Rosete e a Academia de Ficções
Capítulo 4 - Amizade com Montecchio
Graças ao Marion, ele, Simon, Jasmine e eu estávamos na sala do diretor. Quer dizer, Simon e Jasmine estavam na sala do diretor. Marion e eu ficamos do lado de fora, esperando. Não falamos um com o outro durante vários minutos, deixando o clima desconfortável e tenso.
Mas foi ele quem quebrou o silêncio:
— Como vai aquela assombração a quem você chama de ‘’pai’’?
Suspirei antes de responder, sem encará-lo:
— Bem. E como vão aqueles idiotas dos seus pais?
— Muito felizes.
— Bom saber. – Ficamos mais um tempo calados.
— Sabe... Eu me pergunto quem seria a mulher louca que se casaria com o seu pai. Isso é, se ele casou com ela.
Apertei os punhos, respirando bem fundo, para controlar a raiva. Esse garoto está falando o que não deve.
— Meu pai se apaixonou por ela. E ela por ele. Casaram-se sim porque ele guardou duas alianças numa caixa há muitos anos.
— Como pode ter certeza? Aquelas alianças podem ser muito bem algo que ele preparava para a minha mãe. Eu até imagino a verdadeira história: O Fantasma procurou por uma noiva que substituísse a sua amada. Ele encontrou uma mulher e a história se repetiu, mas a mulher fugiu e descobriu que estava grávida. Como vingança, ele tirou o bebê dela.
Maldito...
— Isso não aconteceu. – Falei, firme e séria.
— Como não? Essa história é cara dele.
— Meu pai conheceu a minha mãe porque ela o consolou e o tirou da dor que Christine e Raoul causaram nele. E a mulher não fugiu. Ela morreu.
— Ele a matou, sem dúvida. E não adianta negar. Você sabe que está na natureza do Fantasma da Ópera...
— Eu a matei. – O interrompi.
Na mesma hora, Marion se calou e arregalou os olhos, me encarando.
— Se eles nunca decidissem ter um filho, ela estaria viva e o meu pai feliz. Mas olha só o que eu fiz. Vim para esse mundo e ela se foi. – Então virei o rosto, para poder olhar para o jovem Chagny. – Não brinque com o que não sabe. É irritante e doloroso.
Com isso, eu o calei.
Não demorou em Dante sair com Jasmine e Simon.
— E se eu vir você brigando com o outros novamente, senhorita Hyde, eu juro que chamarei o seu pai para dar um jeito em você.
— Jeckll é meu padrasto. Não confunda.
— Que seja. Agora vá e pede à enfermeira para cuidar logo desse nariz.
— Tá bom. – E a garota saiu.
— E você, Holmes, sem gracinhas. Ou os seus pais saberão disso.
— Tudo bem.
— Certo. Agora vá.
— Obrigado, Sr Fiction. – Simon caminhou até a porta, mas, antes de sair, ele me encarou e piscou o olho pra mim, me fazendo sorrir.
— Esse Holmes nunca sabe a hora de parar. – Marion murmurou, aparentemente contrariado.
— Olha quem fala. – Eu disse.
— E vocês. – O Sr Fiction nos encarou seriamente. – Pra dentro da sala, agora.
Sem falar mais nada, nós entramos e nos sentamos nas cadeiras que estavam na frente de sua mesa de madeira. Na sala, além da mesa e das cadeiras, havia estantes com vários livros e arquivos. Atrás da mesa, estavam duas janelas com cortinas vermelhas.
— Muito bem... – O Sr Fiction sentou-se em na enorme cadeira da mesa. – O que aconteceu? Eu achei que vocês iam se entender, como está escrito...
Eu e Marion encaramos o homem com uma expressão confusa.
— Como é?
— Está meio óbvio, não? Você é a filha do Fantasma da Ópera e ele é o filho de Christine Daaé. Mais cedo ou mais tarde, vocês vão... Hã... Quer saber? Esquece. Acho que andei dormindo na biblioteca de novo.
— Hã... Onde está o diretor? – Perguntei.
— Eu sou o diretor. – Ele respondeu, sorrindo. – Pelo menos, até encontrar um para ocupar o cargo permanentemente.
