SPIN OFF - Carta Para Você

Jenny, Os Dezoito Anos de Sophie E Alguns Pensamentos Sobre O Que É Ser Mãe.


— Jen? – Ouvi Jethro me chamando. Mas não fiz questão de respondê-lo. Não. Tudo o que eu queria nesse exato momento era voltar ao passado. - JEN! – Porém eu tinha me esquecido que meu marido é teimoso. E insistente.

— Aqui. – Murmurei. Ele poderia estar ficando velho, mas ainda não estava surdo.

Ouvi seus passos e seus murmúrios de desaprovação pelo lugar onde me encontrava. Até que vi o topo de sua cabeça branca aparecer no alto da escada do sótão.

— O que você está fazendo aqui, Jen? – Ele perguntou entre o abismado e o assustado.

Limpei minha garganta, passei a mão no rosto para secar as lágrimas.

— Nada.

Pela cara dele era fácil de se perceber que ele não tinha acreditado em mim.

— Jen... – Veio o chamado em tom de alerta.

— Eu estou velha, Jethro! – Falei e para minha total vergonha, funguei.

— Você está o que? – Ele perguntou. E eu não sabia se era porque ele não tinha entendido o contexto da frase ou se era porque ele queria atazanar a minha vida.

— VELHA! – Praticamente gritei.

— E de onde você tirou essa informação, Jen?

— Pelo amor de Deus, Jethro! Como assim de onde? Do passar do tempo, é claro!

— Você fala isso todo ano, Jen. E, se quer a minha opinião, você não mudou muito.

Lisonjeiro o comentário, ainda mais vindo dele. O que significava que ele estava preocupado comigo.

— Jethro, você pode não ter percebido, pode ter se esquecido, mas em março passado a minha filha, a sua filha, a nossa filha completou 18 anos. DEZOITO ANOS! E sabe o que isso significa? Significa que eu vou fazer 50 no próximo outubro. CINQUENTA! Sophie está indo para a faculdade, é dona, teoricamente, do próprio nariz, pode fazer o que bem entende, também na teoria. A minha bebê já é uma adulta. Teoricamente o meu dever como mãe terminou em março e agora ela só está dentro dessa casa esperando o dia e a hora para poder pegar o voo para a Inglaterra e ir para a Faculdade. Você consegue entender isso? Consegue entender o meu desespero ao constatar que o meu tempo do lado da minha filha, da garotinha a quem eu chamo de “Minha Miniatura” desde o momento em que eu a peguei no colo, ACABOU??? – Comecei a chorar.

— O quanto disso você bebeu, Jen? – Ele apontou para a garrafa de Bourbon que estava apoiada precariamente em um velho álbum de fotos, ou nem tão velho, já que era de Sophie.

— O suficiente para tentar me afogar, e tudo o que eu consegui foi ficar mais depressiva ainda.

— Então pare.

— Não posso. Quero usar o álcool como desculpa. – Falei sinceramente. E esse era o efeito contrário do álcool em mim, o excesso de sinceridade, eu simplesmente não conseguia mentir estando sob influência dele.

— Você se escondeu nesse sótão para beber e chorar o fato de que a nossa filha fez 18 anos?

— Jethro, Sophie completou 18 anos enquanto estávamos em meio à caçada de Sahar, a pobrezinha nem festa teve. Quando a admissão dela para Harvard, Cambridge e Oxford chegaram, nem tivemos tempo de comemorar. Depois veio o casamento de Tony e Ziva e os quinze dias cuidando de Tali. Setembro está batendo na porta, Jethro, e a realidade me atingiu como uma bola de demolição quando acordei hoje de manhã. Sophie vai sair de casa.

Meu marido se sentou do meu lado, tirou o copo meio vazio de minha mão, deu uma golada generosa e olhando para o líquido âmbar soltou:

— E você sempre me dizendo que seria eu quem daria um surto.

— Você surtou quando foi Kelly, sofreu por antecipação durante anos. Está na sua segunda filha, sabe o que esperar. EU NÃO SEI!!!

— Claro que sabe. Esteve do lado de Kelly o tempo todo.

— Kelly e Sophie são a água e o óleo.

Jethro deu de ombros, claramente discordando do meu comentário.

— Nem tão diferentes assim. Talvez Kelly seja mais previsível do que a Ruiva, no mais, elas são irmãs.

— Não tenho como prever o que Sophie vai fazer. – Murmurei. – Nunca tivemos.

— Ela vai fazer absolutamente aquilo que a ensinamos a fazer, Jen. A Ruiva não é tão diferente assim de Kelly. Creio que é até um pouco mais responsável e madura que Kells era com a mesma idade.

— As duas passaram por coisas e situações completamente distintas.

— Se para cada argumento que eu for usar, você for me atacar com um outro de cunho pessimista, eu vou parar. – Ele reclamou.

— Você acabou de usar a expressão “cunho pessimista”? – Perguntei incrédula.

— Depois de tantos anos escutando você e a Ruiva conversando, acho que uma ou outra palavra foi absorvida, não acha?

— Sim. Tem razão. Sophie tem um vocabulário e tanto, me pergunto...

