Nos sentamos na mesa do refeitório, no almoço, e começamos a comer. E, dessa vez, James parecia nervoso.

— Gente — Ele chamou. — Depois daqui vou ir falar com a Erica.

— Sério? — Lili disse, abrindo um sorriso incentivador. — Legal. Boa sorte!

— Obrigado — respondeu, meio tenso.

James olhava pelo refeitório, talvez procurando por Erica, até que a encontrou, não muito longe de onde estávamos sentados. Ele terminou de comer e esperou que ela também acabasse, antes de levantar e ir até lá.

As três amigas de Erica olharam para James, e Erica se virou. Ele disse alguma coisa, ela concordou e seguiu ele para o jardim, pegando sua mochila.

— Tomara que dê tudo certo — Lili disse, animada.

Terminamos de comer e fomos para o dormitório. Lili guardou suas coisas e depois veio para o meu quarto.

— Como será que eles estão? — perguntei a ela.

— Pelo jeito, bem. Mandei mensagem pro Júlio e ele disse que o James ainda não subiu.

— Eita, deve estar bom então.

Ela riu. — Devem estar colocando o papo em dia. Tá com ciúmes é?

— Quê?

— Tô brincando! Vamos descer?

Ciúmes, tá doida.

Saímos para o corredor e caminhamos devagar para as escadas, assim que descemos o primeiro degrau, Erica apareceu, subindo, e ao nos ver, abriu um sorriso enorme.

— Bruna, Lili! — Subiu rapidamente, quase dando pulinhos. — Eu queria agradecer por terem me ajudado.

— Não foi nada — respondemos juntas.

— Foi sim! Vocês podiam ter fingido que falaram, mas vocês contaram. Obrigada. De verdade.

— Ah, não foi nada. — Lili sorriu, se achando um pouquinho pela atenção que recebia.

— Agora podemos conversar normalmente! — exclamou e pulou em mim, me abraçando. Segurei um espirro quando seu perfume invadiu meu nariz, e logo ela se afastou para abraçar Lili também. — Então nos vemos depois, tchau!

Acenamos para ela, e aí eu espirrei.

— Uau, ela tá feliz mesmo... Que foi?

— Que foi o quê? Eu só espirrei. Acho que foi o perfume dela. — Cocei o nariz. — Doce demais.

Lili riu e continuamos nosso caminho. Júlio estava nos esperando.

— Cadê o James? — Lili perguntou.

— Encontrei ele quando tava descendo. Só foi lá deixar a mochila e já vem.

— Ah, vamos indo, então. — Começamos a caminhar para a mesa. — O James parece estar feliz?

— Acho que sim, mas é lógico que ele ia ficar feliz em resolver as coisas. Eu me senti um pouco mal de saber o que aconteceu. Também foi culpa minha que eles não se acertaram antes — comentou ele, cabisbaixo.

— Você só tava protegendo ele, eu provavelmente faria o mesmo, eu acho... Bom, só espero que ele não deixe a gente de lado quando começar a namorar.

— Você nem sabe se eles vão namorar mesmo. E além disso, ele não deixaria a gente de lado.

— Vocês acham que a Erica faria ele se afastar da gente? — perguntei, receosa de que isso realmente acontecesse.

— Não sei, talvez. Não conheço ela pra saber. Mas duvido que ele deixaria — Lili respondeu firme, aparentemente achando que algo assim nunca aconteceria.

Nos sentamos. Eles ficaram pensativos, e eu, preocupada.

— Que clima de enterro é esse? — Ouvimos a voz de James e o olhamos ao mesmo tempo. — Aconteceu alguma coisa?

James se sentou do meu lado e eu me aproximei, lhe dando uma leve empurrada com o ombro. — Nada não.

— Então do que vocês estavam falando? — pressionou ele, apoiando os braços na mesa depois de me devolver a empurrada.

— Estamos falando de inglês. — Lili pensou mais rápido do que nós. — Júlio don’t know how to speak. — Deu risada, dando uma olhada zombeteira para o Júlio.

— Eu sei sim — reclamou ele, fazendo uma careta para ela.

— Então fala aí.

— Não sou obrigado, sua chata.

Lili segurou a risada.

— Vocês não têm jeito mesmo. — James riu, negando com a cabeça.

Júlio e Lili começaram a falar, ou discutir, não sei. Não estava mais prestando atenção porque estava tentando decifrar como James estava se sentindo, se parecia feliz, triste ou sei lá.

Ele ignorou a discussão dos dois e me olhou. — Que foi? Parece preocupada.

— Acho que estou, um pouco.

— Com o quê?

Se eu falar, das duas, uma: ele vai me achar idiota, ou ele vai se sentir ofendido achando que eu penso que ele não sabe cuidar das próprias coisas. — Ah, deixa quieto.

— Quem foi que gaguejou na prova oral no ano passado? — Júlio retrucou. — Eu que não fui.

— Eu tava nervosa, não tinha a mesma confiança que tenho hoje. Isso não é justo — Lili resmungou, fazendo um bico, brava.

Continuamos ignorando os dois.

— Mas eu quero saber. Sou seu amigo, não sou? — perguntou James tranquilamente.

— Claro que é.

— Então. Assim você me deixa preocupado... É por causa da Erica?

— Pelo menos eu consigo lembrar das palavras, é por isso que eu jogo videogame em inglês, viu só? — Júlio se vangloriou, erguendo as sobrancelhas como se fosse expert no assunto.

— Grande coisa. Quem precisa de jogos quando se tem filmes e livros? — argumentou ela, virando o rosto para frente, deixando claro que ela ganhou a discussão.