— Então você é diretor e também ‘’manda’’ na cidade?
— Exato. Mas vamos para o que interessa. Qual é a causa da briga?
— Simples. – Marion começou. – Eu apenas queria conhecer a Rosete e dar-lhe as boas vindas. Até chamei a Jasmine Hyde para ver se as duas se entendem, mas, do nada, ela, com ajuda do Holmes, nos atacaram.
Que mentira mais mal feita! Por mais que eu quisesse apertar o pescoço desse visconde ridículo, eu permaneci quieta.
— Isso é verdade, Rosete? – O Sr Fiction me encarou.
— É sim. – Eu menti também, com um tom mais firme o possível ao ponto de ser confundido com uma confissão verdadeira, arrancando um olhar de surpresa de Marion, que estava com os olhos arregalados.
— Ora, menina Le Roux! É o seu primeiro dia aqui! Não sei como as coisas funcionam em Paris, mas eu tenho certeza de que socar a cara do coleguinha não é o jeito certo de dizer ‘’prazer em conhecê-lo’’.
— Desculpe-me, senhor. Eu estou nervosa porque, como o senhor mesmo disse, é o meu primeiro dia. Prometo que não acontecerá novamente.
— Desculpas não consertarão as marcas no rosto do Senhor de Chagny, muito menos o nariz da senhorita Hyde. Infelizmente, terei que lhe dar uma punição... Senhor Marion, está liberado. Deixe que eu me entenda com a Senhorita Rosete.
— Obrigado, Sr Fiction. – O acastanhado, mesmo ainda perturbado por eu ter entrado na mentira facilmente, sorria de alívio e alegria por escapar de um castigo.
Assim que ele saiu, eu encarei o ‘’diretor’’, que sussurrou pra mim:
— Acha que ele acreditou?
— O que? – Perguntei, confusa.
— Acha mesmo que eu sou ingênuo, criança da ópera? Eu conheço o jovem visconde há muito tempo.
Isso me pegou de surpresa.
— Então sabe que ele se acha o dono da escola?
— Sim. Ele faz isso só porque é o único com pontos altos no título de nobreza.
— Como assim?
— Deixe-me explicar: Digamos que tenha alguém nessa escola com a família que tem o título de cavaleiro. Não é grande coisa comparada ao título de visconde. Por isso, o visconde é quem manda. Se ao menos tivesse um filho de um conde ou de um arquiduque, ou melhor! De um rei! Aí sim o Senhor Marion não mandaria tanto assim.
— Mas o senhor é quem praticamente manda na escola de verdade, Sr Fiction. Por que o deixa fazer essas coisas?
— Porque eu adoro membros da nobreza. Deixam a história mais interessante. – Respondeu, sempre com um enorme sorriso.
Bufei.
— Então só preciso de alguém com um título nobre maior que o do visconde para derrubar o Chagny?
— Exatamente.
— Por que o senhor está me ajudando?
— Ajudando? Eu só dei uma informação. Não quero causar briga entre os meus alunos, mas acho que falei demais, então não posso lhe impedir de fazer algo para acabar com a tirania daquele rapaz mimado. Além disso, se eu não fizer nada, as coisas ficarão mais divertidas. E aposto um rim que ninguém gosta de um diretor que importuna as aventuras dos jovens.
Ele parece ser tão esperto e tão ingênuo ao mesmo tempo...
— Obrigada mesmo assim, senhor.
— Não foi nada, minha pequena. Agora vá. Daqui a pouco você terá que voltar para a sala.
— É verdade... Mas... E a punição?
— Vou deixar isso pra lá, mas se isso se repetir, não terei outra escolha. E, se alguém perguntar, diga que é confidencial. – Disse, dando uma piscadinha.
Levantamos-nos. O Sr Fiction me acompanhou até fora de sua sala, me desejando boa sorte e fechando a porta logo depois.
De certa forma, gostei do estilo desse Dante Fiction. Uma combinação perfeita de elegância, por causa da maneira que ele se veste e anda, e de criancice, por sua personalidade divertida. Mas ele ainda é bem suspeito... E parece ser um pouco irresponsável. Afinal, onde já se viu deixar um visconde tão arrogante como Marion de Chagny no comando da escola só porque a família tem um título de nobreza?!
