Medo. Ele tinha medo de perder Rey. Um medo assustador e visceral. Se ela soubesse da verdade... que era ele o responsável por matar Ben Solo... Só aquela mera possibilidade o fazia quase sufocar.

Como um monstro poderia amar algo cheio de vida e bom como Rey? Mas, ele amava. Amava apesar de todas as suas memórias, apesar de tudo o que seu lado racional lhe gritava, apesar do seu pecado.

Rey era a pessoa mais importante para ele. Ela não era somente a razão para ele viver. Rey era a razão de sua vida. Ela era o motivo pelo qual precisava sobreviver. Só o pensamento de que poderia perdê-la, deixava-o completamente destruído. Não suportaria ver o olhar de repulsa e acusação dela. Aquilo o aniquilaria.

Aninhou Rey entre seus braços. Ela havia adormecido em seu colo. Todos aqueles sentimentos que a atormentavam, por alguma razão, não lhe eram desconhecidos. De alguma forma, sabia que já havia sentindo e vivido tudo aquilo antes, mesmo que não encontrasse nenhuma lembrança específica em seus fragmentos caóticos de memória. A sensação de abandono, de que pessoas que deveriam cuidar dele haviam o deixado eram vividas nele. Ele e Rey compartilhavam muitos sentimentos semelhantes, assustadoramente semelhantes. Por isso, a compreendia tão bem.

Com cuidado, carregando Rey entre os braços, ele deixou a floresta. A noite havia caído completamente sobre eles, era preciso um certo cuidado para não tropeçar nas pedras, galhos e outros obstáculos que encontrava pelo caminho.

Colocou Rey com delicadeza em cima da cama e deitou-se ao lado dela. Estendeu o cobertor sobre eles. Ela tinha uma expressão tensa mesmo dormindo, o cenho franzido, como se estivesse sofrendo. Passou a mão levemente sobre o cenho, desfazendo a ruga. Envolveu-a em seus braços, trazendo-a para seu peito. Gostava daquela sensação, tê-la assim tão perto de si, era quase como se pudesse desfrutar de um pouco de paz. O corpo quente de Rey junto ao seu era como um pequeno sol indicando que a vida ainda era possível.

Não queria pensar no que fizera no seu passado como Kylo Ren nem no fato de que ele a fizera sofrer, era por causa dele que aquele cara havia deixado de existir... Ele havia retirado a vida do homem que Rey amava. Nunca se perdoaria por isso. Nunca se perdoaria por tê-la feito sofrer. Nunca.

Ele era um ser egoísta e desprezível por se manter ao lado dela mesmo tendo cometido aquele crime, um dos piores possíveis. Porém, precisava de Rey tanto como seus pulmões precisavam do oxigênio. Sua punição por ousar querer algo que não deveria era a culpa. A culpa que estava o corroendo cada vez que respirava.

Uma lágrima escorreu por sua face. Uma lágrima salgada e amarga.

Mas, se ele iria ousar continuar percorrendo aquele caminho, precisava... precisava focar no futuro, deixar o passado morrer, matá-lo se necessário, só assim ele poderia permanecer ao lado de Rey.

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Rey acordou com o barulho de metal. Ela demorou um momento para situar-se, sua mente ainda estava naquele estado semi-inconsciente de quem desperta de um sono profundo. Estava no quarto de Ben. Devia ter adormecido no colo dele, na floresta, e ele a carregara até lá. Não sabia que horas eram. Poderia ter dormido por apenas alguns minutos ou horas. Ben se mexeu ao seu lado. O barulho aumentou e ele despertou também.

Ben olhou para ela. Quando seus olhos se encontraram por um instante parecia que tudo ao redor girava em câmera lenta e o mundo exterior perdia a sua importância.

— Rey... — ele disse baixinho. Havia uma espécie de sortilégio no modo que ele pronunciava seu nome.

Ela levou a mão até a face dele e sorriu, sentindo na ponta dos dedos a textura da sua pele, sua temperatura.

Ben aproximou-se um pouco mais dela, o suficiente para que seus narizes se tocassem, suas respirações se encontravam, se misturavam. Ele apertou a mão dela na sua, segurando-a contra sua face, acariciou-a levemente, fazendo pequenos círculos com o polegar sobre o dorso. Rey podia sentir uma pequena eletricidade emanando dos dedos dele para a mão dela.

— Rey? — A voz de Poe chegou antes do que sua pessoa. — Yuri?

Ela ainda estava embriagada de sono. Se afastou um pouco de Ben e levantou a cabeça, o suficiente para ver a porta do quarto.

— Ah, vocês estão aí! — disse Poe, abrindo a porta e entrando no quarto sem o menor pudor.

— O que foi? — perguntou ela, ou melhor, resmungou, esfregando os olhos.

— Encontramos uma base da Primeira Ordem! — anunciou ele, com uma voz excitada. — E parece ser a base principal! A coisa é grande!

— Como? — disse Rey, tentando processar aquela informação. — Uma base da Primeira Ordem?

