Noemi estava deveras alarmada com a notícia que acabara de ouvir da boca de Mileena. Havia uma adoradora de Pravus infiltrada entre as Darphai e, de algum jeito, usou a rebelião do clã como fachada para um sacrifício em massa com o intuito de libertar Málgama, um monstro colossal com poderes avassaladores. A moça de manopla ainda desconfiava que, se essa irmã dela conhecia a história de Málgama, então muito provavelmente não cometeria os mesmos erros que os criadores do monstro cometeram, gerando a possibilidade de ela ter encontrado um jeito de controlá-la.

Noemi: Se essa sua irmã liberar Málgama... Sortiny será varrida do mapa. E isso será só o “aperitivo”. Você tem alguma pista do paradeiro dessa irmã?

Mileena: Não tenho... (Pior que eu nem perguntei isso a luva... Que mancada...)

Noemi: Ai ai... Eu sinceramente não sei o que fazer... Os sacrifícios já foram feitos, então só falta achar a chave... Se ela encontrar a chave, estaremos perdidos...

Mileena: Desculpe perguntar isso, mas como foi que o rei Lucky morreu? Ele saiu do castelo para lutar?

Noemi: Não, ele ficou no interior do castelo como para defender nossos filhos... Mas eu não sei direito o que aconteceu. Achamos que uma das Darphai se infiltrou no castelo e travou uma luta com meu marido... E ele acabou morrendo...

Mileena: Eu sinto muito mesmo...

Noemi: É, mas ela também não saiu viva da batalha. Rashu mencionou que encontrou o cadáver dela aqui no castelo...

Mileena: E ele disse como era a aparência dela?

Noemi: Ele não me disse. E eu também não perguntei nada... Eu devia ter perguntado, mas... De nada me adiantaria saber naquele momento... Só sentiria mais dor...

Mileena: Ah, não se culpe. Eu compreendo...

Noemi: O que eu mais gostaria de saber agora... O que realmente mais me incomoda nessa história toda, além da Málgama... É o que aconteceu com o meu filho, Pickie...

Mileena: Você disse que ele sumiu, não é?

Noemi: Sim... Ele simplesmente desapareceu. Ninguém o viu sair do castelo, nem para onde foi. E com a bagunça que aquela rebelião toda causou, não tínhamos como procurá-lo.

Mileena: E eu aposto que Ritchie não moveu um dedo para encontra-lo...

Noemi: Hmph... Ele o deu como morto. Disse que, se ele não havia retornado até então, é porque ele foi atacado por alguém; ou por uma Darphai ou por algum outro malfeitor... Mas... Se fosse o caso, já teríamos encontrado o corpo dele! Ninguém sairia matando-o por nada, ainda mais sendo ele um príncipe! Ele... Eu ainda tenho esperança de encontrá-lo um dia... Nem que seja nos meus últimos momentos...

Mileena entendia os sentimentos de Noemi e ela mesma também se sentia mal com isso tudo. Noemi também era uma vítima naquela história e até aquele momento sentia os flagelos do desespero afligindo seu coração. A moça de manopla já tinha a confiança da rainha-mãe e sabia que o sentimento era recíproco. Para ela, chegou a hora de revelar a Noemi o paradeiro de Pickie e da chave. Ela merecia saber.

Mileena: Minha rainha... Muito obrigada. Graças a você, descobri algumas coisas muito importantes.

Noemi: Igualmente, minha querida. Infelizmente, ainda não tenho ideia do que fazer; mas pelo menos ficarei mais alerta...

Mileena: Na verdade, tem uma coisa que você pode fazer, mas antes, há algo que eu preciso te contar também.

Noemi: Oh... Sendo assim, por favor. O que tem para me dizer?

Mileena: Eu havia te contado que recuperei o diário de minha mãe na casa de Aspo. Eu consegui decodifica-lo ontem. Para minha surpresa, descobri que minha mãe selou uma parte da consciência dela no diário... E ela me contou algumas coisas.

Noemi: Como é? Você... Viu Midea?

