—SENSEI! – gritou uma voz do fundo da sala.

Reconheci a voz imediatamente, mas, como todos, tive que verificar com os meus olhos.

Ryu estava de pé observando seriamente o professor, uma expressão muito diferente daquela sonolenta que ele sempre demonstrava.

—Pois não, Kato-kun? – percebi olhando de canto de olho que ele não estava mais voltando sua atenção para mim, o alvo dele agora era o Ryu.

—Não acho que o que você está fazendo é certo – admirei a coragem com a qual ele se dirigia ao sensei.

Houve uma certa inquietação pela sala. E com isso, um dos amigos que sentava perto dele sussurrou aflito:

—Ryu o que você está fazendo?! Você tá raciocinando?!

—Sente logo, idiota! – acompanhou uma garota que sentava atrás dele.

Mas ele ignorou os conselhos recebidos e prosseguiu:

—Acho que já foi o suficiente - o seu rosto estava sério, mas não chegava a dar-lhe uma impressão adulta como a do sensei; eles realmente eram diferentes. Os seus olhos, ao contrário do tom frio e, de alguma maneira, elegante do monstro ao meu lado, eram de um marrom tão escuro que dificultava distinguir suas pupilas; a maneira como encarava o professor passava uma impressão de não ver mais ninguém além da pessoa a qual ele se direcionava.

—Algum problema com isso, Kato-kun? – ele parecia não ter se abalado, ainda confrontando seu aluno.

—A culpa não foi dela e você sabe disso.

—Eu sei? Não há provas concretas que afirmem isso. Ou será que está dizendo que a culpa é sua?

—Exatamente – aquilo me surpreendeu, a coragem e a ousadia dele havia me espantado, de novo!

—Problema resolvido. Parece que você terá um companheiro na detenção, Monami-san – ainda sem nenhum expressão, ele completou a frase voltando seus olhos para mim. Automaticamente me encolhi diante dele.

—Isso é abuso de poder – continuou Ryu. Era difícil acreditar que ele insistia em enfrentar o professor, ainda mais sem possuir nenhuma alteração no seu comportamento diante daquele homem! – Ela não tem culpa de algo assim ter acontecido, não há motivos para...

—Então me explique esse agasalho no quadril dela, Kato-kun. – ele o interrompeu com uma notável voz contida.

Foi perceptível a falta de mais argumentos do meu defensor, ele estava encurralado.

—Mas me parece – continuou Fukuyama-sensei, voltando sua atenção para uma nova presa – que vocês não serão os únicos na detenção, não é, *Furederich—kun ?

A curiosidade tomou a mim e a sala toda. Afinal, quem não estava curioso em saber de quem era aquele sobrenome estrangeiro? Segui a direção dos olhares e pasmei quando vi quem era.

O gêmeo perfeito estava lá, na mesma sala que eu, observando o professor da mesma maneira indiferente de quando o vi pela primeira vez. Perguntei-me como era possível eu não ter notado que ele estava na minha sala!

—Por que está sem o seu agasalho, Furederich-kun? – e aquele crápula continuou seu interrogatório!

—Não gostei dele - o garoto que possuía um sobrenome e aparência explicitamente estrangeira deu de ombros, superando todas as expectativas de respostas que alguém pensou que ele poderia dizer.

—Se você se importa tanto com o uniforme, deveria ter escolhido outra escola, não acha? - o desprezo tomou tanto o tom da sua voz como de suas feições.

—Talvez – da mesma forma que antes, ele havia respondido aquela pergunta que sabia que não necessitava de uma resposta. Até o Ryu, que ainda permanecia em pé, mudou sua expressão de sério para surpreso com a atitude cética do novato.

Um meio sorriso sarcástico preencheu por um tempo aquelas feições malignas da pessoa ao meu lado, pressentia que teria mais um “amiguinho” para me fazer companhia.

—Então presumo que não haja objeções em relação á sua companhia aos seus outros dois colegas após as aulas.

—Então também não acho que você se importará se eu relatar o seu abuso de poder – retrucou Ryu, se intrometendo na discussão de novo.

—Faça o que você quiser Kato-kun, mas não acredito que a sua reputação seja a das melhores.

—E você não tem nenhum mérito nessa escola ainda – aquilo parecia ter acertado em cheio a moral do nosso professor responsável. Entretanto isso não foi o suficiente para acalmar os dois e como se para colocar mais lenha na fogueira, Furederich completou:

—Provavelmente ele se esconde em algo que quer parecer ser.

Vi o professor ter quase um ataque cardíaco silencioso. Ele queria explodir, isso era mais do que notável. Percebi a chama que atravessava seus olhos a qualquer momento fuzilar de verdade tanto o Ryu quanto o Furederich, mas ele pareceu conseguir se conter e simplesmente disse com um tom frio e cheio de desprezo:

—Adoraria que vocês dissessem isso na frente da diretora, acredito que será uma surpresa para ela ver vocês.

