Realeza em tanto

Capítulo 40


A dor de cabeça era horrível. Parecia que tinha batido contra algo. Tentei abrir os olhos mas uma forte luz apareceu à minha frente fazendo-me fechá-los novamente.

—Então a princesinha não quer acordar?

Aquela voz…eu conhecia aquela voz. Eu sabia a quem pertencia.

Comecei a lembrar-me dos últimos instantes em que estava acordada. Eu estava no quarto à espera do Ethan. Era ele que me ia levar ao altar. Mas ele estava atrasado. Lembro-me que ia reclamar com ele por causa desse atraso. E…depois alguém bateu à porta. Mas a pessoa em questão não era o Ethan. Não! Era alguém que eu não esperava ver ali. E depois essa pessoa atacou-me.

Tentei levantar-me mas as minhas mãos e pés estavam amarrados à cadeira.

—Não vale a pena.

Finalmente abri os olhos e encarei-a. À minha frente encontrava-se a princesa Eva.

—O que…o que… - comecei. Mas eu não sabia o que dizer. Eu estava demasiado chocada com a pessoa que estava à minha frente. Fora ela que me fizera desmaiar. Fora ela que me prendera aqui. A última pessoa que eu imaginaria que faria isto estava à minha frente com uma pistola apontada a mim.

—O que…o que… - imitou-me a princesa Eva – Escusas de gaguejar querida.

—Como é que é possível? Você é princesa! – consegui dizer.

—E o que é que isso me impede de fazer o que estou a fazer? Aliás, isso só me ia incentivar ainda mais. Uma princesa como eu ser trocada por uma cabra como tu. Onde é que isto já se viu? É ridículo! RIDÍCULO!

—Não é ridículo quando as pessoas gostam uma da outra. – respondi – Eu sei que está furiosa por o Killian a ter abandonado no dia do casamento, mas tem que compreender que nós nos apaixonamos. Nós não queríamos que sofresse.

Sem mais nem menos, a princesa começou a gargalhar. Parecia até que eu tinha dito algum tipo de piada. Olhei para ela sem entender nada. Ela estava a começar a enervar-me.

—A sério? A sério que tu ainda não percebeste? – continuei a olhar para ela sem entender – Eu nunca gostei do Killian, querida. Aquilo era tudo uma farsa. A única coisa que me interessada era o poder. Lusitana é uma potência mundial. Juntando-a a Galiza, seríamos um império invencível. Mas claro que tinhas de aparecer para estragar tudo!

Eu olhava para ela cada vez mais chocada. A princesa Eva, doce, simpática, querida por todos afinal era uma total farsa. Uma identidade criada pela verdadeira princesa para se fazer passar por querida entre todos. Com o objetivo de fazer o Killian se apaixonar por ela. Com o objetivo de ganhar Lusitana.

—Eu estava prometida ao Killian há muito tempo. Os nossos pais tinham feito esse acordo há muito tempo. Quando o meu pai me disse que finalmente ia conhecer o Killian, eu fiquei radiante. Não porque estava completamente apaixonada por ele, ainda nem o conhecia, mas sim porque assim ficava mais próxima do meu objetivo. Quanto mais cedo o conhecesse, mais rápido seria o casamento. No dia em que aqui cheguei, o Killian foi um cavalheiro. Admito, podia habituar-me a ele facilmente. Um doce de pessoa. Mas bastou um dia ou dois para perceber que alguma coisa estava errada. Se há coisa que eu não sou é ser burra. E rapidamente descobri. O Killian é completamente transparente. Finalmente percebi porquê que ele andava sempre tão distraído. Era por tua causa. – acusou a princesa Eva apontando para mim – Claro que, apesar de ele andar assim, eu não estava muito preocupada, afinal tu eras uma criada. Mas tudo mudou numa noite em que vocês se encontraram. Na noite em que o Killian te disse que estava a planear deixar-me para ficar contigo. Na noite em que ele te disse que seria complicado, mas conseguiria porque estava completamente apaixonado por ti.

Olhei para ela ainda mais chocada. Eu lembrava-me daquela noite. Lembrava-me perfeitamente daquela conversa. A única coisa que eu não sabia era que eu e o Killian não estávamos sozinhos.

