Narrado pela Autora

A chuva não deu trégua pelos próximos três dias consecutivos devido a um ciclone tropical ter atingido a costa com toda a sua potência. Para passar o tempo, as amigas dedicaram-se aos jogos de tabuleiro, montaram suas vidas com o “jogo da vida”, entraram no mundo dos negócios com “banco imobiliário”, armaram guerras com “War” e bancaram as verdadeiras investigadoras com “detetive” e “Scotland”, mas nenhum deles gerou tanta confusão quanto Uno.

Regina ficou pelo tempo exato de dez minutos sem falar com Emma depois que ela lhe presenteara com uma carta de “comprar +4” pela terceira vez numa mesma rodada. Elsa foi mais radical com Belle voltando a falar com a garota somente no dia seguinte depois que ela perdeu uma partida para a iniciante Regina.

Obviamente estar em um paraíso tropical assolado pela chuva e pelos ventos não é exatamente o primor de férias que você deseja, mas na premissa do ditado popular que reza “há males que vem para o bem” esses dias enclausuradas serviram para que os laços se estreitassem ainda mais.

Mills que nunca teve nenhuma experiência dessas estava em êxtase com tudo que partilharam nesses dias, colchões pelo chão, travesseiros misturados. Encantada em como a vida poderia ser leve e em como a alegria estava presente em pequenas coisas, como um jogo de cartas.

Foi só dois das depois da tempestade finalmente ter passado que os campistas foram permitidos circular livremente por todas as áreas daquele local. Verificações de segurança e a limpeza foram realizadas minuciosamente para que nada oferecesse risco aos adolescentes cheios de energia para gastar.

O sol começava a descer deixando o céu em um tom alaranjado manchado por pequenas nuvens brancas e fofas que passeavam livremente devido a leve brisa. Na paisagem ao redor não havia vestígio algum da tempestade de dias atrás que parecia que destruiria tudo pela intensidade com que veio.

Passeio como esse havia se tornado rotina nos dias de Emma e Regina, tirando a caminhada pela manhã com os minutos no píer era raro elas estarem sozinhas para poder conversar coisas mais íntimas e que pouco a pouco gostariam de compartilhar uma com a outra. Então o fim de tarde havia se tornado seu refúgio para poder conversar de tudo e de nada ao mesmo tempo. Por vezes compartilhavam do silêncio que dizia muito mais que palavras.

O toque de mãos era tímido e reconfortante. O encontro dos lábios doce e cálido. A união das risadas era melodia e canção. Emma fazia carinho no braço de Regina que estava sentada no meio de suas pernas com suas costas apoiadas no peito da loira.

_Como foi quando contou para seus pais? – Regina quebrou o silêncio. Emma suspirou antes de responder.

_Não foi fácil. Meu pai foi visivelmente mais compreensivo, mas acho que ele sofreu muito internamente. Minha mãe gritou, chorou, achou que era algum vestígio de rebeldia, mas no fim compreendeu que era assim que eu seria feliz, então ela decidiu me respeitar. – A loira olhava o horizonte lembrando-se desses tempos sombrios – Meu pai levou mais tempo para me tratar da mesma forma apesar de nunca ter gritado ou brigado comigo. Eu sei que ele só não queria que eu sofresse.

_Mas por que sofreria sendo você mesma? – Regina perguntou, mas ela sabia a resposta. Ela passava pela mesma situação com um pequeno agravante. Cora.

_Sou de Storybrook Regina, a cidade nem está no mapa. As pessoas costumam se assustar com o que é diferente do que estão acostumadas. – Respondeu tranquilamente.

_E você sofreu muito com isso?

_Incrivelmente não. Mas acho que isso se deve ao fato do meu pai ser o xerife. – ambas gargalharam. – Eu sei que as pessoas me olharam de forma estranha, comentavam de mim, mas eu deixei isso para lá. Graham arrumou umas brigas por minha causa, mas no fim as pessoas perceberam que eu era a mesma Emma e acho que tiveram que engolir isso na marra, ou ao menos fingem muito bem.