Eles não poderiam recusar, se fosse passado um relatório para a coordenadora pelo próprio professor, sem a presença dos alunos acusados, eles sabiam que seria pior; pelo menos o Ryu já sabia.

Com relutância, Ryu se dirigiu até a porta acompanhada de um ainda indiferente Furederich.

Eu já estava tomando as dores deles quando escutei o meu nome:

—Monami-san, quando pedi para irem até lá, isso incluía você. – olhei pasma para ele, que estava anotando algo em um caderninho. Por que raios eu também tinha que ir?!

Como esperado, eu estava borbulhando por dentro. Eu ia acabar com o brilho de vida que aqueles olhos azuis possuíam. Ok, eu não faria realmente isso, mas na hora da raiva você tem vontade de acabar com todos, pelos menos é assim comigo.

Mas eu me levantei e me dirigi para a saída, seria melhor do que continuar na sala e correr o risco de acontecer coisas piores.

Quando fechei a porta atrás de mim, eu queria gritar de frustração. Como tudo aquilo aconteceu?! Reparei a minha volta e percebi que os dois já estavam se afastando, apressei-me para alcançá-los, não queria ficar sozinha em um momento como esse!

Mas não podia parar de me sentir culpada por tudo ter acontecido, afinal, eles me defenderam e por isso estavam encrencados. Sim, tudo sempre indo de mal a pior.

Andamos em silêncio até a sala da diretora, parecia que era somente eu que estava preocupada com o que viria. Mas antes de bater na porta, um pensamento mais forte tomou conta de mim. Isso não poderia continuar assim. Minha mãe não havia me educado dessa maneira, eu TINHA que pelo menos agradecer. Respirei e juntei a minha coragem (se eu ainda a possuía) e me curvei, dizendo com a voz mais alta que pude:

—DESCULPE!

Eles se viraram na minha direção. Continuei, mirando o chão:

—Desculpe envolver vocês nisso. Ele tinha invocado comigo e acabou colocando a culpa em vocês também. Desculpe!

Continuei nessa posição até ouvir um suspiro que identifiquei ser do meu defensor número 1.

—Não se preocupe comigo, não gostei dele desde o início mesmo. E também, ele estava abusando.

Levantei a cabeça um pouco e o vi bagunçado ligeiramente o cabelo, meio desconcertado. Dei um sorrisinho, ele estava realmente *kawaii.

Senti algo tocando o meu ombro de leve, virei um pouco o meu rosto para o lado direito e vi que o estrangeiro, dono daquela mão, estava me observando diretamente, corei rapidamente, desviando o olhar.

—Não precisa ficar curvada tanto tempo – ele disse tirando a mão do meu ombro. Voltei a minha posição inicial automaticamente.

—Então vamos logo – desconversei, dando um sorriso amarelo – Vamos acabar com isso de forma rápida, assim já vou pensando no que falar para a minha mãe.

Quando eles concordaram, eu bati na porta. Ouvi um remexer em alguns papéis e logo em seguida uma mulher pediu para entrarmos.

Com receio, abri a porta. Não me recordava muito bem da diretora. Pensando melhor, durante todo esse tempo que estudei nessa escola, foram raras as vezes que eu consegui ver a diretora.

Quando me deparei com o semblante dela, fiquei surpresa. Ao vê-la novamente me recordei um pouco das vezes que a vi; ela não havia mudado nada. Sim, ela era linda, deveria ser o sonho de muitos rapazes tê-la como professora. Mas eu não era um desses garotos e, mesmo que eu fosse, não acho que eu gostaria de ver ela na situação em que eu me encontrava.

— O que aconteceu dessa vez, Ryu? – direcionou-se a diretora ao mesmo, excluindo-me e ao meu outro colega também.

— Pergunte isso ao novo professor que você arranjou – respondeu ele de cara fechada.

Ela suspirou.

—Você já está tendo problemas com ele no primeiro dia de aula, Ryu?

—É o que parece.

Pelo que se podia observar, o clima na sala da diretoria não estava dos melhores (não que eu esperasse que seria algo agradável visitar essa sala). Eu sentia que tinha algo que eu não sabia, algo muito estranho. Escutei que o Ryu havia vindo parar aqui algumas vezes, mas não compreendia o porquê dessa mulher tratá-lo tão informalmente. E a fisionomia dele? Ele parecia irritado. Para dizer a verdade, ele estava MUITO irritado! Algo dentro de mim me alertava de que coisa boa, de agora em diante, definitivamente não viria.