Mas é melhor eu deixar isso de lado por alguns momentos. Eu preciso achar o Bertoli! Onde é que aquele loiro se meteu?
— Rosete! – E lá estava ele, correndo até mim, com os olhos brilhando e um pouco inchados, provavelmente por causa da choradeira de alguns minutos atrás...
— Hei, Montecchio!
— Eu fiquei preocupado. Ouvi o Marion dizer que você seria punida.
— Olha pra mim, Bertoli. Eu tenho cara de quem foi punida?
— Não...
— Isso aí. Bem... Vamos voltar para a sala.
— Claro. Mas... Como escapou de uma punição? Ou o Marion mentiu?
— Eu lhe conto os detalhes depois. O Marion pode ter olhos e ouvidos por todos os lados e eu não quero mais problemas. Mudando de assunto, como você está?
— Melhor agora que eu estou inteiro e você aqui comigo.
— Você é muito gentil.
— Mas... Por que me salvou? Podia ter escolhido ficar quieta e ter deixado a Hyde me machucar...
— Bertoli, há quatro coisas que eu não vou permitir que acontecesse na minha vida. Um: Falarem mal do meu pai. Dois: Tocarem na minha máscara. Três: Mandarem em mim. E quatro: Machucarem alguém indefeso.
— Eu não sou indefeso... – Murmurou, fazendo bico.
Fofo.
— Não. É uma princesinha que precisa de uma mascarada para lhe tirar de uma fria.
— Não me chame de princesa! É chato!
Eu ri.
— Não fique magoado. Eu estava só brincando. Juro que não falo mais isso. – Ele não respondeu. Continuou com uma cara fechada. – Bom... Pelo visto, não quer mais falar comigo. Tudo bem. O vejo na sala.
Acelerei o passo, deixando-o pra trás. Não demorou em Bertoli correr até mim e agarrar o meu braço, me pegando de surpresa.
— Não, espera! Eu quero andar com você, eu só estava um pouco... – Foi quando ele percebeu que havia tocado em mim e rapidamente me soltou e se afastou. – Desculpe! Eu me esqueci de que você não gosta de... Bom... Eu faço o que você quiser, mas não... Só não me deixe sozinho de novo, tá bom?
Eu realmente não gosto quando me tocam sem a minha permissão. Mas vi que Bertoli era um rapaz adorável que não faria mal a ninguém. Não tem o porquê de me afastar. Ele é um garoto tão frágil e sensível... Faz-me querer cuidar dele e protegê-lo de tudo e de todos.
Na mesma hora, eu toquei em sua mão e sorri o mais amigavelmente que conseguia. O loiro abriu os olhos e corou na hora.
— Eu não quero que se obrigue a fazer nada por causa de amizade, Bertoli. Eu não quero um cachorrinho carente que corre atrás de mim o tempo todo. Eu quero um amigo.
— Rosete... Obrigado. – Ele sorriu como um anjo.
Um amigo tão fofo como ele não pode deixar pra trás. Sei que não nos conhecemos muito bem, mas sinto que eu lutaria e apanharia por ele.
— Bertoli.
— O que?
— Eu não lembro onde fica a sala. Pode me levar?
— Claro! É por aqui!
Deixei que ele me conduzisse pelos corredores. Tudo bem, eu menti que não sabia o caminho até a sala de aula, mas era a única maneira de deixá-lo feliz daquele jeito. Como eu disse, acabamos de nos conhecer, mas parece que seremos bons aliados e amigos no futuro. Mas, sobre o contato físico, deixemos que seja apenas um toque entre as nossas mãos. É cedo demais para pensar num abraço ou coisa parecida.
Ele me levou até a sala de aula, sempre com as mãos dadas. Marion falava com algumas meninas e pudemos ouvir muito bem elas dizerem:
— Oh, Meu Deus! É a filha do Fantasma da Ópera... Com o Bertoli Montecchio?!
— Eles estão namorando?! Nossa! Ela é rápida!
— Eles são tão fofos juntos!
— Coitado do visconde! Parece que ele perdeu de vez!
