SEGREDOS

Eu corria pela floresta, e ao meu lado corria um lobo de cor castanho ferrugem. Ele se iluminava a cada vez que os raios de sol que conseguiam passar pelas frestas entre as árvores alcançavam seu pêlo. Eu sorria para ele, que me olhava com seus profundos olhos castanhos, e com o focinho, me indicava o caminho a nossa frente. Ele apertou o passo e se distanciou de mim. Eu corria com toda minha força, mas não conseguia alcançá-lo e ele sumia entre as árvores. Eu seguia o seu trote pela floresta, mas esta já não era o parque ensolarado que eu conhecia, era uma mata densa e escura. Eu corria desesperada para encontrá-lo. As lágrimas que eu vertia já encharcavam todo o meu rosto, quando eu senti aquele cheiro. Eu sangrava novamente e Jake não estava aqui. Eu não conseguia mais correr, pois chorava convulsivamente. Só quando parei percebi os passos atrás de mim. Me virei num reflexo, e lá estava a criatura que me seguia vindo na minha direção. Eu não podia ver seu rosto, mas ela tinha pele branca como a minha, e eu podia ouví-la farejando o meu sangue. Meu coração disparou com a aproximação, mas meu corpo estava paralisado. Esperei a morte, mas ela não veio. Acordei assustada, meu coração batia tão forte que eu não podia ouvir mais nada além do seu barulho. Respirei fundo tentando me acalmar, só então pude ouvir a voz da minha mãe, que falava com o Jake.

–-Ele está irredutível Jake. O que eu posso fazer? --

–-Porque ele tem que estar sempre no meu caminho? -- ele parecia desesperado ao responder com outra pergunta.

–-Não o culpe Jake. Eu que me precipitei. -- ela implorava.

–-Ele entende o que é o imprint para um lobo mais que qualquer um de vocês. Por que ele é o único que não consegue aceitar isso? -- ele quase gritava.

Eu tentei me levantar sem fazer barulho. Sentei-me na cama, tentando ouvir melhor a conversa. Mamãe ia continuando...

–-Porque ele é... Trimm!Trimm! –- mas foi interrompida pelo som do meu celular tocando.

Ah! Droga. Procurei o aparelho pelo quarto e o achei no meio da bagunça das minhas malas. Olheio o visor, que piscava com o nome Alice. Só podia ser. Os dois silênciaram na sala.

–-O que foi tia? -- perguntei limpando os olhos

–-Bom dia pra você também Nessie!

–-Desculpa tia. Bom dia! É que você acabou de me acordar. -- eu menti.

–-Só liguei pra pedir que você venha aqui antes de sair pra caçar. -- ela disse fingida. Era sábado, meu aniversário seria no dia seguinte. Nós iríamos pra Forks só a tarde, pois antes eu sairia pra caçar novamente. Já me sentia completamente saciada, mas não custa nada prevenir, teriam humanos na festa. Os outros caçaram durante a noite.

–-Aconteceu alguma coisa? -- perguntei desconfiada. Desde o sábado passado eu não estive em casa.

Os dois claramente ouviam a minha conversa.

–-Não, é que seu sangramento vai parar essa tarde. E o seu pai tem uma surpresa pra você. -- Apesar da raiva, as palavras dela me encheram de alegria. Eu finalmente podia voltar pra minha casa.

–-Que bom! Obrigada tia! -- falei fingindo euforia. -- Qual a surpresa, você já viu?

–-É só o seu presente. Mas você tem que provar o seu vestido. Não sei bem se comprei o tamanho certo.

–-Tudo bem! Em meia hora eu passo aí.

Saí do quarto rapidamente. -- eu tinha que manter o meu teatro -- mamãe e Jake me olhavam desconfiados, mas logo conversavam sobre outro assunto. Cumprimentei os dois e fui tomar o café que o Seth preparava. Fiquei tão ansiosa em voltar pra casa que quase esqueci aquele sonho. Nunca sonhei com algo assim, nem mesmo quando os volturi nos visitaram anos atrás. Resolvi esquecer aquilo, não queria preocupar ninguém, e afinal era só um sonho. Ainda tinha aquela conversa estranha entre a mamãe e o Jake, e eles com certeza estavam mais que conversando. Além disso, o telefonema da tia Alice me pareceu muito suspeito. Me apressei no banho, e logo estava pronta, mamãe já me esperava na porta quando Jake nos pediu que o esperasse, ele iria conosco e o Seth também. Caminhamos todos calados pelo caminho até a casa. Mas podíamos sentir uma certa tensão entre a mãe e o Jake. Imaginei qual a causa daquela discussão mais cedo.

