Pierre’s P.O.V

David sempre foi o meu melhor amigo. Ele é uma pessoa que desperta a atenção, tem um brilho tão grande que, por várias vezes, me peguei pensando o porquê dele me considerar seu melhor amigo. Logo eu, um cara sem graça, beleza e talento. Cheguei à conclusão que, ou era por pena, ou pelo fato das nossas mães serem tão amigas (claro que tento esquecer a primeira opção).

Depois de completarmos 16 anos David começou a namorar. Isso me incomodou de uma maneira que não consegui explicar, até descobrir e aceitar o inevitável: eu, Pierre, amo meu amigo David. Foi um choque compreender que eu não sentia incômodo quando via David com outra pessoa, eu sentia ciúmes.

Passaram-se dois anos desde que eu percebi o que sempre senti. Dois anos com David morando no Texas, longe do Canadá, longe de mim. Quando eu recebi a notícia que ele estava voltando me preparei e fui buscá-lo no aeroporto, eu estava pronto para contar que o amava, mas ele me fez perder a coragem ao vê-lo. Ele caminhou na minha direção, mas não estava sozinho, seus dedos se entrelaçavam com os de outro rapaz, mais baixo que eu, porém mais alto que David. E por falar em David, ele estava completamente diferente. Seus cabelos, antes loiros artificialmente e arrepiado para todos os lados, agora estavam pretos e lisos, com a franja na altura dos olhos. Ele continuava com a maquiagem pesada, mas as roupas eram mais apertadas do que as que ele costumava usar.

Quando me viu, ele correu e pulou sobre mim, selando nossos lábios por um instante. Era normal isso acontecer entre nós, ele chamava de "beijinho de amigo".

- Pierre! Que saudade! - ele gritou ainda no meu colo, com uma perna de cada lado da minha cintura,

- Eu também senti a sua. Você não sabe o saco que foi terminar a escola sem você. - eu o abracei forte e beijei sua testa.

Ele desceu do meu colo e trouxe o rapaz que estava com ele para perto de mim.

- Seb, esse é Pierre, meu melhor amigo desde sempre. - ele me deu um sorriso lindo - Pierre, esse é Sebastien, meu noivo.

O ar faltou nos meus pulmões e a palavra "noivo" ecoou na minha cabeça.

- Nós nos conhecemos em uma das aulas de literatura. Foi algo tão forte, tão quente, que... Mas os pais dele são muito tradicionais e disseram que, se ele queria continuar com isso teria que ser longe deles. Então decidimos nos casar e morar aqui.

- Mas, vocês são tão novos... - esse foi o primeiro argumento que me surgiu.

- Temos 18 anos. Já não devemos nada á ninguém.

Eu respirei fundo tentando segurar as lágrimas que queriam se formar. Abracei meu pequeno com força e disse a única coisa capaz de fazer o sorriso voltar ao seu rosto.

- Parabéns Dave. Espero que você seja feliz. E você, Sebastien, - me dirigi ao outro pela primeira vez - cuida bem dele.

Sebastien concordou apenas com um aceno de cabeça.

- É lógico que ele vai cuidar bem de mim, como você é exagerado... Agora me solta porque você 'ta bagunçando meu cabelo. – ele se afastou e colocou os fios no lugar. – Vamos embora ou ficaremos aqui pra sempre?

- Vamos sim. Pat preparou uma festa de boas vindas pra você lá em casa. – peguei sua mala e me virei, mas parei ao ver que ele não se mexia. – Vamos?

- O Comeau estará lá – ele estava muito irritado. Era fato conhecido que, apesar de ter convivido com Chuck apenas por um ano, David o detestava.

- Sim, o Chuck estará lá. Eu não sei o porquê dessa sua implicância com ele.

- Não sabe? Só porque você esqueceu de mim depois que ele veio para cá. Era “Chuck pra cá, Chuck pra lá”, você preferia até estudar com ele.

- Chuck era da minha turma, e ele é um nerd.

- E ele gosta de você. – David revirou os olhos ao dizer isso. – Todo mundo sabe disso. Charles Comeau tem uma grande queda por Pierre Bouvier.

Foi minha vez de revirar os olhos. Eu sabia muito bem que Chuck não gostava de mim. Na verdade ele era meu confidente em relação ao que eu sentia por David durante o ano que antecede a partida do meu “melhor amigo”, mas não falaria isso para David.

