Setores de Sangue
Capítulo 3: Últimas Perdas
A porta se abriu e três guardas adentraram a sala, carregando uma jovem mulher de longos cabelos escuros reunidos em um rabo de cavalo.
– Quem é essa? - Perguntou o presidente, recostando-se em sua poltrona enquanto a mulher era lançada contra o chão.
– Eva Rifles. Esposa do monitor responsável pelas câmeras do Setor 8.
– E quanto ao homem?
– Desaparecido.
A mulher apoiou as mãos machucadas no carpete e ergueu o rosto para a poltrona em sua frente.
– O Zack não fez nada. - disse.
– E onde ele está? - indagou o presidente, observando os olhos verdes e assustados da moça.
A mulher balançou a cabeça.
– Eu não sei.
– Não sabe ou... Não quer falar? - O homem curvou-se para obter uma melhor visão de sua expressão amedrontada.
– Eu realmente não sei. - Respondeu Eva.
– Mentirosa! - um dos guardas atrás dela agarrou seu rabo de cavalo e puxou-o para si, com força.
A mulher guinchou baixinho e exclamou:
– Eu não sei!
O presidente levantou a mão.
– Já chega, Garbon.
Garbon abriu a mão, permitindo que Eva se chocasse contra o chão novamente.
– Bem, se é assim... só me resta pedir que se caso o encontre - prosseguiu o homem recostado na poltrona. - Avise que estamos esperando.
Ela ascentiu.
– Agora tirem-na daqui.
Os dois guardas parados à porta a ergueram do chão pelos braços e arrastaram seu corpo machucado para fora do aposento.
– Poderíamos tê-la usado como isca - Garbon, naquele momento, era o único guarda restante na sala, e encontrava-se inquieto. Esperava por uma atitude diferente em relação à mulher.
– Acalme-se, Garbon - o presidente posicionou suas mãos lentamente nas descansadeiras da poltrona. - Nós temos tudo sob controle.
Nós.
》》》
Robert poderia acabar de vez com aquilo. Poderia tomar a arma da mão do guarda e investí-la contra sua cabeça e tudo se encerraria. Parecia fácil.
– Estamos quase chegando - revelou o guarda, atravessando mais um estreito corredor em direção à uma porta com um visual diferente, no fim do vagão. Ela era a única que não encontrava-se desgastada, sem contar com a presença de um painel, recheado de teclas numéricas, e outro guarda, ao lado dela.
O guarda que os acompanhava ascenou com a cabeça para este, que inseriu uma série de dígitos no painel para que a porta finalmente se destrancasse.
Robert ainda sentia as mãos quentes de Mayla em sua costa, desejava que o momento em que deixaria de sentí-las nunca chegasse, mas esse momento seria exatamente quando chegassem a onde quer que estavam indo.
Ao passarem pela porta, foi possível visualizar o interior do último vagão. Ele era diferente dos demais, não possuía poltronas, nem passageiros ou guardas, em vez disso, haviam cabines gradeadas de ambos os lados, semelhantes a celas presidiárias.
– Andem. - O guarda levantou a arma e a apontou para o peito de Robert. Era tarde demais para fazer alguma coisa.
Ele caminhou lentamente para frente, enquanto o guarda se afastava, e dirigiu-se para a frente de uma das cabines.
– Cada um em uma cabine diferente - o homem uniformizado permanecia com a arma apontada para Robert, apenas locomovendo-se para o lado a fim de tirar as mãos de Mayla da costa dele.
– Não encoste nela! - Robert perdeu o controle a partir do momento em que ele tocou o braço da filha.
O guarda sorriu, aproximou o cano da arma do queixo de Robert, e disse:
– Você quer morrer? É isso que você quer?
Ele levantou o cotovelo esquerdo e inferiu um golpe com a coronha da arma sobre a cabeça de Robert, que emitiu um grito abafado, antes de cair no chão.
Mayla afastou-se do corpo do pai. Não sabia o que fazer. Estava apavorada.
– Corra, Mayla! - gritou Robert, levando a mão até o local onde fora atingido, com dificuldade.
O guarda sorriu e virou-se para ela.
– Mayla. Venha cá.
A expressão no rosto da garota era de horror.
– Não, por favor... - Mayla estendeu as mãos, exibindo suas palmas, e caminhou lentamente para trás.
– E se eu matar a sua filhinha aqui e agora? - o guarda possuía um sorriso sádico. Ninguém sairia daquele vagão ileso.
O homem uniformizado fincou o pé direito no chão, inclinou a arma para baixo, apontando diretamente para o rosto de Mayla, que soluçava incessantemente, e saldou:
– Boa noite, garotinha.
De repente, a dor na cabeça de Robert desaparecera. Ele esforçou-se ao máximo para levantar, guinchou o mais alto que pôde e lançou-se contra o guarda, que pressionou o gatilho.
A arma disparou.
Mayla encontrava-se encolhida no canto do vagão enquanto Robert puxava a arma da mão do homem e acertava consecutivos golpes em seu rosto, até que o guarda não apresentasse mais nenhum sinal de ameaça. Até que o guarda não apresentasse mais nenhum sinal de vida.
A porta se abriu novamente e outro guarda invadiu o vagão. Robert ergueu a arma e apontou para ele, suas mãos ainda se encontravam trêmulas e sua cabeça ainda latejava, mas não importava, estava fazendo aquilo pela sua família. Ele atirou. Mais uma vez. E mais uma. O último tiro deformou a feição do homem à sua frente, que caiu de joelhos com o dedo indicador direito no gatilho e a arma apontada para o teto.
– Mayla! - Robert correu em direção à filha, puxou seu braço com a mão direita enquanto a esquerda segurava a arma roubada, e atravessou a porta, passando sobre o corpo do guarda que acabara de matar.
Aquele não era Robert. Não o Robert que Mayla conhecia.
Ele correu em direção ao final do corredor do próximo vagão, onde outra saída de emergência o aguardava, e levou todas as pequenas alavancas do painel ao lado, para baixo. Não funcionara.
O trem começou a desacelerar e Robert entendeu o que estava acontecendo. Eles haviam chegado ao Setor 1.
– Não saia daqui! - ordenou ele, encarando Mayla por um breve momento, logo seguindo para o antepenúltimo vagão.
Tudo o que Mayla poderia fazer naquele momento era desobedecer a ordem e impedir seu pai violento de ferir mais pessoas inocentes. Então correu, o mais rápido possível, até encontrar Robert, estático, no meio de um corredor observando a tropa de homens uniformizados apontando suas armas para ele.
– O que foi que eu disse?! - Robert soava enfurecido, estava definitivamente falando com Mayla, porém nem sequer virara o rosto, seus olhos ainda fitavam os canos voltados para seu corpo.
– Senhor, nós só queremos que você abaixe a sua arma - explicou um dos guardas, pacientemente.
– Para me matarem? À mim e à minha filha? Nunca! - retrucou ele.
Mayla gritou. Um estalo se propagou no ar, e Robert foi atingido no braço, derrubando a arma no chão. Repentinamente, os guardas correram e se lançaram contra ele, impedindo que tomasse posse da arma novamente.
Tudo escureceu.
》》》
– Mayla! - exclamou ele, levantando-se de uma superfície acolchoada. Mas não havia Mayla, ou trem. Havia apenas um quarto, escuro e empoeirado.
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