"Eu falei. Eu falei que ainda faria isso uma última vez", ele disse, após beijá-la nos lábios.

Os Baudelaire, surpresos, apenas observavam a cena.
Não apenas haviam acabado de ver Olaf - sim, aquele Conde Olaf - realizar o que Violet chamara de "provavelmente a única boa ação em sua vida", e agora ele beijara sua protetora.
Nada mais fazia sentido.

Ele estava gravemente ferido, e ela, envenenada. Fora o fato de estar em trabalho de parto.
Não havia ocasião mais conveniente para aquele beijo de despedida, até mesmo porque não haveria outra.

Kit olhou para o homem deitado na areia, não muito longe de ele a havia colocado.
Por mais que Olaf fosse um homem vil e inescrupuloso, ela não conseguira deixar de amá-lo após todos aqueles anos, nem mesmo quando encontrara um novo amor.

A cisão, as mortes, os crimes, os disfarces, as tramas, tudo isso fazia parte da perfídia que ele personificava tão perfeitamente.
Eram coisas que ela jamais poderia perdoar.
Os beijos, os toques, os olhares, as memórias, os sussurros... Tudo estava gravado profundamente no coração de Kit.
Eram lembranças que ela nunca conseguiria apagar.

Nem mesmo naquele momento, quando ele dava seus últimos suspiros, ela esperava por um pedido de desculpas da parte de Olaf, pois sabia que arrependimento era uma palavra que não fazia parte do dicionário daquele homem. Ele usara suas últimas forças para completar o poema que ela havia fracamente começado a recitar, e agora deixava este mundo de vez.
Deixava para trás uma vida desperdiçada, sem família ou amigos, e um rastro de mortes. Não chegou a dizer um último "eu te amo" (e sabe-se lá se Kit o aceitaria, de qualquer jeito).

Para os Baudelaire, foi um choque. Conde Olaf estava morto.
Não havia mais quem os perseguisse. Mas será que aquilo realmente significava que teriam paz?

Não, ainda não.
Havia uma prioridade.

Kit gritava de dor, já que o bebê forçava sua saída. Os órfãos correram para acudí-la, não vendo assim o último suspiro daquele homem que tanto os afligiu.
O parto foi difícil, tenso e dolorido. E também foi triste, pois ao mesmo tempo que uma vida nova chegava àquele mundo cão, outra também se ia. Mas talvez as coisas fossem melhor assim. Ela já estava cansada.

Cansada de sofrer, de perder o que tinha, de abdicar das coisas que mais amava...
Kit finalmente teria seu merecido descanso.

Os olhos da menina recém-nascida abriram-se, e os de sua mãe se fecharam pela última vez.
Ao longe, o sol raiava na costa da ilha.

Na areia, apenas dois túmulos simples, lado a lado, com os dizeres Kit Snicket e Conde Olaf.

Ali, o mundo era sereno.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.