—Foste tu que… - comecei lembrando-me do que aconteceu na manhã seguinte.

—Sim, fui eu que fiz com que a Rainha Isabella aparecesse lá na manhã seguinte. – completou a princesa Eva – Como te disse, tu estavas a roubar-me o meu futuro marido. Eu tinha de fazer alguma coisa. Não era uma simples criada que ia acabar com o meu objetivo. Mas infelizmente não deu certo. A Rainha acabou por encontrar o Killian sozinho. Vocês conseguiram livrar-se, daquela vez. Mas eu não ia desistir. Não! Logo quando estava tão perto do meu objetivo. O meu próximo passo foi encontrar alguém que realmente te odiasse dentro do castelo. Toda a gente tem o seu ódio de estimação e tu não serias diferente. E foi aí que conheci a Alison. Uma pessoa cheia de ódio contra ti. A pessoa ideal para te fazer ir embora e eu ter o caminho livre até ao príncipe. Contei-lhe que tu e o Killian estavam a ter um caso. Ela não queria acreditar. Pobre coitada. A verdade é que as sonsas como tu conseguem enganar muito bem as outras pessoas. Mas eu consegui convencê-la que era tudo verdade. E consegui convencê-la a ajudar-me. Na realidade não foi muito difícil. Bastou mencionar que seria a vingança perfeita contra ti e acenar um monte de notas que ela aceitou logo. A partir daí só tive que esperar. Até ao dia em que a Alison apareceu nos meus aposentos e mostrou-me provas de vocês os dois. Estava ali a prova. A prova que a Rainha precisava para vos separar. Com sorte, tu eras condenada a pena de morte e aí nunca mais teria de me preocupar contigo. Mas não tive sorte nisso. Naquela mesma noite fiz com que a Alison fosse mostrar à Rainha as provas que tinha. Não poderia ser eu a fazê-lo pois corria o risco de o Killian saber que tinha sido eu a separá-lo do seu amor e corria o risco do casamento não ocorrer. Assim, a Alison ficou com as culpas por mim e todos ficamos a ganhar. Eu continuei a ser a inocente naquela história. Para o Killian, eu era um anjo. Mas claro que tu tinhas de estragar isto tudo. Claro que tu tinhas de ir parar ao hospital logo no dia do casamento. Não conseguias ter esperado mais um dia. Tu estragaste tudo. Estragaste-me completamente a vida. – a princesa Eva gritou a última frase, assustando-me.

—A vida não é só poder, princesa. Existe o amor. O amor é a arma mais poderosa de todas. Você ainda vai a tempo de encontrar um amor, princesa Eva. – disse tentando fazer com que ela me soltasse. Em resposta, recebi um sorriso maquiavélico.

—Nada é mais importante que conseguir a coroa de Lusitana. – respondeu – A única coisa que me está a separar do meu objetivo és tu. Mas eu tenho solução para esse problema. A única coisa que falta é tu desapareceres. Depois, eu vou muito desesperada ter com o Killian e digo que te encontrei morta. Nunca ninguém vai desconfiar de mim. Aos olhos das pessoas, eu sou demasiado inocente para fazer seja o que for. Depois de um tempo lá conseguirei casar com o Killian. A única coisa que eu preciso é ter paciência.

—Só tenho a dizer que tenho pena dos seus pais. Eles criaram um monstro. Eu não percebo como é que eles conseguiram criar um monstro.

Quando dei conta, já a princesa Eva me tinha dado um estalo. Um estalo bem forte. A minha face ardia e devia estar completamente vermelha, mas eu não dei parte fraca. Eu tinha de conseguir sair dali. Pelo meu bebé. Por Killian. Voltei a encará-la e sorri.

—A perder o controlo? – perguntei sarcasticamente.

—Está calada. – gritou agarrando-me no cabelo e colocando uma faca encostada ao meu pescoço. Arfei – Agora já não dizes nada, sua cabra? Pelos vistos a sonsinha perdeu a fala e o sorriso. – respondeu a princesa Eva no mesmo tom que eu utilizei.

Eu não sabia o que fazer. Realmente tê-la feito perder o controlo foi a pior coisa que fiz. Eu já sabia que a ideia dela era matar-me para ficar com o Killian. Mas talvez eu tenha acelerado esse momento.

