Segredos

Sequestrados


Russell estava voltando para o Refúgio. Fazia-se uma semana desde que entrara para a polícia local. Ele sempre voltava cansado, mas ainda assim ensinava Charlotte a manejar a espada e a lutar sempre que podia. Não quis contar à Cara porque todo os policiais que trabalhavam com ele sabiam de seus poderes, não a delegacia toda, mas apenas os da equipe. Russell se sentia livre pela primeira vez desde que a guerra secreta acabou e talvez, pensou, só talvez, Cara poderia estar certa sobre os humanos. Eles os odiavam, mas ainda havia esperança de que poderiam um dia conviver em paz.

O rapaz chegou procurando por Cara. Decidido à contar à amiga e líder o que aconteceu na última semana. Porém havia um problema: Cara não dava atenção aos demais. Sua vida agora era descobrir o que John e Stephen tanto faziam juntos e procurar por Jedikiah para saber mais à respeito de Kevin.

Russell suspeitava que John quisesse ficar mais tempo longe deles, que eram todos estranhos, além disso, Steven sabia convencer alguém de que estava certo, então sua teoria era de que Steven convencera John a ficar com ele, pelo menos até recuperarem a memória de John.

Jedikiah, por outro lado, não parava no refúgio. Cara aceitou que Jedikiah voltasse a ficar no prédio porque ele poderia ser uma peça importante para acharem Daniel. Ela suspeitava que Jedikiah estivesse mentindo sobre o irmão de Kevin, porém não tinha certeza e não teria tão cedo. Jedikiah estava sempre fora e chegava tarde, quando todos já estavam dormindo.

Russell percebeu então, que todos tinham segredos. Até mesmo Charlotte mantinha em segredo dos demais que possuía uma espada. Achou melhor então, deixar o assunto da polícia quieto.

Levou um susto quando ouviu alguns bips seguidos. Estava passando num corredor vazio e acabou rindo de si mesmo. Olhou no celular, que outrora roubara em uma lojinha qualquer, e viu que alguém estava ligando-o da polícia.

– Russell na escuta.

– Você realmente precisa falar desse jeito? – Disse uma voz feminina do outro lado da linha.

– É meu charme. Alguma emergência?

– Sim. A prefeitura acabou de ser invadida. Precisamos de um infiltrador.

Russell sorriu. Apesar de estar feliz pelo fim da guerra sentia falta de alguma ação.

Alguns instantes depois, ele apareceu num beco, derrubando algumas latas de lixo. Uma mulher de cabelo vermelho curto e fardada, apareceu dando um tapa na própria testa. Russell sorriu disfarçando a vergonha que sentiu naquele momento.

– Qual o motivo de ser um infiltrado se nem silêncio você consegue fazer?

– Relaxa, gata. Eu posso fazer melhor do que isso.

– Eu acho bom mesmo. E meu nome não é gata – a mulher bateu em Russell fazendo-o cambalear para o lado um pouco – Você sabe que eu odeio homens assim.

– Desculpe, Donna.

– Assim está melhor. Pronto para entrar?

– Eu não conheço lá dentro. Sou novo nessa coisa.

– Eu conheço. Pode ler minha mente?

– Sim.

– Então não temos tempo a perder.

Russell abraçou-a rindo da situação e teleportou-se dali.

Donna e Russell apareceram numa saleta, felizmente, vazia. Parecia um escritório.

– O que está acontecendo? Alguém está tentando atacar o prefeito?

– Sim. E nós precisamos descobrir quem é. Vamos ter que lutar com os guardas caso eles não deixem a polícia passarem. Tente não revelar sua espécie.

– Você fala como se fôssemos animais.

– Para alguns humanos vocês são. Eu não os vejos assim, mas... Ah! Teremos outra hora para discutir biologia, agora precisamos achar o prefeito. Parece que o maluco não controla os poderes muito bem.

– Espera! Poderes?

Donna encarou Russell com um sorriso no canto da boca.

– Como você acha que ele passou pelos guardas e porque você acha que está aqui?

– Posso tentar algo antes?

– Vai ler a mente dos guardas?

Os dois se aproximaram da porta que estava entreaberta para espiar como estava a situação lá fora enquanto Russell respondia um “mais ou menos”. Russell vasculhava na mente de todos que podia enxergar. Isso seria mais fácil para Cara, que era a melhor telepata, porém, ele precisaria se virar no momento.