_Você não tinha medo de sei lá... – Regina gesticulava com suas mãos – de ser tudo diferente, das pessoas nunca te aceitarem?

_É claro que eu tinha. Tinha medo dos meus pais me odiarem, do meu irmão virar as costas para mim. Da vó de Ruby proibir minha melhor amiga de andar comigo... – Emma parou rindo.

_O que foi Emma? – Regina se desencostou da garota para poder olhá-la.

_Vó Granny derrubou uma bandeja cheia de restos de comida em cima de um babaca que estava falando mal de mim no café. – Riu.

_Sério?

_Sim. E disse ainda que o lixo do restaurante dela sabe reconhecer os seus por isso caíram em cima dele. – Ambas gargalharam - E que ela sabia proteger os seus, sua família. - Eu morrendo de medo e ela me amando, me considerando da família. Isso foi muito importante para mim. Ela me abraçou e me disse com seu jeito bronco e rude; “eu olho para você e vejo a Emma, a minha pequena Emma. Não é ser gay que te define é seu coração.”

_Uau. – Regina suspirou secando uma lágrima que desceu pela bochecha de Emma enquanto lutava com suas próprias lágrimas ficando em silêncio logo em seguida. – Seria algo que meu pai falaria, ele era um homem muito bom, se estivesse aqui ainda, acho que tudo seria diferente e eu provavelmente já teria contado a ele. E sem duvidas ele me apoiaria. Como sempre fez. – A loira puxou a morena para encostar-se a ela novamente o que a garota fez sem contestar.

_Quer falar sobre ele? - Perguntou gentilmente voltando a acariciar seu braço. Regina continuou em silencio e deitou sua cabeça no ombro da outra e Emma respeitaria a vontade da garota de não falar e preparava-se para mudar de assunto quando ela interrompeu sua intenção.

_Ele era o melhor pai do mundo. – sua voz era baixa – Amoroso e carinhoso. Cada dia que ele chegava em casa ele largava tudo e sua atenção era cem por cento voltada a nós. A mim e a Zel. Era a melhor parte do dia. Ele chorou quando aprendemos a andar de bicicleta e bateu palmas entusiasmadas quando venci minha primeira competição de hipismo. Falava para todo mundo “ela é minha filha”. – Emma podia sentir o ritmo do coração de Regina se acelerando – Eu estava suja, suada – sua voz embargou e ela respirou fundo – e ainda assim ele me envolveu em seus braços num abraço longo. Dois dias depois ele teve um infarto fulminante. Estávamos na escola, eu não tinha visto ele de manhã, acordei atrasada e ele me gritou da cozinha, mas eu saí correndo... eu... – sua voz foi engolida pelo choro...

_Shiii não precisa dizer mais nada. – Emma abraçou Regina pela cintura e a apertou forte contra si e a garota desabou em soluços – não segura, chore Regina. – A morena se encolheu abraçando os joelhos e chorou compulsivamente enquanto Emma acariciava suas costas em silêncio. Era a primeira vez que a morena podia sentir a morte do pai sem reservas, sem medo do olhar de repreensão de sua mãe, podia sentir como uma filha deve sentir a perda do pai, do seu melhor amigo.

A loira continuava seu gesto carinhosamente nas costas da outra enquanto os soluços de Regina iam diminuindo gradativamente até restar um leve fungado. Nessa altura o sol já havia baixado completamente. A morena levantou a cabeça e encontrou o olhar amoroso de Emma sobre ela e sorriu timidamente agradecida. Em um gesto inesperado abraçou a loira pela cintura apoiando a cabeça em seu peito recebendo os braços da menina logo em seguida em torno de si.

_Obrigada. – Disse baixinho.

_Não tem que agradecer.

_Tenho sim. Ninguém nunca fez isso por mim. Nem minha irmã, - sua voz continha um tom de rancor - nem Ariel.

_Eu estou aqui agora.

_Você não vai me abandonar também vai? – Regina não queria soar tão vulnerável, mas era Emma. Ela sempre poderia ser ela mesma com Emma.

_Eu estarei aqui por você Regina, enquanto você me permitir.

