Rainbow War

A volta dos que não foram


Dentro da casa, nos deparamos diante de uma sala cheia de plantas e bichinhos que viviam em plantas. A casa mais parecia um viveiro de biologia do que uma casa mesmo, mas ignoramos esse fato e continuamos a nos locomover em direção à cozinha, em busca de um almoço. Eu devia ter lanchado melhor quando sai da escola, porque eu detesto comida vegetariana (eu já suspeitava que ela não comia carne).

Entretanto a mesa estava composta organizadamente com um verdadeiro banquete, não só de saladas, mas de arroz maria-isabel, filé de peixe frito, vinagrete e sucos diversos. Tive de tirar o chapéu, pois a culinária dos meus amigos estava realmente me engordando.

– E então? O que eu posso fazer por vocês? – perguntou ela sorrindo com sinceridade.

Fiquei um pouco atônito com a facilidade com que ela recebia estranhos em sua casa e perguntava o que poderia fazer para ajudá-los, sem se importar com o risco que corria. Felizmente Kahel tomou a dianteira.

– Bem, Tatiana…

– Pode me chamar de Tati.

– Sim. Bem, Tati… nós viemos aqui por uma razão um pouco perturbadora e acho que você não vai nos levar a sério logo de cara, mas podemos provar pra você a maior parte do que vamos te contar.

E ela continuou ouvindo atentamente.

– Nós três somos aliens, e você também é uma.

E ele desfiou o mesmo rosário de explicações que desfiou pra mim e pra Romolo, e explicou um pouco sobre Darkshadow e suas intenções malignas também, e mais tarde finalizou o discurso com um “precisamos muito de você e da sua ajuda” bem enfático! Mantive-me calado, juntamente com Romolo para ver as reações dela, e fiquei surpreso ao constatar que quando terminei (pela terceira vez), ela ainda sorria e não tinha surtado como eu. Mas seu sorriso parecia triste agora, como se lembrasse de algo desagradável.

– Eu sempre soube que era uma garota diferente, mas mesmo assim… Eu nunca poderia imaginar que fosse uma alien. Eu sou muito sensível com energias, sabem? Posso sentir quando a sua energia está positiva e quando ela está negativa. As vezes, posso manipular a energia presente no universo da maneira como eu quero, sabem? Serve muito bem pra curar as pessoas.

Eu fiquei um pouco confuso com essa historia e energia, mas depois de ver Kahel amolecendo e endurecendo o chão, e de Romolo criando e controlando ouro, de repente a manipulação de energia não parecia assim tão impossível.

– Você poderia nos dar uma demonstração do seu poder? – perguntou Romolo, se inclinando um pouco pra frente a fim de olhar bem fundo nos olhos dela.

– É claro – disse ela, como se ele tivesse pedido um copo d’água.

Ela se levantou da mesa e foi até os fundos da casa, e não demorou muito e voltou com alguma coisa nos braços, e me dei conta de que era um vasinho com uma pimenteira seca, mais tão seca que me perguntei porque ela ainda guardava um cadáver como aquele dentro de casa. Sorte era que esse tipo de cadáver não fedia. Mas ela não parecia achar que a planta estivesse morta, ao contrario, ela a abraçava como quem abraça uma pessoa doente e muito fraca e pude ver as folhas da planta se tornar mais vivas, se levantarem um pouco do tumulo.

– Eu não quero que fiquem assustados com o que vão ver e se possível, gostaria que poucas pessoas soubessem disso tudo bem? Geralmente não mostro tanto do meu poder pra que eu não conheço.

Ela começou a passar o dedo com carinho na planta, e a mesma assumiu um tom mais verde e mais bonito. A cada passada de dedo pelas folhas da planta fazia parecer que ela estava literalmente ressuscitando dos mortos e se tornando jovem e forte outra vez, como se na verdade a vida estivesse sendo inchada dentro dela. Fiquei totalmente passado ao constatar que o que me aparecera como um cadáver vegetal agora era um espécime lindo, com pimentas vermelhas e suculentas de dar água na boca. Na verdade, ela teria feito mais pela planta, mas se interrompeu aos risos quando olhou pra mim e pra poça de baba que era o meu prato.

