Sem Final Feliz

Capítulo 5 - Quinto Estágio: Aceitação


XVII.

É uma tarde ensolarada como qualquer outra quando acontece.

Emma está voltando do supermercado e, em seu trajeto, ela passa por seus filhos e Snow. Eles parecem ocupados construindo um castelo de areia alguns passos em frente à casa e ela escuta Snow batendo palmas enquanto Imogen e Michael riem. Sentado na varanda, pernas longas esticadas sobre o batente, Henry lê um livro e, distraidamente, inspeciona o empreendimento arquitetônico de seus irmãos menores.

"Precisa de ajuda?" Ele pergunta olhando para os dois sacos de papel que Emma traz em seus braços.

"Não, tá tranquilo." Ela pisca para ele e abre a porta com uma manobra e uma só mão, distribuindo o peso das sacolas sobre os quadris.

"Como está sua mãe?" Ela pergunta ao filho casualmente, antes de entrar.

"Eu verifiquei a pouco, ela estava dormindo feito uma pedra." Ele responde sem tirar os olhos do livro, mas repensa e acrescenta. "Não diga a ela que eu disse isso."

"Seu segredo está seguro comigo." Emma concorda bem-humorada ao entrar na casa.

A cozinha está imaculadamente limpa (graças a Snow), então Emma decide ajudar a manter as coisas no lugar e começa a guardar os mantimentos. As caixas de leite vão direto para a geladeira. O pote de manteiga de amendoim em que Michael se viciou, as caixas de cereais e panquecas exigidas pela mãe dela vão para o armário. As maçãs brilhantes são colocadas em uma tigela no meio da mesa da cozinha. Com um sorriso, Emma pega uma delas, divide ao meio e, junto com um prato e uma colher, coloca a fruta em uma bandeja.

Ela já pode ouvir Regina reclamando de ser alimentada como um bebê, mas Emma sabe o quanto ela aprecia a fruta. Na bandeja, ela também arruma um copo d'água e uma flor que pegou no mercado. Emma não sabe o nome da flor, mas ela é vermelha, bonita e cheira bem. Algo que Regina vai gostar, mesmo que secretamente.

Em seu caminho até o andar de cima, ela ainda ouve as crianças do lado de fora, Imogen contando o que parece ser uma história excessivamente elaborada e de vez em quando a voz de Michael interrompendo-a gritando palavras sem sentido como bananas e fogo de dragão. Isso faz Emma revirar os olhos e quando ela entra no quarto principal, primeiro as costas, depois o restante de seu corpo e então a bandeja, sua voz é leve com algo que poderia ser quase um tom alegre.

“Levante-se e brilhe Vossa Majestade!” Emma diz colocando a bandeja sobre a mesa do canto oposto da sala, para enfim encarar Regina.

Seu sorriso oscila, trêmulo quando Regina mal parece recuperar a consciência. Ela abre os olhos, entretanto, e Emma tenta se dar por contente com pequenas vitórias. “Com vontade de comer seu lanche favorito?”

"Por que demorou tanto?" As palavras de Regina são evidência de sua vontade de ferro, sua respiração superficial e dolorosamente difícil.

“Você não acreditaria no trânsito da rua principal. Quem diria que tantas pessoas realmente mora, aqui nesta época do ano?”

"Emma..." Regina chama seu nome, ignorando completamente sua história, e algo em seu tom, embora sutil, capta a atenção de Emma, fazendo com que ela deixe tudo de lado.

“O que foi? O que você precisa?" Enormes olhos verdes cheios de preocupação imediatamente focam em Regina.

“Cale a boca” Ela diz e tenta estender a mão com pouco sucesso, “e chegue mais perto”.

“Você está com dor? Precisa de mais comprimidos?” Emma pergunta claramente ansiosa agora, mas se aproxima da cama assim mesmo, atendendo ao pedido de Regina.

Sentada ao lado dela na cama, Emma imediatamente pega suas mãos apenas para sentir o quão frias elas estão. Então, por instinto, ela toca a testa de Regina e notando sua temperatura elevada. O tempo todo, aqueles olhos castanhos escuros seguem seus menores gestos.

“Por Deus, Regina você está queimando! Precisamos levar você ao médico ou chamar uma ambulância.” Emma está prestes a se levantar, tentando se lembrar onde diabos ela colocou seu telefone, quando Regina aperta sua mão, bem de leve.

É o suficiente para parar Emma em seu caminho.

"Você não vai...fazer... nada disso." Regina instrui, completamente serena. Se não houvesse lágrimas sendo derramadas pelo canto de seus olhos, Emma não saberia o quanto ela está sofrendo.

Mas há. E ela está.

E é assim que Emma sabe que está na hora.

"Por favor, não." Ela engole em seco então, sua visão completamente turva.

Regina não responde de imediato, agarrando-se a qualquer reminiscência de força que ainda lhe resta.

"Sinto muito... meu amor." Sua voz frágil vacila.

Emma tenta pensar em algo para dizer então. Existem tantas coisas. Tanto que ainda precisa ser dito e tão pouco tempo. Ela quer agradecer e desculpar, mas cada palavra parece tão pequena para expressar o quanto ela realmente sente. Ela quer relembrar cada um de seus momentos preciosos e reviver cada uma de suas brigas. Ela quer as discussões, as vozes exaltadas, a respiração ofegante, as risadas e os sussurros. Cada palavra que elas já compartilharam e tudo que elas não tiveram a oportunidade de dizer ainda.

Acima de tudo, Emma quer parar o tempo e nunca ter que se despedir.

"Eu não quero fazer isso." Suas lágrimas escorrem livremente agora, encharcando suas mãos entrelaçadas e afogando sua voz.