— Do que estão falando, suas idiotas?! Calem as bocas! – Perguntou Marion, impaciente.
— Desculpe!
Soltei a mão de Bertoli, que se sentou.
— E você, Fantasma irritante, vem comigo. – Ordenou enquanto caminhava até a porta da sala.
— Não quero.
— E eu não aceito ‘’não’’ como resposta. Vem logo.
— Aceite rápido que dói menos. Eu não vou.
O rapaz ficou impaciente. Ele se aproximou de mim e me puxou pelo pulso. Tentei me soltar, mas foi inútil.
— Solta esse pulso se não quiser perder o seu braço. – Falei seriamente, com o olhar mais frio que podia fazer.
— Então venha, porque eu quero falar com você.
— Fale aqui mesmo.
— Não. Temos companhia e essa conversa é particular.
Suspirei.
— Tudo bem. Vamos.
O jovem visconde sorriu, satisfeito por ter ‘’vencido’’ nessa briga.
Saímos da sala e encostei-me à parede próxima à porta enquanto ele ficou na minha frente.
— Pode falar.
— Sei que normalmente as pessoas tem medo de falar qualquer coisa que me incriminem para o diretor, mas sei que você é diferente, Fantasma. Por que aceitou a mentira com facilidade? Nem tentou se defender. Concordou comigo tão rápido que nem deu tempo para que eu raciocinasse algo.
— Adiantaria mentir? Além disso, era só para acabar com a palhaçada de uma vez.
— Está planejando alguma coisa, Fantasma?
— Tipo o que?
— Qualquer coisa contra mim.
— Nada.
Ele pareceu confuso e surpreso.
— Nada?
— Nada. – Repeti. – Posso ir?
— Hã...
— Rosete! – Simon Holmes apareceu não sei de onde e ficou entre mim e Marion. – Ainda bem que eu a encontrei! Preciso falar uma coisa muito importante...
— Não vê que estamos conversando, Holmes?! – Perguntou Marion, seriamente.
— E daí? – E voltou a sua atenção a mim. – Vamos?
— Claro. Assim que o visconde me liberar.
— Ele não precisa liberá-la. – E segurou a minha mão. – Eu a libero. Agora vamos?
— Hei! – Marion me puxou para si, fazendo com que as minhas costas batesse em seu peito, me tirando de perto de Simon. – Já estou cheio de você!
— Por quê? Eu apenas quero conversar com a minha colega de sala! Além disso, ela não o suporta... E nem eu.
— Detetive maldito!
Marion ia avançar contra o Holmes, mas eu o parei.
— Espera aí! Acabamos de sair da diretoria! Querem voltar pra lá?
— Não que isso faça diferença para o visconde. Ele sempre escapa dos castigos.
— Claro! A culpa sempre é de vocês!
— Tenho testemunhas que indicam que isso não é verdade.
Essa briguinha estava ficando bem chata...
— Simon, você não ia me contar algo? – Perguntei, atrapalhando a discussão.
— Claro. Vamos logo.
O rapaz de cabelos cacheados se afastou, esperando por mim. Eu avancei para segui-lo, mas...
— Espera... -... O Chagny me impediu ao segurar a minha mão.
— O que foi agora? – Perguntei já impaciente.
Olhamos-nos, no qual Marion não dizia nada, apenas analisava o meu rosto. Até que ele piscou duas vezes ao perceber que ainda segurava a minha mão e que não parava de me encarar.
— Hã... Essa conversa ainda não terminou. – Disse, me soltando e se afastando.
— Tanto faz. – Dei as costas e continuei seguindo Simon, que entrou na sala, sentou em seu lugar e eu no meu.
Antes de qualquer coisa, verifiquei se Bertoli estava bem. O loiro sorriu ao me ver e continuou a escrever sei lá o que em seu caderno.
— Sabe o que eu descobri? – Simon perguntou.
— O que?
— A Hyde é apaixonada pelo Nathan Gray.
— O que? Aquilo ali se apaixona? – Bertoli perguntou, surpreso.
— Bom... – Comecei... – Por baixo daqueles músculos, deve haver algum sentimento.
— Tá, mas pelo Gray?
— Quem é Gray mesmo?
