Semideuses Rebeldes

Caminhando para a morte e percebendo que sua sorte nunca muda.


Roberta e Diego tropeçavam nos próprios pés enquanto corriam. Quione os seguia rapidamente, e sem nem ao menos se esforçar, chegava bem perto deles com frequência, mas os deixava escapar somente para sua brincadeira não acabar tão rápido.

Ela ria como uma psicopata, o que causava arrepios em Roberta.

— Mas que droga! — Ela gritou quando Quione encostou de leve em seu ombro, assustando-a. — Diego, não vamos conseguir fugir nunca!

— Eu estou tentando não pensar nisso, Roberta. — Ele disse depois de alguns segundos.

Um paredão de gelo surgiu de repente na frente dos dois, o que os obrigou a mudar de direção, fazendo uma curva brusca para a esquerda.

— Temos que despistá-la! — Gritou Diego. — Temos que sair de seu campo de visão!

Roberta, usando toda a força que ainda lhe restava, tentou invocar um grifo novamente. Segundos depois, ela e Diego ouviram um barulho estranho, sinalizando que Roberta conseguira.

— Vem por aqui! — Ela disse, apontando para uma parte da floresta onde a mata era mais fechada.

— Argh! Mas o que...? — Eles ouviram o grito raivoso de Quione atrás deles, e, desesperados, continuaram correndo.

Roberta e Diego correram tanto, tão rápido, e por tanto tempo, que quando pararam para descansar, não sabiam quanto tempo havia se passado. O sol já estava se pondo, e eles se sentaram, exaustos.

— Giovanni... — Roberta balbuciou.

— Ele está bem... eu acho. — Disse Diego.

— Não fale o que não sabe. — Roberta retrucou. — Nossos amigos estão sumindo um a um, e você diz “eles estão bem”. Se não fôssemos filhos de quem somos, não estaríamos nessa situação.

— Eu te entendo, Roberta. Mas é tarde demais para voltar atrás. — Disse Diego, olhando para ela. — Além disso, se não fôssemos filhos de quem somos, não seríamos assim. Nós não teríamos nos conhecido.

— De que adianta conhecer e ser amigo das pessoas, se elas correm perigo? — Roberta disse e Diego se calou.

Alguns segundos depois, ela se levantou, atraindo a atenção de Diego.

— Para onde você vai? — Ele perguntou enquanto ela olhava para cima, tentando saber que horas eram.

— Para o Castelo do Vento Norte. — Ela respondeu. — Giovanni está em perigo, e temos uma profecia para cumprir. Eu prefiro seguir o destino à ser obrigada a segui-lo.

Ela se voltou para Diego e sorriu tristemente.

— Você vem morrer comigo? — Ela perguntou com a voz trêmula, ansiosa pela resposta do garoto.

Ele assentiu sem nem pensar duas vezes.

~Lupita, indo para o Norte~

“Sabe, minha filha, às vezes, ser imortal é tedioso.”. Desde que Mia e Miguel desapareceram, parecia que a deusa Hécate sentia necessidade de falar com sua filha, de modo que ela não sentisse falta dos dois amigos, aparentemente mortos. “De um lado, você tem que cuidar de seus filhos semideuses, senão, eles ficam com raiva de você e planejam um motim, ou até mesmo uma guerra contra os deuses. Foi isso que aconteceu da última vez. Pobre Hermes.... E por outro lado, se você tentar se divertir com os mortais, acontece uma catástrofe e você tem que assumir as responsabilidades e arcar com as consequências daquilo. E tem que limpar a bagunça, obviamente.”

— Ah, mãe pare de falar, por favor. — Lupita implorou pela milésima vez, mas, como sempre, Hécate a ignorou.

“Qual é sua profecia mesmo, querida?” Hécate mudou rapidamente de assunto, vendo que aquele aborrecia sua filha.

A maldição cai sobre a filha da magia

Do equinócio de primavera, viverá até o meio-dia

Onde o dia se encerra, com a pomba e o raio...

Encontrará as oferendas e acabará o fardo” Lupita se lembrou, odiando cada verso daquele poeminha idiota que definiu seu destino.

“Ah, sim. Bem... espero que seus amigos não estejam mortos, pois a profecia não se cumprirá sem eles.” Hécate lembrou.

— É impossível evitar profecias, não é? Quer dizer que eles devem estar vivos até cumprirem seu destino, não? — Disse Lupita.

“Bem, é uma esperança concreta, mas não se agarre nisso, minha filha. Como deusa das encruzilhadas, devo lembrar e ensinar aos meus filhos que o futuro é imprevisível.” Ela disse e Lupita revirou os olhos, cansada daquela conversa.

— Mãe, com todo o respeito: poderia calar a boca?

Hécate parou, aparentemente surpresa com o pedido da filha, mas o obedeceu sem tentar contrariá-la. Ela parecia não se importar, mas estava preocupada com Mia e Miguel, principalmente com o estado mental e emocional de Lupita, se eles morressem. Ela, como a deusa que é, deu uma espiada nos possíveis caminhos do futuro para sua filha e seus amigos, e, tristemente concluiu que eles não tinham opções muito boas.

— Eu agradeceria se você saísse da minha cabeça e me deixasse em paz, também. Seria bom se eu pudesse pensar sem que ninguém me escutasse. — Lupita comentou, e sua mãe a obedeceu novamente,

Pela primeira vez em dias, Lupita se sentiu completamente sozinha: sem amigos, sem mãe. Somente ela, e um monte de pensamentos.

— Não... — Ela disse, contrariando seu pedido de segundos atrás. — Eu não quero ficar sozinha.

Mas sua mãe não estava mais lá, sua mãe não pôde ouvir.

Lupita estava sozinha.

Lupita estava morrendo.

Lupita tinha que cumprir a profecia e encontrar seus amigos antes que fosse tarde demais.

~Mia e Miguel~

Mia gritava enquanto corria, e Miguel seguia atrás dela, tentando ao máximo afastar os pássaros. Os gritos dela faziam efeito nos monstros, mas não era assim tão eficiente.

Os dois possuíam ferimentos: o braço esquerdo de Miguel possuía um grande corte, do seu ombro até o pulso. Uma parte de sua camisa estava rasgada, assim como a barra de sua calça, onde os pássaros se aventuravam e rasgavam vez ou outra. Ele sangrava e suava muito, mas continuava correndo, mancando. Mia possuía alguns cortes pequenos no rosto; um grande corte nas costas, do pescoço até a cintura, e corria com dificuldade, mancando assim como Miguel.

Um pássaro deu um rasante na frente de Mia, e arranhou seu olho com o bico, fazendo-a gritar de dor. Miguel a olhou com preocupação.

— Não para, Miguel! Continue correndo! — Ela gritou.

Os dois correram, completamente desnorteados e assustados.

Eles não parariam tão cedo.

Isto é, eles não parariam tão cedo por conta própria.

No meio da corrida, os dois caíram em um grande buraco coberto por folhas: uma armadilha, ao que tudo indicava. A sorte foi que eles despistaram os pássaros.

O azar foi que os dois bateram a cabeça e ficaram desacordados.

Parece que a sorte não muda para esses dois.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.