— Isso mesmo! A gente tá indo para lá agora! O que vocês estão esperando? Levantem deste ninho do amor e vamos partir para cima, meus amigos! — Poe mal terminou de falar e saiu do quarto.

Ela levantou-se da cama, com movimentos ainda lentos calçou as botas e deu uma ajeitada na roupa que estava um pouco amassada, enquanto ganhava tempo para seu cérebro trabalhar sobre aquelas novas informações.

Primeira Ordem... o que eles estavam planejando exatamente? Tinha certeza que Palpatine possuía relação com aquilo. Só pensar nisso um calafrio percorreu seu corpo. O encontro entre eles era inevitável, mas ainda não estava preparada para encará-lo frente a frente novamente.

Olhou para Ben, que também havia se levantando da cama. Ele estava calado e com um olhar alheio, parecia fazer gestos mecânicos.

— Posso ir com você?

Rey hesitou por um momento. A história dele com a Primeira Ordem não era das melhores. E agora ele não estava mais na Força. Bobagem, ele ainda era Ben, conectado à Força ou não.

— Claro — assentiu ela.

Tudo ocorreu rápido. Quando Rey deu por si, estavam em uma nave a caminho de um pequeno planeta e depois recebiam instruções de como agir.

O planeta era rochoso, quase sem nenhuma vida, muito diferente do seu belo vizinho Búri. Toda a paisagem era monótona. Nada além de gigantescas cavernas rochosas. Não havia nenhuma vegetação no lugar, nenhuma sombra de vida.

Vários caças faziam a segurança área, Rey optou por fazer parte da equipe que iria invadir as cavernas em que a Primeira Ordem havia se instalado. Eles não eram muitos. Porém, tratando-se da Primeira Ordem, o melhor não era arriscar, eles continuavam perigosos e ardilosos. Eles haviam sobrevivido por três anos sendo caçados por toda a galáxia, um feito que não deveria ser desprezado.

— Me dê cobertura — disse ela a Ben, dando-lhe um blaster.

Ele assentiu, segurando a arma com um jeito familiar de quem sabia muito bem o que estava fazendo. Podia ter perdido sua memória, mas seu corpo não, pensou ela. E ele era muito bom com um blaster.

Rey ligou seu sabre e correu em direção a um pequeno grupo de stormtroopers. Bem correu ao seu lado, dando lhe cobertura. Não era preciso que nenhuma palavra fosse trocada entre ambos para que pudessem se comunicar. A sintonia entre eles no campo de batalha não havia se alterado. Nunca haveria um parceiro melhor para ela do que Ben. Lembrou-se de quando enfrentara a guarda pretoriana ao seu lado, de como eles se moviam em sincronia. Agora, ainda que não pudessem mais se comunicar pela Força, seus corpos continuavam a se mover de forma sincrônica e familiar.

Os golpes do sabre acabaram rapidamente com o grupo de stormtroopers e ela correu para ajudar as outras pessoas. Ben sempre lhe acompanhando, atirando e deixando seu caminho livre.

— As coisas são complicadas por aqui, não? — disse ele, desviando-a de um tiro.

— São — falou ela, jogando com a Força um stormtrooper que mirava em Ben.

Os dois correram em direção a entrada de uma grande caverna. Mais stormtroopers os aguardavam. Rey acertou um deles com o sabre, enquanto jogava o outro contra a parede. Ben acertou outro.

— Você realmente é bom com o blaster — elogiou ela.

— Eu me viro.

— Ótima maneira de se virar.

— Vocês dois aí! — gritou Poe. — Chutem o máximo de bundas que puderem!

— É o que estamos fazendo — respondeu Ben, derrubando um stormtrooper com um soco.

Rey sorriu, ele nunca deixaria de utilizar os punhos em suas lutas. Havia coisas que nunca mudariam.

Os três entraram na caverna. Havia uma equipe lá dentro, Rey estava encarregada de dar cobertura.

A equipe saiu, segurando um homem.

Rey arfou.

Os cabelos dele estavam grandes, e completamente desalinhados, uma barba de semanas crescia naquela face. Ele estava totalmente diferente do General que ela conhecera. Porém, jamais iria confundi-lo, aqueles cabelos continuavam tão ruivos como o de suas memórias.

— General Hux? — disse ela, cheia de espanto, mal acreditando no que seus olhos viam.

Um sorriso se formou nos lábios dele de desprezo e ironia.

— É, aqui estou eu, sucateira — falou ele, de modo desdenhoso.

— Mas, você não havia morrido? — falou Poe, não menos perplexo do que Rey. — Por que as pessoas por aqui nunca morrem de fato? Qual é o problema?

Hux se limitou a soltar um som indecifrável, uma espécie de grunhido e risada.

Às vezes, o passado era impossível de matar.

Os olhos do ex-general da Primeira Ordem caíram sobre Ben. Rey não gostou nenhum um pouco daquele olhar. Ela se colocou entre Ben e Hux, olhando para este com uma expressão desafiadora.

Hux sorriu sem retirar os olhos de cima de Ben.