— Melhor olhar no espelho, Jen. O seu vocabulário sempre foi complicado. E você nunca facilitou a vida da nossa filha. E tem o acréscimo de Ducky.

Concordei com ele. Mas ainda não tinha superado a expressão que ele usou.

— Vai ficar aqui até quando? – Ele quis saber.

— Até que a garrafa de Bourbon faça efeito e eu desmaie por aqui, vendo fotos de minha filha com um, dois e três anos de idade. – Disse e abri o álbum que estava em minhas mãos, uma foto de Sophie vestida de Moranguinho me trouxe uma enxurrada de memórias.

— A Ruiva tem todas essas fotos nos diários dela. – Jethro comentou.

— Eu sei... mas gosto de ver a sequência que montei. Lá são as memórias dela, do jeito que ela se lembra, se é que se lembrava de verdade, aqui são as minhas memórias, Jethro. Aqui sou eu e a realidade imutável do que realmente aconteceu.

Fui passando pelas fotos, vendo a minha menina crescer em cada clique.

Eu definitivamente não estava preparada para o baque.

Dezoito anos.

E não era só porque eu estava velha.

Tá, tudo bem, admito, isso também.

Mas, Sophie. Sozinha? Na universidade?

E ela tinha que ter batido o pé e escolhido Oxford?

— Ela vai cruzar o Oceano e ir morar sozinha na Inglaterra. – Falei ao ver a foto que por tantos anos carreguei no fundo falso da minha bolsa. Minha filha, aos cinco anos, de braços abertos na frente do Big Ben.

— Eu disse que era para ela ficar por aqui.

— Ela iria de qualquer jeito, Jethro. Com ou sem a nossa ajuda. Sophie colocou na cabeça dela que faria faculdade na Terra da Rainha desde a formatura de Kelly. Como impediríamos? Brigaríamos? Abandonaríamos a nossa filha?

Jethro ficou calado, só observava a foto na qual a minha mão descansava.

— Eu vou sentir falta de tê-la por perto...

— Eu também... talvez, só talvez, consigamos fazer ela se mudar no meio do curso... vai que por uma ironia do destino ela consegue um estágio no Governo Americano... – Sonhei com o impossível.

— Jen... não brinque com o futuro dela.

— Não estou brincando, Jethro, só conjecturando.

— Alguma vez algum de seus planos deu certo? – Me perguntou seriamente.

— Não. Ok, vou deixar nas mãos dela.

— É o melhor que fazemos, Jen. Pode apostar.

— Mas eu ainda não quero deixá-la ir.

— Ela vai. Não importa o que façamos. Todos eles vão.

Abri o outro álbum, esse recheado de fotos da família no nosso primeiro ano em solo americano... pensar que todos ainda estavam por aqui... que ainda chegaram mais, me alegrou o coração.

— Vai parar de chorar agora?

Dei uma encarada em Jethro.

— Jen... não adianta, já sou imune.

— Eu sei. – Dei de ombros. – Mas velhos hábitos não morrem.

— Vamos descer. – Me chamou.

— Olhei para a garrafa de Bourbon, estava vazia.

— Eu vou ter uma ressaca daquelas amanhã... espero que as crianças não apareçam... não vou ter energia para cuidar delas.

— Qualquer coisa a gente coloca a Ruiva de babá. Ela parece gostar.

— Ela gosta é de receber o dinheiro... me pergunto o que ela vai fazer com todo esse dinheiro que ela guardou ao longo dos anos.

— A primeira leva, ela comprou o presente de casamento de Kelly. – Jethro me lembrou.

— Me lembro do colar. Kelly não o tira do pescoço. Mas e com o que ela tem guardado hoje?

— Desde que ela não cisme de fazer uma festa na loja de sapatos, eu posso aceitar qualquer coisa. – Jethro falou se levantando e me estendeu a mão.

Cambaleei ao me levantar e tentei me lembrar quando foi a última vez que fiquei tão bêbada.

— Sérvia? – Jethro me perguntou.

— Creio que foi... não me lembro de mais nenhum dia.

— Amanhã será divertido.

— Divertido para você, Jethro. Eu vou sofrer! – Murmurei ao descer a escada do sótão.

— Não tenho pena de você, Jen. Sabia que isso poderia acontecer.

— É, eu sabia.

Ele me deu um sorriso. Talvez um muito parecido com o que ele me dava durante as nossas missões.

— Uhn... Jethro. – Chamei-o.

— Já tá passando mal, Jen?

— Ainda não. Vou deixar para mais tarde... O que eu quero dizer é... – Parei ao encarar a escada do sótão: - Por que raios eu subi aqui?

— Porque gosta de sofrer nas alturas... - Ele brincou. – Mas creio que não é isso que você queria falar. – Me ajudou a descer degrau por degrau, mesmo que ele tenha feito quase todo o trabalho, afinal, eu não estava lá com muito equilíbrio.

— Não... eu ia perguntar: E o jantar? Eu não tenho condições nenhuma de ir para frente do fogão, e nós dois sabemos que a sua comida...

Ele me olhou torto, e antes que ele respondesse, escutamos um barulho de panelas e vasilhas, vindo da cozinha.