Mileena: Sim. Uma das coisas que ela me falou foi sobre o meu irmão mais novo. Esse meu irmão é adotado... Ele apareceu em minha vida no dia seguinte ao da rebelião.

Noemi: N-No dia seguinte? Você... Não está dizendo o que eu estou pensando o que é, está?!

Mileena: Me perdoe, alteza. Eu juro por Argenta; eu só descobri quem ele realmente era ontem de noite. O Purkeed, meu irmão mais novo, é o seu filho, Pickie.

Quando Noemi ouviu tal notícia, ela começou a derramar lágrimas enquanto mantinha a expressão de surpresa em seu rosto. De súbito, ela se pôs de pé, mas por causa de sua perna ruim, ela perdeu o equilíbrio e caiu para frente. Porém, Mileena a acudiu, impedindo-a de ir ao chão.

Noemi: Onde ele está?! Me diga, por favor! Onde ele está?!

Mileena: Alteza, acalme-se. Eu vou contar, mas você precisa fazer silêncio.

Noemi: Desculpe... Mas, por favor, escute o pedido dessa mãe aflita; me diga onde ele está! Se possível, me leve até ele! Eu juro que clamarei ao Ritchie por você!

Mileena: Alteza... Eu vou te levar até onde está, mas vou pedir pra que você mantenha o controle. Ele está aqui, em Gricai... Pra ser mais exato, em Al-Katrax.

Noemi: Al-Katrax?! O Ritchie... Ele prendeu o Pickie em Al-Katrax?! Por quê?!

Mileena: Ele está com a chave.

Noemi: O quê?! Está dizendo que... O Ritchie quer...

Mileena: É o que parece... Mas não se preocupe; Ritchie não tem como pegá-la. Está protegida por um Cadeado Mágico feito pela minha mãe.

Noemi: Ah... Isso explica porque ele está tão furioso... Mas aquele moleque... Ele sempre invejou o Pickie quando era pequeno... Ele quase deixou o Pickie morrer afogado uma vez. Pensei que a surra que ele levou do pai tinha lhe ensinado uma lição, mas...

Mileena: Olha, não vamos ficar remoendo essas coisas agora, tá bem? Você quer ver o Purkeed... Digo, o Pickie, não é?

Noemi: Ah... Sim, é claro! Mas o acesso às celas subterrâneas fica atrás do castelo. Somente eu, Ritchie e os Combatentes Reais tem acesso a elas.

Mileena: Então, será menos arriscado ir por fora do castelo. Se formos por dentro, maiores serão as chances de sermos vistas...

Noemi: Er... Mileena, posso dar uma sugestão melhor? Eu vou por dentro; você vai por fora e fique me observando. Quando eu chegar à entrada do acesso, eu faço um sinal para você.

Mileena: Hm... Talvez seja melhor fazer como você diz. Tá legal, eu te encontro depois.

Seguindo como combinado, Noemi pegou sua bengala e saiu do quarto, e Mileena se dirigiu à janela. Após invocar a Sexta Bênção para se ocultar com a escuridão da noite, ela desceu, tomando cuidado para não fazer muito ruído. Noemi foi até uma plataforma movida à magia que se encontrava no fim do corredor de acesso aos seus aposentos e desceu até o andar térreo. Tomando cuidado para não ser vista, ela saiu pelos fundos do castelo, se dirigindo em seguida para o acesso às celas subterrâneas. Esse acesso era, na verdade, uma entrada feita de pedras. Esta dava em uma pequena caverna encrustada em uma densa vegetação, a qual não permitia ver a parte externa da caverna. Os guardas que estavam naquela entrada viram Noemi chegar sozinha e julgaram estranha a sua vinda. Ela parou por um momento e deu uma espreguiçada, esticando seus braços ao máximo para cima. Mileena, que a observava do telhado, entendeu aquele gesto como sendo o sinal de que a rainha mãe falara e foi atrás dela. Noemi, então, se aproximou dos guardas, que se ajoelharam.

Guarda 1: Majestade!

Guarda 2: Vida longa a ti, rainha!

Noemi: Congratulo vocês pelo bom trabalho. Podem se levantar, por gentileza.