— O filho de Dorian Gray.
— Ah sim!
— É. – Disse Simon. – Ela gosta dele. Aposto que podemos chantageá-la com isso. Podemos dizer que se ela bater em alguém de novo, nós espalharemos pra todos sobre esse fato.
— Tentador, mas não. – Falei.
— Por que não?
— Podemos torná-la nossa aliada.
— Aliada? A Hyde?
— Isso. Somente assim ela não encherá a nossa paciência e nem será mais a ‘’capanga’’ do Marion.
— Rosete, a Hyde é parceira do visconde há anos. Desde a infância, na verdade. – Disse Bertoli.
— E daí? Eu deixei pra trás as pessoas que conheci desde a infância lá em Paris e estou tranquila.
— Como você é fria...
— O fato é... – Disse Simon. – Como usaremos essa informação para atrair a Hyde para o nosso lado?
— Ora... Para um filho do famoso detetive Sherlock Holmes, você é muito lento.
— Olá, alunos. - O professor chegou.
— Farei um plano e contarei tudo amanhã.
Os rapazes concordaram, começando a pegar os seus cadernos e prestarem atenção na aula. O tempo passou, o professor saiu, conversamos mais um pouco... Marion não veio falar comigo nem mesmo para me provocar, o que é bom, e logo o professor chegou, uma nova aula começou, terminou novamente, e finalmente podíamos guardar os nossos materiais e sair da sala.
Já nos corredores, Bertoli e Simon me alcançaram.
— Então, Rosete? O que achou do primeiro dia aqui? – Perguntou o loiro.
— O que você acha? Eu briguei feio com um idiota, fui para a diretoria, descobri que só por você ter uma família de título nobre poderá mandar na escola e as aulas foram muito entediantes.
— Então foi...
— Foi bom para o primeiro dia. – Sorri.
— O que? Sério? – Bertoli perguntou enquanto Simon ria.
— Sério. Primeiro dia sem confusões é chato.
— Queria muito ver a reação do Fantasma da Ópera quando você contar isso pra ele. – Disse o jovem Holmes.
— E eu quero ver você contar para o seu pai que foi parar na diretoria.
— Eu não preciso contar. Com simples deduções, ele acaba descobrindo tudo.
Nós saímos da escola, parando até de frente da calçada.
— Bem... Eu preciso resolver uns assuntos antes de ir pra casa... – Disse Simon, que olhava em volta, como se procurasse por algo, mas logo fixou os olhos em algo e fez uma expressão de decepção. – Esquece... Lá vem a carruagem do meu tio.
— Onde? – Bertoli perguntou. Procuramos reconhecer uma carruagem, mas era impossível, já que todas eram pretas, sendo que só as cores dos cavalos é que as diferenciava um pouco.
— Seu tio é que vem buscá-lo? – Perguntei.
— Geralmente, é a minha mãe... Mas o tio Mycroft quer assegurar que eu não desvie do caminho de casa, que é o que eu sempre faço para poder fazer o trabalho do meu pai.
— Entendo.
— Tenho que ir. Até amanhã!
— Até!
Eu e Bertoli assistimos Simon se distanciar e entrar na carruagem, que começou a andar. Ela virou numa curva da rua e desapareceu.
— É melhor irmos também, Rosete.
— Claro.
— Hei, Garota Fantasma. – Eu suspirei bem fundo ao escutar a irritante voz do jovem Chagny. Virei-me para encará-lo. – Até amanhã!
Sua voz era em tom de provocação.
— Sério? Só isso? – Bertoli perguntou, desconfiado assim como eu.
— Eu vou fingir que nem ouvi. – Falei enquanto encarava o rapaz desaparecer na multidão de alunos.
Começamos a andar, escapando do tumulto que tinha na frente da escola.
— Nunca vi tantas carruagens desde a última ópera do meu pai.
— Acostume-se. Só há uma escola, então quase toda a cidade vai pra lá.
— Entendo. Como você está, Bertoli?
— Hã... Bem. Por quê?
— Estou curiosa. Você não sabe se defender?
— Não muito.
— Achei que o Romeu soubesse esgrimir. Não foi assim que ele lutou contra o Teobaldo?