Ao chegar em casa, papai, tia Alice e meus avós já nos esperavam. Fui recebida com muito carinho por todos, eles também parecem ter sentido a minha falta. Notei que tia Alice estava um pouco angustiada, o que me deixou preocupada com o resto da família que havia viajado. Eu não tinha noticias a um bom tempo. Todos nós entramos e nos espalhamos pela sala. O clima de confraternização seria perfeito se não fosse a tensão que eu podia perceber nos seus rostos. Eles me escondiam alguma coisa, e eu não ia deixar eles me tratarem como criança me poupando dos problemas.

–-Não foi nada Nessie! -- meu pai estava atento aos meus pensamentos.

–-Então porque tia Alice parece tão preocupada? -- eu perguntei desconfiada. Ela logo mudou sua expressão tentando parecer mais relaxada.

–-Eles só devem ter encontrado Nahuel. Você sabe como ela fica quando não consegue nos ver. -- Todos pareciam atentos a nossa conversa.

–-Mas vocês combinaram que encontrando Nahuel ou não, eles estariam aqui para o meu aniversário.

–-Eles estarão meu bem, não se preocupe. -- meu pai encerrou o assunto com um abraço e um beijo na testa. Ele parecia mais jovem que eu agora, mas ainda me tratava como criança.

–-Isso mesmo. -- tia Alice falou interrompendo o nosso abraço. -- Nenhum deles se atreveria a faltar a essa festa. E agora venha comigo. Você precisa provar esse vestido. Senão eu não terei tempo pra corrigi-lo, ainda tenho uma festa inteira pra preparar. -- ela já parecia a mesma Alice de sempre.

Antes que eu pudesse seguir com ela pra o meu quarto, papai bloqueou nosso caminho.

–-Ah não Edward! Depois você dá esse presente mixuruca! -- tia Alice protestou.

–-Não seja invejosa Alice. -- papai parecia deliciado com a situação.

–-Eu vou te dar logo meu presente, porque você vai precisar pra viajem. -- ele me dizia com o seu melhor sorriso. Então, do bolso da calça, ele tirou um pequeno chaveiro em forma de uma maçã vermelha de onde pendia uma chave de carro.

–-Ah! Pai!Obrigado!Obrigado! Obrigado! -- Eu não pude me conter e me pendurei no pescoço dele. Ele é tão super-protetor, que era a última pessoa da qual eu esperaria ganhar um carro. Ele devia ter ouvido falar da minha nova velocidade. Todos na sala ficaram muito animados com a notícia, só Jake parecia meio desconfortável. Mas eu estava muito feliz pra dar importância a isso, talvez ele e o papai ainda estivessem de birra, e agora essa briga com a mamãe, ele deve estar chateado. Seguimos todos para garagem, que além dos usuais, guardava um novo carro todo coberto por uma capa de nylon. Todos deixaram que eu tivesse a honra de descobrí-lo. A primeira coisa que percebi foi a sua cor branca. Quando a capa caiu pude olhar os detalhes. Era um Porsche, da linha Boxster S, o mesmo tipo de esportivo que a tia Alice teve há alguns anos, só que esse era conversível. Eu não era tão ligada em carros velozes quanto o resto da minha família, talvez porque até agora, eu não tinha os mesmo reflexos que eles. Mas esse carro podia chegar a mais de duzentos e cinqüenta quilômetros/hora, seria com certeza muito legal rodar a essa velocidade. Eu quis logo experimentar, mas a tia Alice reclamou, e eu não quis pertubá-la ainda mais, ela devia estar mesmo com inveja, porque o carro era lindo. Subi as escadas correndo, com ela me puxando pelo braço. Paramos em frente a minha porta, e em menos de um segundo Esme estava ao nosso lado. As duas me olhavam ansiosas.

–-O que foi? Qual é o mistério? -- eu perguntei sem entender.

–-Abra! -- as duas falaram em coro me indicando a porta.

Ao abrir a porta, percebi a transformação pelo qual o meu quarto havia passado. As paredes rosa foram trocadas por um tom de verde-água muito bonito. A mobília era diferente também, só permaneceram a velha cadeira de balanço, agora reformada e meu espelho de corpo inteiro, sem os motivos infantis. Adentrei o quarto observando cada detalhe, o novo carpete grafite, a penteadeira repleta de maquiagens e perfumes e o meu novo banheiro, sem desenhos ou bichinhos na parede.

–- Você gostou? – Esme me perguntou. – É o meu presente.

–-Obrigada vó! -- eu falei me aconchegando no seu abraço maternal. Ela era tão sensível, que no pouco tempo em que estive aqui ela pode perceber a minha mudança. Não só a transformação exterior, mas também a que se processava internamente.

–-Tá bem! Já chega! -- tia Alice interrompeu novamente, praticamente expulsando Esme do quarto.

