- ... Mine, sabe que dia é hoje?

- Deixa eu me lembrar... Dia de fazer compras?

- Não...

- Dia de treinar? Dia de realizar alguma missão?

- Não é nada disso. Hoje é um dia especial pra mim, pois faz um ano desde que comecei a manejar a Extase, a cortadora da criação. Sabe, esse título fui eu que dei à ela, pois quando assassino seres humanos considero que estou cortando restos de papel, restos que a criação produz e esquece de eliminar.

- Não sabia, é bom que vocês duas ainda estejam juntas. Formam uma bela dupla, não é a toa que são tão compatíveis. Pois é, desde o meu ingresso aos Invasores da Noite, você já possuía a sua relíquia. - Quando acabara de falar, Tatsumi aparecia na porta do quarto

- Oi meninas, eu estava caminhando até a cozinha para ajudar a Akame no preparo do almoço e me interessei pela conversa de vocês. - Ele confessava

- Que intrometido, humpf! Duvido que a Sheele compartilhe tudo com você por perto, novato! - Mine reclamava

- Tudo bem, Mine. Não me importo de contar essa história aos meus amigos. Bem, desde pequena meus pais tinham um restaurante que era muito querido e frequentado pelos moradores, só que como eu não conseguia ajudar na cozinha nem no atendimento, decidia conversar com alguns peregrinos. Eles são bem fáceis de identificar: geralmente levam mochilas, mapas, trajam coletes e calças com vários bolsos, usam botas e tem uma gentileza, um nível espiritual bem acima do resto da população. Nunca me julgavam por ser desastrada nem implicavam com meus óculos grossos e fundos. Certa vez, conheci uma mulher chamada Edna, ela era uma guerreira veterana que desejava finalmente descansar, por isso viajava por vários lugares a procura de um local que a satisfizesse. Estava contando sobre meus problemas graves com a visão, e como eu queria que eles sumissem, quando ela revelou saber de uma solução. Segundo a dona dos cabelos rosa, existia uma poderosa feiticeira a qual habitava uma longínqua cadeia de montanhas. Ela dominava a arte das trevas e das invocações, entretanto as utilizava para o bem, auxiliando os viajantes que eram destemidos e determinados o suficiente para conseguirem chegar até o local. Edna já havia sido curada de uma ferida profunda decorrente de suas antigas batalhas, desse modo testemunhara e confirmara o êxito dos poderes. Animada, não demorei para me preparar para a viagem. Agradeci à minha mais nova colega e fui pedir permissão aos meus pais. Claro, não era necessário, afinal no fundo eles já tinham desistido de mim, não acreditavam que eu conseguiria fazer algo útil sozinha.

- Nossa Sheele, que incrível!! E aí, você conseguiu chegar ao topo da montanha? - Tatsumi perguntava ansiosamente

- Aahh, fique quieto seu mal educado!! Não interrompa, deixe ela continuar a história!! - Mine gritava

- Pessoal, sem brigas por favor. Onde eu parei mesmo?? Ah é, começando a jornada. Peguei um folheto, dado pela Edna, que me informava a localização e os caminhos mais rápidos. Como nunca tinha saído do centro da capital, não reparei no nome escrito e nas advertências, adentrei em um túnel muito escuro e longo, o qual produzia bastante eco. Naturalmente acendi minha tocha e continuei caminhando, passando direto por algumas placas fincadas no solo ao meu lado. Naquele momento senti algo passar por entre minhas pernas, algo peludo e fugaz. Quando meus olhos finalmente focaram aquele borrão roxo, percebi que era um cachorro pequenino e com uns chifres bem peculiares. Sempre adorei animais, então fiz carinho em sua cabeça, em sua barriguinha e em suas orelhas. Mas quando parei de acariciá-lo, porque precisava seguir em frente, aquela bola de pelo transformou-se em uma temível besta. Tentei espantá-la com o fogo, o que não funcionou, então apelei para o meu lado sentimentalista e toquei-o novamente, na esperança de que só estivesse querendo receber carinho. Dessa vez minha tentativa obteve sucesso, o bicho havia regressado à sua forma inicial. Tendo compreendido a situação, não pude deixá-lo para trás, então coloquei-o em meu ombro a fim de evitar alguma luta que atrapalhasse meu objetivo. Chegando ao final da passagem, percebi que aquele era o lar do guardião da feiticeira, que impedia intrusos ou pessoas má intencionadas de entrarem em seus domínios. Pelo que parece, quando a pessoa tem bom coração, esse caminho alternativo disponibiliza-se, entretanto devido ao temperamento instável do cãozinho, era extremamente desaconselhável e perigoso. A vantagem de ser distraída é que eu não fico com medo antecipadamente, o que dessa vez me proporcionou um atalho ótimo. O guardião havia me acompanhado até o ponto em que devia, voltando então a inspecionar os limites daquelas terras.

- Pessoal, o almoço está na mesa!! Venham antes que esfrie ou que eu coma tudo!! - Akame avisava ao grupo

- Opa, minha barriga está roncando de tanta fome... Sheele, será que a gente pode continuar depois? - Mine e Tatsumi repetiam em coro

- Pare de repetir o que eu falo, bobo!

- Mas eu não estou fazendo de propósito!!

- Vamos comer, vamos. Aposto que a Akame caprichou dessa vez...

Após terem almoçado, degustarem a deliciosa sobremesa e terem escovado os dentes, os três amigos continuaram a conversa.

