No subúrbio da cidade, boatos escorriam como água e logo todos já ouviram falar sobre a derrota esmagadora de Marley e os Becker para as famílias Gestova, Manifield e Solastra. Uma ameaça viva ao governo de Karl Fritz, à paz e aos habitantes estrangeiros. Não era mais raro ver pessoas de malas prontas deixando o luxo do distrito de Aveiro, dos Tybur, para ganhar um pedaço de pão e um teto caindo aos pedaços na comunidade – e não a toa, já que o único líder deles está desaparecido e dado como morto por muitos.

O tom melancólico se estendia por todos os lados. As pessoas temiam por suas vidas, questionam e subestimam os direitos dados à eles por Karl. Não acreditam nos seus dizeres e promessas, não mais.

Dentro de uma das residências, Helos estava diferente em relação a última vez. Não mais abatido, seu olhar parecia confiante como na era de ouro, a barba estava feita e a grande roupa militar era trajada: uma roupa azul escuro com um "x" de fitas brancas no peito, duas ombreiras vermelhas e uma calça branca.

Ao fundo, Freydis indignada. Helos esteve vegetando todo esse tempo, homens foram massacrados por sua ausência e só agora ele veste sua roupa e apanha sua lança?

— Diga, Freydis. O que te incomoda? — indagou o herói, sem virar o rosto. Não era dificil sentir o incômodo de Freydis.

— Por que agora, depois de tudo? Thomas está morto! Eu vi a esposa dele, o filho dele! Ele... — Cerrou os punhos. — tinha um filho, Helos. Um filho! E agora ele está morto por sua ausência!

— Sim. — respondeu Helos, frio. Arrumava o colarinho de sua blusa. — Thomas foi corajoso, e foi para guerra sabendo o que deveria proteger. Mas, conhecendo ele — Finalmente se virou para Freydis. Tinha o mesmo olhar inexpressivo de sempre. — certamente se arrependeu no último instante.

Freydis ficou cabisbaixa, e Helos apenas ficou quieto. Conheceu Thomas ainda na infância, ele era quase seu irmão – levando em consideração que também foi treinado por Ivar. Tinha boas memórias, e sabia que a guerra não era o lugar de Thomas. Ele só queria uma vida normal, mas a guerra o puxou. No fundo, talvez esse fosse também o desejo de Helos.

— Protegerei o legado de Thomas e Ivar no meu coração, e por isso eu devo voltar à luta. Marley precisa de mim, finalmente chegou a hora. — Helos deu as costas, abrindo uma das gavetas e lá estava: o clássico chapéu bicórnio preto-azulado com duas penagens vermelhas. Vestiu e se tornou outra pessoa, de um homem a uma lenda. — Sabe, Freydis... Thomas nunca foi um guerreiro, e por isso não prestava atenção nas lições de Ivar. — Freydis olhou no fundo de seus olhos, curiosa. Helos parecia dez anos mais jovem agora. — "Marley é soberana. Não deve aceitar migalhas. Não deve se curvar a ninguém." — Helos suspirou fundo. Bons tempos. — No início, também pensei que era puro egocentrismo, mas é muito maior que isso. Quer dizer que Marley, acima de tudo, deve ter autonomia. Marley não deve depender de nenhuma casa eldiana, e sim o contrário. Os Tybur estão em perigo, os Becker estão em perigo, e os únicos que podem ajudá-los somos nós. Mas, acima de tudo... o reinado dos Fritz está em perigo, e por isso, pela primeira vez na história, um símbolo da Resistência ficará cara a cara do rei. — Freydis arregalou os olhos. — E ele não tem opção se não comer na minha mão para manter essa paz de mentira.

— Eu não quero que você volte pra guerra sem mim, Helos. Não quero ter que cuidar de você de novo. — No fim, Freydis estava desviando seu olhar num tom melancólico. Cuidou e conviveu com Helos por um ano, vê-lo partir assim era preocupante. Tinha que estar por perto, tinha que cuidar dele – mesmo que se trate de um homem com o dobro do seu tamanho.

Um sorriso de canto emergiu do rosto de Helos. Ele também precisa de você, Freydis.

E assim eles saíram da casa caindo aos pedaços, prontos para sua mais importante missão, que ironicamente, não precisaria da icônica lança desta vez (mas mesmo assim a levava). Olhares curiosos foram surgindo nas ruas de acordo com que o homem passava acompanhado da garota, pessoas duvidando, outras perseguindo. Era Helos, o protetor de Marley, o herói da Resistência. Ele tava vivo.

As pessoas começaram a gritar, chamar por seu nome. Helos esteve ali por quase um ano, mas sem seu chapéu e sua lança, era só mais um homem. Mas agora, finalmente o terreno estava disponível para seu retorno, e iria fazê-lo triunfalmente. Subiu no cavalo branco, se juntou aos outros poucos soldados que o acompanhavam, ergueu sua lança e gritou:

— Vamos para capital!

E todos gritaram em comemoração, mesmo que não soubessem o que aquilo significava. Helos trazia esperança.