"Eu amo você." A voz de Regina está sumindo, assim como a faísca de vida em seus olhos.

Emma responde freneticamente, beijando suas mãos com devoção sincera. Palavras sussurradas contra sua pele macia.

"Eu te amo tanto. Tanto...” Ela soluça profundamente enquanto suas mãos buscam o rosto de Regina. Seus lábios, suas bochechas, a trilha úmida deixada por suas lágrimas salgadas.

“...” Regina abre os lábios pálidos e tudo o que sai é uma lufada de ar quente. Emma pisca com força, tentando acalmar sua própria respiração para ouvir o que ela está tentando dizer.

"O que? Eu não entendo, Regina...” Suas lágrimas são quentes. O peito de Regina sobe uma última vez.

"Ame novamente."

Então não há mais movimento.

Não há mais som.

Não há mais.

Lá fora, seus filhos ainda riem.

.::.

XVIII.

O funeral acontece em Storybrooke. Era o desejo de Regina ser enterrada ao lado de seu pai (e Daniel, embora isso seja algo que elas nunca conversaram realmente). Muitas pessoas aparecem, pessoas que Emma não vê há anos. Ela não poderia se importar menos.

Henry parece muito elegante em seu terno preto. Imogen reclama das tranças feitas por Snow. Michael segura a mão de Emma e nunca chora.

Ela também não.

A Fada Azul faz um discurso. Seguido por Snow. E Archie. Regina teria odiado.

Então Henry lê um poema. O favorito de sua mãe, afirma o jovem. Emma quase não escuta as palavras, mas ela tem certeza que Regina teria adorado isso.

Quando tudo acaba, sua filha a pega pela mão dela, mostrando o caminho.

A recepção é realizada na residência dos Charming. Depois de um tempo ignorando as pessoas, Emma é deixada sozinha, sentada em um balanço na varanda. Michael está tirando uma soneca em um quarto no andar de cima e Imogen está brincando com Pongo no jardim, junto com as filhas de Snow. Então Emma pensa em Henry e em como ela não o vê desde que eles deixaram o cemitério.

Uma rápida busca pela casa confirma sua ausência. Emma pega as chaves da caminhonete de seu pai e sai sem muito alarde. Ela encontra seu filho exatamente onde ela imaginou que ele estaria.

A velha mansão, embaixo da macieira.

Sentado na grama, com as pernas cruzadas e o cabelo rebelde, ele se parece muito com o garoto que a trouxe até aqui pela primeira vez. Toda uma outra vida atrás.

"Sabe, eu posso não ser mais a xerife daqui garoto, mas, até onde sei, invasão de propriedade ainda é um crime."

“A casa nem tem cerca.”

“Lamento, mas essa não é uma sólida defesa...” Emma se aproxima e se senta ao seu lado. "E se alguém estivesse morando aqui agora?"

"Na mansão da Rainha Má?" Ele dá a ela um olhar de pura descrença. "Sem chance disso."

Agora que ela está perto, Emma percebe que Henry tem algo debaixo do braço, protegido com segurança. "O que é isso que você tem aí?"

Ele hesita por um segundo, apenas para ceder de qualquer maneira, puxando o livro antigo de sua mochila e exibindo-o em seu colo. O objeto é dolorosamente familiar.

“Garoto, você só pode estar de brincadeira comigo! Onde você conseguiu isso?" Os dedos de Emma traçam a inscrição familiar na capa.

“Eu sempre tive. Estava apenas... guardado." A informação claramente surpreende Emma.

"Eu não fazia ideia."

Henry não tem uma resposta lhe oferecer. Em vez disso, ele abre o livro e começa a folhear as páginas. “É tão estranho, eu estava lendo agora e tudo parece tão bizarro. Como você acreditou em mim quando eu apareci e te contei todas essas histórias?”

Emma sorri com carinho perante a memória. “Quem disse que eu acreditei? Achei que você fosse pirado na batatinha."

Henry sorri então, um misto de descrença e humor dançando em seus lábios, da mesma forma que Regina costumava fazer. Emma pode sentir o ar sendo roubado de seus pulmões, embora tente não se deixar abalar. É absurdamente agonizante, a ferida ainda muito recente.

"Bem, o que eu não daria por um pouco dessa loucura agora?" Emma divaga, seus olhos fechados e sua voz distante. “Eu teria beijado a sua mãe e ela não teria nos deixado. Nem agora, nem nunca.”

Henry abaixa a cabeça e um soluço tímido é tudo que Emma pode ouvir antes de perceber as lágrimas caindo sobre páginas do livro.

Ela coloca a mão sobre o ombro dele, oferecendo qualquer pequeno conforto que esteja ao seu alcance. “Eu sinto muito, garoto, gostaria que houvesse algo como ‘felizes para sempre’ neste mundo.”

Henry enxuga as lágrimas então, os olhos avermelhados e um sorriso resignado sendo oferecido como um consolo para si mesmo.

“Pelo menos existe amor verdadeiro.” Ele se sente bobo falando em voz alta, então acrescenta sem jeito. “Quer dizer, era isso o que vocês tinham certo? Você e a mamãe?"

"Pode acreditar que sim, garoto." Emma suspira com saudade, anos e anos de memórias dançando em sua mente, a risada de Regina ainda ecoando em seus ouvidos, o gosto de seus beijos ainda persistentes. Em seguida, há uma brisa suave e o cheiro de maçãs enche o ar.

Quando Emma abre os olhos, é com um sorriso agridoce e nada além de verdadeira confiança em suas palavras. “E se isso não for magia de verdade, então eu não sei o que é.”

Fim.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.