Rebel Rebel

1. This is where we belong, this is where we long to be


O dia começou cedo em Storm Hills. Às sete horas da manhã já era possível ouvir o som de diversos cortadores de grama nas perfeitas casas alinhadas. Vizinhos se cumprimentavam, mulheres faziam o café da manhã e as lojas eram abertas. A partir desse horário, os despertadores começaram a tocar nos quartos dos jovens da cidade.

Reyna Ramírez ouviu o pequeno relógio tremer e começar seu toque insistente. A garota, ainda sonolenta, apenas bateu nele para que parasse, e foi o suficiente. Apesar de acordada, não fez questão de levantar tão cedo. Costumava fazer isso sempre, e não ligava para o horário que chegaria na escola. Ouviu o barulho da chaleira no andar de baixo, o que significava que estava suficientemente atrasada.

O tempo voou enquanto ela colocava suas roupas e passava sua maquiagem pesada. Os coturnos adornaram seus pés segundos antes de ela descer as escadas. Como sempre, levava em suas costas uma pequena mochila com materiais para anotações e suas coisas pessoais.

– Ah, resolveu levantar então. – Hylla disse, escorada na bancada, com a xícara de café recém-passado entre os dedos. Usava, como de costume, um vestido rodado – desta vez, amarelo – que combinava perfeitamente com o pequeno laço preso à sua trança embutida, e seus sapatos brancos. Reyna sorriu, cínica.

– Bom dia, maninha. – pegou duas fatias de bacon que estavam quase frias, dispostas em um prato no balcão. Mordeu uma delas e saiu sem dizer uma palavra.

O sino da porta de entrada tocou assim que a garota passou por ela. O ponto de ônibus do outro lado da rua estava vazio, e Reyna seguiu até lá. Ficou em pé, esperando seu meio de transporte enquanto encarava o esmalte preto das unhas compridas e perfeitamente pintadas. Levou apenas um minuto para que ele chegasse. Ela subiu, se sentando e terminando de comer seu último pedaço de bacon. Em cerca de dez minutos estava chegando na frente da escola.

A questão é que ser quem era trouxe muitas coisas para a vida de Reyna. Trouxe liberdade, trouxe desprezo, trouxe ódio, trouxe pessoas novas, e trouxe aquela coisinha chamada popularidade. Desde que se transformou na nova Reyna e passou a namorar com Jason, as pessoas repararam nela. Todos em Ithaca High tinham uma opinião sobre a garota, mesmo que ela não tivesse tentado chamar a atenção. Metade das garotas queriam ser ela, a outra metade odiava-a com todas as suas forças por ser a “rainha” de Ithaca, e todos os garotos desejavam a garota e invejavam Jason por tê-la.

Obviamente, em Storm Hills, cuidar da vida alheia é um dos passatempos favoritos dos habitantes, e por isso todos estes também tinham uma opinião sobre Reyna. Alguns consideravam normal sua mudança radical, alegando que eram apenas coisas de adolescente, mas a maioria reprovava suas atitudes. Mães e pais morriam de medo que suas filhas seguissem os passos da moça, ou que seus filhos resolvessem se envolver com “aquelazinha”.

Assim que pisou dentro do terreno de Ithaca, todos se voltaram para a morena. Ela devolvia certos olhares, mas apenas seguiu seu caminho, indo diretamente até a grande árvore ao lado da entrada, com passos firmes, costas eretas e um olhar sério e desafiador. Chegando lá, deu de cara com quem esperava. O grupo se concentrava ali todas as manhãs, antes da aula começar.

– Oi, vadia. – Hazel disse, tirando o cigarro da boca e o segurando entre os dedos finos. Deu um sorrisinho enquanto soltava a fumaça pelos lábios, com as pernas cruzadas e o cotovelo apoiado no joelho. Reyna sorriu para os amigos e se sentou ao lado de Jason. O loiro passou um braço pelos ombros da namorada e virou o rosto para ela, trocando um longo beijo. Hazel revirou os olhos. – Ugh. Vocês me dão nojo.

– Podemos chamar o Zhang para você, H. – Will riu alto, mostrando todos os dentes brancos. Os amigos o acompanharam e Hazel fechou a cara.

– E você pode calar a boca, Solace. – ela disse, o fuzilando com os olhos. – Não é como se eu fosse querer nada com ele, de qualquer jeito. A culpa não é minha. – deu de ombros.

O grupo restrito continuou conversando até que ouviram o barulho irritante que indicava o início das aulas. A massa de estudantes que estavam no pátio permitiu que eles passassem à sua frente, liderando a procissão de alunos. Jason andava com o braço pelos ombros de Reyna. Sabia o quanto causava inveja nos garotos por ter a caçula dos Ramírez como namorada.

– Eu já disse o quanto você fica gostosa com essa blusa preta? – ele sussurrou ao pé do ouvido dela.

