Seven Lifes

V - Wreckage


04:13

16 de junho, 2013

4 vidas

Percy Jackson gritou de dor. Annabeth puxava a agulha para baixo, era possível ouvir os ruídos de sua pele rasgando vagarosamente.

Lágrimas escorriam dos olhos de ambos. A loira estava presa nos escombros, não conseguia sair, nem tinha motivos para tentar. O monte de cimento e cartas a prendiam dentro de sua mente, o pior lugar do qual ela poderia estar. O mais quebrado. O mais instável.

Ela berrava internamente, e estendia suas mãos em vão no ar. Ninguém a agarraria, e ela sabia daquilo. Tinha apenas a si mesma para se livrar de si mesma.

Os berros cessaram. As lágrimas não.

Era possível? Ser salva de si mesma?

Ela não sabia.

Tudo o que fizera, durante todos aqueles anos, fora fugir.

E o que aquilo havia lhe causado? Apenas sua própria morte. Para fugir de um sonho, ela entrara num pesadelo. E agora não sabia mais como acordar.

Apesar de ter nascido filha de um cientista desgraçado que estava envolvido com uma facção criminosa, ela podia ter fugido da coisa certa. Mas optou por fugir do inimigo em comum que tudo o que fez foi juntá-la aos Olympus.

Sempre reconfortara a si mesma, dizendo que era por uma questão de sobrevivência. Mas sinceramente? O caralho que era!

No fundo, ela sempre soube que escolhera viver daquele jeito. Que fora ela, apenas ela e mais ninguém, quem entrara por aquela porta, quem atendera aquele telefone...

Que fora ela quem se matara, afinal.

No dia em que Frederick Chase lhe trouxe uma droga, dizendo que aquilo a salvaria, deixando que toda a fé da garota fosse para sua perdição, ele a matara.

Mas não havia mais saída, afinal.

Dormir significava entrar inteiramente em sua mente quebrada.

Permanecer acordada não parecia mais a real solução para seus problemas.

Só então percebera que a vida era um pesadelo disfarçado de sonho.

Tarde demais.

*

No fim, o estrago não fora tão grande.

Um corte superficial ardia dolorosamente no braço de Percy, mas nada mais.

Não demorou para que todos chegassem correndo às celas, assustados com os gritos.

Eles lhe faziam perguntas das quais ele não sabia o que responder.

Só conseguia pensar no que vira nos olhos de Annabeth.

Ele pôde sentir a insanidade neles, caindo como gotas de uma tempestade. Pôde sentir o os trovões dentro dela, da qual tentava fugir, se escondendo dentro de cobertores como uma criança, em vão.

Nunca se sentiu tão perturbado.

Presenciara mortes, estupros, matara inocentes, vendera órgãos ilegalmente.

Ele achava que já tinha visto o que de mais sombrio havia naquele mundo nojento.

Mas percebeu que não chegara nem perto.

Já vira humanos caídos em podridão, mas nada se comparava à uma mente caída em podridão.

Tudo à sua volta estava borrado.

Lágrimas caíam despercebidas por suas bochechas.

Foi a voz de Nico que o acordou de seus devaneios.

– Percy? Que porra aconteceu aqui? – Ele sorriu ao ver a preocupação do amigo.

Se perguntou se seu sorriso voltaria a ser o mesmo depois de ver aquilo.

– Eu a provoquei demais, – não sabia por que estava mentindo por ela; talvez remorso? – e ela se descontrolou. Não a culpo. Mas alguém pode me falar como que não tiraram a merda da seringa dela antes de prendê-la?!

– Espera... – Jackson se surpreendeu ao ver que Castellan se pronunciara. – Ela injetou a droga em você?

– Sim, mas vai precisar de muito mais que uma dose pra me derrubar. – O moreno sorriu, orgulhoso.

– Puta que pariu! Jackson, aquilo não era uma droga comum! – Luke estava desesperado. Todos estavam confusos.

– Como assim? – Franziu o cenho, confuso.

– Era uma droga modificada pelo pai dela. – Ele suspirou. – Eu não posso dizer. Desculpem, mas é ela quem precisa contar isso.

– Espera, por que você ficou tão desesperado? O que essa merda vai fazer comigo?!

O loiro o encarou, sem graça.

– Eu não sei.

*

Annabeth estava tremendo demais.

Tinha acabado de acordar, e não sabia se estava pior dormindo ou acordada.

Viu um vulto correr até ela.

Percebeu que não estava mais cela.

Alguém a estava abraçando. Não sabia o que fazer, sua única reação era chorar.

– Ann, você dormiu. – Luke a apertava forte, e seu coração doeu ao perceber que ele também chorava.

Demorou um certo tempo para que o nó em sua garganta se dissipasse, e mesmo assim, pronunciou com dificuldade:

– Eu sei.

– E então? – Ele afrouxou o aperto, mas suas mãos continuaram nos ombros da loira. Ele a encarou nos olhos, triste.

– Ele voltou.

*

Estavam todos em um círculo, sentados no chão.

Annabeth encarou os rostos desconhecidos.

Havia uma garota de cabelos pretos curtos e uma mecha azul na franja. Tinha olhos azuis dos quais era quase possível ver eletricidade, e usava maquiagem preta forte. Tinha uma pele tão branca quanto a de Nico, com algumas sardas nas bochechas. Poderia defini-la facilmente como punk.

