Capítulo I

O Desaparecimento de Edwin Thursby

Em 1913, o mundo havia a pouco presenciado o maior salto tecnológico já visto na humanidade, a chave disso, vapor, o calor e engrenagens. Com ela o mundo era capaz de coisas jamais vistas.

Máquinas que levavam pessoas de um lado ao outro do mundo por cima das nuvens, dispositivos menores que estantes capazes de armazenar informação equivalente a uma biblioteca inteira, luzes que podiam queimar perpetuamente e claro… tudo isso tinha um fim.

Para a guerra, para os campos de batalha e para se tornarem ferramentas da morte, a guerra estava próxima, todos sabiam disso. E cada país desejava tomar a maior vantagem possível das novas tecnologias. Na Inglaterra, então, o centro dessa revolução e do seu uso para guerra era um homem: Edwin Thursby.

Nosso projeto era além de insano, assim ouviria de uma pessoa comum, mas eu sabia a verdade, ele também era brilhante o que nós chamamos de Coração a Vapor seria um órgão artificial que se integraria ao corpo perfeitamente, pois o coração é a fonte da vida de um humano, o fazendo funcionar com uma fonte de energia tão vasta.

—Aiwa, você não entende? Vamos criar um humano que não pode morrer.

Ele me disse isso. Enquanto a energia continuasse a fluir, seria impossível parar essa pessoa, um órgão desconectado às fraquezas, mas suportando todas as forças de um humano, era genial, e desde que a esposa de Edwin havia sumido, nós trabalhamos incessantemente nisso, eu tinha certa hesitação, havia algo que me impedia de colocar todo meu empenho, mas até Edwin pode ver quando essa hesitação sumiu, a meio-ano atrás, após o fatídico dia em que minha família foi quebrada mais uma vez.

Perdão, eu não conseguiria ignorar essa chance, um amigo meu deu a ideia para essa piada e… aqui está.

É um pouco infeliz, no entanto, que essa piada revela um fato triste. Por vinte anos, eu nunca soube que havia me encontrado com a esquadrilha real antes, em outro mundo, muito menos da existência de quem era o homem mais forte do mundo, de outro mundo, Jacob.

Contudo… foi assim que a história ocorreu, tal qual, eu continuarei a conta-la como ocorreu, então, para o final dela, onde finalmente, todas as crises daquele tempo foram resolvidos.

Igualmente, naquele mundo, Edwin havia sumido e tal qual, um grupo foi chamado para o resgatar, mas dessa vez…

Em vez de me chamar, o governo disse que eu deveria chamar um grupo, por algum motivo, o governo decidiu que o assistente do Edwin seria plenamente capaz de tomar conta de seu resgate. E bem… de certa forma, eles tinham razão.

Com a colaboração do governo, eu chamei um grupo, mais três pessoas vieram…

Tal qual em outro mundo, Christopher veio, não tenho certeza como, mas naquele mundo ele era um conhecido meu, além de um mercenário bem eficiente, por sua vez, ele chamou Yuki e por último… pois precisávamos de mais um homem, veio Haaji.

Ele eu conhecia desde a outra linha do tempo, porém, dessa vez, ao precisar de algum fogo a mais, eu o chamei para isso, dizendo que poderia usar esse trabalho para si no futuro.

Haaji era um homem indiano, um funcionário do expresso oriente e também um inventor. Quando eu conheci eu não consegui ver, o semblante idiota, cabelos mal-cuidados e restos de fuligem no rosto não faziam tanto jus a ele, contudo, quem o acompanhava, ou melhor, o que o acompanhava fazia.

Cake, um autômato humanoide. Uma invenção que Haaji construiu em uma epifania, um lapso de brilhantismo que impressionou até mesmo o Edwin. Mesmo ele disse que era incapaz de recriar aquela invenção, o autômato que se movia com a agilidade de um humano, mas a força de uma máquina, que ainda tinha um semblante de personalidade em si.

Eu especialmente achava impressionante o quão resistente o robô era, ele havia feito todas as engrenagens e caldeiras por dentro do corpo humanoide, a única vez que via uma pista da parte de dentro da Cake era quando era necessário usar toda a energia, então algumas aberturas apareciam por onde vapor espirrava em jatos.

Assim… todos nós havíamos nos reunido, após eu fazer, pelo o que não sabia ser a segunda vez, um resumo do que havia acontecido, nós fomos ao dirigível que eu havia conseguido com o dinheiro que o governo havia nos provido.