A minha atenção prendeu-se com uma sombra que passou praticamente à minha frente. O meu coração começou a bater descompassadamente. Será que estava ali alguém? Será que era o Killian?

A princesa não reagiu. Possivelmente não vira a sombra. Também existia a possibilidade de o cansaço me estar a fazer ver coisas.

A princesa Eva afastou-se de mim com a faca na sua mão direita. Aproximou-se de um pequeno cantil que estava encostado na parede e pegou nele. Depois tudo aconteceu muito depressa. Num momento o cantil estava na mão da princesa e no outro já ele estava no meio do chão. Ethan agarrava a princesa Eva. Esta tentava lutar mas Ethan era mais forte. Outro guarda segurava na faca que há momentos a princesa tinha encostado ao meu pescoço. E por fim, vi Killian. Ele acabara de entrar na cela subterrânea e correu até mim.

—Alexia. – disse ofegante ao chegar perto de mim – Eu pensei que te ia perder. Eu pensei que vos ia perder.

—Não te vais ver livre de mim assim tão facilmente. – consegui dizer tentando aliviar o momento. O meu coração continuava a bater a mil.

—Não brinques, Alexia. Vocês podiam ter morrido. O que é que eu iria fazer sem vocês as duas? – perguntou Killian encarando-me.

—Segundo a princesa Eva irias casar com ela. – respondi amargamente.

—Quem diria, não é? Afinal a doce Eva era um monstro. – comentou Killian.

—Como é que deram comigo? – perguntei curiosa.

—Foi a Selena que se lembrou deste sítio. Também ela foi presa aqui pelo Philip. Foi um palpite. E ainda bem que deu tudo certo. – disse Killian. Eu apenas concordei.

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Depois de me terem tirado as cordas de volta das mãos e dos pés, Ethan e Killian acompanharam-me até ao meu quarto.

Todos estavam presentes. A minha mãe, os meus irmãos, Selena, o príncipe Adam, Malia, Freya, Arthur. Pela primeira vez, senti que aquele quarto era pequeno.

—Querida, estava tão preocupada. – disse a minha mãe chegando perto de mim mal pus o pé no quarto.

—Maryanne, ela precisa de se deitar. – disse Killian tentando abrir caminho até à cama.

—Eu estou bem, Killian. Eu não preciso de descansar. Killian, o casamento. – disse voltando-me para ele. Todos os que estavam no quarto calaram-se. De certeza achavam que eu estava louca.

—Alexia, tu precisas de descansar. Esquece o casamento. O importante é a tua saúde. – disse Killian tentando convencer-me a deitar-me na cama.

—Eu estou perfeitamente bem. A sério que estou. – confirmei vendo a cara de descrença de todas as pessoas ali presentes – Eu quero casar-me. Eu quero casar-me agora. Não amanhã. Nem depois. Nem daqui a uma semana. Eu quero agora, Killian. Eu quero tornar-me tua mulher hoje.

—Mas… - começou Killian mas foi interrompido por Malia.

—Numa hora consigo pô-la totalmente pronta. Um bocado menos com ajuda. – completou ao olhar para Freya, para a minha mãe e para Selena.

—Ajuda não faltará. – respondeu Freya.

—Mas ela não está em condições. – continuou a insistir Killian.

—Quem te ouvir falar até parece que não te queres casar comigo. – brinquei.

—Não digas isso nem a brincar. Eu só estou preocupado com a tua saúde.

—Eu já disse que estou bem. – respondi tentando convencê-lo.

—Porque não chamamos o doutor Granger? – sugeriu Selena Ele saberá dizer que ela está perfeitamente bem. E aí vocês já se podem casar. Um casamento à luz da lua e das estrelas. Dá para ser mais romântico? – disse Selena, sonhadora.

Killian, para minha alegria, concordou. Eu sabia que ele estava preocupado comigo, mas eu realmente estava bem. E ainda ficaria melhor quando tivesse um anel no dedo.

Não demorou muito para que o doutor Granger confirmasse aquilo que eu já sabia. Eu estava completamente bem. O bebé estava completamente bem. Tudo estava bem.