— Creio que a sua preocupação é em vão, Jen! – Ele riu e logo escutamos.

— Graças a Deus! Procurei vocês dois pela casa inteira e não tinha encontrado. O jantar está quase pronto. E... Por que vocês estão tão empoeirados assim?! – Era Sophie quem falava enquanto subia a escada.

— Sua mãe resolveu chorar no sótão a sua ida para a Inglaterra. – Jethro foi o sincero de sempre e só me restou dar um tapa na cabeça dele, daqueles bem barulhentos.

Sophie mordeu o lábio inferior para não rir da cena e só avisou:

— Vocês precisam de um banho, isso sim. Vão logo. – Saiu nos empurrando até o quarto.

— Quando foi que ela virou a mãe e nós os filhos? – Jethro perguntou assim que a nossa filha fechou a porta de nosso quarto.

— No momento em que a mãe dela se escondeu no sótão para chorar e beber?

— Deve ter sido...

Fui para banho e só de passar na frente do espelho eu tive um vislumbre do que me aguardava no outro dia. Uma ressaca daquelas.

— Jen... vai demorar muito? Você sabe que a Ruiva não tem lá muita paciência para ficar esperando...

— De quem será que ela puxou isso? – Gritei de dentro do banheiro.

— Você! Não é você quem vive falando que ela é a minha Miniatura? – Ele retrucou.

— Haha! Sério, Jethro? Tenho certeza de que foi de você, afinal ela é a Garotinha do Papai!! Acha que eu não sei quem é o preferido dela? - Falei ao abrir a porta do banheiro.

E nós escutamos:

— O Jet. Só para ficar aqui dentro de casa. – Ela apontou para o fiel pastor alemão que a seguia desde que ela o trouxe para dentro de nossa casa. - Mas se quiserem a verdade, o Tony. – Sophie respondeu sarcasticamente.

Nós dois olhamos para ela que estava parada na porta, braços cruzados e pano de prato no ombro.

— Não precisava ser tão sincera assim. – Jethro falou.

— Vem com o meu signo... Sabe como é, arianos e sua sinceridade ímpar. Assim como os escorpianos. No caso, vocês!

E nós três nos encaramos, Jethro foi o primeiro a quebrar o silêncio.

— E o que isso tudo significa?

Eu comecei a rir e Sophie só jogou os braços para o alto e saiu murmurando que era impossível que em pleno século XXI alguém não soubesse nada sobre signos.

— Falei algo que não devia? – Ele me perguntou.

— Só vai para o banho, Jethro! – Falei para ele que estava mais perdido que cego em tiroteio. – E vê se não demora!

Acabei de me arrumar e desci, Jethro não se demorou, ele e seu banho de fuzileiro, e acabamos chegando juntos à sala de jantar, que tinha uma mesa completamente preparada e uma Sophie com cara de poucos amigos sentada em seu lugar de costume, brincando com uma taça de água.

— Estamos aqui... pode explicar o motivo do jantar de gala? – Jethro perguntou ao passar atrás dela e dar um beijo no alto de sua cabeça.

Sophie deu um suspiro audível, daqueles bem dramáticos que ela aprendeu com Tony.

— Posso servir o jantar?

— Só se me servir uma dose de Bourbon antes... – Jethro comentou e Sophie parou encarou o pai e disse:

— Vocês dois já não beberam o suficiente para o resto do ano não?

Jethro olhou para a filha e disse:

— A sua mãe bebeu o suficiente para o resto da vida dela, eu não.

Minha Miniatura revirou os olhos e saiu da sala, voltando com um copo de Bourbon para o pai e um suco verde anti-ressaca para mim.

— Vai ajudar a senhora amanhã. – Ela falou ao me entregar o copo.

— Obrigada. – Murmurei, mas ela já tinha sumido para a cozinha.

— Mas o que significa isso? – Jethro estava curioso com o comportamento de Sophie. Não que ela não cozinhasse. Ela faz isso, e muito, ainda mais com os nossos horários malucos de serviço. Minha filha aprendeu a se virar dentro de casa e não raro, ela aparece no Estaleiro com algo para comermos, porque ela sabe, se deixar tanto eu quanto o pai dela, viveríamos de comida para viagem, ainda mais depois do advento dos aplicativos de delivery.

E a Ruivinha da casa voltou com o primeiro prato, deixou na mesa, retornou à cozinha... e quando terminou de colocar efetivamente a mesa, tinha ali o meu prato preferido, na verdade, o prato que tanto quanto Jethro só comemos em ocasiões especiais. Steak au poivre.

— Sophie Shepard-Gibbs, o que é isso tudo? – Jethro tinha deixado a posição calma e relaxada e agora encarava a filha.

Ela se sentou todo educadinha na mesa e encarou a nós dois.

— Bem... vocês sabem que em setembro eu vou para a universidade, certo? – Começou.

— Sim. – Respondemos juntos.

— E vai para a Inglaterra. – Jethro completou.

— Então... é sobre isso que eu quero conversar com vocês. – Ela mordeu o lábio e buscou por alguma ponta dupla no cabelo.

— Estamos esperando... – Instei-a a continuar.