Cake, o robô, tomou o posto de piloto, então todos nós nos reunimos numa minuscula sala de estar do dirigivel que…

Quando eu dei meu primeiro passo lá, vendo todas aquelas pessoas…

“Estranho…”

Por um segundo eu presenciei diversas visões da minha jornada no outro mundo, porém, naquele dia não consegui raciocinar que tal coisa poderia ser produto de algo como um outro mundo, afinal, eu só descobriria como a viagem no tempo era possível algumas horas depois…

—Christian… eu te conheço?

—Err… claro, nós nos conhecemos na…

Antes que ele terminasse a frase, por trás de mim, houve uma grande explosão, um raio partiu os céus e seu trovão jogou nosso dirigivel para trás.

—O que foi aquilo?! Rápido! Aiwa, Yuki, Haaji, vamos!

Nós corremos para o lado de fora e, diferente do que poderia ser imaginado por algumas pessoas, não havia ninguém nos gritando ameaças, era outro dirigivel, esse populado por…

Pessoas…? Eram humanoides com certeza, contudo tinham corpos cobertos dos pés a cabeça, eles não falavam, no entanto…

Um deles nem pensou antes puxar uma sniper e…

—AH!

Eu fui acertado em cheio no tórax, eu sei bem que deveria ter morrido naquele momento, o tiro quebrou minha caixa torácica, perfurou meu pulmão, eu cai imediatamente ao chão, tombado de costas.

Foi assim, assim então que a luta começou.

Uma longa, longa e dolorosa batalha.

Chris foi o primeiro a agir, ele encontrou facilmente o homem que havia atirado em mim, logo, ele instintivamente mirou nele e…

Ele precisava tomar a vantagem, o mais rápido possível ainda, os viajantes tinham mais números, muito mais, assim… ele apontou para aquele com o fuzil e…

Sua mira foi perfeita, uma execução impecavel da técnica o qual ele mais se orgulhava, com o som e a luz de um disparo, o tambor daquela arma havia sido despejado sobre o viajante.

Ainda assim…

Foram seis tiros, seis tiros que acertaram nas pernas, nos braços, no tronco e até no pescoço daquele viajante, contudo, a unica coisa que ele via… era um forte jato de ar saindo daqueles buracos e após alguns segundos…

—!

Ele revidou, um tiro direto contra a posição dele, foi sorte que ele pode se esconder logo antes e a cobertura bloqueou aquele tiro, ainda assim…

“Como…? Ninguém nunca sobreviveu a isso! É impossível!”

Era. Em toda sua vida, essa era uma técnica absoluta, algo que nunca falhava. Quem havia sido vítima daquilo nunca sobreviveu para contar a história, tal qual, as testemunhas normalmente também, elas eram silenciadas.

O fato de ninguém saber dessa técnica, o segredo absoluto ao redor dela, isso era uma demonstração da excelência do trabalho de Christopher, e também uma fonte de orgulho para ele. E agora… esse orgulho havia incapaz de sequer incapacitar um homem? Para ele, isso era inacreditável.

E logo, os outros tripulantes daquele dirigível puxaram suas armas e abriram fogo contra nós.

Yuki normalmente não lutava assim, mas daquela vez, ela havia se preparado, trazendo um fuzil de precisão, ela o carregou para o quão longe podia, topo do dirigivel, então começou a abrir fogo.

Se encontrando então com os mesmos problemas de Chris, não importava quantas vezes os tiros pegaram naqueles monstros, a única coisa que se via saindo eram jatos de ar, mal parecia que causava dor. E ela logo, também virou um alvo.

Com sua velocidade escapar dos tiros era possível, porém, aos poucos, mesmo que fosse apenas de raspão, ela estava sendo acertada, contra-atacar era então cada vez mais dificil.

E para Haaji, aquela luta era um show, ele sabia se defender, mas não era um soldado, um mercenário, ele era um homem que trabalhava honestamente, quando ele via a chance, saia brevemente de seu esconderijo e tentava atirar com seu fuzil de assalto em direção ao inimigos, mas nem quando ele conseguia um tiro perfeito, nem mesmo assim algo ocorria.

Quando viram, o seu grupo estava prestes a ser exterminado, tentaram se manter, preservaram a pouca vida que tinham e se esconderam, entretanto, nem isso seria o suficiente, rastejar pelo navio e tentar se esconder não bastaria, pois...