O vestido estava praticamente bom. O grande problema dele eram as pontas. Mas isso não demorou a deixar de ser um problema. Freya decidiu que o ideal seria cortá-las. O vestido era comprido por isso um bocado a menos ninguém daria conta.

Malia tratou-me do cabelo enquanto a minha mãe tratava das minhas unhas e Selena de retocar a maquilhagem.

Tal como a Malia tinha dito, eu fiquei pronta num instante. Selena saiu para avisar o irmão de que eu já estava completamente pronta e que finalmente poderíamos começar o casamento que já estava atrasado umas boas horas.

Ethan desta vez esperara à porta. Segundo ele, não poderíamos correr riscos e a única forma de isso acontecer era sempre ter alguém comigo. Eu disse várias vezes que não era preciso, mas o lado protetor de Ethan falou mais alto.

Entrelacei o meu braço no de Ethan e juntos seguimos até ao exterior do palácio, onde se realizaria o casamento.

O seu estava completamente limpo. Dava para ver cada constelação. A lua estava cheia. Completamente brilhante. Apenas ela bastava para iluminar todo o jardim.

Comecei a avistar algumas cabeças. Todas as atenções estavam voltadas para mim. Confesso que o meu coração voltou a bater como há algumas horas atrás. Confesso que pensei que isto poderia ser um erro. Mas, mal vi o Killian, tudo isto passou. Todas as inseguranças que passaram pela minha cabeça nestes segundos, evaporaram-se da mesma forma que apareceram.

Esqueci completamente as pessoas à minha volta. Era como se só estivesse eu e o Killian. Só nós os dois. No dia mais feliz das nossas vidas.

O padre iniciou a cerimónia. Várias coisas foram faladas, mas tenho de confessar que não ouvi algumas coisas. A minha atenção estava em Killian. Assim como a atenção de Killian estava completamente em mim.

—Alexia Viviane Jones Gomez aceita Killian Danvers Price como seu futuro esposo? – perguntou o padre dirigindo-se a mim.

—Aceito. – respondi.

—Killian Danvers Price aceita Alexia Viviane Jones Gomez como sua futura esposa?

—Aceito. – respondeu.

—Pode beijar a noiva.

Killian aproximou-se de mim e deu-me o beijo mais calmo de sempre. Um leve beijo que transmitiu todos os sentimentos ali presentes.

Maria aproximou-se de nós com as alianças. Killian pegou na minha e segurou a minha mão esquerda.

—Alexia tenho de admitir que me apaixonei por ti mal te vi. A forma inocente e preocupada que tiveste quando me viste pela primeira vez foi o fósforo para o início da minha paixão. Houve mal entendidos. Muitos mal entendidos para falar a verdade. Mas esses mal entendidos só fizeram com que me apaixonasse mais por ti a cada dia. Cada gesto, cada impulso, tudo isso serviu para te amar mais. Para te amar não até que a morte nos separe mas sim para toda a eternidade. Porque o nosso amor é eterno. – terminou Killian colocando a aliança no meu dedo.

Peguei na aliança de Killian e segurei na sua mão esquerda.

—Killian, tu não imaginas como eu fiquei nervosa naquele dia. Tinha acabado de chegar, pronta para trabalhar e corri o risco de ser despedida logo no primeiro dia. Aí recebi o teu primeiro gesto de bondade. Fizeste-me prometer que não voltasse a andar sozinha à noite pelos corredores do palácio a menos que estivesse em trabalho. Ambos sabemos que eu quebrei essa promessa a teu pedido inocente. Lembro-me que naquela noite contei que te tinha achado muito simpático. Aquilo foi apenas o início de uma linda história de amor. Até confessar para mim mesma que estava apaixonada por ti demorou um bocado. Não por falta de avisos. Esses estavam lá presentes em todos os momentos. Mas sim por medo de sofrer. A melhor coisa que eu fiz foi ter admitido este amor que sinto por ti. Amarei-te hoje, amanhã e para todo o sempre. Para toda a eternidade. – concluí colocando a aliança no dedo de Killian.

Killian voltou a beijar-me. O amor continuava ali presente. E sempre continuaria. Agora estava tudo bem.