— Estive pensando nas três faculdades que em aceitaram, nas possibilidades de emprego para quando eu me formar e, bem... em vocês.

— Em nós? O que você quer dizer com isso?

— Sabe mamãe, é que... olha. – Ela brigava com as palavras e isso era raríssimo de acontecer, Sophie sempre fora uma oradora excelente, tanto que foi a oradora na cerimônia de formatura do ensino médio e a líder do time de debates da escola, indo discursar até mesmo no Congresso sobre a restrição de uso de armas pela população. E além de se embolar toda, ela estava ficando vermelha e começou a gesticular sem parar. Minha menina estava nervosa. O que explicava ela ter feito o jantar, Sophie era muito parecida com Jethro, quando tinha muito na cabeça, precisava usar as mãos para se concentrar e respirar.

— Filha. – Jethro segurou a mão dela e a fez olhá-lo. – O que foi?

E os olhos de Sophie, que hoje estavam um de cada cor, se encheram de lágrimas.

Ela respirou fundo, tentando se controlar, mas foi em vão.

— Eu não posso ir para a Inglaterra. – Soltou de uma vez só. – Eu estive pensando nisso, pensando muito, para falar a verdade. E eu não posso deixar vocês aqui e, simplesmente, cruzar o Oceano Atlântico e ir estudar lá. Eu não vou conseguir ficar lá. Não tão longe de vocês. E se alguma coisa acontecer? E se vocês precisarem de algo? E se alguém da nossa família precisar de algo? E se eu precisar? São mais de dez horas de voo, três horas a mais no fuso... Eu amo Londres. Amo a Inglaterra... mas.... eu não posso morar lá. Não ainda. Treze anos tendo essa família doida foi muito pouco tempo para dizer que eu estou pronta para seguir com a minha vida longe de vocês... Eu não posso fazer isso. Assim, eu... usei o dinheiro que me deram para a inscrição em Oxford para me matricular em Harvard... – Sophie tomou fôlego para continuar mas eu fui mais rápida que a pausa dela e, literalmente voei até a minha filha e a abracei.

— Você não vai para a Inglaterra?

— Não mamãe, não posso! – Ela me falou chorando. – Eu não sou grande o suficiente para ficar tão longe sozinha. Eu preciso de vocês! – Me abraçou apertado.

— Então você é a terceira da família que vai para Harvard? – Jethro perguntou, tentando manter a pose de que para ele era a mesma coisa a filha ir ou ficar.

— Sim. Eu vou. – Ela respondeu tentando olhá-lo, mas eu impedi, porque eu ainda não a tinha soltado. Segurava apertado a minha filha como a segurei na primeira vez que a peguei no colo, dezoito anos e cinco meses atrás. – Eu sinto muito você terem me dado todo aquele dinheiro... mas eu não gastei tudo, está tudo aqui. – Ela tirou um envelope do bolso do short que usava e colocou em cima da mesa. – Eu fiz a minha inscrição em Harvard e já até sei em qual dormitório estou... as aulas começam em três semanas. – Terminou.

Pouco me importava agora quando as aulas dela começavam, Sophie iria ficar no país. Mesmo que até Boston fossem longas oito horas de carro, eu não ligava. Era o mesmo país, o mesmo continente, o mesmo fuso-horário.

— Você não tomou essa decisão pensando só em nós não, foi? – Tive que perguntar, porque, por mais que o meu lado mãe estivesse feliz de que a minha filha não estava indo para tão longe, o meu lado filha, me dizia que eu poderia ter atrapalhado os planos dela.

— NÃO! Não mesmo! – Disse certa. – Como eu falei, mamãe, eu pesei as hipóteses, não tinha a menor condição de eu só ver vocês e a família nas férias de Natal e de Primavera... é pouco. E... – E aqui ela ficou vermelhinha. – Eu preciso dos abraços de vocês, da falação de vocês, preciso saber que faço parte de uma família e que tem pessoas que se importam de verdade comigo. É besta, mas é verdade!

— Você longe ou perto, nunca deixaríamos de nos importar com você, Miniatura.

— Mas eu não teria isso. – Ela mencionou para o nosso abraço. – Eu ainda preciso de colo... e de uns tapas na cabeça... – Fez uma careta e depois de me soltar, foi abraçar Jethro, que, sendo ele, simplesmente deu um sonoro tapa na cabeça da filha. – É... eu realmente precisava disso.

Depois dessa notícia, o jantar correu como qualquer outro, com a falação de sempre de Sophie e as ocasionais implicâncias de Jethro com a forma da filha sempre estar conectada e com uma nova expressão ou novo termo que ele não sabia.

Sophie nem se importou de arrumar a cozinha depois de comer e nosso sábado terminou com nós três na frente da televisão, assistindo uma das séries preferidas de nossa filha, Criminal Minds.

O meu domingo foi maçante. Estava com uma ressaca que só não me matou porque eu sabia que ressacas não matavam, mas o simples ranger de uma tábua me provocava uma dor aguda na cabeça. Sophie tomou a frente do almoço de família, dizendo que eu estava com uma infecção estomacal e pediu para que as crianças não me incomodassem. Todas ouviram, com a exceção de Jack, que quando dei por mim, estava deitado do meu lado, quietinho, me encarando com seus dois imensos olhos azuis.