Pois os tripulantes haviam cansado de esperar, e interessantemente… os viajantes que tinham todo o tempo do mundo, fizeram seu maior erro quando cansaram de esperar.

Com uma força que não era normal, eles pularam de seu dirigivel e em direção ao nosso, pois ele iria tentar atirar, Haaji viu isso, então:

—Cake! Recuar!

Em uma manobra arriscada, inclinando o dirigível a quase 45 graus e o afastando abruptamente dos inimigos, ele havia feito algo que… sinceramente, havia sido o motivo daquela batalha não ter acabado bem ali.

Diversos viajantes caíram das nuvens, para suas mortes no mar.

Finalmente, a batalha estava começando a se virar para o nosso lado, eu não sabia, claro, mas foi nesse momento, por algum motivo…

Eu abri meus olhos, apesar da perda de sangue, de o quão rarefeito o ar parecia, foi ainda asism naquele momento em que eu me levantei e…

Apesar de boa parte dos inimigos terem caido para suas mortes, pois aparentemente os tiros haviam os afetado minimamente e o suficiente para que só alguns metros a mais que foram abertos pela manobra de Cake terem os feito cairem no mar, haviam dois que… sequer haviam sido arranhados ainda, ambos estavam em minha frente…

—AHHHHHHHHHH!!

Eu rolei para o lado, desviando de um tiro por pouco em desespero, eu institivamente pulei para cima, tirei meu jaleco e.

PUH! PUH!
Dois tiros, esses deveriam ter ido em cheio nas minhas costas, mas eu havia conseguido desviar, eles não perceberam que haviam atirado no meu jaleco apenas, foi sorte, muita sorte. Eu nem consegui acreditar que aquilo realmente funcionou.

Corri então para longe, foi finalmente quando o resto dos meus aliados apareceu.

Me puxou para o canto, então ficou de guarda com seu fuzil apontado.

Yuki e Chris, no entanto, estavam de volta a ofensiva, de perto, eles pensavam que talvez pudesse vencer.

Os viajantes olharam para eles, sacaram armas de uma mão.

Chris sacou sua própria arma Yuki sua lâmina, então… foi quando um tiroteio, rápido e franco começou, uma luta sem mais truques. De certa forma…

De perto, enquanto Yuki atacava impiedosamente, fazendo cortes um atrás do outro, abrindo buracos no viajante que apenas soltava jatos de ar, enquanto ele se afastava, tentando revidar a lâmina com fogo direto, ele estava conseguindo acertar, contudo a velocidade de Yuki não permitia ele de conseguir um tiro certeiro, isso se resolveria logo.

Enquanto Chris estava atirando sem parar, a todo momento ele queria mostrar e provar que sua técnica era de fato infalível, ouvia-se um tiro apenas e ele já abria o tambor de sua arma, colocava mais balas e novamente, outra vez e outra vez, assim que suas balas acabaram, ele apenas jogou aquela arma fora, sacou outra e continuou a atirar, no entanto…

No final, ele ainda estava tirando apenas “ar” daquele inimigo, enquanto o viajante, o fazia perder sangue.

Um momento, sangue era tudo para Chris.

O som de sangue pingando no chão, o cheiro de sangue, a vista coberta pelo sangue, a sensação dele por sua pele, o gosto em sua boca. E um pouco depois, apesar de ter todos os sentidos cobertos por aquilo, ele ainda atirou, mais uma vez. Uma unica vez e…

Tombou ao chão.

Assim como Yuki, que nem era tão resistente, havia caido também.

—PAREM COM ISSO!

Eu havia visto aqueles homens sem rosto atacarem sem piedade, eles não deram motivo, eles não sangravam, não falavam, sequer sentiam dor, para mim, eles sequer eram humanos. Naquele mundo, foi a primeira vez que me encontrei com algo tão absurdo que eu sequer podia compreender, não importava o quanto tentasse, então, quando vi… eu havia ativado overclock outra vez, sem sequer perceber.

Foi assim com um revolver em cada mão em atirei para todos os lados, não aleatoriamente, eu havia percebido algo, sendo estratégico assim…

Pois havia começado logo a atirar, as balas estava em um complicado percuso de ricochetes pelo dirigivel, cada passo meu, uma bala acertava em cheio aquele viajante, assim, eu continuei a correr em direção dele:

“Um ponto fraco! Eles precisam ter um ponto fraco!”

