– Espero que haja uma explicação para isto. – Esmeralda dirigiu-se a Martin, ainda assustada.

– A senhorita é, com certeza uma Pura. E seguindo as descrições que pude ouvir ao longo da vida, é uma das três jóias de Selenia, embora não tenha certeza de qual delas. – A principio Martin não queria contar o motivo por capturar a princesa, mas era contra seu código de honra capturá-la sem mais. - Rei George de Selenia, seu pai, nos traíu, a mim e ao meu pai... A culpa foi dele... – Sentia o choro, que até agora estivera preso na garganta, lutar para chegar, mas o engoliu de volta. Precisava ser forte e enfrentar seus inimigos. Já não era mais um garoto. Era Martin Türin de Solaris, o Rei Sob o Sol. – Princesa, você está sendo capturada pela Ordem do Sol, de Solaris, e será mantida em meu poder, o Rei, até que seu pai, Rei George Magliare de Selenia pague por sua traição... E ele pagará... – Era difícil dizer aquelas palavras tão duras à uma donzela tão bela e que aparentava tamanha pureza, mas sabia que aquela beleza não passava de feitiçaria daquele povo místico de Selenia.

– Sir Kiousuke... – Disse Esmeralda num fio de voz que se esforçou para usar, pois o medo havia tomado conta de cada musculo.– Faça!

Kiousuke sacou por inteira sua espada e imobilizou ao Príncipe pelo pescoço com o braço livre. Todos na taverna olhavam, mas nada faziam. Pareciam assustados, ou simplesmente não se importavam com o que acontecia a sua volta. Martin golpeou com o cabo da espada, o quadril direito de Sor Kyousuke, que o segurava com o braço esquerdo, mas não houve nenhuma reação, pois estava protegido pela armadura, então Martin tentou curvar-se para a frente, tentando, com algum impulso jogar Kyousuke ao chão, porém ainda não obteve sucesso algum, pois o monge, além de pesado, carregava uma armadura que quase dobrava seu peso.

– Martin Türin de Solaris. Você está sendo capturado sob a acusação de rapto de Princesa Safira Magliare, A Primeira joia de Selenia. Devolva-me minha irmã inteira, ou eu mesma terei o prazer de sufocá-lo com uma corda virgem até que não haja mais ar seus pulmões e nem vida em seu ser. – Esmeralda pensou todo o caminho nas palavras mais cruéis a se dizer a qualquer um que tivesse raptado sua irmã. Aquelas eram verdadeiras, sim, no entanto lhe doía muito dizer a alguém que perdeu tudo e que parecia tão desnorteado. Algo lhe dizia que ele não havia a sequestrado... no entanto ele havia acabado de tentar raptar também a ela.

– Alteza, acredita realmente que este é o responsável pelo rapto de sua irmã? – Disse Kiousuke, sem tirar os olhos de Martin, que não parava de se bater, um segundo.

– Haverá um julgamento em Selenia. No entanto, primeiro ele vai me contar aonde está Safira. – Respondeu Esmeralda, com o queixo erguido, e num rodopio das saias, que agora estavam sujas e rasgadas, retirou-se, exausta do dia.

– Quem é Safira? Do que está falando, sua bruxa alada? – Esbravejou Martin, ainda tentando com todas as forças desvencilhar-se de Kiousuke.

Então lembrou-se de Rax e assobiou. Segundos depois o grifo adentrou a taverna grasnando. O som fez com que Esmeralda voltasse aos tropeços, afim de ver o que acontecia. O grifo afastou Sor Kiousuke de Martin empurrando-o com o bico e deu-lhe uma patada que fez com que caísse por cima de uma mesa, quebrando-a na parte em que fora atingida. Esmeralda soltou um grito histérico ao ver a cena.

– Pare este monstro – Gritou a Martin, que respondeu com um olhar desafiador e nada mais.