— É... Sim. — Tive que reformular a pergunta de James, já que os dois do outro lado estavam falando mais alto.

James deu um pequeno sorriso. — Não precisa se preocupar. Não vai sair tudo errado de novo, e mesmo que algo dê errado eu posso contar com você, não posso?

— Claro que pode.

Seu sorriso aumentou e afirmou com um aceno de cabeça.

Talvez eu queira que você não se envolva com ela... Mas o que eu poderia fazer? Afinal, eles se gostam... Ele não ia desistir dela só porque eu estou com esse pressentimento estranho. Então o jeito é olhar e esperar que dê certo.

— E você... por acaso... quer ficar com ela?

— Hmm... Não sei. Não vou apressar as coisas. Vamos ver como as coisas vão seguir... Por quê? Tá com ciúmes? — perguntou, brincalhão.

Você também?! — Não! — exclamei, ficando corada. — E-eu só quero saber o que você tá pensando. Quero poder te ajudar se precisar.

Ele pareceu meio decepcionado com minha resposta, mas sorriu. — Obrigado. — Olhou para os dois que ainda estavam se provocando. — Ei, chega né. Parecem um casal de velhos.

Eles ficaram em silêncio. Júlio apoiou a cabeça nas mãos, parecendo meio chateado. — Tô com fome.

— Você comeu agora pouco — James acusou.

— O que quer que eu faça? Não tenho culpa.

— Não sei como você não engorda — Lili retrucou, ainda brava.

— Muito menos eu — Ele falou, imitando o tom dela.

...

À medida que tomava meu café, ficava mais nervosa. Com toda aquela história do James, praticamente esqueci do primeiro dia do ensaio da peça. Algo tão importante e eu deixei de lado. Não sei nem como consegui fazer isso, porque eu adoro sofrer com antecedência por qualquer coisa.

Ensaio, Yan, James... Yan.

Provavelmente essa sensação vai durar eternamente até o fim do ano.

Quando acabamos, eu e James caminhamos para o jardim, com ele tentando me acalmar contando como seria esse primeiro dia e que eu não precisava me preocupar tanto.

— James! — Olhamos para trás. Erica estava se aproximando e nos alcançou. — Oi, Bruna.

Sorri em resposta. — Oi.

— Tô ansiosa pra começar — comentou, abrindo um grande sorriso para James.

Os dois conversaram o resto do caminho até as cadeiras do auditório. Ficamos na primeira fileira, Erica, James e eu. Eles estavam conversando tão animados que eu não me senti à vontade de entrar no assunto.

Tô vendo que vou ficar praticamente sozinha se continuar desse jeito...

Algumas pessoas chegaram e escolheram os lugares. Pelo que eu soube, os ensaios eram abertos para quem quisesse assistir. Só mais um detalhe para ajudar.

— Posso sentar aqui? — De repente notei alguém do meu lado, já puxando o assento para baixo e se sentando, sem nem esperar uma resposta. Não que ela fosse sair da minha boca.

Yan sorriu. — Tá nervosa? — perguntou olhando para as minhas mãos juntas, se apertando, no meu colo.

Isso devia ser óbvio. Eu fiquei mais tensa do que já tava. — Acho que sim.

— É a sua primeira vez?

Meu rosto esquentou. O teatro. É a primeira vez que você faz teatro. — Ah, sim, é sim.

Mesmo que eu evitasse olhar diretamente para ele, conseguia ver que ele me encarava. Você tá querendo que eu exploda de vergonha ou o quê?

— Como tá sua testa? — indagou, despreocupado, se recostando na poltrona.

— Eu nem sei... Acabei esquecendo.

— Posso ver?

Dei uma olhada para ele e afirmei timidamente. Ele chegou mais perto e eu afastei a franja da testa. Fiquei imóvel sem nem respirar. Yan ergueu a mão, devagar, como se avisasse o que ia fazer, e com a ponta do dedo tocou o machucado, pressionando levemente ao redor do galo.

— Dói? — Neguei, e ele baixou a mão. — Não tá mais tão alto. Amanhã deve estar normal, só com o hematoma.

Por ele estar perto, senti um aroma de algo doce, e percebi que ele estava com uma bala na boca. Parecia de morango...

— Arrã. — Foi só o que consegui dizer. Pelo menos eu estava com sorte pelo teatro ter uma baixa iluminação, assim ele não veria minha cara vermelha igual a uma pimenta dedo de moça.

— Você não se sentiu mal? — Yan tentou arrumar minha franja e deu um sorrisinho de desculpas, se afastando.

— Não. Senti nada. — Ajeitei meu cabelo e vi Yan olhando para o lado, vendo James conversando com Erica, e ergueu as sobrancelhas, surpreso com algo.

Encarei o palco vazio, me sentindo nervosa e envergonhada pelo que acabou de acontecer. Foi um pouco estranho, muito inesperado, mas... Ai. Não consegui evitar o sorrisinho bobo que surgiu na minha cara.

— Oi, Yan — James cumprimentou, me tirando de meus pensamentos. — Nem te vi aí.

Yan sorriu para ele. — Cheguei agora.

Subiu uma vontade monstruosa de espirrar e eu não consegui segurar. — Atchimm!

— Saúde — Yan e James disseram ao mesmo tempo.

Senti um arrepio pela espinha e estremeci. — Brigada.

A porta principal do teatro foi aberta e fechada estrondosamente — Estão prontas, crianças? — A professora Beatriz perguntou, descendo as escadas animadamente. — Jasmim e Marilya, pro palco!

Erica levantou rapidamente e me puxou para o palco. Segurei mais um espirro e fui, soprando o ar pela boca, tentando não surtar de nervoso.