Secrets

O Caminho Secreto Conveniente.


A expressão “no escuro”, como eu tenho certeza de você sabe, pode se referir não apenas aos arredores sombrios, mas também dos segredos obscuros dos quais uma pessoa pode não estar consciente. Se você está tomando banho de sol em um parque, por exemplo, mas não sabe que um armário trancado está enterrado quinze metros abaixo de sua esteira, você está no escuro, mesmo que não esteja realmente no escuro; ao passo que se você está fazendo uma caminhada à meia-noite, sabendo muito bem que uma porção de bailarinas vem vindo logo atrás, então você não está no escuro, mesmo que de fato esteja no escuro. É claro que é perfeitamente possível estar no escuro no escuro, bem como estar não no escuro não no escuro, mas há tantos segredos no mundo que é provável que você esteja no escuro em relação a uma coisa ou outra, esteja você no escuro no escuro ou não no escuro não no escuro, muito embora o sol possa se pôr tão depressa que você pode ficar no escuro quanto a estar no escuro no escuro, somente para olhar em volta e descobrir que não está mais no escuro quanto a estar no escuro no escuro, como no escuro no escuro não obstante, não só por causa do escuro, mas por causa das bailarinas no escuro, que não estão no escuro quanto ao escuro, mas também não estão no escuro quanto ao armário trancado, e você pode estar no escuro quanto às bailarinas estarem desenterrando o armário trancado no escuro, apesar de não estar mais no escuro quanto a estar no escuro, portanto, pode cair no buraco que as bailarinas cavaram, que é escuro, no escuro e obscuro.

Já Joseph, estava no escuro no escuro, em relação ao bilhete misterioso e à passagem até pouco tempo secreta. Este, não conseguiu abrir a porta pela qual ele havia entrado.

“Devem ter escombros em cima da porta”, pensou consigo.

Devo lhes dizer que estava errado. A porta tinha sido trancada por uma mulher, a mesma que jogara o menino ali. Sua mãe.

“Vou morrer de fome.” Agora, em voz alta. Tateou desesperadamente mais uma vez. Notou que o lugar era estreito e não muito alto, teria de ficar agachado. Estava sentado em um degrau, baixo o suficiente para sua cabeça ficar a menos de um palmo do teto.

“O que será que tem no fim dessa escada?” Murmurou, esperançoso. Começou a descer, com muito cuidado, pois tudo o que lhe faltava era um enorme galo na cabeça.

Após de vários minutos de caminhada, o garoto notou que o caminho era bastante sinuoso; ele seguia reto por muitos metros, e logo após, virava bruscamente para a esquerda ou direita, o que fez com que Joseph desse de cara várias e várias vezes com os tijolos empoeirados do túnel. O caminho também subia e descia bruscamente, o que fez com que o suposto herdeiro da família Wood tropeçasse nos degraus, quando estes indicavam uma subida, ou escorregasse e descesse quase rolando as escadas, logo após, se levantando e fazendo sua cabeça ir ao encontro do teto.

Pos fim, após muito tempo, uma fraca luz pálida de dia nublado foi avistada, muito longe de onde o garoto estava, mas, como desde que fora trancafiado dentro do túnel, não vira um sinal de qualquer outra coisa que não fosse escuridão. Correu. Tropeçou. Caiu. Mais uma vez se esqueceu da altura do túnel, e foi de encontro ao chão, que diferentemente do imaginado por Joseph, era extremamente liso e gelado. Se Joseph tivesse tateado um pouco mais, lá perto de onde entrou, provavelmente acharia um interruptor. Se acionasse o interruptor, várias lâmpadas acenderiam, ele poderia ver o rosa-chiclete horrível com que pintaram as paredes. Poderia também ver as estampas de âncoras repulsivas, feitas de caneta hidrocor. Mas, poderia ver que o local liso e frio no qual ele deu de cara, era um azulejo, onde estavam escritas as iniciais C.S.C., entrelaçadas para formar uma figura. Uma figura que o jovem Joseph veria, − e seria visto por ela − muitas vezes, daqui para a frente.