— Vovó vai ficar bem. – Ele dizia e me dava um beijo na bochecha.

Quando Kelly, enfim, descobriu onde o filho mais novo estava, me pediu milhões de desculpas e, antes de fechar a porta do quarto, só falou:

— Isso não é infecção estomacal...

— Não. É ressaca.

E ela voltou para dentro do quarto e parou na minha frente.

— Isso explica o prato que Soph está fazendo para você... mas só uma pergunta...

— Não vale rir da resposta. – Falei, porém Kelly já estava rindo.

— Isso tudo é por que a Moranguinho vai para a Inglaterra?

— Ela não vai mais para a Inglaterra. Mas sim, era por conta disso.

— Ela desistiu de ser chique em Londres?! A minha irmã desistiu disso?

E antes que eu respondesse à pergunta sarcástica de Kelly, escutamos o grito de DiNozzo:

— A PESTE RUIVA VAI FICAR!!! ELA NÃO VAI ATRAVESSAR O ATLÂNTICO!!

— Eu nem quero saber o que ele vai.... – Kelly começou e logo escutamos o som de algo – ou no caso, alguém – sendo arremessada na piscina.

— Ah eu vou te pegar seu Italiano de Araque!! – Sophie xingou.

— Faltou que eu sou o seu preferido!! – Tony respondeu, mas logo escutamos outro som, de outra pessoa caindo na água.

— Acabou de virar festa na piscina. – Kelly comentou rindo, ao chegar na janela e ver a bagunça que tinha virado o quintal dos fundos. – Melhor eu descer antes que Jack.... tarde demais, ele acabou de pular dentro d’água.

Eu ri. Sophie, Tony, Ziva e Jethro tinham educado Jack muito bem... para ser o moleque da casa, o pestinha, aquele que não pode ver uma bagunça que já está no meio... isso quando ele não começa a confusão e põe a culpa no irmão mais velho.

- Vai ficar aqui, ou vai lá para baixo, para a guerra de bexiga de água que acabou de começar e, estranhamente, tem meu marido como alvo de 95% das pessoas?

Eu não estava tão mal assim, então resolvi descer com Kelly, que mal tinha pisado no quintal e já foi dando ordens para Will e Jack entrarem porque eles não tinham roupa de banho e já estavam encharcados. Acontece que ela não terminou de xingar os filhos, pois Abby, Sophie, Tony e Jethro acertaram uma bexiga nela cada um, chamando-a de mãe careta e clamando que era alto verão.

O almoço saiu quase às quatro da tarde, contudo, ninguém se importou com isso, a notícia de que Sophie iria ficar no país era a melhor que todos ali poderiam querer.

E esse foi só o começo das “festas de despedida” que Sophie ganhou.

Nas próximas três semanas, cada dia era uma invenção nova. Abby, como sempre, planejou tudo nos mínimos detalhes, e não faltou bagunça, não faltou saudade. Pois a Cientista conseguiu replicar todos os momentos felizes, que nos marcaram nos últimos treze anos.

Nossa última noite foi em um boliche. E nós mal entramos, Tony já foi perguntando:

— Quem vai deslizar pela pista hoje?

Desnecessário dizer que todas as crianças levantaram as mãos e, correndo o risco de nos expulsarem, Tim e Tony, jogaram cada uma pista abaixo, como se ali fosse o escorregador de um parquinho.

O resumo da noite... bem, podemos dizer que Henry continua sendo um excelente prefeito, porque mira para jogar boliche não tem nenhuma. Ziva não entendeu o espírito da coisa até hoje, e, também não aprendeu que não se pode pisar na linha que demarca onde se pode soltar a bola, resultado: dois tombos, e só não ficou em último porque Henry é realmente ruim. Jimmy e Breena só foram para se divertir mesmo, e não ligaram muito para a posição em que chegaram. Torres e Bishop, bem... demonstraram um ótimo comprometimento em jogar a bola, mas em acertar pinos... e como Tali disse: “pelo menos não levaram tombos!” Tim e Abby chegaram a assustar, fazendo strikes consecutivos, e ganhariam, se não fossem o fato de os finalistas serem competitivos ao extremo.

E, a finalíssima da noite foi entre Tony, Kelly, Jethro, Sophie e eu – sim, eu melhorei bastante nos últimos anos. Ducky ficou de fora, afinal, teve que ser o juiz por inúmeras vezes, principalmente nas jogadas de Torres e Tony que virara e mexia, usavam das regras do jogo e as de Jethro para saírem da linha.

— Então, vamos às regras, antes que as reclamações comecem! – Ducky nos chamou. E bastou que ele falasse isso para Kelly e Tony começarem a se bicar. – E por favor, mantenham o tom, seus filhos estão aqui. – O que não impediu que Jethro começasse a falar:

— A Jen só tá aqui porque teve sorte, jogar que é bom...

— Como é Jethro?!

— E vocês dois! Suas filhas estão aqui, assim como seus netos! – Ducky teve que entrar no meio. Nos calamos, mas não deixamos de nos encarar.