- Nós vamos mesmo discutir isso aqui? Vamos. A gente deixa suas malas na sua asa e vai pra festa. E nada de “mas”. – eu o interrompi quando vi que ele pretendia retrucar. David suspirou e pegou a mão de Sebastien, mostrando-se pronto para ir.

Os vinte minutos até a casa dos Desrosiers foram pontuados pelo mais novo deles tagarelando sem parar. Como tínhamos combinado deixamos as malas na casa e fomos para a festa, que já rolava.

Os pais de David o abraçaram apertado para, em seguida, fazer o mesmo com Sebastien, me fazendo crer que eles já sabiam dessa loucura de casamento.

- E aí Dave? – era Patrick, que vinha carregando sua inseparável câmera. – Fiquei sabendo que agora é um homem comprometido.

- Pat! – David o abraçou forte, quase derrubando a garrafa de cerveja que estava na outra mão do “cinegrafista”. – Sim, agora sou tão responsável quanto o Jeff... Tirando a parte dos filhos. – ele riu e apresentou o noivo, que não tinha dito nenhuma palavra até agora, mas que a todo o momento selava seus lábios com de David.

- Eu já estava a ponto de ter um ataque quando alguém colocou uma garrafa de vodka em minha mão e atrapalhou a seção de amasso com um cumprimento.

- Bem vindo de volta David. Era Chuck, que só estava fazendo aquilo por mim, ele não era o maior fã d meu pequeno.

- Ah, Charles, obrigado. Deixe-me te apresentar... Seb, esse é Charles, ou Chuck, como preferir.

- Previ que ele faria como com todos, cumprimentaria e então voltaria sua atenção para David. Entretanto o que ocorreu foi muito diferente, quando olhou para o meu amigo, Sebastien ofegou e arregalou os olhos, deixando a mão estendida para o costumeiro “aperto de mãos” cair ao lado de seu corpo. E pela primeira vez ouvi-o falar.

- O... O que você está fazendo aqui? – ele me pareceu trêmulo, mas nada se comparava com o estado de Chuck ao meu lado.

- Seb, é realmente você? – ele tentou se aproximar, mas o outro se afastou, repetindo a pergunta, agora com mais firmeza. Chuck, ainda meio confuso, respondeu- Eu moro aqui, desde que saí do Texas... Eu nunca pensei que te encontraria de novo.

- É lógico que não. Que eu saiba você não queria me ver mais, não é? – ele se virou para David e declarou – Vamos. Eu não quero mais ficar aqui.

Mas eu sabia que, se existia algum problema, David não sairia até resolvê-lo.

- Não, parece que vocês precisam conversar. Pierre, você ainda tem a chave do porão?

- Tenho sim, mas não seria melhor eles conversarem lá em cima?

- Não mesmo, eu vi seu irmão subir. Vamos lá pra baixo.

Peguei as chaves do porão e os levei até lá. Sebastien estava muito descontente, mas Chuck pareceu apreciar a ideia de David. Quando abri a porta que levava para o meu canto preferido da casa David me impediu de entrar primeiro, empurrando os dois porta adentro e trancando-a por fora.

- O que você ‘tá fazendo? – perguntei assustado com o sorriso malicioso no rosto angelical.

- Sebastien e Chuck tem uma história antiga. Vem, vamos para o seu quarto e eu te conto.

- Mas o meu irmão não está lá?- ele riu e balançou a cabeça.

- Não acredito que você caiu nessa. – e me puxou para o andar superior.

Entrando no meu quarto nos sentamos um de frente para o outro no tapete feupudo que ele me obrigara a comprar. Sentindo-se confortável, ele começou:

- Bom, quando eu cheguei ao Texas a primeira pessoa que eu conheci foi o Seb, ele demorou muito para confiar em mim, mas depois me contou que isso acontecia com todos. Ele disse que um ano antes ele tinha se entregado para alguém que não deu valor, disse que tinha sido um erro e logo se mudou para o Canadá. O nome desse cara era Charles Comeau.

“Desde que passamos a andar juntos eu percebi que, apesar de tudo, ele ainda gostava do Chuck, então eu me lembrei daquela vez que o Gerard pediu pra ficar com ele e ele respondeu que só magoaria ele pois tinha deixado uma pessoa no Texas e que um dia teria coragem de buscá-la. Eu somei 2 + 2, inventei esse noivado e trouxe Seb pra cá”.

- Então quer dizer que tudo isso é só uma...

