É três da manhã (ou talvez mais tarde, mas ela não sabe). As estrelas estão cintilantes, o barulho da chuva ecoa pela cidade de Kyoto, e Kumiko Oumae tem sua face pressionada contra a frieza da janela. Protegida por muitas camadas de grossos cobertores, a figura da adolescente descansa, em pé, apoiada no vidro. Seu rosto é iluminada pela luz da lua, e ela fita com certo cansaço silencioso a rua vazia de seu apartamento.

Tem um copo quase vazio de leite quente ao seu lado, mas ele não estava ajudando em nada em trazer seu sono de volta. Pelo contrário, provavelmente a mantinha mais acordada ainda. O céu aparentava estar nublado (não que o escuro da noite deixasse fácil de distinguir um céu nublado de um céu normal), e Kumiko solta um longo, longo suspiro.

A casa está silenciosa, e naquela hora, a garota não sabia se tinha o direito de chamar um lugar tão estrangeiro de "casa".

O frio vindo de fora lhe dá um certo tipo de conforto, mas ela controla o impulso de soltar as cobertas que usava como capa. Seu medo mudo do escuro havia completamente se esvaído naquele momento, e ela era completamente consumida pela noite. Ouvia o ecoar do silêncio, se é que isso faz algum sentido, e tudo aquilo parecia surreal — parte de si acreditava que não estivesse mesmo acontecendo.

O familiar vibre do seu celular foi o que a "acordou" do sonho inconsciente. Kumiko foi rápida em dirigir o olhar para o dispositivo, que continuou a pular em sua cama. Um baixo toque de telefone conseguia ser escutado pelos ouvidos mais atentos, mas Oumae foi rápida em extinguí-lo.

— Alô.

Silêncio.

— Boa noite. — soou uma voz do outro lado, igualmente baixa, e a adolescente levou menos que um segundo para reconhecer a dona do som.

Ofegou, como se perdesse o ar. — Reina.

— Boa noite. — repetiu o outro lado da linha, dessa vez de modo a confirmar as palavras da moça. Kumiko formou um sorriso ao tentar imaginar Reina Kousaka, acordada, três horas da manhã, ligando para ela (ela, de todas as pessoas!).

Por alguns segundos, não se ouviu nada. As mãos de Kumiko estavam suadas, e ela mexia com as pontas do cabelo, ansiosa. — Por que você me ligou...? — resolveu tomar a iniciativa, e sentiu-se suar ainda mais. Seu quarto aparentava estar repentinamente mais abafado do que antes.

— Está meio tarde, e eu queria conversar com alguém. Eu sabia que você estava acordada, então eu te liguei.

Oumae mostrou um sorriso. — Por acaso você está me stalkeando ou alguma coisa?

— Não. Eu senti que você estava acordada, e realmente estava. — houve uma pausa prolongada, e Reina parecia estar encarando a janela também. — Estamos conectadas. Tenho certeza disso.

Por um instante, o mundo parou. Kumiko Oumae alargou o sorriso, e fechou os olhos, deliciando-se no momento. Se sentia infinita. A noite lhe sugava cada vez mais e mais, assim como o mistério que era Reina Kousaka.

Seu quarto se esfriou novamente. O relógio continuou a bater. Ela fechou as cortinas, e voltou lentamente para a cama. Nenhuma das duas falou nada, mas o silêncio trazia um tipo de aconchego cheio de segurança.

— Acho que eu vou dormir. — declarou Kumiko, por fim.

Reina parecia ter assentido. — É, eu também. Boa noite. Durma bem.

— Você também.

O telefone desligou, e Kumiko estava mais acesa do que nunca.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.