E no meio da minha briga com Jethro e das provocações incessantes entre Kelly e DiNozzo, tinha Sophie, que tinha pegado uma cadeira, comprado uma caneca imensa de chá gelado e, de pernas cruzadas, com aquele ar de nobreza que ela tem, apenas falou diante do olhar espantado de Ducky:

— Eu só quero um bom lugar de onde eu possa vê-los perder!

— E lá vamos nós com o Loki, novamente... – Tim murmurou do fundo.

— Será que vocês entenderam as regras, ou estão aqui para a guerra?

A nossa resposta?

— Estamos aqui para guerra!

— Que o melhor sobreviva, então. – O Bom Doutor desistiu de nós e foi para o placar. – A ordem de jogadas: Anthony, Kelly, Jennifer, Jethro e Sophie.

— É claro que a Pestinha seria a última! Aliás, esse é o lugar onde você irá terminar!! – Kelly brincou com a cara de Sophie, que continuava impassível, tranquila e imperturbável em sua cadeira com o seu chá.

As três primeiras rodadas trouxeram strikes de todos, e Henry gemeu que esse jogo não terminaria nunca.

Kelly foi a primeira a errar um pino e caiu para último. Sophie não falou nada, continuou esperando sua vez, sentada na cadeira e calada, algo que começou a perturbar DiNozzo.

Falando em DiNozzo, ele perdeu um strike, e Kelly, mesmo estando atrás no placar, não perdeu a oportunidade de encher a paciência dele.

Restavam Jethro, Sophie e eu. E a atitude blasé de Sophie com o jogo começou a me incomodar de uma maneira nada normal. Era como se ela não se importasse com o resultado, mesmo todos sabendo que ela detesta perder. E todo esse pensamento voltado para o comportamento de minha filha fez com que eu errasse a jogada e perdesse uma bola.

A grande final era entre Jethro e a filha caçula, que tinha uma expressão de completo tédio no rosto quando foi fazer a jogada.

Jethro, por sua vez, não se abalou com a atitude da filha e fez outro strike, jogando a pressão para cima dela, e todos que estavam assistindo ao final da partida, começaram a torcer para ele, afinal, se ela errasse, todos poderiam ir para casa.

Só que ela não errou. Sophie não tinha perdido um strike o jogo inteiro, jogando com a mesma maestria que Jethro joga, e para cada strike que ela fazia não tinha comemoração, não tinha piadinha. Era somente Sophie a seu eterno tédio.

— O que deu em você, Ruiva? Jogando para cumprir tabela? Se não quer jogar, pode errar de propósito que eu não vou me importar de ganhar mais esse.

Por “ganhar mais esse” Jethro queria dizer: Continuar invencível.

Sophie sentada estava, sentada ficou, só deu uma golada no seu chá enquanto via Jethro pegar uma bola e olhar para ela, com aquele ar superior que ele sempre carrega por aí.

Vi minha filha levantar uma sobrancelha para o modo como o pai pegou a bola e correu para a pista. Ela abriu o mínimo sorriso enquanto acompanhava a trajetória da jogada, e se levantou da cadeira antes que os pinos fossem derrubados, sorrindo. Sophie passou atrás do pai, deu um tapinha nas costas dele e soltou:

— Não dessa vez, Marine. – E apontou para o único pino de pé. – Não hoje.

Jethro e todos nós encarávamos o teimoso pino que se recusava a cair, ele balançou para todas as direções igual a um boneco inflável de posto de gasolina, mas permaneceu de pé.

Sophie, por sua vez, já estava com a bola nas mãos e olhava concentrada para a pista. Para o alvo. Para a sua meta. Os dez pinos foram baixados, ela respirou fundo, deu a sua corrida elegante até a marca e soltou a bola com toda a força que tinha.

A bola seguiu uma linha reta, batendo com força no primeiro pino que ao cair derrubou o próximo e, em efeito cascata, os demais caíram. Era um strike.

O último strike da noite.

E Sophie desbancou Jethro.

Tirou dele a invencibilidade.

E foi só quando o strike foi confirmado que ela se virou para a atônita plateia e, abrindo os braços, falou:

— Contemplem a nova rainha do boliche. – Disse levantando o queixo, com um sorriso de lado e seus olhos coloridos brilhando. – Onde estão as mesuras? As vênias?

— Eu não vou reverenciar você! – Kelly disse injuriada.

— Sabe como é, Kells.... você foi a última. Aceita que dói menos.

Kelly revirou os olhos e pegou o filho mais novo no colo.

— Podemos ir agora. O jogo acabou.

— É uma péssima perdedora. – Sophie provocou.

Kelly não respondeu, mas Jethro abriu a boca depois de minutos encarando o placar e vendo que a filha mais nova tinha ganhado dele.

— Você joga sujo, Ruiva.

— Não joguei. – Ela disse.

Jethro chegou bem perto de Sophie e encarou a filha de perto. O problema, ela não era tão mais baixa que o pai e ainda estava com o par de converses de plataforma, assim, o respeito que Jethro tentou impor pela diferença de altura não funcionou.