O “órfão” chegou perto da luz, e viu que havia uma portinhola, assim como a que ficava escondida debaixo do tapete da imensa e vasta biblioteca da sua casa, porém, muito mais rústica. Tinha um enorme cadeado, mas a madeira estava tão podre que parece que o cadeado fora colocado ali só de enfeite, e que surpreendentemente não teria esmagado a madeira quase decomposta com o seu peso.

Joseph, empurrou a portinhola, e com um sonoro créc, ela se quebrou em vários fragmentos.

Ficou cego durante alguns instantes, tinha ficado muito tempo dentro daquele túnel sem luz nenhuma. Se levantou e içou-se para fora do túnel, o que não o dava muitas esperanças. Estava no fundo do poço − que como vocês sabem, é uma expressão comumente utilizada para dizer que o indivíduo está na pior, mas aqui foi empregada em seu sentido literal. Joseph olhou ao seu redor, e viu que havia uma pequena e aparentemente frágil escadinha de metal.

“Já perdi meus pais, minha casa, e acho que uma ou duas costelas, agora sim, não tenho mais nada a perder.”

O garoto tratou de começar a subir a escada, pois o poço aparentava ter 48 ou 84 metros de profundidade.

Acho que nem preciso mencionar o quão foi exaustiva a escalada do poço. O órfão, subia, subia e subia, mas não saía do lugar. Resolveu olhar para baixo. Não pode ver o fundo, pois estava escuro, uma vez que a excursão pelo túnel e a escalada do poço demoraram o final da manhã e a tarde inteira. Estava com fome. Estava com sede. Queria dormir. Queria sua casa. Queria seus pais. Seus pais. Apesar das poucas horas de muito tempo de afastamento, sentia muita falta dos seus pais. Perguntava-se se sua mãe estaria no fim − ou no início, melhor dizendo − do poço, junto com seu pai, que estaria esperando-o para lhe dar um caloroso abraço, bagunçar seu cabelo − como o Sr. Wood fazia todo santo dia, assim que via o filho pela primeira vez, no café-da-manhã, ou quando este voltava de algum passeio com seus amigos nas ruas poluídas e conturbadas da cidade. − e dizer: “Parabéns filho, você conseguiu.”.

Como provavelmente alguma pessoa pessimista que você conheça te disse, não é bom criar esperanças. De acordo com esse tipo de gente, criar esperanças é ruim, pois você pode se decepcionar se tiver bastante esperançoso, uma vez que se você estivesse sempre esperando pelo pior, não teria uma desilusão assim tão grande.

Com o órfão Wood, aconteceu a mesma coisa. A primeira coisa que viu quando saiu do poço, não foi sua mãe, muito menos seu pai. Foi uma casa enorme, mas não em sentido de largura, mas sim de altura. Era praticamente uma torre. Não, era uma torre. Era construída de mal jeito, como se o arquiteto que a projetou tivesse algo melhor pra fazer, e rabiscou qualquer coisa na planta. A casa era pintada com um branco desbotado. A tinta estava descascando, por ação do sol ou chuva intensa. Era torta. Muito torta. Pendia para a direita, e depois para a esquerda, depois para a direita de novo e mais uma vez para a esquerda. Nos fundos da casa, havia uma espécie de celeiro, cuja chaminé exalava muita, mas muita fumaça branca. Havia também uma casinha de cachorro, aparentemente abandonada, uma vez que estava completamente tomada por heras, tudo isso no topo do mais alto morro que podia ser avistado a quilômetros de distância, e protegido por grades de metal tortas e enferrujadas.

Joseph resolveu bater na porta. Aproximou-se lentamente, e encarou o grande olho que estava na porta, provavelmente o “olho mágico”, mas parece que o mesmo arquiteto entediado que projetara essa casa resolveu levar essa expressão a sério. O garoto ergueu a mão, e antes de podre bater, onde deveria ser a íris do olho se abriu, revelando uma mulher pálida de cabelos grisalhos, com os olhos tão azuis que aparentava ser cega.

“Oh, Deus! Carl, venha cá! Parece que Joseph Wood veio nos fazer uma visitinha.”