Vendo que não obteria ajuda nenhuma do príncipe nada galante dono do grifo, Esmeralda correu ao socorro de Kiousuke, e jogando-se por cima dele protegeu-o contra a segunda garrada do animal, que feriu boa parte de suas costas e até suas asas, além de ter causado um impulso que fez com que caísse por cima do monge. A dor foi tanta que Esmeralda sentia-se zonza e Sor Kiousuke parecia muito preocupado.

– Rax, já é o suficiente! – Disse Martin, em desespero quando viu a princesa pôr-se a frente daquele monge gigante, que não precisaria de proteção nenhuma com aquela armadura. Rax tentou parar o golpe quando viu a princesa, mas era tarde. Quando conseguiu parar ela já jazia por cima do cavaleiro. – Princesa estúpida. O que te deu para fazer uma coisa dessas?! – Esbravejou o príncipe, sentindo-se fraco por ter parado os ataques do grifo apenas por que a vitima tratava-se de uma mulher.

– Ela está desacordada. – Disse Kiousuke, que havia sofrido poucos ferimentos, apesar da força do grifo, levantando-se pesadamente, por causa da inflexibilidade da armadura que era o motivo pelo qual se feriu pouco. No entanto a princesa, que devia ser sua protegida, jazia agora de olhos fechados e corpo totalmente imóvel em seu colo. O temor de que ela houvesse falecido o afligia muito. Especialmente pelo fato de ter sido para protegê-lo.

Quando Rax se aproximou da princesa, visivelmente pesaroso e cuidadoso, Kiousuke permitiu que ele a visse. O grifo parecia gostar da donzela. Não poderia culpá-lo. Quem não se encantaria com aquela beleza angelical? Martin, para sua surpresa, também se aproximou, mais cuidadoso do que o grifo e com um olhar preocupado. Depois que o grifo adentrou a taverna, todos dentro dela passaram a prestar atenção á movimentação deles.

– Ela não está morta, tolos. – Disse um homem vestido de preto, o qual ninguém havia percebido a presença, até o momento. Ele trajava um manto com capuz que escondia boa parte do rosto, era magro e de pés leves.

– Como sabe? Não se parece em nada com um clérigo. – Disse Martin, levantando-se para encarar o rapaz.

– Ela é uma pura... uma das três jóias. Elas não morrem fácil, eu mesmo me meti em uma briga com a outra que esteve por aqui e consegui uma bela de uma cicatriz nas costas. Mas valeu a pena...

– O que fez com Safira? – Perguntou Kiousuke, visivelmente alterado.

– Isto é um coração partido? – Ele pôs as mãos sobre o tórax, fazendo uma encenação exagerada de surpresa. – Mas é claro que é... – sorriu.

– Diga-me. O que fez a Safira? – Insistiu Kiousuke, o que deixou Martin curioso, pela forma de tratamento que usava para se referir a ela, totalmente informal.

– Aquela preciosidade saiu daqui há uns dois dias. Estava apenas de passagem e a conheci. – Ele tomou Esmeralda nos braços e com uma varinha tirada de dentro de seu manto, fez um movimento que resultou em uma luz, e Esmeralda abriu os olhos. – Tentei leva-la de volta a seu país, mas o que ganhei, ao invés da recompensa, foi isso. – Ele tirou o capus, abriu o gibão bordado que trajava e levantou a camisa de linho na parte de trás, mostrando uma enorme cicatriz nas costas, que não era profunda, mas longa.

– O que aconteceu? – Disse Esmeralda, ainda acordando.

– Milady... Temos noticias de sua irmã...

– Quais? – Esmeralda esforçou-se por levantar-se rápido mas sentiu tontura, então apenas sentou.

– A notícia de que não fui eu quem a sequestrou! – Disse Martin, oferecendo a mão, para ajudar Esmeralda, que ignorou o gesto, segurando-se em Kiousuke, que logo a ajudou a pôr-se de pé.