— Eu entendi o seu jogo, e saiba, foi a primeira e última vez que funcionou comigo.

Sophie abriu um sorriso de lado, igual ao do pai e só falou:

— Eu precisava que funcionasse uma vez... penso em outro para a próxima. Sou uma ótima enxadrista. Posso pensar em mil e uma estratégias diferentes... se der certo, eu ganho, se der errado, eu parto para a próxima. Mas, por essa noite, eu sou a grande vencedora.

Jethro olhou bem para a filha e depois passou o braço esquerdo pelos ombros dela, a abraçando de lado, bagunçando seu cabelo com a mão direita.

— Essa é a minha Ruiva! – Ele falou ao dar um beijo no alto da cabeça dela.

Faltavam cinco dias para ela ir para Harvard, e ela ia como a Rainha do Boliche da Família.

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— Eu não acredito nisso!

— Jen!

— Jethro! Eu... nós... ela! – Tentei falar.

— Vejo que o tema faculdade fez tanto você quanto a Ruiva conseguirem sem embolar com as palavras.

— Não brinque comigo. Ela ficou chorando! – Me virei para trás, tentando ver algum lampejo dos cabelos ruivos de minha filha.

— Como todas as outras garotas e garotos que estão chegando hoje, Jen.

— Como você pode ser tão insensível, Jethro! É a nossa filha.

— Você está chorando mais do que ela, Jen!

— É a minha filha que está ficando para trás! Minha filha!

Nossa filha. – Ele me corrigiu. – E nós não estamos deixando-a para trás, Jen. Ela está começando a vida dela.

— Pare o carro! – Ordenei.

— Olá, Madame Diretora! Sinto te informar, hoje é domingo, e eu estou de folga. – Ele retrucou.

— Não me chame de Madame. Te avisei anos atrás que eu não gosto desse termo! Agora pare esse carro, Jethro. Minha filha precisa de mim e eu vou voltar para lá.

— Jen... não. Você sabe o motivo. É a hora dela viver a vida dela. Sophie escolheu a faculdade, tomou a decisão que era mais suportável para ela, que era ficar aqui no país. Agora ela tem que se acostumar com a nova realidade dela que é essa. – Ele apontou para os portões da Faculdade. – Nosso trabalho está feito, Jen. Agora é com ela.

— Sophie continua sendo o meu bebê! A minha Miniatura. Eu preciso...

Você precisa. Essa é a questão, Jen. Você precisa aceitar que ela cresceu. Eu preciso aceitar que ela cresceu. Tony, Ziva, Tim, Abby, Jimmy, Breena, Ducky, Kelly, Henry... todos nós precisamos aceitar isso. Sophie é adulta. Legalmente dona da própria vida. Nós somos o suporte, a família. Não podemos interferir mais. O que nós tínhamos que ensiná-la, já ensinamos.

Eu chorava copiosamente dentro do carro. Nunca pensei que deixar a minha filha no dormitório da faculdade fosse doer fisicamente em mim. Mas estava doendo. Doía como se uma parte de mim tivesse sido arrancada.

E se eu pensasse com calma, essa era a verdade, Sophie era parte de mim, desde sempre.

— Como você conseguiu deixar Kelly aqui e ir para a Europa, Jethro?

— Agora você entende o que eu senti... – Ele falou tranquilo.

— Como? Como conseguiu deixá-la aqui, deixá-la ir para a Faculdade, se casar?? Eu... eu sinto como se eu fosse sufocar de preocupação, de desespero, eu não sei o que vai acontecer com Sophie e, nem sei quando ou como ela vai precisar de mim, só sei que ela vai.

— Jen... – Jethro me chamou. Eu continuava a enumerar todas as hipóteses que poderiam ser um motivo para Sophie precisar de mim. – Jen, olhe para mim. – Não tinha notado que ele havia parado o carro no acostamento. – Não fica mais fácil. Essa sensação não passa, ela diminui um pouco a cada ligação, a cada vez que ela for em casa, mas vai aumentar cada vez que ela sair pela porta e voltar para cá. Porque isso é ser mãe, é ser pai. A preocupação nunca cessa. Pois Sophie será, para mim, eternamente a garotinha de uniforme que eu tirei de dentro daquele poço. E, para você, a bebê que você segurou nos braços pela primeira vez, dias depois que ela nasceu. Kelly, por mais que seja Tenente-Comandante na Marinha, já esteja casada há dez anos e tenha dois filhos, ainda é a garotinha que corria na minha direção de braços abertos quando eu chegava em casa. Isso nunca vai mudar. Elas cresceram, sim. São responsáveis? Sim. Mas são minhas filhas. E eu vou me preocupar com elas até na outra vida.

— Dói, Jethro. Muito. – Eu murmurei.

— Vai amansar quando ela ligar.

— E se ela não ligar.

— Sophie vai ligar. Se eu conheço a Ruiva, ela está de bruços agora, chorando desesperada. Mas vai se levantar, vai organizar o que ela tem que organizar, vai chorar mais um pouco. Vai murmurar em hebraico todos os palavrões que aprendeu com Ziva, e, antes de ir dormir, ela vai nos ligar, ela vai querer alguém para conversar. Sophie detesta ficar sozinha, exatamente como você, Jen. – Jethro me garantiu e arrancou o carro.