_E se eu precisar de você para sempre? – sua voz baixa em um nível quase inaudível fez o coração de Emma bater em disparada o que fez com que Regina sentisse e ouvisse o retumbar devido à proximidade de seus corpos. Ela não precisava dizer nada, Regina sabia.

_Então acho que terá que me aguentar por um longo tempo.

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Depois do jantar todas as garotas foram para seus quartos. Depois de um final de semana sem sair devido ao mal tempo esse era um grande dia. Killian as levaria para o centro da cidade onde acontecia o festival de verão da cidade. Todas as ruas eram enfeitadas com bandeirinhas coloridas e eram lotadas por barraquinhas de comida típica, artesanato e muitas bebidas.

Ninguém perguntou por que o rosto de Regina estava inchado como se ela tivesse acabado de acordar o que Emma agradeceu posteriormente. Já passava das dez e meia da noite e aos poucos o silêncio ia ganhando o acampamento. A vistoria já havia passado pelo chalé das meninas e a agitação nos quartos começara logo em seguida.

Regina saiu novamente com um tênis de Swan que ela secretamente pensava em roubar. Primeiro porque era de Emma, segundo porque era confortável. A música era ouvida de longe. Killian parou em uma rua transversal porque não as ruas mais perto do centro estavam fechadas para o evento.

E era um evento de grande porte. As ruas estavam abarrotadas de turistas com suas câmeras penduradas em seus pescoços. Diferente das outras vezes, Regina reparou que Killian ficou perto delas conversando baixo com Swan, mas não fez qualquer questionamento. Não tinha ciúmes do garoto.

Divertiram-se em um parque de diversões montado para aquela festa. A morena só entrava nos brinquedos que ela achava não correr risco de vida e sabiamente ficou de fora da auto pista. Emma saíra do brinquedo com dois hematomas nos ombros onde o cinto prendia, pois era o alvo de todas as meninas que jogavam os carrinhos para bater exclusivamente nela. A alegria daquele grupo era quase palpável.

Narrado por Regina

Eu estava completamente maravilhada com toda aquela gente em meio as ruas rindo e se divertindo no ritmo das musicas que ecoavam por todos os lados. E a comida? Aquelas bombas calóricas que a gente não tinha nem ideia da procedência eram provavelmente as coisas mais gostosas que eu já havia comido na minha vida.

Lambia contente meus dedos depois de devorar mais um churros (sério, quem inventou isso tem um lugar garantido no céu) quando percebi que minha loira não estava mais perto de mim. Como assim ela saiu nem disse para onde ia?

_Belle, você viu a Emma? – Perguntei a garota que terminava seu churros também.

_Ela disse que já volta. – Responde de boca cheia.

_Ela foi ali. – Disse Elsa e eu olhei a direção que mostrava e o churros fez um movimento brusco dentro do meu estomago quando eu vi naquela direção uma ruiva que eu conhecia muito bem.

_Hum. – Foi tudo que consegui responder enquanto Ana chutava a canela da irmã.

_A Emma não foi ali conversar com Mérida Regina, essa ruiva abusada deve ter visto a loira e está seguindo ela. – Completou Dot em defesa da amiga.

_Eu não disse nada. – Balancei meus ombros como se não estivesse preocupada, mas eu estava e muito preocupada e com raiva também.

_Mas nem precisa dizer. – Belle riu – Essa veia na sua testa que está quase saltando para fora de seu corpo já diz tudo.

_Não tem porque ficar nervosa Regina. – Ana me disse – A Emma não vai fazer nada.

_A Emma pode fazer o que ela quiser. Ela não é nada minha. – Respondi rápido e nervosa demais o que só fez as garotas rirem da minha cara o que fez meu bico provavelmente aumentar e minha veia pulsar ainda mais. Maldita veia delatora.

Os minutos passavam e nada de Emma voltar. Meus pés batiam freneticamente no chão, a irritação tomando conta de todo meu corpo. As meninas haviam começado uma conversa e estavam alheias ao meu tormento. Onde Emma tinha ido e por que diabos ainda não tinha voltado?

