“Eu tenho certeza de que estamos esperando
Pelos dias em que poderemos nos ver

Vamos acenar e gritar
Numa estrada coberta por cerejeiras”


— Por favor, não vá!

Cerejeiras haviam florescido e o vento conduzia suas pétalas como em uma dança melancólica, e ainda assim bela. Mas isso só servia para deixá-lo mais distante de mim.

— Não vá! Não vá!

Eu repetia isso sem parar. Gritava mesmo que pudesse ficar sem voz, entretanto parecia em vão. Souji não me ouvia.

— Pare! Não vá, não vá!

E ele apenas se afastava cada vez mais. Estava completamente fora de qualquer alcance. De repente, o rosa das daquelas flores tornou-se vermelho e gradativamente, as pétalas se transformaram em gotas. Gotas que mancharam o chão e nossos corpos em uma chuva de sangue. Então, acordei suando frio e muito assustado, com o coração disparado.

— Souji... – Sussurrei para mim mesmo. Sem aviso, as lágrimas que eu tanto segurava e evitava mostrar a todos desceram sobre meu rosto, deixando-me estranhamente aliviado. As permiti saírem sem hesitar, já que não havia ninguém no quarto, além de mim.

Sentia-me aflito, preocupado, desnorteado e triste. Estava de mãos atadas e não existia nada que eu pudesse fazer para mudar a situação. O destino dele estava selado e todos da base sabiam disso. Gostaria que Souji parasse e aproveitasse um pouco mais a sua vida e que ele vivesse por mais um tempo. Quem sabe assim, encontraríamos uma cura? Mas não. Com toda a certeza ele era um dos homens mais teimosos que já conheci, porém um dos mais honrados e determinados. Eu admirava isso nele, apesar de suas brincadeiras sádicas e comportamento infantil.

“Não importava quão difícil fosse
Você sempre sorria
Então, mesmo quando comecei a duvidar
Eu acreditei que faria o meu melhor”


Só de pensar que nunca mais poderia ver seu sorriso, meu coração apertava e a dor era mais insuportável do que a de uma lâmina cravada nele. Essa era a minha angustia. Ter que conviver com esse infeliz fato. Perguntava-me por que ele? Por que justamente ele? Droga Souji... Você é o culpado de tudo!

“Nessa memória enfraquecida
Eu consigo ouvir a música daquele dia


Levantei-me e pus minhas vestes habituais. No do ato, me pegava pensando no sonho e quanto mais o fazia, mais a vontade de chorar aumentava. Respirei fundo e abri o shoji para enfim sair da minha “toca”.

— Bom dia, Hajime-kun.

— Souji...? O que está fazendo aqui? Não deveria estar descansando?

— Ah, quer que eu vá embora? – Ele ameaçou girando o corpo fingindo que ia realmente voltar para o seu quarto. De súbito um medo me dominou e no mesmo instante eu corri e o peguei pelo braço.

— Não! Não vá! – Disse em voz alta, assustando a mim mesmo.

— Hajime-kun... – Olhou-me incrédulo com aquele olhar esverdeado, totalmente surpreso com a minha nada típica reação. Tendo consciência do que acabara de fazer, prontamente me recompus. – Você está bem?

— Estou...

— Não parece... Por um instante, podia jurar que vi você com medo. – Ele retrucou, dando mais um daqueles sorrisos debochados. Sim, era medo. Medo de perdê-lo. Permaneci parado em sua frente, cabisbaixo. Por sua vez, Souji pousou suas mãos em meus ombros e continuou. – Aconteceu algo?

De todos os meus companheiros, Okita Souji era o mais importante. No primeiro momento que me juntei a eles, esse rapaz de olhos felinos me confrontou de igual para igual. Fora surpreendente como uma amizade aflorou disso e que pouco a pouco se tornou algo mais forte. Buscava coragem dentro do meu ser para dizer aquele punhado de coisas que haviam se aglomerado há certo tempo, todas as palavras que nunca dissera e que sempre quis dizer, mas que ao mesmo tempo não julgava necessário expor. Enquanto avaliava meu próprio interior, ele continuava me olhando até que por fim prosseguiu.

— Hajime-kun, você está realmente bem? – Perguntou mais uma vez. E novamente respondi.

— Estou. – Quanto mais o olhava, mais doía. Como ele conseguia sorrir mesmo sabendo que logo iria...