A morena o encarou com um sorriso malicioso brincando em seus lábios. Se aproximou do rosto do namorado e disse um “já”, para logo após morder o lábio inferior dele. Jason riu de leve e eles entraram na sala de aula.

xx

Leo aproveitava o almoço sentado ao pé de uma das árvores do extenso jardim de Ithaca. Ainda tinha muito tempo até as aulas recomeçarem, e ele já tinha comido no refeitório. Suspirou e abriu sua mochila, retirando seu caderno e um lápis. Começou a rabiscar qualquer coisa, qualquer palavra ou imagem. O local estava silencioso, e ninguém apareceu por ali. Por um tempo.

– Eu não acredito que você fez isso, Jason. – a voz de Reyna Ramírez soou pelos jardins e Leo parou de súbito e escutou. Sentia seu coração batendo duas vezes mais rápido.

– Mas eu não fiz nada, Rey. – Grace disse. Eles estavam alguns metros atrás da árvore em que Leo se encontrava e não pareceram perceber a presença do garoto.

– Você mandou o professor Octavian ir se foder, Jason. – ela o olhou, séria.

– Ah, isso. – ele deu um sorrisinho. – sim. Ele ficou lá com aquela cara ridícula dele, se achando o máximo e ainda me mandou ficar quieto, Reyna.

– Não me venha com explicações. Você sabe que o Octavian te odeia por causa do seu pai. Você também sabe que não está nada bem na maioria das matérias, e eu não quero que meu namorado faça a droga do terceiro ano de novo. Então, manera nessas suas besteiras porque se você acabar precisando de nota no final do ano, o Octavian não vai te ajudar em nada.

– Eu…

– Você, nada. Vai me escutar e vai parar de ser tão infantil. A gente pode até ser a galera popular, mas não mandamos nos professores, na direção, e não temos influência sobre eles.

– Você tem… – ele resmungou.

– Posso até ter, mas não pretendo usar ela. Muito menos pra salvar você das suas bobagens. Para de tentar ser tão superior e pensa um pouco sobre as suas atitudes, Jason.

E ela foi embora, deixando o loiro para trás. Ele ainda estava meio atordoado, porque não esperava por isso. Foi algo pequeno, e Reyna fez com que fosse enorme. Jay não estava ligando para nada da escola, e mesmo tendo sido um pouco abalado pelas palavras da namorada, não seria tão cedo que mudaria seus pensamentos por completo. Rumou até o prédio e entrou novamente.

Leo assimilava o que tinha ouvido enquanto voltava até o prédio no horário das aulas. Jason com notas ruins, problemas com o professor Octavian, alguma história com o senhor Grace, Reyna preocupada…

– Droga, finalmente te achei. – alguém disse e puxou o ombro de Valdez para trás, fazendo ele se virar. Deu de cara com um garoto um pouco mais alto que ele, de cabelos e olhos negros e pele pálida. Vestia, em sua maioria, roupas pretas, mas era mais discreto do que o grupo de Reyna. – onde você se meteu?

– Fiquei lá nos jardins depois do almoço. – Leo revirou os olhos. – eu falei que estaria lá, mas você estava ocupado demais conversando com Annie e olhando para…

– Tá, tá bom. Já entendi. – Nico revirou os olhos. – você não pode sair falando essas coisas no meio do corredor, Valdez. E se alguém escuta?

– Ok. Desculpa. – os dois entraram na sala e se sentaram mais ou menos no meio. Cinco minutos depois, Annabeth entrou na sala, conversando com Travis. Ela se sentou na classe à frente de Leo, junto com o Stoll mais velho.

– … E o professor Quíron me disse que eles vão abrir algumas disciplinas extras para as garotas, o que me deixou bem empolgada. Quer dizer, acho ridículo esse machismo todo, e não permitirem que façamos certas coisas. – ela terminou o que estava dizendo e sorriu para os amigos. Leo piscou para ela como um cumprimento, e eles ouviram a professora entrar na sala. Só que não era a professora de História, e sim…

– Pai? – a loira disse, um pouco alto demais. Todos olharam da garota para o homem à frente da turma, e ele sorriu para ela. Annabeth arregalou os olhos e suspirou, exasperada.

– Bom dia, classe. Sou o professor Frederick Chase, e vou substituir a professora de vocês por algum tempo. Sim, para quem esteja se perguntando, sou pai da Annabeth, mas certamente não devem ligar para esse fato.

Leo quase riu da expressão da amiga, mas sabia que estaria do mesmo jeito se isso acontecesse com ele. A aula se seguiu normalmente, apesar de o humor de Annabeth ter caído drasticamente depois dos períodos de História.

– Quero dizer, ele podia ter me contado que ia lecionar para nós, e eu não estaria assim agora. - ela resmungou. A loira e Valdez moravam muito perto, e estavam seguindo até suas casas, a pé, quando Leo olhou para seu relógio, arregalou os olhos, puxou-a para trás de uma árvore e esperou. Ela revirou os olhos. – lá vamos nós de novo…

Cerca de cinco segundos depois, um carro parou na frente da casa dos Ramírez. Leo assistiu Jason e Reyna se despedirem calorosamente - o que não o deixou muito feliz - e depois viu-o arrancar e Reyna entrar em sua casa, concentrada no molho de chaves em sua mão. O moreno suspirou, e Annabeth o encarou.

– Ah, qual é, Leo. Faz muito tempo.

– É, eu sei. - ele disse. E realmente fazia. Muito tempo.