Os guardas prontamente obedeceram à rainha-mãe e a indagaram sobre sua vinda. Embora não parecesse, Noemi estava cada vez mais nervosa.

Guarda 1: Em que devemos a sua visita, minha rainha?

Noemi: Eu estou precisando falar com o prisioneiro que está em Al-Katrax. Portanto, por favor, deixem-me entrar.

Guarda 2: Er... Minha rainha, nos desculpe, mas... Não estamos autorizados a deixar que vá até aquela cela.

Guarda 1: O rei nos proibiu expressamente a entrada de toda e qualquer pessoa, excetuando a ele mesmo. Ele foi bem explícito em não te incluir como exceção também. Não concordamos com isso, mas...

Guarda 2: Ele nos ameaçou com a forca, minha rainha. Por favor, tenha piedade de nós.

Noemi: Ai ai... Aquele garoto...

Naquele exato momento, um dos guardas sentiu um forte impacto no pescoço e caiu desacordado. O outro guarda, quando viu o seu colega cair, começou a olhar em volta, procurando o perpetrador, mas não via ninguém. Logo depois, ele mesmo também sentiu um impacto no pescoço e desmaiou. Então, Mileena, ao desativar a bênção, se revelou.

Noemi: Espero que ninguém os veja assim... Senão, o meu filho idiota vai saber e...

Mileena: Depois você cuida disso. Precisamos ir.

Noemi: Sim, vamos lá.

A moça de manopla e a rainha-mãe entraram na caverna. A caverna era realmente pequena; tinha o espaço interno de uma cabana. Havia um quadrado de múltiplos contornos na porção central do chão e também, ao lado desse quadrado, uma pequena coluna quadrangular de granito.

Noemi: Essa coluna mágica autoriza o transporte até as celas. Somente a família real e os Combatentes Reais são reconhecidos por ela. Se fosse qualquer outra pessoa, ela simplesmente não funcionaria. Ou seja, mesmo que saiam vivos das celas, os prisioneiros ainda ficam encurralados nos caminhos subterrâneos.

Mileena: Chances de fuga virtualmente nulas... Engenhoso.

Ao impor a mão sobre a coluna, Noemi citou o nome da cela para qual iria, Al-Katrax, e a coluna se ativou. Noemi e Mileena se posicionaram no centro do quadrado e logo desapareceram.

Pouco depois...

Purkeed: Hã?

Purkeed estava dormindo em seu colchonete de palha, mas acordou quando percebeu que havia gente bem diante dele. Eram duas mulheres, sendo que uma delas segurava uma tocha acesa. A que segurava a tocha estava sorridente; a outra não conseguia conter as lágrimas. Ele logo reconheceu a mulher que segurava a tocha.

Noemi: É ele... É ele mesmo... Chuif...

Mileena: É. É ele sim.

Purkeed: Irmã Mileena?! O que está fazendo aqui?!

Mileena: O que você acha, bobo? Vim te tirar daqui. Ou vai me dizer que gostou desse fim de mundo aqui?

Purkeed: Eu não! Esse lugar me dá muito medo... Sem contar também que, se dependesse daquele rei, talvez não saísse vivo daqui.

Noemi: Aquele moleque... Ele não te machucou, foi?!

Purkeed: Ele me bateu com o cetro na cabeça ontem. Ele tentou tirar alguma coisa do meu peito... Ele disse que era uma chave; não entendi nada do que ele falou... Aí, quando viu que não conseguiu, ele se enfureceu e me bateu. Por pouco, ele não me deu uma surra...

Noemi: Desgraçado! Eu devia... Eu devia...

Mileena: Alteza, controle-se, por favor...

Purkeed: Er... Irmã Mileena, quem é ela?

Noemi: Você não me reconhece?

Mileena: Ele tem amnésia. Quando ele foi resgatado, ele não se lembrava nem do próprio nome.

Purkeed: Espera... Eu acho que eu me lembro de você...

Noemi: S-Se lembra de mim?!

Purkeed: Eu... Essa noite eu tive um sonho. Nesse sonho, eu vi uma silhueta. Não consegui ver o rosto, mas a silhueta era igual a sua.