Os guardas corriam de um lado para o outro. Russell nunca vira tanto guarda junto em toda a sua vida. Sabia que a polícia não interferiria no momento porque ele estava ali a mando da polícia, mas sob um evento desse, talvez a FBI aparecesse a qualquer instante e não haveria mais nada que ele pudesse fazer.

Uma explosão.

Russell imediatamente redirecionou sua atenção para um guarda que estava de frente para a escadaria principal. Através da mente do guarda ele viu a escada explodida, como se tivessem jogado uma bomba no local.

– O que foi isso? – Perguntou Donna apreensiva.

– A escada. Foi explodida. Telecinese fora de controle, eu acho.

– Você conhece alguém que poderia fazer algo assim?

Stephen, John, Charllotte, Kevin, Bathory, Cassie e Roger, ele pensou. Porém, além de Kevin, era improvável que um deles estivessem ali. Principalmente Cassie e Roger.

Balançou a cabeça ao despertar de seus pensamentos. Agora não era hora para luto ou arrependimentos.

– Então?

– Não. Não me lembro de ninguém que pudesse fazer isso... Vem. Vamos entrar direto no gabinete do prefeito.

– Não! Eles vão te ver. Tem um corredor que dá próximo ao banheiro no segundo andar. Podemos nos teleportar para lá. Leia minha mente e saberá o caminho.

Russell pôs a mão direita no ombro de Donna e os dois se teleportaram, reaparecendo num corredor vazio. Mais à frente via-se clarões e ouviam-se barulhos de tiro.

O jovem correu e acabou saindo num corredor bem mais estreito, cheio de guardas e até mesmo alguns policiais. Donna apareceu logo atrás gritando para não atirarem e mostrando o distintivo, porém em vão.

– Você pode fazer algo? – Ela perguntou tentando olhar pela porta dupla de madeira que estava explodida assim como a escada.

Russell pôs as pontas dos dedos indicadores e médio nas têmporas e as armas de quem estava atirando pararam de funcionar. Russell ativou telecineticamente e telepaticamente as travas das pistolas.

Donna aproximou-se dos policiais e guardas para explicarem a situação ou simplesmente conseguir mais tempo para que Russell fizesse a mágica acontecer.

Porém, o susto de Russell foi grande, quando este entrou no enorme gabinete do prefeito que mais parecia uma casa de tão grande. Os objetos, grandes – como mesas e estantes – e pequenos – como livros, cadeiras e folhas – flutuavam rodeando o gabinete. No “olho” estavam o prefeito jogado no chão estampando medo em seu rosto e à sua frente estava Kurt.

– Kurt?

O rapaz magricela de cabelos pretos que escorriam pelo rosto olhou para trás. Estava mais magro do que de costume, pálido e as olheiras eram tão fortes que parecia que seus olhos haviam tornado-se pretos. Ainda usava a roupa que usou na festa em que atiraram em Irene, apesar de estar toda destruída.

– Achei que Cara tinha tirado seus poderes.

Russell tentou avançar, mas foi obrigado a se desviar de uma mesa que voou em sua direção.

– Acalme-se! Kurt!

Os poderes de Kurt estavam fora de controle. Ele não estava mais poderoso, disso Russell tinha certeza, caso contrário, ele nem estaria mais ali. No entanto não podia arriscar.

– Russell!

Donna e os homens encaravam a sala do lado de fora, todos esperando que o rapaz tomasse alguma atitude.

– Você pode me cobrir!?

Ele gritou. Imaginou que Kurt não tivesse ouvido, já que este parecia estar falando alguma coisa com o prefeito. Donna fez que sim com a cabeça e avançou sendo impedida por uma cadeira.

Os homens, vendo que ela estava agindo como distração, também avançaram. Um deles fora rodeado por papéis. Um segundo, fora atacado por livros voadores. O terceiro ficou preso à parede por alguns lápis e canetas. Os outros continuaram entrando e tentando desviarem dos objetos que avançavam ferozmente.

Russell, sem ainda acreditar no que estava acontecendo, conseguiu se aproximar de Kurt, mas tudo aconteceu tão rápido, que a única coisa que deu tempo, foi de pensar em algo.

“Stephen”

Os três que estavam no centro do evento sumiram dali quando Russell puxou Kurt pela manga rasgada da camisa.