- Ih, me perdi novamente. Se vocês estiveram atentos, podem me falar onde eu devo continuar? - a garota de cabelos lisos e arroxeados perguntava discretamente

- Você estava acabando de chegar nos domínios da feiticeira - o menino de olhos verdes ajudava sua amiga

- Ah sim, lembrei. Pois bem, depois de ter alcançado aquele lugar, tive que caminhar mais um pouco, até me deparar com um grande muro. Bati o sininho que ficava ao lado do portão, até que um mordomo musculoso e educado apareceu, indicando meu caminho e dizendo que sua mestre estava a minha espera. Agradeci e entrei naquele sobrado diferente e obscuro. Apesar das aparências, os móveis eram muito confortáveis. Sentei em um banco acolchoado e fui surpreendida por uma aparição súbita de uma figura que eu já sabia quem era.

- Bem vinda ao meu lar. Vi que você conseguiu passar pela Mary, impressionante. Meu nome é Rey, e esse aqui é o Haunt - um espírito com um chapéu de bruxa e uma lamparina surgiu ao seu lado

- Sheele. Devo admitir que você é mais bonita do que eu pensei - a viajante admirava os olhos esmeralda de sua anfitriã - Parece com uma pessoa que eu conheci a pouco tempo.

- Obrigada pelo elogio, mas vamos direto ao que te interessa, a razão de você estar aqui. O que deseja? Dinheiro, fama, um namorado? Posso te ajudar com qualquer problema desses, conquanto eles não prejudicarem alguém.

- Na verdade, estava a procura de uma cura para a minha visão, que é extremamente defeituosa de nascença. Desejo me livrar desses óculos, quero liberdade para observar o mundo sem o auxílio de um objeto.

- Compreendo. Infelizmente, não posso ajudar. James a levará de volta com segurança, considere isso como uma retribuição.

- O que? Mas por que não? Digo, não quero nada de mais, por favor!

- Desculpe, entretanto não tenho o direito de alterar o que já foi premeditado. Você nasceu assim por um motivo, e se nós mudarmos isso, sua vida pode estar em jogo. Aceite seus defeitos e cresça com eles, pois assim você poderá ser mais forte.

- Poxa, não sabia que isso era algo tão importante assim... Bem, vou confiar em sua sabedoria e em seu caráter, afinal você sempre quer ajudar os outros. Gostaria de ser assim também, mas meu jeito descuidado não serve para nada. - Sheele segurava as lágrimas

- Oh criança, não chore. Todos nós nascemos com talentos e utilidades diferentes, só que algumas pessoas os descobrem mais cedo do que outras. Eu por exemplo, era filha de uma família rica, muito mimada e metida, que só sabia fazer compras e rebaixar os outros. Certo dia, comecei a perceber que a vida que eu levava era tediosa e repetitiva, então comecei a visitar mais a cidade e especialmente a biblioteca, pois descobri que adorava ler. A partir daí descobri, aprendi e desenvolvi minhas habilidades de invocação e magia negra, que uso até hoje. Não foi fácil, e tive até sorte, mas a hora certa vem para todos. Só você poderá despertá-la e senti-la. - Rey consolava a garota

- Tudo bem, vou prestar mais atenção ao meu redor! - os olhos por trás das grossas lentes secavam.

- Já percebi que você é muito gentil com as pessoas, mesmo que elas sejam desconhecidas. Isso pode ser uma pista. Se você quiser um conhecimento mais profundo do seu talento, o Haunt pode te auxiliar.

- E o que eu tenho que fazer?

- Um pacto será o suficiente. Assim, o espírito travesso lhe dará a localização de algo que será precioso e incrementará seu potencial natural.

- Isso parece arriscado, mas para poder ser útil e ajudar as pessoas, farei o que for possível! - Sheele entusiasmava-se.

- Gosto da sua determinação! Muito bem, Haunt, hora de realizar um novo pacto! - a invocadora balbuciava uma linguagem indecifrável, enquanto a lamparina do espírito brilhava em três diferentes cores. - O ritual está completo, aqui está a informação. Mas lembre-se: não vá até esse destino enquanto não sentir que está pronta!

Mine ajeitava-se em seu pufe cor-de-rosa. Tatsumi estava maravilhado com a inimaginável aventura que sua amiga passara.

- Depois de ter voltado para a capital, conheci aquela minha amiga e o resto vocês já sabem. Quando descobri o que me fazia sentir útil era matar para proteger àqueles que amo, senti que aquele era o momento certo. Foi assim que encontrei a Extase, ela estava guardada em um cofre em uma papelaria abandonada, de uma cidade inabitada e destruída . Meio irônico, não é? Aposto que as pessoas que esconderam-na ali tinham um senso negro de humor. - a contadora de histórias dava um risinho

- E agora você está onde pertence, onde sabe que pode ser útil. E todos nós te adoramos desse jeitinho que você é, inclusive com os óculos. - Mine a abraçava.

- Muito obrigada, eu realmente me sinto amada e parte de um time. Esses momentos juntos a vocês são os melhores de minha vida. - Sheele corava e virava para o lado

- E será assim para sempre, se depender de mim. Prometo que todo mundo aqui vai sobreviver até o final. Vocês prometem? - o novato ansiava pela resposta

- Prometemos!! - ambas respondiam com um brilho nos olhos, levantando-se para responder ao chamado da chefe.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.