Então a música parou de tocar e logo pudemos ouvir uma voz sair pelos auto falantes. Uma voz que eu conhecia.

_Desculpem todos. Na queríamos atrapalhar a festa de vocês, mas minha amiga aqui – a voz continuava – vem cá criatura! Desculpem ela é tímida – todos riam inclusive eu – Essa minha amiga queria cantar uma música para alguém especial.

_Killian. – A voz da menina soou repreensiva no microfone e todos ouviram e riram ainda mais. E eu? Bem... depois de ouvir a voz de Emma pelos auto falantes minhas pernas viraram gelatina. Eu não poda evitar e desejava ardentemente que essa pessoa especial fosse eu. Mas eu nem se quer sabia que Emma cantava.

_Ué? Não é para isso que estamos aqui? – Mais uma rodada de gargalhadas. As meninas estavam tão surpresas quanto eu no início, mas já davam pulinhos de alegria ao meu lado. – Regina querida... – Killiam disse – Aparece aí para a gente parar de atrapalhar a festa.

Meus pés fincaram no chão. Eu não conseguia reagir. Eu não sabia onde eles estavam eu não tinha visto um palco nem nada. Então eu comecei a me movimentar, mas os comandos não eram meus. Estava sendo empurrada pelas meninas em meio a toda multidão.

Se eu contar que parecia que as pessoas abriam caminho para mim parece mentira, mas foi exatamente assim que me senti enquanto era empurrada até um local que parecia um pequeno coreto no centro da praça. Lá em cima estava Emma sorrindo tímida para mim e provavelmente vermelha como um pimentão. Meus olhos não conseguiam desviar daquela imagem.

_Oh, ela chegou! – Killian disse apontando para minha pessoa e todos os rostos se viraram para mim e começaram a assoviar e bater palmas – Solta o som DJ. Opa, somos nós que fazemos o som. – Disse arrancando mais risadas do público enquanto pegava algo que parecia uma guitarra e pendurava nos ombros e dava um violão para Emma. Pude perceber que ela tremia.

Então a melodia começou e eu não conseguia prestar a atenção em nada só nos movimentos que a mão de Emma fazia, mas quando ela abriu a boca eu senti todo ar deixar meus pulmões.

Deitada aqui com você tão perto de mim é difícil lutar contra esses sentimentos. Quando parece tão difícil de respirar, estou presa neste momento. Presa no seu sorriso. Eu nunca me abri para ninguém. É tão difícil me segurar, quando estou com você em meus braços. Mas nós não precisamos apressar isso. Vamos devagar. Apenas um beijo em seus lábios ao luar. Apenas um toque do fogo ardente. Não, eu não quero confundir as coisas. Eu não quero forçar demais. Apenas um tiro no escuro e você poderá ser a única que eu estive esperando por toda minha vida. Então, querida, eu estou bem, com apenas um beijo de boa noite. Eu sei que se dermos tempo ao tempo, isso só vai nos aproximar do amor que queremos encontrar. Nunca foi tão real. Não, nunca me senti tão bem.”

Swan cantava sorrindo olhando para mim, intercalando as estrofes com a voz de Killian. Eu nunca tinha ouvido aquela música em toda a minha vida, mas tinha se tornado minha favorita. Sua voz era suave e lírica e entorpeceu todos os meus sentidos. Provavelmente eu estava com a boca aberta olhando para aquele monumento brilhando lá de cima.

Somente reparei que a música havia acabado quando ela apareceu na minha frente e ajoelhou-se me perguntando algo que eu respondi sim sem nem ao menos ter ouvido o que era. A loira então prendeu uma pulseira trançadinha no meu pulso e ela tinha um pingente que eu não prestei muita atenção porque Emma levantou e me beijou na frente de toda aquela gente que começou a assoviar e bater palmas freneticamente e só aí que percebi que por alguns segundos eu tinha ficado fora do ar, em um mundo paralelo em que só existia eu e os braços de Swan ao redor de minha cintura e seus lábios nos meus. E o restante daquela festa? Eu jamais tive condições de lembrar.