O dia do aniversário

Emily começara a escrever diários e pintar quadros, seguindo as recomendações de seu médico. Daniel saíra cedo para o trabalho como faria em qualquer outro dia e deixara Emily na cama. Ele sabia que era um dia crítico e seria conturbado do começo ao fim, por isso, deixara um bilhete dizendo que não sabia quando voltaria pra casa. Usava o trabalho como desculpa e a bebida como medicação.

Não eram mais as mesmas pessoas, nem não se tocavam ou se aproximavam um do outro e muito menos falavam sobre o assunto. Não se olhavam nos olhos e mentiam descaradamente. As refeições eram momentos de pura angústia. Tudo o que se ouvia era o tilintar dos talheres no prato, até que um ou outro havia terminado e se retirava.

A terapia aliviava a dor e disfarçava a distância. Aquilo a fazia se lembrar dos bons momentos que tiveram como família.

Ainda que aquela fosse uma ferramenta útil, não a ajudara a superar o aniversário de Amanda. Na verdade, nada ajudaria.

Emily chorara do amanhecer ao entardecer, sem conseguir controlar o pesar. Abraçava-se na tentativa de se proteger do vazio que a habitava.

Procurou por sua caixa de fotos e hesitou antes de abri-la. Respirou fundo e deixou-se tomar por mais lembranças.

Era difícil olhar para o rosto delicado e feliz de sua garotinha.

Havia preparado um bolo durante o dia, como fizera nos anos anteriores enquanto suas memórias felizes tentavam bravamente sufocar os dias escuros e solitários.

O sequestro havia arruinado sua família por completo. Seus sonhos foram desfeitos como um castelo de areia atingido pela maré arrebatadora.

Ainda que esperasse recuperar sua pequena, tudo parecia distante e o mundo, um lugar cruel.

Apenas mais uma gota num oceano ou outro grão de areia num deserto.

Emily encarava a vela acesa sobre o bolo e deixava suas lágrimas lavarem seu rosto.
Ouviu os passos de seu marido que cambaleava.

Daniel, como sempre, voltara para casa embriagado.

Ele se tornara agressivo e culpava Emily pela situação. Antes fora um pai dedicado e até mesmo, um bom marido, mas as coisas começaram a mudar depois do desaparecimento de sua única filha, a luz do seu dia.

Dizia coisas sem sentido e tudo o que reprimia durante o tempo em que passava sóbrio.

Emily temia não ser capaz de aguentar muito mais. Ambos sofriam a falta que sua pequena lhes trazia, mas ele não a entendia. Encarava-a da ponta da mesa da cozinha e chorava.

– Era isso que queria?! – ele estava furioso e profundamente triste – Graças a você, eu estou morto por dentro! Morto!

Emily não conseguiria mais lidar com aquilo.

– Eu também estou! – ela se levantara e olhava-o nos olhos, tristeza e fúria se propagando de ambos – Nós fizemos isso um para o outro, Daniel. Você acha que é a única pessoa nesta casa que sofre? Eu fiz tudo o que pude pela Amanda. Depois de tudo o que passamos... Como você pode me culpar?

Ele se sentara no pé da escada e escondia seu rosto nas mãos. Emily apagara a vela e jogara o bolo na lixeira.

– Isso não é uma guerra, Daniel. – ela tentava se controlar – Nós dois a perdemos. Ela está em algum lugar precisando da nossa ajuda e tudo o que você sabe fazer é se acovardar e fugir. Eu estou tão assustada quanto você. Estamos no mesmo barco, querido. Precisamos achar uma saída para isso e logo.

O telefone estridente toca e ambos se encaram.

Quem poderia ser numa hora como aquela?

Daniel se levanta com certa dificuldade e alcança o telefone o mais rápido possível.

– Alô?

– Papai? Eles não querem me deixar voltar pra casa!

– AMANDA? AMANDA! - ele não podia acreditar.

Sua filha gritava do outro lado da linha e a ligação fora encerrada antes mesmo que pudesse dizer mais alguma coisa.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.