- Armação? É. Seb é um amigo maravilhoso e merece ser feliz. Não que ele soubesse ou que concorde com isso. – David voltou a rir. – Você tinha que ver a sua cara quando eu apresentei o Seb como meu “noivo”. Pode ficar tranquilo porque era só uma mentirinha.

- Que bom. – eu deixei escapar, me arrependendo em seguida ao vê-lo arregalar os olhos e ficar vermelho. – Não que eu não queira a sua felicidade, mas... Mas...

David abriu o sorriso mais perfeito que eu já vi, se inclinou em minha direção e capturou meus lábios com os dele, aprofundando o beijo assim que pode. Eu não pude fazer nada, a não se corresponder, afinal era o que eu mais queria há anos. Mas do mesmo jeito repentino que começou ele terminou o beijo, se afastando, mas permanecendo com os olhos fechados.

- Me diz que não é um sinal ruim você continuar com os olhos fechados. – eu estava desesperado por algum sinal dele.

- Me diz você, se eu devo me arrepender de ter feito o que eu tenho vontade de fazer desde que trocamos o nosso primeiro “beijo de amigo”. – ele abriu os olhos e me encarou, me fazendo mergulhar nas íris chocolate. – Me diz que você gosta de mim e que a sua reação lá no aeroporto foi de ciúmes. – ele estava tenso com a possibilidade de eu dizer o contrário.

Sorrindo, eu me aproximei e coloquei uma mecha de cabelo dele atrás da orelha.

- Você não tem noção de quanto tempo eu esperei por isso. Eu amo você Dave, e faz muito tempo.

Voltamos a nos beijar, rindo e fazendo carinhos um no outro... Acho que nunca fui tão feliz.

Depois de um tempo eu sentei na cama recostado na cabeceira e com David aninhado em meu peito.

- Será que Chuck teve a mesma sorte que eu? – perguntei, acariciando os fios negros.

- Espero que sim. Seb merece ser feliz.

Sebastien’s P.O.V

Depois que entendi o que David tinha feito fiquei com um pouco de raiva dele, mas entendi que ele teve boa intenção.

Virei-me e encarei Charles, que me olhava atentamente, e decidi que, se eu ficaria ali com ele, então deveria esclarecer tudo de uma vez.

- Olha Comeau, eu sei que você se arrependeu de ter dormido comigo, e sei que você estava bêbado, mas eu gostava de você, ok? Eu não consegui não ficar chateado. Nós nos dávamos tão bem e eu não consegui não me apaixonar e...

- Quem foi que disse que eu me arrependo de ter dormido com você?

- Você... Quando nós acordamos você disse que não deveria ter feito aquilo. – ao me lembrar disso não pude impedir que lágrimas viessem aos meus olhos.

Charles aproximou-se e secou meu rosto, segurando-me em suas mãos.

- Você entendeu tudo errado... Desde que te vi me perdi nos seus olhos de uma maneira que nunca aconteceu antes. Mas você nunca me deu abertura, sempre me tratou só como um amigo. Naquele dia eu tinha recebido a notícia que teria que me mudar pra cá, deixar você... Por isso bebi tanto, queria ter coragem pra te dizer o que sentia... O que ainda sinto.

- Mas...

- Eu não me arrependo de ter dormido com você, me arrependo por tê-lo feito bêbado. Eu queria que tivesse sido especial, não algo que só o meu corpo ditasse. – ele se afastou, secando as próprias lágrimas. – Eu passei esses três anos pensando em você, pensando em embarcar para o Texas assim que possível pra te ver... Agora você vai se casar? Você ama o David? Me diz, você realmente o ama?

Eu fiquei estático. Sempre soube que David era apaixonado por Pierre e ele sempre soube que meu coração pertencia a Chuck (eu só não sabia que ele o conhecia). Eu aceitei vir com ele apenas para fazer ciúmes para Pierre, mas nunca pensei que ele tinha armado uma confusão pra mim também.

Chuck se aproximou novamente e, dessa vez, me abraçou.

- Diz que me ama e me faz a pessoa mais feliz desse mundo.

Sem poder responder, me coloquei na ponta dos pés e selei os nossos lábios com fúria.

- Eu nunca deixei de te amar. – eu disse voltando a beijá-lo, dessa vez com calma. Se David conseguiu ter a mesma sorte que eu, então teríamos muito tempo até eles pensarem em abrir a porta.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.