Mas quando cheguei perto, quando finalmente vi…

Eu recebi um gancho no pescoço, meu cérebro que já estavam em seu limite quebrou finalmente e eu perdi minha consciência outra vez…

Sem falar nada, o viajante deu um passo a frente, ele pegou uma arma do chão, ele apontou em minha direção enquanto seu colega assistia a execução…

Contudo…

—AHHHHHHHHHHH!!

Era outro milagre, eu havia caido logo ao lado do Chris e apesar daquele homem já está práticamente morto, em seu ultimo esforço…

Com seu corpo, ele se lançou em minha frente, seus braços nos meus ombros, enquanto suas costas bloquearam as balas…

—Ah…

Naquele momento… eu consegui acordar, então lembrar… pois não era a primeira vez que tal coisa acontecia…

Eu vi naquele corajoso herói que havia me salvo, meus olhos marejados por lágrimas e sangue, neles eu vi outra pessoa…

“Naomi…?”

Estava prestes a deixar tal coisa ocorrer outra vez, alguém se sacrificaria, minha fraqueza faria alguém morrer, mas… dessa vez, dessa vez…

AHHHHHHHHHHHH!!!!!

Com ódio que devia ser impossível de ser sentido, meu corpo havia se revigorado, um pouco de energia, apenas o suficiente para tentar, eu podia ainda tentar algo, a um segundo atrás, havia encontrado a fraqueza deles…

“Eu posso vencer! Eu vou vencer!”

—AHHHHHHH!

Com gritos de ódio e dor, eu agarrei Chris, eu o levei comigo a frente, quando um tiro veio, outra vez, seu corpo bloqueou a bala, então, eu o lancei contra aquele monstro, que perdeu o equilibrio e… com meu braço fazendo um arco…

Eu tirei a máscara de seu rosto…

Aquele rosto… era de um humano, mas apenas eu pude ver, pois havia se passado por tanta coisa, que normalmente aquilo seria irreconhecível como tal.

Contudo, eu vi, desespero naqueles olhos mostravam que, definitivamente… era o rosto de um humano, aquele humano se agarrava a seu pescoço, enquanto parecia cada vez mais desesperado e fraco, como se sufocando, ele não gritou e logo… tombou no chão, morto…

E o outro deles… aterrorizado com o que via, um quase-morto como eu, um quase-morto que talvez para ele, não era um humano como qualquer outro que já tinha visto, se aproximando dele e…

Novamente, arranquei sua máscara e, ele também sufocou, tossiu e tossiu, seus olhos mostraram sua humanidade ao se revirar em desespero até que ele morreu, por fim…

Ainda lá, com uma força que não era minha, uma que meu frágil corpo jamais devia possuir, eu penetrei pelo peito daquele homem com apenas minhas mãos e o que retirei de lá, não eram ossos, não era sequer um pulmão, eu não senti tudo o que deveria compor um humano lá, mas o que eu buscava, aquilo, aquilo sim estava lá.

“Um coração a vapor… exatamente como ele deveria ser…”

Era como ver um sonho que havia se tornado realidade, havia dois viajantes, com dois corações, uma das coisas que eu sabia como sendo possível daquele invento, na sua ultima frase seria…

Me arrastei até Haaji e o disse:

—Me ajude… eu posso salvar os dois…

Yuki havia morrido, Chris também, seus corpos estavam frios, seus corações pararam, mas aquilo podia ser revertido. Eu tinha certeza disso.

Naquele mesmo dirigível, quando eu estava a beira da morte, nós dois teríamos de fazer uma cirurgia, trocariamos corações orgânicos, dois que haviam parado, por dois corações a vapor, assim que eles fossem colocados da maneira correta, sabia que voltariam a bater, assim então… eu teria os trazido de volta a vida.

E assim foi feito, mesmo que eu estivesse com minhas roupas manchadas de sangue, sem metade do equipamento necessário para tal procedimento, eu teria que fazer com aquilo.

Com a engenharia de Haaji, nós conseguimos algo, tinhamos o mínimo necessário para fazer tal processo. Porém, o tempo era curto, nós não tínhamos mais do que algumas horas, então… nos dividimos.

—Haaji, você e seu robô farão a operação no Chris, eu vou fazer a da Yuki… deve ser mais fácil.

E assim… longas, longas e exaustivas horas começaram, naquela sala de cirurgia improvisada, mal iluminada, em meio as nuvens…