Ao seu lado, havia uma garota de cabelos castanhos compridos, olhos também azuis mas doces, do contrário dos da outra. Tinha uma maquiagem leve e um sorriso radiante. Parecia uma modelo de tão linda.

E mais um loiro de olhos azuis a fez quase se sentir deslocada com seus olhos acinzentados. Era musculoso e suas feições eram ridiculamente perfeitas.

Primeiro, todos se apresentaram. A garota punk se chamava Thalia Grace, e o loiro era seu irmão, Jason. Já a morena se chamava Silena.

Todos eles eram filhos de algum membro da Olympus, assim como Annabeth.

– Bom, – a voz de Percy ecoou na sala. – acho que você nos deve algumas explicações.

Ele a encarou, e ela logo começou a ficar nervosa.

Nunca conseguiria a confiança daquelas pessoas depois de atacá-lo, certo?

Decidiu ficar na defensiva.

Eu? Foram vocês que me prenderam aqui por ordens do meu pai. Não vou me recusar a cooperar, mas creio que quem deve começar com as explicações são vocês.

Jackson ia retrucar, mas Luke o interrompeu.

– Nem tente. Podemos fazer com que isso não se torne um conflito, então, por favor, comecem vocês.

Thalia bufou.

– Vocês estão começando a me irritar. Eu disse que não deveríamos ter aceitado esse trabalho ridículo. – Ela começou a se deitar no chão, apoiando as duas pernas em Nico de forma folgada, este que não reclamou e deu um leve sorriso de canto.

– Certo. Nós dizemos uma coisa, e vocês outra. Faremos isso até não ter mais informações. – Sugeriu Percy. Quando todos concordaram, ele começou. – Estamos fazendo trabalhos extra para nos afastar de nossos pais e sairmos da Olympus. Por isso aceitamos o trabalho de seu pai. Sua vez.

Luke e Annabeth se encararam. Xingou o loiro mentalmente quando ele lhe deu a vez de falar.

Sem saber o que falar, decidiu que devia uma boa informação à eles depois de tamanho problema que os trouxe.

– Quando eu tinha sete anos, alguma coisa aconteceu. Até hoje eu não sei exatamente que porra foi aquela, mas se manifestou em um sonho. Desde então, eu deixei de dormir. Meu pai, Frederick Chase, que era um biomédico renomado, desenvolveu um tipo de droga que me manteve acordada por todos esses anos. A primeira vez que dormi desde aquele dia, foi hoje. – Todos a encararam, perplexos.

– Como assim você não dorme desde os sete anos?! Garota, isso é... – A loira interrompeu Thalia, incomodada.

– Vez de vocês.

A morena se calou.

– Tudo o que seu pai nos disse, foi que deveríamos fazê-la dormir exatamente as três horas da manhã de hoje. Em troca de um pagamento adiantado, se falhássemos, ele ficaria com Percy. Não nos disse por que. Continue, Annabeth. – As palavras de Nico a atingiram como um tapa. Por que ele queria que ela dormisse? Depois de tanto tempo...

Pensou no que dizer. Não sabia.

– Bem... eu não sei o que dizer. Será que podem me perguntar o que querem saber? – Pediu, envergonhada.

– Se é assim... – pronunciou-se Percy. – que sonho era esse?

– Percy! – Nico o repreendeu. – Não acha que é mais importante saber o que tinha naquele frasco?!

O moreno deu de ombros.

– Não. Então, Annabeth?

Ela suspirou.

– Eu acordava com um telefone, então quando atendia, tinham pessoas berrando ao fundo e um cara ria. Depois, disse que estava esperando por mim. Não dormi por que sabia que ele voltaria. – Seus olhos se encheram de lágrimas. – Vocês não acreditam em mim, não é?

Ninguém a encarava. Era difícil de acreditar que tal sonho era algo sério.

Optou por encarar o chão também, mas sentiu algo queimando. A sensação de que alguém a observava.

Olhou para frente, e percebeu que Percy era o único que não olhava para o chão. O único que não fugira da tempestade da qual seus olhos se tornaram.

Os escombros eram pesados.

Ela voltou a estender a mão direita, que ficou um tempo no ar.

E daquela vez, alguém a agarrou.

Surpresa, encarou as ondas de um mar que a engoliram. Quando cessaram, boa parte dos escombros haviam sido levados junto.

Annabeth apenas apertou mais aquela mão, que a puxava com todas as forças para fora daquele lugar.

Quando as ondas voltaram, ela já não as temia mais. Apenas deixou que a engolisse, como se estivesse envolvida por um abraço.

Ambos entenderam o recado com aquele olhar, e sorriram um para o outro.

Vez de vocês. – Disse ela. Seu tom alegre pareceu contagiá-los também.

– Acho que poderiam dar uma pausa. – Um garoto baixinho apareceu pela porta. Tinha cabelos encaracolados, um sorriso travesso e orelhas de... elfo? Usava um avental e seu rosto estava sujo de farinha. – Alguém aí está com fome?

Todos se levantaram. Os dois loiros intrusos ficaram sem graça e decidiram continuar sentados.

– Ei! – Thalia gritou, a boca cheia de bolo. – Estão esperando o que?

Se encararam, surpresos.

Percy apareceu ao lado deles, e estendeu a mão para ajudar Annabeth a levantar. Ela a agarrou.

Ambos entenderam o que aquele gesto significava.

Enquanto andava em direção à sala ao lado, sentiu um enorme peso de suas costas sair.

Como se antes, tivesse um pedaço de cimento impedindo-a de se mover...