Sam deu de ombros e foi em direção a Freddie, que a pegou gentilmente em seus fortes braços, carregando-as pelos céus de Seattle.

Pouco depois ela percebeu aonde ele queria ir: estavam indo em direção ao Bushwell Plaza, o velho edifício onde passaram tantas horas juntos quando eram adolescentes. Freddie pousou na escada de incêndio, onde tinham compartilhado o primeiro beijo de ambos.

“Meio clichê, eu sei. Mas este lugar é muito especial pra mim.”

“Não, nerd, não é clichê”, ela o beijou, “É lindo. Pra mim este lugar também é especial.” Sam tirou a proteção de chumbo do pingente de kryptonita roxa, colocando-o no pescoço.

O moreno sorriu e abriu a mochila, fazendo-a arregalar os olhos.

“E agora eu me lembro por que eu te amo tanto... Fala sério, sanduíches de presunto, fatcakes e Peppy Cola?! Isso tá perfeito!”

Os dois comeram prazerosamente, enquanto relembravam coisas da adolescência, brigas e outros fatos engraçados, que os faziam rir enquanto comiam. Depois que terminaram, sobre a capa vermelha do herói ambos deitaram e observaram a noite. O céu estava límpido, e as estrelas reluziam com esplendor. Alguns minutos de silêncio se instalaram entre os dois.

“Olhando para onde ficava Krypton de novo?”

“Sim.”

“Ainda melancólico?”

“Não mais”, ele se pôs acima dela, “Agora que tenho você, que tudo está perfeito... O que aconteceu com Krypton foi uma tragédia, mas faz parte do passado. Você é o meu presente, e é por isso que sou eternamente grato a você.”

Os lábios rosas da loira arquearam em um sorriso, e o casal se beijou.

Os beijos se tornaram mais profundos, as mãos do rapaz logo viajaram até os botões da camisa branca que ela usava. Sem pensar no local onde estavam, ela se perdeu no desejo de tê-lo ali mesmo.

Freddie se livrou do uniforme bio-tecnológico e logo o casal começou a se amar sob as estrelas de Seattle.

Depois de alcançarem o regozijo, apreciaram o céu mais uma vez. Freddie percebeu que a esposa estava com um semblante triste.

“O que foi, Sammy?”

“Nada...”, ela respondeu, virando um pouco o rosto.

“Fala”, ele pediu, virando-se em direção a ela.

Os olhos dela começaram a brilhar, e ela, numa vã tentantiva de disfarçar, esboçou um pálido sorriso.

“Ah... Tipo... isso não é muito do meu feitio... mas, Freddie, estou tão feliz. As coisas estão tão bem entre nós, nossas famílias, amigos...”

“E por que você está assim, querida?”

Ele respirou fundo, demorando um pouco para responder.

“É que... eu tenho medo que algo aconteça e estrague tudo isso, sabe?”

Momentos de reflexão se seguiram à afirmação da loira. Mas, por fim, o rapaz se virou de bruços, olhando atentamente para os belos olhos azuis da esposa.

“Nada vai acontecer, amor. Nevel está na cadeia, Zod, Ursa e Non também, completamente sem poderes... Não tem mais ninguém que possa nos trazer problemas.”

Ela olhou para ele de volta, uma lágrima escorreu por sua bochecha.

“Promete?”

“Palavra de escoteiro. Quer dar um voo romântico nesta bela noite de outono?”

Sam acenou e, com isso, Freddie encapsulou novamente o pingente, colocando seu uniforme. Ele esperou a amada se vestir e ofereceu-lhe sua mão, que ela pegou.

Com um impulso, o casal começou a flutuar, subindo até ultrapassar a altura das nuvens. Sam nunca se cansava daquela sensação gostosa de estar a quilômetros acima do solo. O céu, sem a presença de poluição e nuvens, assumia uma beleza sem comparação.

Freddie apanhou apenas sua mão esquerda, fazendo com que Sam experimentasse a sensação de voar. Ela fechou os olhos e sentiu o leve deslocamento do ar lhe acariciar a pele macia da região de suas maçãs.

Após alguns metros, Freddie parou verticalmente, Sam se apoiou em seus pés. Ele a abraçou pela cintura, os olhares congelaram um no outro.

“Eu te amo, sabia, Sammy?”

“Claro que eu sei! E eu também te amo!”

Os lábios dos amantes se aproximaram, selando um beijo apaixonado, cujas únicas testemunhas eram as estrelas cintilantes no céu azul escuro de Seattle.

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Epílogo

A imprensa em polvorosa se aglomerava à frente do tribunal, onde Nevel Alexander Papperman acabara de conseguir um habeas corpus para poder responder aos seus crimes em liberdade. Graças à sua influência, o outrora homem mais poderoso dos EUA conseguiu fugir por uma porta dos fundos, onde rapidamente entrou em um luxuoso carro.

Uma vez lá dentro, notava-se que Nevel estava diferente do que o normal: olheiras profundas, cabelo bagunçado, barba por fazer.

Sentada ao seu lado estava Valerie Meltzer, a atual presidente da outrora poderosa corporação NevelCorp.

“Valerie. Prazer em revê-la, depois de frequentar o Inferno.”

“O prazer é meu, Nevel.”

O engomado bilionário limpou imaginariamente a região das mangas, como se tentasse se livrar da sujeira de estar em uma cela, ainda que sua cela fosse do mais alto padrão.

“Gostaria de saber se vocês já acabaram com a vadia da Chloe.”, perguntou o homem, com uma surpreendente calma.

“Impossível. Todos que tentamos têm medo de chegar perto dela, o Superman espalhou pela cidade que acabaria com qualquer um envolvido no seu caso.”

Nevel massageou suas têmporas, fechou os olhos e inspirou fundo.

“Não importa. Não importa. Diga-me, o projeto A, como está?”

“Bem... Avançou pouco, pois tivemos de desviar os recursos para atividades que tentassem reverter a má imagem da NevelCorp...”

Nevel encostou-se ereto no banco do carro. Seu rosto ficou vermelho, uma veia saltou na testa.

“Valerie, nós vamos remanejar todos os recursos para o projeto A. Eu não quero saber quanto isso nos custará em imagem!”

Valerie olhou incrédula para ele, protestando com veemência, gesticulando.

“Mas, Nevel... Ahhh!”

Nevel apanhou rudemente seus pulsos, sua feição se tornou assustadora.

“Não importa quanto isso me custe, eu vou destruir o Superman! Às favas com os acionistas, funcionários... Você não tem do que se preocupar, Valerie, já a recompensei muito bem e sei que tem negócios extra-corporativos! Eu vou destruir o maldito alien, nem que seja a última coisa que eu faça na vida!”, ele bradou em alto tom, com os dentes cerrados.

“Okay!” Valerie respondeu, massageando seus pulsos, depois de Nevel soltá-la “Eu vou mexer os pauzinhos para isso.”

Nevel ajeitou seu colarinho, cruzou os braços e novamente se recostou no banco, calando-se pelo resto da viagem.

Valerie o fitou com descrença, aquele Nevel ela não conhecia. Apesar de sentir por jogar pela janela sua carreira, ela sabia que o que o seu chefe havia lhe dito era verdade. Já tinha feito investimentos bons o bastante para mantê-la confortável pelo resto da vida, bem como seus amantes fogosos.

Mas a mulher não pôde deixar de sentir uma desagradável sensação de que algo muito ruim sairia daquela recente sede de vingança de Nevel Papperman.