Quando chegamos no aeroporto de Boston, eu tinha uma aparência lamentável. Tentei esconder meus olhos vermelhos e inchados com os óculos escuros, mas foi em vão. Foi o avião decolar e passar por cima do campus da universidade, que eu comecei a chorar novamente.

E de nada ajudou Kelly nos ligar, assim que aterrissamos, querendo saber como Sophie estava. Eu não tive condições de falar nada, Jethro respondeu por nós.

Eram dez da noite, quando Sophie, já de pijamas e chorando, ligou pra mim. Eu e ela choramos por quase quarenta minutos, nenhuma palavra foi dita, mas eu não precisava de palavras para entender a minha filha. Quando ela teve condições de conversar, mesmo fungando, soltou:

— Anotem aí, faltam 55 dias até o próximo feriado, e eu já reservei a passagem para casa.

Jethro ainda conversou com ela por um bom tempo, eu só escutava os murmúrios de minha filha e, cada vez que ela fungava mais forte, eu abraçava Jethro mais apertado, tentando, mentalmente, confortar a minha filha.

Ouvimos um barulho na ligação e pela tela vimos Sophie se deitar abraçada ao travesseiro.

— Sou muito velha para escutar uma história antes de dormir? – Ela perguntou chorosa.

Eu não tinha condições nenhuma de contar uma história para Sophie agora, mas Jethro me surpreendeu e inventou uma. Ou melhor, reciclou uma que ele contou para Sophie muitos anos atrás.

Escutei a risada dela quando reconheceu a história reinventada da própria vida e Jethro não se abalou, continuou a contar a história da “Princesa Sophie e o Reino dos Bobos”, onde, claro, o Bobo da Corte se chamava Tony.

Eu não prestei muita atenção no que Jethro falava, só via minha filha pela tela do celular, e logo percebi que ela estava quase caindo no sono, tem coisas que nem a idade é capaz de mudar, e Sophie adormeceu ao som da voz do pai, abraçando mais forte o travesseiro. Quando Jethro viu que a filha caçula já tinha pegado no sono, quis encerrar a chamada, eu não deixei, eu sabia o que vinha em seguida.

Sim, eu pajeei o sono de minha menina de 18 anos até que ela começasse a falar, e não deu outra, dez minutos depois, Sophie se ajeitou no colchão e falou:

— Te amo, mamãe. Te amo, papai.

— Também te amo, Minha Miniatura e jamais vou te abandonar. – Falei para a dorminhoca. – Agora, Jethro, pode encerrar. – Murmurei.

E quando pus a cabeça em meu travesseiro particular eu notei uma questão:

Todo o meu choro não era sobre ficar velha. Era sobre deixar minha menina crescer. Eu ficaria velha quantos anos fossem necessários para que eu sempre tivesse a minha menina do meu lado, mas isso era egoísta, assim como eu tive a oportunidade de construir a minha vida, Sophie também tem esse direito.

Eu só esperava que ela sempre voltasse para mim, porque ela pode crescer, mas eu sempre vou precisar de seus abraços, de seus beijos na bochecha, da forma como ela implica com o pai, usando palavras difíceis só para confundi-lo...

— Jethro... – Cutuquei meu travesseiro.

— Sim, Jen? – Ele ainda não tinha dormido.

— Não era sobre ficar velha... – Comecei.

Escutei a risada em seu peito.

— E era...

— Eu queria que ela ainda coubesse aqui, no meio de nossa cama para sempre. Mas não posso querer isso.

— E o que você quer?

— Que ela seja feliz.

Ele me abraçou apertado.

— Agora você entendeu.

— Eu vou estar sempre preocupada com ela, se ela está bem... mas se ela estiver feliz e realizada, eu vou estar também. No fundo, eu acho que a minha vida agora é ver nossas filhas felizes.

Jethro me deu um beijo na cabeça.

— E elas serão.

— Só mais uma coisa...

— Que é?

— Quantos dias faltam para o próximo feriado mesmo?

— Ah... Jen...

E eu percebi ali, e talvez muito tarde, que eu deixei de viver a minha vida no momento em que decidi que teria Sophie. E só percebi o quanto a minha vida era entrelaçada na dela quando tive que me separar de minha filha para que ela vivesse a própria vida...

Ninguém me avisou que a maternidade tinha seus altos e baixos, creio que isso deva ser lugar comum, mas também não me avisaram que doía tanto deixar os filhos crescerem... deixar que eles fossem ser o que estava destinado para eles serem.

E agora era a vez de Sophie. Ela iria conquistar o mundo, disso eu não tinha a menor dúvida. Eu só tinha que deixá-la ir... mas no fundo eu sabia, ela seria para sempre a minha Miniatura, a minha Salvadora, a melhor lembrança de Paris.

Sophie sempre seria a minha filha, não importa que idade ela tivesse, e eu sempre a estaria esperando com os braços abertos quando ela precisasse.

Afinal, maternidade é isso, é abrir mão de quem você é, para viver os sonhos de seus filhos.