— Nem me fale... Ele tentou me ensinar, mas eu sou muito ruim.
— Meu pai tentou me ensinar a tocar órgão... Mas eu também era muito ruim. Porém, eu estava decidida a me esforçar.
— Então?
— Agora eu sou uma profissional.
Ele riu.
— Eu quero tirar o Marion do poder, mas só será possível se alguém for maior que ele na nobreza. Eu não sou nobre.
— Nem eu. Muito menos o Holmes.
— Mas podemos enfrentá-lo.
— De novo? Você não já apanhou o suficiente por hoje?
— E estou disposta a apanhar mais se for para tirar aquele visconde mimado do poder. Mas não podemos mostrar os nossos pontos fracos.
— Eles me conhecem há anos. Sabem de todos os meus pontos fracos.
— Então faça uma armadura para que ninguém os atinja. No entanto, temos um pequeno problema.
— E o que é?
— Bertoli. – Eu parei de andar, fazendo o loiro parar também. – Hoje, eu estive disposta a arriscar, mas, se eu não fosse tão rápida, a Jasmine teria lhe ferido. Eles podem ser mais ousados nas futuras ameaças e nem sempre eu vou conseguir protegê-lo. Eu não quero abaixar a cabeça para nenhum daqueles idiotas e muito menos quero que você se machuque. E vê-lo desprotegido, sem saber se defender, é o meu ponto fraco.
— Eu não quero ser um fardo pra você...
— Então aprenda a lutar.
— Mas como?! Eu sou fraco! Mal consigo responder as provocações deles... Mal sei fugir direito!
— Eu posso lhe treinar.
— Hã?
— Meu pai me ensinou o suficiente para que eu pudesse cuidar do meu próprio nariz. Eu não vejo o porquê de não poder fazer o mesmo por você.
— Rosete... Eu não sei...
— Quer ser uma vítima a vida toda, Montecchio?
— Claro que não.
— Então, acho que você não tem outra escolha. – Continuei o meu caminho, sendo seguida por Bertoli.
— Mas... Como vamos fazer isso?
— Veremos depois.
— E quando começamos?
— Quando você quiser. Olha! Chegamos. – Paramos em frente a sua casa.
— Nossa! Eu nem percebi!
— Sai logo daí, seu verme! Esse lugar está reservado para o meu neto! – Escutamos uma voz de um senhor de idade.
— ‘’Seu neto’’? ‘’Seu neto’’?! – Outra voz de um senhor de idade.
— Papai... Por favor, agora não... – Agora era a voz de uma mulher jovem.
— Como você não percebeu? – Perguntei ao Bertoli.
— Pelo amor! O que eu devo fazer para ter um pingo de paz nessa família?! – O loiro perguntou, transformando a sua expressão angelical numa bem irritada. – Até amanhã, Rosete.
— Até.
Bertoli foi até a porta, a abrindo e gritando:
— Vovô! Quer parar de gritaria?!
— Bertoli! Como foi a escola?
— Não me venha com ‘’Como foi a escola?’’! O que está havendo?! – E fechou a porta.
Eu ri e continuei andando.
‘’Sou fraco’’? Acho que nem tanto, Bertoli. Vejo muito potencial em você. Aposto que, por fora, é um gatinho assustado, mas guarda um leão forte por dentro. E nós vamos libertá-lo, só assim você não será abusado por mais ninguém.
Eu não entendo. Nem o conheço direito, mas tenho tantos sentimentos em relação ao Bertoli. Não! Não é amor, muito menos um amor de namorados! Namorar o Bertoli seria o mesmo que namorar um irmão. E não é como se eu quisesse namorar alguém. Amor só fez o meu pai sofrer e, em nome desse sentimento, eu ganhei essa cicatriz que sangra toda noite. E é por isso que eu isso a máscara... Para esconder o que esse ‘’amor’’ fez comigo.
Por falar nisso, Jasmine Hyde está apaixonada por Nathan Gray. Ela tem aquela cara de valentona, mas deixou um sentimento ameaçar a sua reputação. Não sei como Simon conseguiu essa informação, mas ele acabou de me ajudar a provar que o amor pode ser uma arma bem perigosa.
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