Noemi: Ah...

Mileena: Purkeed... Esta mulher aqui é a Noemi. Ela é a mãe do rei Ritchie.

Purkeed: A mãe do Ritchie? Espera... Ritchie disse que eu era irmão dele... Então...

Mileena: Esta moça aqui é a sua verdadeira mãe.

Purkeed: Minha... Mãe?

Bastante comovida, Noemi não se conteve e, largando a bengala, caiu de joelhos diante de Purkeed e lhe deu um abraço apertado e caloroso, seguido de vários beijos no rosto dele, e chorava em voz alta. Purkeed, embora estranhasse a situação, se sentia acalentado com aquele abraço.

Noemi: Eu senti tanto a sua falta! Não faz ideia de como senti! É como se eu estivesse dando a luz a você de novo! É o dia mais feliz da minha vida... Chuif...

Purkeed: Eu... Er... Nem sei o que dizer... Eu queria me lembrar de mais coisas, mas...

Noemi: Ah, meu filho... Você vai lembrar. Eu sei que vai. Não se pressione, tá bom?

Purkeed: Está bem... Erm... Mãe...

Noemi não conseguia conter tanta felicidade e também mal sabia o que dizer naquele momento; só sabia mesmo se expressar mantendo o abraço. Mileena também estava feliz, embora tivesse várias dúvidas sobre como seria as situações seguintes a essa descoberta. Porém, Noemi se ergueu e acabou interrompendo os pensamentos da moça de manopla. A rainha mãe se levantou e se dirigiu sua companheira.

Noemi: Mileena... Você hoje tem a minha eterna gratidão. Você é mesmo uma discípula autêntica de Midea. A mesma confiança que ela tinha, eu pude encontrar em você. Por isso, muito obrigada!

Mileena: Eu é que agradeço por ter acreditado em mim. Eu esperava reações mais cautelosas quando fui até você, mas tudo foi melhor do que eu esperava. Eu estou muito contente... Por você e pelo Pickie também.

Purkeed: Er... Irmã Mileena... Será que você pode continuar me chamando de Purkeed?

Noemi: Por quê? Não gosta do seu nome verdadeiro?

Purkeed: Não é isso. É que... Soa bonito quando Irmã Mileena me chama de Purkeed...

Mileena: Heh... Se você insiste, por mim, tudo bem... Purkeed.

Purkeed: Bem melhor. Obrigado, irmã.

Noemi: Hahaha! É tão bonito ver momentos assim... Infelizmente, vamos ter que interromper esse momento por agora. Não podemos permanecer aqui.

Mileena: Sim. Mas temos que decidir onde Purkeed vai ficar depois de sairmos daqui. Ele precisa ficar em um lugar seguro.

Noemi: Nem precisa pensar nisso. Ele vai com você.

Mileena: Comigo? Tem certeza?

Noemi: Se Pickie ficar aqui, Ritchie certamente vai assediá-lo. Talvez, se perder o controle de si, ele pode descontar a fúria no irmão e até matá-lo. Ele estará mais seguro com você.

Mileena: Bom... Por mim, tudo bem. Mas você acabou de encontrá-lo. Seria bom se passassem um tempo a mais juntos...

Noemi: Eu sei... Me dói ter que deixar ele embora assim, mas é preciso. Não se preocupe comigo; só de saber que meu pequeno Pickie está vivo e bem já me alegra muito. Só peço que, quando possível, me mande notícias dele, tá bom?

Mileena: Deixa comigo. Não vou decepcioná-la, alteza.

Então, ambas as mulheres e o menino se dirigiram para fora da tenebrosa prisão e foram para a sala de teleporte para voltar à superfície. Quando voltaram, porém, Mileena teve uma sensação ruim. O motivo ficou evidente tão logo saíram da pequena caverna: Dezenas de soldados faziam um cerco a poucos metros da entrada. O líder deles era ninguém menos que o principal Combatente Real e, com seu típico aspecto indomável, deu sua explícita ordem.

Rashu: Afasta-te de nossa rainha, Mão de Pravus.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.