–-Alice! -- vovó a repreendia.

–-Eu também quero entregar meu presente. -- ela se justificava.

Esme nos deixou a sós e Alice me levou até o closet, que parecia menor, não sei por eu ter crescido ou pelo acréscimo de algumas milhares de novas peças. Acho que ela enlouqueceu depois que eu cresci da última vez. Aquelas roupas podiam vestir toda a Oak Harbor. Do meio de uma quantidade absurda de vestidos, ela tirou uma sacola onde eu podia ver um vestido azul. Eu o vesti rapidamente, também estava curiosa pra ver como ficaria. Era um vestido de frente única de um tecido leve e acetinado, sua gola tinha um fecho atrás do meu pescoço e descia reto no comprimento até os joelhos. As costas eram completamente nuas até a altura da cintura. Eu me observava atentamente no espelho, e estava me sentindo realmente linda vestida assim. Sem que eu percebesse tia Alice envolveu minha cintura com um fino cinto de couro preto, elevando o vestido e o deixando mais curto. Enquanto eu prendia o meu cabelo pra observar melhor o modelo nas costas, Alice me trouxe um sapato pra combinar com o vestido. Assustei-me com o tamanho do salto, eu só estava acostumada com os meus tênis de sempre, mas não era difícil, eu me sentia bem mais segura com o meu novo corpo. Me observei mais um pouco, o reflexo que eu via no espelho era de uma mulher muito bonita e segura, como uma estrela de Hollywood, ou melhor, como uma vampira. Pensei na reação do Jake quando me visse assim. Imaginei que em Forks, talvez eu pudesse descobrir o que ele sente por mim, sem a Leah ou o Seth pra atrapalhar. Opss! Ai não! O papai! Procurei a voz da mamãe pela casa, só ela podia me salvar. Escutei-a do lado de fora da casa, rindo da empolgação do papai mostrando o carro pro Seth. Por sorte, ele não estava prestando muita atenção em mim no momento, mas eu precisava policiar meus pensamentos enquanto estivesse perto dele. Tirei o vestido, pra evitar que minha imaginação me traísse, tia Alice imediatamente o guardou na minha mala, que ela já havia preparado. Eu já podia imaginar as coisas que ela me daria pra vestir esse fim de semana. Mas não quis discutir, queria dar uma volta no meu carro novo. Quando descia as escadas, percebi o Jake conversando baixinho com o vovô na sala do piano.

–-Mas o que você acha? -- ele perguntava agitado.

–-Eu não posso me envolver Jake, ele é... -- A conversa foi interrompida tão logo eles ouviram meus passos. Qual é! Isso já está parecendo um complô! Passei reto pelos dois e nem precisei me virar pra perceber os olhares desconfortáveis que eles me lançavam. Por que todos resolveram esconder algo agora? Leah, Jake, mamãe, papai, Alice e agora até o vovô estava falando pelas minhas costas. Fui até a garagem onde meu pai mostrava ao Seth o interior do carro. Todos calaram quando eu cheguei pisando firme.

–-Eu quero dar uma volta! -- falei imperativa, pra o papai e o Seth que ainda estavam dentro do carro. Meu pai saiu do carro com o cenho franzido, sua careta habitual quando alguma coisa o preocupava. Seth apenas pôs a cabeça pra o lado de fora, do banco do passageiro, e implorou.

–-Deixa eu experimentar! Por favor!

–-Tudo bem, você dirige na volta. -- esbocei um sorriso. Seth não escaparia das minhas perguntas agora.

–-Eu vou caçar. -- falei, já dentro do carro, para os meus pais que me olhavam assustados.

Saí cantando pneu pela estrada, enquanto meus pais entravam em casa apressados, procurando a causa do meu comportamento rude. Pelo visto, meu pai também não estava prestando muita atenção na conversa deles. Seth parecia não ter percebido o clima que se formara, a perspicácia parece não ser uma característica dos lobos, afinal. Seguimos para o sul, subimos a ilha Whidbey pela rodovia principal até a baía Dugualla, onde viramos para o norte a toda velocidade. E o carro era realmente veloz, chegou muito rápido aos duzentos por hora, deixando o Seth excitadíssimo. É claro que ele podia correr muito mais que isso, mas tenho certeza que ele nunca dirigiu um carro tão rápido. E essa era a minha chance de conseguir alguma coisa dele, de uma forma que o Jake não desconfiasse de nada depois. Seguimos pela rodovia Jones, na costa leste da ilha até a baía Skagit, onde um braço de terra se estendia no mar em direção a uma pequena ilha de mesmo nome. Reduzi a velocidade e peguei uma estrada secundaria, que iria dar na praia. Estacionei o carro enquanto ele me olhava sem entender.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.