– Isso é verdade, Sor Kiousuke? – Perguntou, ainda tonta.

– Sim, e parece que há muito mais o que descobrir. – Kiousuke direcionou um olhar carrancudo para o jovem, que parecia ser um feiticeiro.

– Quem é o senhor? Muito obrigada por ajudar-me – Esmeralda fez uma mesura, segurando-se em Kiousuke.

– Sou Jaime. E você é Esmeralda. A terceira jóia de Selenia. É realmente um prazer conhecê-la. É difícil demais dizer qual das três é a mais bela.

– Depende do que é beleza para o senhor. Rubi é a mais bem intencionada e inocente. – Era difícil ser cortês com a cabeça girando, mas precisava ser. Ele a havia curado, sem nem a conhecer.

– Depende do que são boas intenções para a alteza. Seu pai, por exemplo, com boas intenções traiu um aliado e foi responsável pela desolação de um reino inteiro. As intenções eram boas no que diz respeito ao seu povo, mas no que diz respeito ao povo deste rapaz, foram péssimas intenções. – Fez um leve aceno para Martin – Entende o que quero dizer? Tudo depende de um ponto de vista. – Sorriu. Um sorriso que a Esmeralda lembrou muito a zombaria de Argentus, o Dragão de Prata que extorque seu reino, atualmente. – O importante é saber que do lado de fora, existem coisas mais urgentes do que um reino que se perde, com todo respeito à família Türin de Solaris. Existem dragões que em pouco tempo devastarão tudo por onde passam, se algo não for feito. E não escondem isso de ninguém. Eles querem tudo para eles. Quando conseguirem todo o ouro que querem explodirão esses reinos. E isto não é uma simples teoria. Gostaria muito de lutar contra eles, mas não encontro ajuda, exceto por vocês – Agora o sorriso era seco, mas preenchia boa parte de seu maxilar.

– Do que, exatamente está falando? – Disse Martin, que logo se interessou pelo assunto, apesar do individuo não oferecer confiança alguma.

– Estou falando de vingança, não só para você, como para todos os Deuses. Se me acompanharem, poderei explicar com mais clareza. Aqui é muito movimentado. – Fez um aceno com as mãos – Estalajadeiro! Quanto devemos?

– Três peças de ouro, com a mesa, que quebrou. – Disse o homem gordo, com uma faça de poda preso ao cinto que envolvia o avental sujo ao qual trajava.

– Primeiro as damas – acenou para o lado graciosamente, sinalizando o local por onde ir para Esmeralda, que consentiu, seguida por Kiousuke, seguido por Martin, que não via Rax desde que Esmeralda acordou, mas deduziu que o mesmo estivesse caçando. O animal não suportava o ar da taverna.

Esmeralda, Kiousuke e Martin seguiram por ruas cheias do pequeno país da Sanúbia. O mercado era muito movimentado, junto ao cais, mas cheirava a peixe podre e a todas as impurezas que podia-se esperar de um lugar tão cheio.

– Sei que seus belos reinos cheiram melhor, mas acreditem, este é o menor dos nossos problemas. – Ele fez um leve aceno para uma portinhola no meio do mercado que dava para uma pequena cabaninha de madeira, que mais parecia uma caixa. Todos entraram, sem reclamar.

O cheiro no lugar era diferente. Era como velas perfumadas e tintas de escrever. Além do cheiro, o lugar era visualmente diferente também, com cortinas cor de marfin e estantes abarrotadas de livros. Era tudo estranhamente suntuoso e grande. Sim, o lugar era muito maior do que parecia ser. Havia um ancião sentado trajando roupas de mago, com um enorme volume com capa de couro sobre as pernas, o qual fechou quando viu os jovens entrarem.

– Kiousuke, Esmeralda, Martin, Jaime... Está faltando um... – Disse o senhor, olhando para Jaime com um olhar um tanto inquisidor.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.