– Desculpe – murmurei completamente vermelho de vergonha.

– Não tem importância. Mas se vocês não se importam, eu gostaria também de ver o que vocês podem fazer, sabe? Só por curiosidade.

Nem precisou dizer duas vezes. Qualquer coisa pra me livrar da imagem da baba escorrendo pela minha boca e fazendo um oceano no prato a minha frente. Dei um pouco de espaço de qualquer coisa que pudesse morrer com o contato com o fogo, ou seja, fui pro quintal. E uma vez lá, não economizei nas lembranças mais fortes que tinha do fogo que se alastrava pelo meu corpo e se concentrava nas minhas costas. Quente. Quente como só eu poderia sentir, libertei as minhas asas e fiquei muito satisfeito de poder dizer subi uns 40 cm do chão quando bati com elas.

– Nossa! Que lindo, você parece uma fênix! – disse ela com um misto de assombro e deslumbre.

Romolo também não deixou pra trás e surpreendeu geral quando deu um pulo e uma chapa de ouro se materializou do nada e o sustentou em pleno ar no mesmo nível dos 40 cm que eu. E de mais a mais, ele fez com que correntes de ouro brotassem do chão e dançassem ao redor dele com uma coreografia muito bem ensaiada e depois se desfizessem em um pó dourado que espiralou e desapareceu. Kahel, realmente fez uma apresentação bem mais sóbria do que todos nós: deu alguns pulos no chão e fez com que a terra ondulasse como uma cama elástica e modelou incríveis esculturas de terra mole, para endurecê-las até mais do que diamante. Em suma, nós três demos um show que fez Tati amar o fato de estar com a gente nessa batalha.

– Nossa! Vocês são muito legais com esses poderes. Eu amei conhecer vocês, e vou entrar nessa equipe pra acabar com o Darkshadow, seja lá quem for ele! – disse ela com um sorriso de determinação poderoso.

– Pense bem Tati. Qualquer ato impensado agora fará com que você saia muito machucada no futuro – disse uma voz potente, soberana, feita de morte liquida, que arrepiou até o mais ínfimo fio de cabelo do meu ser – Ah, meus caros zérois. Eu não vou mentir que já estava ficando com saudade de vocês. É um enorme desprazer rever os rostos vivos e ouvir suas respirações.

– E eu não vou mentir que desejei ardentemente esse reencontro pra poder socar a sua cara de novo! – procurei feito um louco, mas não consegui encontrá-lo. Eu precisava acertar as contas com ele, e precisava tirar a Tati dali o quanto antes.

– O quê que é isso? Eu nunca senti uma energia como essa antes! Quem está aí? Que voz é essa? – perguntou Tati completamente apavorada.

– A voz das trevas! – Darkshadow finalmente mostrou a cara, mas não se sabe como, ele saiu de trás da Tati e apenas segurou delicadamente seus braços, mas deve ter sido realmente apavorante pra ela.

O grito pavoroso dela, varreu o espaço e o tempo de uma maneira de dilacerar a coragem de todos os que tivessem peito pra enfrentar aquele monstro. Eu mesmo já estava morto de medo, e não conseguia mover um músculo sequer. Minhas asas tinham ficado reduzidas a duas chamas de palito de fósforo no meio da ventania, e tinha certeza que os outros não estavam em melhor estado. E como pra dar a certeza de que as coisas ainda poderiam piorar um pouco mais, o tempo começou a escurecer. Tipo, fazia um dia de sol absoluto, sem muitas nuvens no céu e agora, o sol parecia estar enfraquecendo e ficando cada vez mais pálido, e frio, muito frio mesmo.

Não reparei quando o grito dela acabou, eu estava muito ocupado vendo-a desmaiar nos braços daquele psicopata, e ele sussurrar algumas palavras que não consegui ouvir direito no ouvido dela. Que ódio de mim mesmo! Por que eu não conseguia mover a porra de um músculo sequer?! O que ele tinha feito com ela?!