Flores de cerejeira, flores de cerejeira
Elas florescem agora
Sabendo que estão destinadas a cair”

Chegava a ser insuportável, tanto que ultimamente tenho evitado olhá-lo, mas isso não passava de puro egoísmo. Tomei coragem e o encarei nos olhos, no entanto continuava paralisado e meus lábios tremiam. Mesmo tendo toda aquela postura, eu nunca fui bom com palavras. Souji sabia disso e tão logo nossos olhares ficaram próximos sua expressão mudara.

— Hajime-kun... Por favor, não me olhe desse jeito. Não me olhe com toda essa pena.

— Mas Souji...

Ele se virou e andou em direção a uma cerejeira que florescera pela primeira vez na primavera passada. A mesma árvore que eu costumava apreciar todos os dias. Quando finalmente parou, sem olhar para trás, disse.

— Por que vocês não entendem?

— ...

— Eu sou um guerreiro, sou um de vocês! Se for para morrer, que seja lutando em um campo de batalhas e não enfermo preso a uma cama! – Teimoso, como falei. Mas isso era uma das coisas que me atraiam nele e me faziam admirá-lo.

— Souji, todos nós estamos preocupados com você! Não queremos que se esforce o suficiente para que agrave sua doença! Se por algum milagre conseguirmos retardá-la, talvez quem sabe... Quem sabe achemos uma cura?! – Em vão eram as minhas palavras, ou apenas não sabia explicar do jeito certo. Mesmo que minha intenção fosse confortá-lo, somente o deixei triste e irritado.

— Seus idiotas...

— Não queremos que você morra... – Naquela altura da conversa, já não conseguiria mais me conter. – Droga, Souji.. Eu não quero que você morra! – Gritei. Meu corpo inteiro tremia e mal me mantinha em pé. Tentei ao máximo conter minhas lágrimas, mas nada adiantou. Eu desabei.

“Adeus, meu amigo. É hora de ir
Aqueles sentimentos que nunca mudam

Agora...”


Não importava se alguém me visse naquele estado tão patético em que estava. Mordia meus lábios, forçando-me a engolir o pranto que me consumia por dentro. Gostaria de ter forças para andar e sair de perto dele o mais rápido possível, mas era como se meus pés se fincassem naquele chão propositalmente para me impedir de fazer qualquer coisa.

“Talvez eu pudesse dizer
Palavras sem mentiras agora
Você brilha enquanto rezo pelo seu futuro
Com palavras honestas.”


Souji havia cerrado os punhos e se calado, mas não tardou a virar-se e me ver daquele jeito. Espantado e preocupado, ele veio em minha direção e outra vez pôs suas mãos em meus cansados ombros. Sorrindo, ele me abraçou sem aviso prévio. O mundo parou naquele momento e me senti quente. Mais do que isso, me senti protegido. Por que o calor do corpo dele era tão bom? Por que isso logo teria de acabar?

“A cidade continua
Como se quisesse nos apressar”


— Hajime-kun, agradeço por se preocupar comigo. Mas entenda os meus sentimentos quanto a isso. Não aceitar esse fato de cabeça baixa. Quero lutar pela minha vida! Jamais deixaria de batalhar ao lado de vocês. Se tiver que morrer... Que seja do jeito que eu escolher.

Ah, como eu o amava...

“Flores de cerejeira, flores de cerejeira
Elas voam pelo ar
Eu acredito que um dia renascerão
Não chore, meu amigo
É hora do nosso doloroso adeus.”


— Souji... – Retribuí o abraço, apertando-o com força, mas com o devido cuidado. Escondi meu rosto para que ele não notasse minhas lágrimas. Que orgulho mais bobo o meu, não é mesmo?

“Sorria daquele jeito lindo
Vamos lá...”


Sem dizer mais nada, ele levantou meu queixo, parece que pudéssemos nos encarar. Não sei como, mas esse encontro findou em um beijo.

— Contanto que eu possa te ver todos os dias até a minha morte, Hajime-kun... Está tudo bem para mim.

“Flores de cerejeira, flores de cerejeira
Vem, dirigindo o vento
Aquecidas pela luz que chora para sempre
Adeus, meu amigo
Vamos nos encontrar aqui de novo
Numa
estrada coberta por cerejeiras
Estrada coberta por cerejeiras”

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.